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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ – UECE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE - CCS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA
SARAH VIEIRA FIGUEIREDO
CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM MIELOMENINGOCELE:
DIREITOS, ACESSO EM SAÚDE E COTIDIANO
FORTALEZA
2014
SARAH VIEIRA FIGUEIREDO
CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM MIELOMENINGOCELE:
DIREITOS, ACESSO EM SAÚDE E COTIDIANO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva da
Universidade Estadual do Ceará, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Saúde Coletiva, Área de
concentração: Saúde e Sociedade.
Orientadora: Profa. Dra. Ilvana Lima Verde Gomes
FORTALEZA
2014
Dedicatória
A Deus, meu criador, supremo Senhor e
salvador da minha vida.
Aos meus pais, José Amaro eAuxiliadora,
e aos meus irmãos, por todo apoio e carinho.
A minha irmã Juliana, por todo suporte e
orientação imprescindíveis.
As crianças e aos adolescentes com
necessidades especiais de saúde e suas
famílias.
Agradecimentos
Agradeço de forma plena a minha professora orientadora Ilvana, por toda a sua
dedicação e apoio, por ter de fato me orientado durante toda a elaboração dessa dissertação.
Muito obrigada por todas as instruções e tempo gasto para que esse trabalho pudesse ser
concluído.
Agradeço a bolsista de Iniciação Científica Ana Carla, que contribuiu
significativamente para a coleta de dados dessa pesquisa. Muito Obrigada pela ajuda!
Agradeço também a todos os docentes do Programa de Pós-Graduação em Saúde
Coletiva da Universidade Estadual do Ceará, que contribuíram consideravelmente para a minha
formação como mestre e desenvolvimento dessa dissertação.
Agradeço ainda ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPQ), por ter apoiado financeiramente essa pesquisa, através de uma bolsa de iniciação
científica.
Agradeço, por fim, ao hospital de referência pediátrica do Ceará que permitiu o
desenvolvimento da pesquisa nessa isntituição, bem como a todos os familiares de crianças e
adolescentes com mielomeningocele por terem acreditado na proposta desse estudo e terem
aceitado participar da pesquisa.
“Confie no Senhor de todo o seu coração e
não se apóie na sua própria capacidade e
entendimento; lembre-se de colocar Deus em
primeiro lugar, em todos os seus caminhos, e
ele guiará os seus passos, e você andará pelo
caminho certo.”
Pr 3:5-6
RESUMO
As crianças e os adolescentes com necessidades especiais de saúde são aqueles que
apresentam riscos maiores de possuírem condições físicas, de comportamento ou
desenvolvimento crônicas, representando um novo perfil de usuários com demandas
diversificadas em saúde. Nesse sentido, destaca-se a mielomeningocele, malformação
congênita que gera deficiências físicas e/ou cognitivas, sendo considerada relevante problema
de saúde pública, por repercutir na vida dos indivíduos que a possuem, bem como de sua
família e sociedade em geral, além de demandar um tratamento ininterrupto e cuidado
profissional prolongado. Desse modo, objetivou-se compreender o cotidiano de crianças e
adolescentes com mielomeningocele e suas famílias; compreender as experiências de acesso
de crianças e adolescentes com mielomeningocele na rede de atenção à saúde; analisar,
através da experiência de familiares, os direitos existentes nas Políticas Públicas de Saúde do
Brasil implementados na atenção as crianças e aos adolescentes com mielomeningocele; e
analisar o conhecimento das famílias sobre os direitos em saúde dessas crianças e desses
adolescentes. Trata-se de um estudo qualitativo, desenvolvido com 15 familiares, em hospital
de referência pediátrica do Ceará, após aprovação no Comitê de Ética e Pesquisa dessa
instituição (parecer n°401.189). A coleta de dados ocorreu em setembro de 2013 a fevereiro
de 2014 através de entrevista semi-estruturada e observação sistemática. Os achados foram
analisados através da Análise Categorial Temática de Bardin, sendo elencadas as categorias:
O cotidiano de crianças e adolescentes com mielomeningocele e suas famílias; O acesso de
crianças e adolescentes com mielomeningocele na Rede de Atenção à Saúde do SUS; Os
direitos em saúde das crianças e dos adolescentes com mielomeningocele: entraves e avanços.
Os resultados revelaram que as famílias sofrem grandes alterações com a chegada de um novo
membro com necessidades especiais de saúde, sendo que a mãe passa a configurar-se como a
principal cuidadora. Ante as diferentes sequelas decorrentes da mielomeningocele, a criança e
o adolescente dependem de atendimentos contínuos em todos os serviços da Rede de Atenção
à Saúde. Entretanto, a maioria mostrou-se inapropriado fisicamente para receber essas
pessoas, em virtude da ausência de adaptações que possibilitasse o seu acesso, além de
existirem serviços com profissionais pouco capacitados para atender as demandas dessas
pessoas em adoecimento crônico. Destaca-se ainda, a baixa interação existente entre os
serviços da rede, com falhas de referenciamento e os obstáculos no acesso a estes. Quanto aos
direitos, percebeu-se o pouco conhecimento das famílias acerca das políticas públicas de
saúde existentes que poderiam beneficiar seus filhos, em virtude da escassez de orientação, e
os diversos obstáculos enfrentados para conseguirem sua aquisição. Conclui-se que há a
necessidade de reestruturação dos serviço públicos de saúde do Ceará, de forma a sofrerem
adaptações que contribuam para a acessibilidade dos seus usuários, bem como haja uma maior
capacitação dos profissionais de saúde em todos os níveis de atenção, para que estes estejam
aptos a assistir pessoas cronicamente adoecidas. Ademais, destaca-se a necessidade de uma
maior discussão acerca de estratégias para real concretização das políticas públicas, que há
mais de duas décadas visam favorecer pessoas com necessidades especiais de saúde.
Palvras-chave: Meningomielocele. Defesa da criança e do Adolescente. Acesso aos Serviços
de Saúde. Políticas Públicas de Saúde. Assistência Integral à Saúde.
ABSTRACT
Children and adolescents with special health care needs are those who have greater riks of
having physical onditions, of behavior, or development chronic, representing a new profile of
users with diverse health care needs. In this sense, stands out the myelomeningocele,
congenital malformation that causes physical and/or cognitive disabilities, it is considered
relevant public health problem, by impacting the lives of individuals who possess it, as well
as their family and society in general, and demand a uninterrupted treatment and prolonged
professional care. Thus, the objective was understanding the daily life of children and
adolescents with myelomeningocele and their families; understanding the experiences of
access of children and adolescents with myelomeningocele in the health care network;
analyze, through the experience of family members, the existing rights in the Public Health
Policies in Brazil implemented into health care children and adolescents with
myelomeningocele; and analyzing the knowledge of families on health rights of these children
and adolescents. This is a qualitative study, conducted with 15 families in a pediatric
reference hospital in Ceará, after approval by the Ethics and Research Committee of this
institution (No. 401 189). The data was collected in September 2013 to February 2014
through semi-structured interviews and systematic observation. The findings were analyzed
by Categorical Analysis Thematic of Bardin, being listed categories: The daily life of children
and adolescents with myelomeningocele and their families; The access of children and
adolescents with myelomeningocele in Health Care Network of SUS; The health rights of
children and adolescents with myelomeningocele: obstacles and advances. The results
revealed that families undergo large changes with the arrival of a new member with special
health care needs, and the mother started to set yourself up as the main caregiver. Faced with
different sequelae resulting from myelomeningocele, the child and the adolescent depend on
continuous care in all services of the Health Care Network. However, the majority showed up
be physically inappropriate to receive these people, because of the lack of adaptations that
enabled your access, plus there are little services with professionals trained to meet the
demands of those people with chronic illness. We also emphasize, the low interaction between
network services, with referencing failures and obstacles in access to them. As for rights, we
noticed the low knowledge of families about the health policies existing that could benefit
their children, due to the lack of guidance, and the various obstacles facing to get the
acquisition. We conclude there is a need to restructure the public health service of Ceará, in
order to undergo adaptations that contribute to the accessibility of their users, as well as there
is more qualification of health professionals at all levels of care, to they are able to care
chronically sick people. Moreover, we highlight the need for more discussion of strategies for
the real implementation of public policies, which for more than two decades seek to favor
people with special health needs.
Keywords: Meningomyelocele. Child Advocacy. Health Services Accessibility. Health
Public Poliy. Comprehensive Health Care.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Mielomeningocele (Fraga et al., 2010). 19
Quadro 1 Caracterização dos responsáveis. Fortaleza, CE. 2014. 49
Quadro 2 Caracterização das crianças e dos adolescentes. Fortaleza, CE. 2014. 52
Figura 2 Criança com mielomeningocele Dara. Fortaleza, CE. 2014. 55
Figura 3 Criança com mielomeningocele Davi. Fortaleza, CE. 2014. 71
Figura 4 Adolescente com mielomeningocele Zilá. Fortaleza, CE. 2014. 118
LISTA DE ABREVIATURAS
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas
ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária
APS - Associação das Pioneiras Sociais
BPC - Benefício de Prestação Continuada
CADEE - Centro de Apoio e Desenvolvimento de Educação Especial
CER - Centro Especializado em Reabilitação
CIES - Centro de Integração Escola, Saúde e Assistência Social
CONADE - Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência
CVA - Cateterismo Vesical de Alívio
DVP - Derivação Ventricular Peritoneal
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
ECLAMC - Estudo Latino-Americano Colaborativo de Malformações Congênitas
ESF - Estratégia de Saúde da Família
ETUFOR - Empresa de Transporte Urbano de fortaleza
HP - Hospital Pediátrico de Referência
HR - Hospital de Reabilitação de Referência Nacional
INSS - Instituto Nacional do Seguro Social
LILACS - Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde
MEDLINE - Medical Literature Analysis and Retrieval System Online
NAMI - Núcleo de Atenção Médica Integrada
NASF - Núcleo de Apoio à Saúde da Família
NETIIF - Núcleo Especializado em Tratamento Infantil da Incontinência Fecal
NOEL - Núcleo de Orientação e Estimulação ao Lactente
OMS - Organização Mundial de Saúde
PNDH - Programa Nacional de Direitos Humanos
RAS - Rede de Atenção à Saúde
RENAME – Relação Nacional de Medicamentos Essenciais
SAME - Serviço de Arquivo Médico e Estatística
SCIELO - Scientific Electronic Library Online
SNAPU - Secretaria Nacional de Acessibilidade e Programas Urbanos
SUDS - Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS - Sistema Único de Saúde
SVA- Sondagem Vesical de Alívio
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UBS - Unidade Básica de Saúde
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO À TEMÁTICA E AOS OBJETIVOS 13
1.1 Aproximação do pesquisador com o objeto 13
1.2 Contextualização do objeto 13
1.3 Objetivos 19
2 REFERENCIAL TEÓRICO 20
2.1 A fisiopatologia da mielomeningocele e suas implicações 20
2.2 O serviço público de saúde e a criança/adolescente com
mielomeningocele
24
2.3 Políticas Públicas de Saúde no Brasil 30
2.4 Direitos em saúde que beneficiam as crianças e os adolescentes com
mielomeningocele
35
3 METODOLOGIA 44
3.1 Tipo de estudo 44
3.2 Cenário de pesquisa 44
3.3 Participantes da pesquisa 46
3.4 Estratégias e técnicas para a coleta das informações 47
3.5 Estratégia para a análise das informações 49
3.6 Questões éticas da pesquisa 50
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 51
4.1 Caracterização dos participantes, das crianças e dos adolescentes 51
4.2 O cotidiano de crianças e adolescentes com mielomeningocele e suas
famílias
57
4.3 O acesso de crianças e adolescentes com mielomeningocele na Rede de
Atenção à Saúde do SUS
73
4.4 Os direitos em saúde das crianças e dos adolescentes com
mielomeningocele: entraves e avanços
118
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 134
REFERÊNCIAS 138
APÊNDICES 152
APÊNDICE A - Instrumento para coleta de dados - Roteiro de
Entrevista Semi-Estruturada I - Entrevista com o familiar
153
APÊNDICE B - Instrumento para coleta de dados - Roteiro para
Observação Sistemática
155
APÊNDICE C - Termo de consentimento livre e esclarecido –
Familiares
156
APÊNDICE D – Termo de consentimento livre e esclarecido –
Fotografia
157
ANEXOS 158
ANEXO A – Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa 159
ANEXO B – Autorização do chefe do serviço 162
ANEXO C – Declaração de pré-anuência 163
13
1 INTRODUÇÃO À TEMÁTICA E AOS OBJETIVOS
1. 1 Aproximação do pesquisador com o objeto
A partir da vivência em um ambulatório de acompanhamento a crianças e
adolescentes com mielomeningocele, em um hospital escola de referência pediátrica no estado
do Ceará, teve-se uma aproximação com alguns profissionais assistenciais que exercem o
cuidado a esses usuários, havendo a possibilidade de conhecer sua assistência prestada e
experiência cotidiana.
Através da observação da terapêutica fornecida a esses indivíduos e do contato
com a equipe de saúde, que manifestou sua concepção e experiência ao realizar esse cuidado,
revelando alguns desafios que estas crianças e estes adolescentes enfrentam no acesso ao
serviço de saúde, o pesquisador foi impelido acerca do objeto dessa pesquisa, levando-o a
buscar um aprofundamento dessa temática, principalmente após a formulação de alguns
questionamentos sobre o assunto e do reconhecimento das lacunas existentes na literatura.
Outro aspecto que fomentou o interesse por esta temática foi o conhecimento, por
meio de um relato de uma mãe de um adolescente com mielomeningocele, de sua experiência
e dos obstáculos que ela enfrenta junto com o filho no cotidiano, principalmente na busca por
seus direitos e por uma atenção à saúde de qualidade.
Ademais, observou-se que apesar de existirem muitos direitos em favor dos
portadores de deficiência, que incluem as crianças e os adolescentes com mielomeningocele,
não se sabe se de fato estes tem sido implementados. Por outro lado, não foi encontrado na
literatura brasileira nenhum direito específico para essa parcela da população, que apresenta
diversas complicações decorrentes dessa enfermidade.
Conhecer, portanto, a experiência da família é essencial para compreender os
desafios vivenciados no dia a dia, e as necessidades particulares enfrentadas, visando um
aprofundamento da discussão sobre a temática que forneça embasamento para a construção de
uma atenção em saúde que gere mais qualidade de vida para as pessoas com
mielomeningocele e suas famílias.
1. 2 Contextualização do objeto
A mielomeningocele, ou meningomielocele, denominação menos utilizada,
representa um defeito na formação do tubo neural, sendo classificada como um tipo de
14
espinha bífida (defeito congênito que atinge a medula espinhal, bem como as estruturas que a
protegem), onde há exteriorização nervosa e das meninges, e que, consequentemente, gera
sequelas graves nos indivíduos que apresentam essa mal-formação, como complicações
neurológicas, deformidades, déficit de sensibilidade, alterações no trato urinário e no
funcionamento intestinal (SOUZA et al., 2007; CORNEGÉ- BLOKLAND et al., 2011).
No contexto mundial, defeitos no tubo neural têm uma incidência que varia entre
0,79 a 6,39 por mil nascidos vivos. Dentre esses, a mielomeningocele representa
aproximadamente 75% dos casos de espinha bífida, sendo a forma mais grave, em
consequência das sequelas decorrentes da exposição do tecido nervoso (CIPRIANO;
QUEIROZ, 2008; BOWMAN; BOSHNJAKU; MCLONE, 2009).
A segunda edição do Atlas Mundial de Defeitos Congênitos, elaborado pela
Organização Mundial de Saúde (OMS), apresentou dados variáveis de defeitos do tubo neural
para diversos países, no período de 1993 a 1998. No Brasil, as estatísticas foram coletadas em
11 maternidades por meio do Estudo Latino-Americano Colaborativo de Malformações
Congênitas (ECLAMC). Entre os resultados, a OMS revelou que as menores prevalências de
espinha bífida por mil habitantes ocorreram na França/Paris (0,077) e Inglaterra/País de Gales
(0,095), e as maiores no Brasil (1,139), Bulgária (1,152), Venezuela (1,196) e México
(1,525). De acordo com esse estudo, o Brasil encontra-se na quarta posição na prevalência de
espinha bífida entre os países pesquisados (WHO, 2003). Levantamento de 2001 do
ECLAMC mostrou taxa de 3,3 por mil nascidos vivos no Brasil, sendo a maior entre os cinco
países avaliados (CASTILLA et al., 2003).
São escassos na literatura os dados nacionais acerca dessa taxa, existindo apenas
alguns estudos pontuais. Entre esses, um realizado em Minas Gerais revelou prevalência de
4,3:1000 nascimentos, entre 1990-2000, e outro de Recife mostrou taxa de 5:1000, no período
de 2000-2004 (AGUIAR et al., 2003; PACHECO et al., 2006).
A etiologia da mielomeningocele ainda é desconhecida, porém pesquisas têm
sugerido que a causa seja multifatorial, relacionada a aspectos genéticos e ambientais como:
diabetes, obesidade materna, deficiência de zinco, ingestão de álcool durante o primeiro
trimestre gestacional, fatores socioeconômicos, consumo de alimentos contaminados com
inseticidas, uso de anticonvulsivantes e agentes anestésicos, entre outros (BRONZERI et al.,
2011).
Entretanto, destaca-se que a carência do ácido fólico no organismo materno é o
fator de risco mais importante, por estar relacionado com a embriogênese e formação
adequada do tudo neural, sendo imprescindível nesse processo. Portanto, a partir desse
15
conhecimento, o Ministério da Saúde passou a preconizar a administração preventiva de ácido
fólico no período pré-gestacional, especialmente quando as mulheres apresentam antecedentes
desse tipo de malformação, e no período gestacional. Ademais, a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA), considerando a recomendação da Organização Pan-
Americana de Saúde (OPAS), tornou obrigatória a partir de 2004 a fortificação das farinhas
de trigo e milho com 150mcg/100g de ácido fólico (BRASIL, 2006a; SOUSA; BARROS,
2010). Nos Estados Unidos, essa medida levou a uma considerável redução de
aproximadamente 19% na incidência de defeitos no tubo neural, demonstrando a real eficácia
dessa estratégia para a prevenção desses problemas congênitos (SOUSA et al., 2007).
O diagnóstico da mielomeningocele pode ser realizado ainda no período pré-natal
por meio da ultrassonografia, onde é possível a observação do alargamento do canal vertebral,
da dosagem de alfa-fetoproteína e eletrotroforese de acetilcolinesterase no líquido amniótico.
Contudo, no Brasil, a maioria desses exames não é realizada de forma rotineira na atenção
básica de saúde durante o acompanhamento pré-natal. Assim sendo, em alguns estudos
nacionais, uma taxa elevada de gestantes não tiveram o diagnóstico durante o período
gravídico, ou tiveram apenas ao final da gestação (ROCCO; SAITO; FERNANDES, 2007a;
SBRAGIA et al., 2004).
Ressalta-se ainda que apesar da ultrassonografia ser um procedimento
amplamente realizado durante o período gestacional, inclusive na rede pública de saúde, a
identificação da mielomeningocele dependerá de uma série de fatores, entre eles a posição
fetal, a qualidade do aparelho e a experiência do profissional de saúde na realização e
interpretação do exame, fatores que também podem relacionar-se com a frequência de
diagnósticos tardios (HISABA et al., 2003).
Ao nascimento de um neonato com mielomeningocele, a cirurgia é necessária
ainda nos primeiros dias de vida, preferencialmente nas primeiras 24 horas, objetivando a
redução das possíveis sequelas e do agravamento do quadro clínico. Dentre as complicações
mais presentes estão: paralisia de membros inferiores, distúrbios de sensibilidade cutânea,
incontinência urinária e intestinal, deformidades musculoesqueléticas e hidrocefalia.
(MACDONALD; SESHIA; MULLET, 2007; CIPRIANO; QUEIROZ, 2008).
Em virtude dessas sequelas, as crianças e adolescentes com mielomeningocele
irão necessitar de uma maior atenção e cuidado dos seus familiares, além de terem que
enfrentar diversos desafios na realização de suas atividades de vida diárias, devido,
principalmente, aos limites de mobilidade e a presença de incontinência fecal e urinária que
irão requerer a realização de alguns procedimentos domiciliares, como a Sondagem Vesical
16
de Alívio (SVA), e utilização de equipamentos de suporte locomotor (CIPRIANO;
QUEIROZ, 2008; SOUSA; BARROS, 2010).
Ressalta-se também, que além da atenção clínica, reabilitadora e desses cuidados
domiciliares, igualmente devem ser consideradas as necessidades psicossociais das pessoas
com mielomeningocele, como de relacionar-se com outros indivíduos, possuir momentos de
lazer e ter acesso à escola/educação, o que irão demandar tempo e condições financeiras para
a sua concretização.
Desse modo, a mielomeningocele é considerada uma doença crônica e relevante
problema de saúde pública, por repercutir na vida do indivíduo que a possui, bem como de
sua família e sociedade em geral, além de implicar em uma adesão terapêutica de reabilitação
complexa, impondo a necessidade de adaptações, cuidados contínuos pelos familiares e de
serviços de saúde que ofereçam suporte prolongado e de qualidade (GAIVA; NEVES;
SIQUEIRA, 2009).
De acordo com a OMS, as doenças crônicas são as principais causas de mortes e
incapacidades no mundo, sendo definidas como aquelas que possuem longa permanência,
evolução lenta, sendo normalmente recorrentes e que, consequentemente, contribuem para o
sofrimento dos indivíduos, das famílias e da sociedade, requerendo atenção contínua e
esforços de um conjunto de equipamentos e políticas públicas (OMS, 2005). Assim sendo, a
mielomeningocele é considerada uma doença crônica, por demandar um tratamento
ininterrupto, cuidado profissional prolongado e internações frequentes (GAIVA; CORREIA;
SANTO, 2011).
Para que ocorra esse atendimento nos serviços de saúde e seja possível à
realização dos cuidados domiciliares de forma adequada são necessárias Políticas Públicas de
Saúde que forneçam suporte a esses usuários e aos seus familiares. Nesse sentido, efetivou-se
uma busca nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (Scielo), Medical
Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline) e Literatura Latino-americana e do
Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), em março de 2013, realizando-se diversos cruzamentos
com os descritores “Meningomielocele”, “Direitos”, “Espinha Bífida Cística”, “Políticas
Públicas de Saúde”, “Políticas Públicas”, “Acesso aos serviços de Saúde” e “Saúde Pública”,
com o intuito de conhecer essa temática e as discussões já realizadas sobre o assunto. No
entanto, apenas um artigo foi encontrado sobre esse tema, que aborda a acessibilidade a três
benefícios legais dos portadores de deficiência física com mielomeningocele, no município do
Rio de Janeiro (ELIAS; MONTEIRO; CHAVES, 2008). O restante dos artigos resultante
dessas buscas abordavam apenas os aspectos clínicos e fisiopatológicos da mielomeningocele,
17
como o tratamento, a utilização do ácido fólico como medida preventiva, o uso de tecnologia
assistida, além de alguns estudos de prevalência e de associação (MACNEILY; MORRELL;
SECORD, 2005; JOHNSON et al., 2007; WOODHOUSE, 2008; PACHECO et al., 2009;
AU; ASHLEY-KOCH; NORTHRUP, 2010; SWARTWOUT et al., 2010)
Destaca-se ainda, serem escassas no Brasil pesquisas atuais acerca das diversas
questões que envolvem os portadores de mielomeningocele, sendo notória a maior
prevalência de estudos internacionais, que têm buscado aprofundar esse assunto no intuito de
contribuir para essa parcela da população, bem como para a prevenção dessa enfermidade.
Somado a isso está o fato de não haver nenhum estudo que aborde a incidência nacional da
mielomeningocele, sendo as estatísticas existentes muito limitadas a algumas maternidades de
determinadas cidades brasileiras, o que pode dificultar o manejo das ações, serviços e
políticas públicas de saúde na atenção as pessoas com essa patologia.
Justifica-se esse estudo, portanto, devido à lacuna na literatura de novos estudos
que tragam ao debate discussões sobre esse conteúdo, abordando as Políticas Públicas de
Saúde instituídas em favor das pessoas com mielomeningocele e que revelem como tem sido
o funcionamento e o acesso ao serviço público de saúde. Ademais, as complicações
decorrentes dessa patologia trazem múltiplas repercussões na vida da criança, do adolescente
e de suas famílias, sendo imperativa a necessidade de desenvolvimento de novos estudos,
objetivando o aprofundamento não apenas de conhecimentos que abordem os aspectos
clínicos dessa enfermidade, mas que envolvam as diversas dimensões do viver com essa
condição crônica. Desse modo, será possível discutir a criação de cartilhas educativas,
estratégias e políticas que auxiliem essas crianças e suas famílias em suas necessidades de
vida diárias e de saúde (MEDEIROS et al., 2011).
Além disso, existe a necessidade de compreender melhor os direitos em saúde
existentes no Brasil que favoreçam essa parcela da população, como tem sido a experiência da
família na sua obtenção, o acesso aos serviços de saúde, o cotidiano dessas pessoas, bem
como suas necessidades para desenvolverem-se de forma mais saudável e com qualidade de
vida.
Nesse contexto, ressalta-se também que apesar de haverem mais de duas décadas
desde a implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), são escassas as pesquisas acerca
do acesso da população com deficiência ou restrição permanente a este sistema, o que
permitiria a formulação de parâmetros para a construção de um serviço de saúde mais
resolutivo e voltado às necessidades locais da população (AMARAL et al., 2012).
18
O Ministério da Saúde, ao longo dos últimos anos, tem estabelecido algumas leis,
decretos e portarias que favorecem os portadores de algumas doenças crônicas, assegurando-
lhes alguns direitos, como a Osteogênese imperfeita, doenças neuromusculares, Síndrome de
Down, Autismo, entre outras, havendo a necessidade de que essas políticas públicas sejam
avaliadas, visando a sua real implementação, e expandidas para os portadores de outras
necessidades crônicas de saúde, como a mielomeningocele.
A Carta dos Direitos dos Usuários do SUS preconiza, em seu primeiro princípio,
que seja assegurado o direito ao acesso às ações e aos serviços de promoção, proteção e
recuperação da saúde promovidos pelo SUS a todos os cidadãos, implicando o fim das
possíveis barreiras arquitetônicas e de comunicabilidade, oferecendo condições de
atendimento adequadas especialmente as pessoas com deficiências, idosos e gestantes
(BRASIL, 2006b).
Desse modo, alguns questionamentos foram elencados, que procuramos discuti-
los durante a realização dessa pesquisa, entre eles: Como tem sido o cotidiano de crianças e
adolescentes com mielomeningocele e suas famílias? Qual a experiência dessas pessoas
acerca do acesso das crianças e dos adolescentes com mielomeningocele na rede de atenção à
saúde (nos serviços de nível primário, secundário e terciário)? Quais são os direitos existentes
nas Políticas Públicas de Saúde do Brasil e implementados na atenção as crianças e aos
adolescentes com mielomeningocele? Qual tem sido o conhecimento da família desses
usuários acerca dos direitos em saúde dessas crianças/adolescentes?
Nesta perspectiva, elegeu-se como objetos de pesquisa o acesso ao serviço público
de saúde, os direitos em saúde implementados na atenção às crianças e aos adolescentes com
mielomeningocele e o cotidiano dessas crianças, desses adolescentes e de suas famílias.
A partir desta pesquisa será possível à obtenção de subsídios para a apreensão de
novos conhecimentos acerca da atenção em saúde à criança e ao adolescente com
mielomeningocele, e uma melhor compreensão das Políticas Públicas em Saúde existentes e
instituídas na prática para essa parcela da população. Dessa forma, haverá a possibilidade de
uma melhor discussão sobre a temática e posterior aperfeiçoamento e/ou criação de
estratégias que favoreçam a atenção em saúde, a partir de um serviço público que considere o
universo em que esses usuários vivem, com suas particularidades e necessidades cotidianas.
19
1.3 Objetivos
- Compreender o cotidiano de crianças e adolescentes com mielomeningocele e
suas famílias;
- Compreender as experiências de acesso de crianças e adolescentes com
mielomeningocele na rede de atenção à saúde;
- Analisar, através da experiência de familiares, os direitos existentes nas Políticas
Públicas de Saúde do Brasil implementados na atenção as crianças e aos adolescentes com
mielomeningocele;
- Analisar o conhecimento das famílias sobre os direitos em saúde dessas crianças
e desses adolescentes.
20
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 A fisiopatologia da mielomeningocele
Para chegar-se aos objetivos dessa pesquisa, acredita-se ser importante discutir
acerca dos aspectos clínicos inerentes a mielomeningocele, bem como suas sequelas e
consequentes implicações na vida das pessoas que possuem essa patologia, de forma a melhor
compreender-se os fatores referentes ao acesso, o atendimento e os direitos em saúde.
As malformações do tubo neural ocorrem na fase inicial do desenvolvimento fetal,
entre a terceira e quinta semana gestacional, e acometem o arcabouço primitivo do tubo neural
que originará as estruturas do sistema nervoso, como o cérebro e a medula espinhal, e embora
esses comprometimentos sejam passíveis de correção cirúrgica, as lesões nervosas são
permanentes e apresentam diferentes tipos de complicações (SANTOS; PEREIRA, 2007).
Não é prevista na legislação nacional a interrupção médica da gravidez nesses
casos de malformações congênitas, o que fortalece a necessidade de conhecer-se melhor sua
evolução e possíveis aperfeiçoamentos terapêuticos, visando uma reabilitação e tratamento
precoce, que possibilitem uma melhor qualidade de vida para um número significativo de
pessoas (SBRAGIA et al., 2004).
Entre esses defeitos congênitos neuronais, a anencefalia caracteriza-se como a
ausência completa ou parcial do cérebro e da calota craniana, a encefalocele como herniação
do cérebro e/ou meninges por meio de um defeito na calota e a espinha bífida como alteração
no fechamento ósseo posterior da coluna vertebral, podendo ser recoberto por pele (espinha
bífida oculta) ou estar associado a uma protusão cística (espinha bífida cística) (AGUIAR et
al., 2003; SOUZA et al., 2007). A espinha bífida cística pode ainda ser classificada quanto
ao envolvimento de meninges, líquido cefalorraquiano e raízes nervosas na protrusão cística,
em: meningocele, mielomeningocele e mielocele (SOUZA et al., 2007).
A figura na página a seguir mostra a forma de apresentação da mielomeningocele:
21
Figura 1: Mielomeningocele (FRAGA et al., 2010).
Por exteriozar os componentes da medula espinhal, há um comprometimento
neurológico, caracterizando-se pela presença de hidrocefalia em 85% dos casos e alta
frequência de associação com a malformação congênita de Arnold-Chiari. Essas complicações
cerebrais associadas podem intensificar e/ou ocasionar deficiências intelectuais, motoras e
visuais (SBRAGIA et al., 2004; CHRISTOFOLETTI et al., 2007; MEDEIROS et al., 2011).
Não existe um consenso na literatura acerca do tipo de parto ideal nesses casos
clínicos, que possibilite um melhor prognóstico neurológico. Por outro lado, estudiosos
descrevem uma série de opções para o reparo da mielomeningocele, não havendo uma técnica
única para os diferentes tipos e níveis lesionais. A escolha dependerá da familiaridade do
cirurgião com a técnica e da possibilidade de máxima resolutividade, com uma baixa
morbidade (FRAGA et al., 2010).
Após o parto e nascimento da criança, objetivando um aumento da sobrevida,
preconiza-se que o fechamento da bolsa que expõe as estruturas nervosas seja feito nas
primeiras 24 horas de vida e que haja o controle da hidrocefalia com a instalação da
Derivação Ventricular Peritoneal (DVP) ainda nos primeiros meses de vida (ROCCO;
SAITO; FERNANDES, 2007a).
A sobrevida dessas pessoas aumentou significativamente durante os últimos anos,
em decorrência desse tratamento intervencionista precoce, dos avanços nas áreas da
neurocirurgia e pediatria, das melhorias no tratamento da bexiga neurogênica e de um
atendimento e acompanhamento por uma equipe multidisciplinar especializada, o que tem
possibilitado-as atingirem a fase adulta. Por outro lado, as principais causas de morte nos
primeiros anos de vida são a hidrocefalia e suas complicações, a pielonefrite e a falência renal
(SOUZA et al., 2007; ROCCO; SAITO; FERNANDES, 2007b).
22
A criança e o adolescente portadores de mielomeningocele necessitam, portanto,
de um processo de reabilitação precoce e um acompanhamento contínuo com especialistas,
aliado as novas tecnologias e tratamentos terapêuticos, objetivando a redução de futuras
complicações decorrentes de uma terapêutica insatisfatória e tardia.
Segundo Collange et al. (2008) e Rocco, Saito e Fernandes (2007b), as
complicações neurológicas consequentes da mielomeningocele variam de acordo com o nível
da lesão, havendo um comprometimento maior nos níveis mais altos (torácicos),
influenciando a movimentação dos membros inferiores e, em uma minoria das vezes, dos
membros superiores, o acarreta em dificuldades para o desempenho funcional nas atividades
de vida cotidiana, como o autocuidado, a deambulação e função social.
Nesse sentido, a marcha das pessoas com mielomeningocele tem sido um aspecto
funcional bastante estudado entre os pesquisadores, sendo classificada há algumas décadas
por Hoffer (1973) em:
Comunitária: conseguem caminhar dentro e fora do domicílio para a maioria de suas
atividades diárias, podendo precisar de muleta ou andador, ou de ambos. Usam
cadeiras de rodas apenas em longas distâncias fora da comunidade;
Domiciliar: caminham apenas dentro de casa e com auxílio de dispositivos,
necessitando de pequena ou nenhuma ajuda para sair da cadeira de rodas para a cama
e vice-versa (independentes para transferências). Utilizam órteses ou cadeira de rodas
para deambular na comunidade e algumas vezes no domicílio;
Não funcionais: deambulam apenas na fisioterapia e usam cadeiras de rodas para
satisfazer todas as suas necessidades;
Não deambulador: usam cadeiras de rodas para todas as atividades, mas normalmente
conseguem transferir-se da cadeira de rodas para a cama (podendo ser independentes
em transferências).
A perda da função de alguns grupos musculares inferiores, associada a fatores
genéticos e ambientais e ao déficit de estatura têm contribuído para o frequente surgimento de
sobrepeso e/ou obesidade e desvios nutricionais nessas crianças e adolescentes com
mielomeningocele, e não somente a ingestão alimentar excessiva, que, na verdade, tem sido
objeto de discussões, já que alguns estudos afirmam que essas pessoas apresentam recusa
alimentar, associada ao desconforto na cavidade oral (hipersensibilidade), tornando o
processo de alimentação algo desprazeroso (COELHO et al., 2009; BRONZERI et al., 2011).
Dessa maneira, ressalta-se a importância de ser feito um acompanhamento nutricional desses
usuários, pois muitas vezes o sobrepeso pode omitir a presença de déficits nutricionais, além
23
de ser um fator que dificulta o transporte da criança e do adolescente, seja no colo ou na
cadeira de rodas (GAIVA; NEVES; SIQUEIRA, 2009).
Além das alterações motoras definidas conforme a altura do comprometimento
neuronal, a mielomeningocele também se caracteriza por alterações sensitivas, que podem
facilitar a formação de úlceras por pressão, mal perfurante plantar, ou queimaduras (ROCCO;
SAITO; FERNANDES, 2007a). Nesse sentido, observa-se a importância da orientação para
os cuidadores e familiares da criança e do adolescente sobre as medidas de prevenção para
tais agravos, visando à redução e formação de novos comprometimentos clínicos, o que
poderá influenciar diretamente na qualidade de vida dessas pessoas.
O comprometimento neurológico também poderá acarretar complicações
urológicas (infecções de repetição, insuficiência renal, bexiga neurogênica, cálculos),
intestinais (incontinência), ortopédicas (deformidades em tronco e membros) e disfunções
sexuais (CORNEGÉ-BLOKLAND et al., 2011).
Entretanto, de acordo com Sá et al., (2010) as complicações urológicas são um
dos motivos de maior preocupação entre os profissionais de saúde, por ser infrequente a
possibilidade dessas crianças evoluírem com continência urinária e devido a possibilidade do
trato urinário superior ser gravemente afetado, tornando-se necessária uma avaliação
urodinâmica precoce, vista como o padrão-ouro no diagnóstico da bexiga neurogênica, e
contínua monitorização das suas funções renais, visando a preservação dessas vias urinárias
superiores ao longo da vida.
Quanto às funções cognitivas, pesquisadores observaram que as pessoas com
mielomeningocele podem apresentar comprometimento principalmente no processamento de
ordens complexas, com consequente falta de concentração durante a realização de suas
atividades, em razão da alta distraibilidade, e dificuldades de aprendizagem (ASSIS;
MARTINEZ, 2011). Para Bronzeri et al. (2011), a partir da discussão sobre algumas
pesquisas, essas alterações podem estar relacionadas a presença de hidrocefalia associada a
mielomeningocele, por gerar aumenta da pressão intracraniana.
Desse modo, ao serem inseridas no ambiente escolar, essas crianças e esses
adolescentes precisam receber um suporte e atenção especial por parte dos educadores, que
devem estar capacitados para acolhê-los e ensiná-los, a partir desse entendimento sobre os
seus déficits cognitivos que podem estar presentes e suas particularidades inerentes a
mielomeningocele.
Outro aspecto peculiar a ser ressaltado é o fato desses indivíduos, ao serem
submetidos a vários procedimentos cirúrgicos, com exposição a cateteres, luvas e derivações
24
ventriculares, possuírem um risco elevado de desenvolverem sinais clínicos de alergia ao
látex. Nesse sentido, Yeh et al. (2012) reforçam a necessidade de que os recém-nascidos
diagnosticados com mielomeningocele sejam submetidos a procedimentos látex-free,
preferencialmente, prevenindo sensibilizações e futuras complicações alérgicas.
Todas essas alterações fisiológicas no organismo da criança e do adolescente
podem acarretar, além dos prejuízos acima citados, implicações na sua autoestima e em suas
interações sociais, aspecto também preocupante por influenciar na sua qualidade de vida e de
seus familiares. Logo, são inúmeros os fatores biopsicossociais que envolvem a vida dessas
pessoas, com diferentes consequências que poderão gerar alguns desafios diários e
necessidades individuais de atenção e cuidado em saúde.
2.2 O serviço público de saúde e a criança/adolescente com mielomeningocele
As crianças e os adolescentes com necessidades especiais de saúde são aqueles
que apresentam riscos maiores de possuírem condições físicas, de comportamento,
desenvolvimento ou emocional crônicas, representando hoje um novo perfil de clientela com
necessidades diversificadas em saúde, principalmente de serviços especializados para prover
suas demandas e uma equipe multiprofissional qualificada que forneça um atendimento
interdisciplinar para estes e suas famílias (REZENDE; CABRAL, 2010; REIS; SANTOS;
MENDES, 2011).
Dentro desse contexto, o usuário com mielomeningocele depende frequentemente
e de forma contínua do serviço público de saúde e desses cuidados especiais, tanto por pioras
no seu quadro clínico, como para o seu acompanhamento, tratamento e processo de
reabilitação, ao mesmo tempo em que a família precisa de apoio emocional e auxílios para o
seu cuidado no ambiente domiciliar, após a alta hospitalar.
Esse suporte domiciliar envolve a capacitação e o apoio familiar pelos
profissionais de saúde para o desenvolvimento de uma assistência satisfatória à criança e ao
adolescente, e a provisão com os materiais e equipamentos necessários, que demandam altos
custos tanto para a família, como para o Estado. Dentre os materiais necessários, estão os de
tecnologia assistida (órteses, tutor, botas, palmilhas, cadeira de rodas, bengalas) e de uso
diário (sondas vesicais, fraldas, medicamentos, entre outros) (GAIVA; CORRÊA; SANTO,
2011).
Além das dificuldades clínicas e financeiras existentes no cotidiano do cuidar
dessas pessoas, a família também precisa gerir os problemas advindos da baixa eficiência do
25
sistema público de saúde, no contexto das doenças crônicas, tais como: dificuldades no acesso
a um tratamento especializado, para a realização de exames de monitoramento da função renal
e no atendimento nos serviços de reabilitação (GAIVA; NEVES; SIQUEIRA, 2009).
Da mesma forma, ressalta-se que para uma atenção integral a essa criança e esse
adolescente, esta deva ser assegurada na rede de serviços públicos de saúde, em todos os
níveis de atenção, para que também seja garantido o recebimento de um tratamento adequado
as suas queixas de saúde com baixo grau de complexidade, nos serviços primários e
secundários próximos a sua residência.
De acordo com o Decreto n°7.508 de 2011, a Rede de Atenção à Saúde (RAS) é
definida como “conjunto de ações e serviços de saúde articulados em níveis de complexidade
crescente, com a finalidade de garantir a integralidade da assistência à saúde.” É formada por
meio de arranjos organizacionais que envolvem serviços com diferentes níveis de tecnologia e
funções assistenciais, interrelacionados de forma complementar, com base nos seus territórios
de atuação (BRASIL, 2011b).
Assim sendo, essa rede deve funcionar por meio de uma interação entre os
serviços, do nível de menor densidade tecnológica (atenção básica), densidade intermediária
(atenção secundária) e maior densidade (atenção terciária), por meio de um compartilhamento
de informações acerca dos usuários, visando gerar uma longitudinalidade do atendimento,
tendendo a um cuidado integral e qualificado a população.
A longitudilalidade diz respeito a uma continuidade clínica dos cuidados, tendo
por base uma relação de vínculo e responsabilização entre os usuários e as equipes de saúde
ao longo do tempo e de forma permanente, de maneira a ser possível um acompanhamento e
monitoramento acerca das mudanças nos elementos de vida desses usuários, bem como das
repercussões do tratamento em longo prazo (BRASIL, 2011b).
Desse modo, torna-se possível realizarem-se adaptações e mudanças nos planos
terapêuticos, ajustando-se condutas quando preciso, prevenindo perdas de referenciamentos e
reduzindo possíveis riscos nos cuidados, provenientes de desconhecimento acerca da
população, seu contexto de vida e caminho percorrido no sistema de saúde, coordenando,
nesse sentido, a assistência prestada dentro da RAS (BRASIL, 2011b).
No contexto das criança e dos adolescentes cronicamente adoecidos, evidencia-se
ainda a necessidade de um atendimento interdisciplinar devido à multiplicidade de sequelas e
possíveis co-morbidades associadas a suas patologias. Portanto, as equipes de saúde desses
diferentes níveis de atenção devem estar habilitadas para acolher e fornecer uma assistência
com maior grau de resolutividade a essa parcela da população (SÁ et al., 2010).
26
Ser um serviço resolutivo significa, entre outros conceitos:
Identificar riscos, necessidades e demandas de saúde, utilizando e articulando
diferentes tecnologias de cuidado individual e coletivo, por meio de uma clínica ampliada capaz de construir vínculos positivos e intervenções clínica e
sanitariamente efetivas, na perspectiva de ampliação dos graus de autonomia dos
indivíduos e grupos sociais (BRASIL, Portaria 2.488 de 2011b).
Na RAS, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) fazem parte da atenção básica, ou
atenção primária, termos considerados equivalentes, constituindo-se como a sua porta de
entrada preferencial, sendo caracterizada através de um conjunto de ações de saúde, que
envolvem aspectos individuais e coletivos, visando à promoção, proteção, manutenção e
reabilitação da saúde, diagnóstico, tratamento e prevenção de agravos. Para tanto, emprega
tecnologias de alta complexidade e baixa densidade, no intuito de solucionar os problemas de
saúde de maior frequência no território onde a população está adstrita (BRASIL, 2011b).
A atenção básica deve funcionar como o contato preferencial dos usuários com o
SUS, seguindo os princípios da acessibilidade, universalidade, e coordenação do cuidado, do
vínculo e continuidade, da responsabilização, da integralidade, humanização, participação
social e equidade (BRASIL, 2011b).
Na perspectiva das pessoas com mielomeningocele, ela tem como fundamentos
possibilitar o acesso a toda a população, de acordo com o princípio da equidade, efetivando a
integralidade com ações de tratamento e reabilitação, através de uma equipe interdisciplinar,
que deve receber estímulo e acompanhamento contínuo para sua capacitação e formação
(BRASIL, 2011b).
Amaral et al. (2012) afirmam que o atendimento aos usuários do SUS, que
possuem deficiência ou restrição permanente de mobilidade, quando realizado em nível de
atenção primária em saúde pode representar um elemento contribuinte para o cuidado a esses
pacientes, facilitando o acesso e diminuindo a demanda reprimida nos setores de média e alta
complexidade, sendo necessário, para tanto, uma aproximação dos profissionais que
compõem esses níveis de atenção com os da Estratégia de Saúde da Família (ESF).
Ademais, na relação de cuidado ao usuário com necessidades especiais, é no meio
sociocultural em que ele vive onde os profissionais poderão visualizar suas dificuldades e
riscos em saúde diários, evidenciando a importância do papel da atenção primária no cuidado
integral à saúde dessas pessoas. Contudo, este ainda constitui-se um desafio nas práticas de
saúde, o que exige uma maior reflexão dos gestores e profissionais para que sejam elaborados
novos métodos que possibilitem um aperfeiçoamento dessa assistência (OTHERO;
DALMASO, 2009).
27
Nesse contexto, dentre os obstáculos existentes para que as crianças e os
adolescentes cronicamente adoecidos e com deficiências recebam um atendimento adequado
em todos os níveis de atenção às quais precisarem, a dificuldade de acesso pode ser um
entrave na continuidade dessa assistência, revelando a necessidade de uma maior discussão
sobre a temática, em busca de possíveis estratégias para facilitar esse acesso e atendimento em
saúde.
O conceito de acesso é muito amplo e complexo, e algumas vezes tem sido
utilizado erroneamente e de forma imprecisa, com pouca clareza na sua relação com os
serviços de saúde. De forma geral, o termo tem sentido de entrada no serviço para alguns
autores, constituindo-se em uma dimensão que possui associação à oferta. Já a acessibilidade
refere-se às características tanto dos recursos de saúde, quanto dos serviços, que de uma
forma ou de outra limitam ou facilitam seu uso pelos usuários. Assim a acessibilidade é um
importante fator para compreender-se as variações de utilização dos serviços de saúde, sendo
uma dimensão essencial nos estudos de equidade na rede de saúde (TRAVASSOS;
MARTINS, 2004).
Por outro lado, de acordo com Assis et al. (2010), o acesso aos serviços de saúde
configura-se como a primeira etapa a ser superada pelos usuários na busca por atendimento
em saúde, e relaciona-se com:
Disponibilidade ou não do serviço; distância e práticas ofertadas para o atendimento
dos usuários; recursos disponíveis; capacitação técnica dos trabalhadores [...] e de
que forma tem se responsabilizado pelos problemas da população a quem e como devem prestar serviço (ASSIS et al., 2010, p.21).
Giovanella e Fleury (1996) discutiram o conceito de acesso e as condições de
acessibilidade a partir de outros teóricos, e organizaram alguns modelos para a sua
caracterização. O primeiro é o Modelo Economicista, relacionado às questões de oferta e
demanda, sendo explicitado através da conformação entre a demanda por meio de diferentes
grupos no acesso aos serviços.
O segundo é o Modelo Sanitarista-Planificador, que traduz o conceito de acesso
por meio da oportunidade de consumo fornecida por meio de uma distribuição planejada e
organizada da rede de saúde, seguindo as diretrizes do SUS e conformando-se como:
regionalizada, ou seja, bem distribuída, de maneira que os serviços estejam próximos a toda
população; hierarquizada por níveis de complexidade que garantam a resolutividade; ágil nos
processos para facilitar a utilização do serviço por toda a demanda de usuários; com garantia
de informações adequadas sobre os serviços e terapêuticas; e baseada nos princípios de
28
referência e contra-referência, facilitando o fluxo no sistema. Sumariamente, nesse modelo o
acesso ocorre através da ação planejadora do Estado, ao garantir a localização adequada,
disponibilidade e interação funcional dos serviços de saúde na rede, conforme a demanda.
O terceiro modelo seria denominado como Sanitarista-Politicista, que se baseia na
conceituação de consciência sanitária, que é discutida por Fleury a partir de outros autores,
como uma ação individual ou de um grupo de indivíduos na busca pela compreensão de que a
saúde é um direito de todos os cidadãos e entendimento acerca dos determinantes sociais
envolvidos no processo saúde-doença. Desse modo, o acesso seria uma construção, com a
participação da população na gestão e no controle social, do sistema de saúde e da formação
de suas práticas.
O quarto modelo seria o das Representações Sociais, onde os autores discutem
que a realidade é permeada por questões simbólicas e subjetivas, como aspectos socioculturais
e intrínsecos de cada indivíduo ou grupo populacional ao longo da história. Dessa forma, seria
importante compreender as representações sociais acerca do sistema de saúde, advindas das
experiências dos usuários com o serviço.
A partir dessa caracterização, Giovanella e Fleury (1996) sintetizam afirmando
que as condições de acessibilidade são permeadas pela dimensão econômica, relacionada a
oferta e a demanda, técnica, pautada pela organização dos serviços, política, referente a
consciência sanitária e a participação popular e simbólica, relativa as questões de
representação social sobre o sistema de saúde.
Essa questão da acessibilidade foi identificada por Othero e Dalmaso (2009) como
a principal dificuldade aos indivíduos com deficiências, sendo esta compreendida de maneira
ampla pelos autores como: acesso à circulação, aos serviços, às oportunidades e aos recursos
disponíveis. Os próprios profissionais da unidade de saúde pesquisada evidenciaram a
preocupação quanto à importância de mudar a estrutura física e arquitetônica dos seus
serviços, bem como dos arredores, para facilitar o atendimento em saúde dessas pessoas.
No período de realização da pesquisa de Sousa e Fraga (2008), no Ceará, a
organização dos serviços de saúde para as pessoas com deficiências também mostrou
precariedade, pois o atendimento de reabilitação física aos deficientes cadastrados no SUS
concentrava-se apenas em dois municípios: Fortaleza e Iguatu, revelando a fragilidade desse
sistema de saúde e a restrição ao seu acesso.
Nesse perspectiva, destaca-se que para o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009a), a
acessibilidade não está interligada apenas a estrutura física e aos mobiliários adequados, mas
também a um acolhimento mais humanizado nos serviços de saúde. Portanto, para instaurar
29
essa acessibilidade de forma completa é essencial que as unidades de saúde sejam modificadas
e disponham de acesso físico, mobiliário e ajustes ambientais relacionados à comunicação,
que sejam adequados às pessoas com deficiência. Do mesmo modo, é também necessário que
os profissionais de saúde estejam mais sensibilizados e capacitados para acolher e cuidar
dessas pessoas (OPAS, 2006), e que os gestores do SUS nas três esferas de governo, federal,
estadual e municipal, também estejam empenhados no desenvolvimento de estratégias que
contribuam para o estabelecimento dessas adaptações e alterações nos sistemas de saúde.
Em súmula, acessibilidade tem como objetivo facilitar os ganhos de autonomia e
locomoção as pessoas com deficiência, de maneira que todos tenham a oportunidade de
usufruir dos espaços com maior conforto, comodidade, independência e confiança. A
acessibilidade também se relaciona a eliminação de barreiras que envolvem preconceitos e
discriminações, que podem ocorrer muitas vezes devido ao desconhecimento da população e
dos profissionais de saúde acerca das potencialidades dessas pessoas (BRASIL, 2009a).
Sobre esse aspecto, Cipriano e Queiroz (2008) declaram que a as condições de
acessibilidade estendem-se desde o transporte para o serviço de saúde até o bloqueio na
comunicação com os profissionais, e que as dificuldades no acesso vão aumentando à
proporção que as crianças com mielomeningocele vão crescendo, principalmente devido às
limitações motoras, alterações corporais e ao aumento do peso.
Destaca-se que nessa pesquisa utilizou-se como conceito de acesso, a partir dessa
discussão por diferentes autores, o que envolve as condições de acessibilidade, dentre elas,
selecionou-se: físicas e estruturais dos serviços (presença de adaptações as pessoas com
deficiências), localização (distância até a residência dessas pessoas), resolutividade dos
problemas de saúde (atendimento e serviços especializados e qualificados aos usuários com
mielomeningocele), relação comunicacional entre profissionais e usuários (humanização da
assistência); recursos disponíveis no serviço (equipamentos para a locomoção) e transporte
(meios para o deslocamento até os serviços de saúde).
Além dessa debilidade de acesso aos serviços de saúde, outros fatores também
podem influenciar no atendimento dessas crianças/adolescentes. De acordo com Elias,
Monteiro e Chaves (2008), devido à vulnerabilidade socioeconômica em que muitas dessas
famílias estão submetidas e a consequente ausência de recursos para arcar com o transporte,
estas são restringidas de levar suas crianças ao atendimento médico especializado, que
dificilmente está disponível nos hospitais ou Unidades Básicas de Saúde (UBS) próximos ao
seu domicílio. Dessa forma, criança e família acabam entrando em um ciclo vicioso, pois
devido à ausência de um tratamento adequado à criança, esta poderá apresentar novas
30
complicações, aumentando a sua necessidade de assistência em saúde, que por outro lado
impede sua ida à escola e demais setores sociais, acometendo sua capacidade de aprender, o
que consequentemente gera mais exclusão e prejudica sua interação social e saúde psíquica, o
que também levará a necessidade de atendimento médico.
A eliminação desses obstáculos aos serviços públicos de saúde, que violam os
princípios do SUS, poderia ter um valor significativo para essa parcela da população que
apresenta alguma deficiência e é muitas vezes esquecida pela sociedade, na utilização desses
serviços, em virtude de que estes têm um papel essencial na melhoria da qualidade de vida e
bem-estar destas pessoas (INTERDONATO; GREGUOL, 2012).
Ressalta-se, entretanto, que para que os serviços de saúde estabeleçam um modelo
de atenção de qualidade para esses indivíduos, mais contínuo e efetivo, é evidente a
necessidade de transformação do ainda vigente modelo hegemônico das práticas em saúde,
centrado na doença e realização de procedimentos, para um modelo que preconize o
acolhimento, a integralidade e a responsabilização, o que depende de uma nova formação de
consciência no fazer e saber profissionais (MEDEIROS et al., 2011).
Corroborando, Othero e Dalmaso (2009) encontraram em sua pesquisa que apesar
de muitos profissionais de saúde declararem fazer uso de uma abordagem integral de cuidado
as pessoas com deficiências, considerando os seus aspectos biopsicossociais, na prática, essas
ações não foram observadas e o trabalho estava voltado, sobretudo, para o corpo e a doença
(incapacidades e complicações).
A família e a criança/o adolescente com mielomeningocele enfrentam desafios
desde o diagnóstico da doença até a cada nova fase do seu desenvolvimento, devido as
sequelas e necessidade de cuidados especiais. Logo, o suporte das redes de apoio tornam-se
essenciais durante essa trajetória, com destaque para os serviços de saúde e as políticas
públicas, que têm como função contribuir para a qualidade da assistência, prezando pelo
cumprimento dos direitos dessas crianças e dos adolescentes com deficiências e doenças
crônicas.
2.3 Políticas Públicas de Saúde no Brasil
Para entendermos as políticas públicas de saúde implementadas e necessárias na
atenção as crianças e aos adolescentes com mielomeningocele, faz-se necessário inicialmente
uma melhor compreensão conceitual e histórica das políticas públicas no Brasil.
De acordo com Viana e Baptista (2008) as políticas públicas de saúde comportam
diversas ações de caráter coletivo, construídas por diferentes instituições públicas e privadas
31
visando responder ao risco das populações adoecerem em contextos históricos diferentes,
sendo consideradas por alguns autores partes integrantes das políticas sociais. Desse modo, a
política de saúde ao ser vista como uma política social assume que a saúde é um direito
inerente aos cidadãos, pois a participação plena dos indivíduos na sociedade política é feita
por meio de sua inserção no contexto de cidadania (FLEURY; OUVERNEY, 2008).
Entretanto, a modalidade de proteção e sistema social varia e distingue-se em
diferentes países, por meio de diversas condições políticas e econômicas, ao longo dos
tempos. Desse modo, a saúde pode ser uma medida de caridade em algumas regiões, em
outras um benefício adquirido através de uma contribuição trabalhista, ou, ainda, um direito
de cidadania universal (FLEURY; OUVERNEY, 2008).
Alguns autores consideram que a política de saúde se encontra na relação entre o
Estado, a sociedade e o mercado, pois a sociedade financeira remete aos impostos e
contribuições, apresentando algumas atitudes e mantendo valores em relação ao corpo e ao
estado de bem-estar, e comportando-se de maneira que poderá afetar a saúde coletiva e/ou
individual. O Estado, por outro lado, poderá por meio do poder que ele demanda, elaborar e
estabelecer normas e obrigações, como por exemplo, regular os seguros de saúde e o processo
de vacinação, recolher recursos e os alocar em setores e ações, incitar a produção de bens,
produzir serviços, definir leis que ratifiquem a acessibilidade, desenvolver tecnologias e
formar profissionais de saúde. Já o mercado gera os insumos, oferece serviços de seguro e
está vinculado a oferta de outros serviços e na formação dos recursos humanos necessários
nesse processo (SOUZA C., 2006; FLEURY; OUVERNEY, 2008).
Desse modo, as políticas públicas, ao abrangerem aspectos que ultrapassam
questões de saúde, produzem consequências em diversas áreas da sociedade e em suas
relações econômicas, políticas e culturais. Logo, compreende-se que suas estratégias,
instrumentos e planos geram ações que podem influenciar a dinâmica geral da sociedade,
podendo, dessa forma, desempenhar outras funções além do seu objetivo básico original
focado na resolução de problemas na área da saúde (FLEURY; OUVERNEY, 2008).
Destaca-se que essa pesquisa enfocou-se nas políticas públicas relacionadas às
questões de saúde das crianças e dos adolescentes com mielomeningocele, que dizem respeito
ao processo de reabilitação, aos serviços de saúde, questões de acessibilidade, recebimento de
suporte material e financeiro, entre outras relacionadas às necessidades particulares dessas
pessoas na busca por melhoria na saúde e, consequentemente, na sua qualidade de vida.
De maneira geral, são amplos e diferentes os conceitos acerca do que seriam as
políticas públicas de saúde. A analisarmos os conceitos “política” e “saúde” separadamente,
32
encontramos que “política” deriva do adjetivo polis, que remete a cidade, ao urbano, social.
Esse termo foi expandindo-se historicamente, sendo influenciado por definições e textos de
grandes filósofos como Aristóteles. Na época moderna, o termo sofreu grandes mudanças em
relação ao significado original, estando mais ligada a expressões como “ciência do Estado”,
“filosofia política”, “ciência política”, indicando atividades que indireta ou diretamente
associavam-se com o Estado. Considera-se também que a Política está estreitamente ligada ao
poder, que pode ser considerado uma forma de domínio da natureza, dos homens sobre outros,
consistindo por vezes numa relação entre dois sujeitos, onde um é o soberano e outro é o
submisso, e aquele impõe a este a sua vontade (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,
1998).
Relacionado ao conceito de política, complementa-se apresentando também
algumas definições de políticas públicas, sendo que há uma gama de explicações acerca dessa
expressão. Uma das mais sintéticas e específicas foi feita por Thomas Dye em 1972, que
declarou que as políticas públicas são aquilo em que o governo decide fazer ou não fazer, ou
seja, podem ser tanto as ações do governo, como as suas omissões segundo esse autor
(VIANA; BAPTISTA, 2008). Para Viana e Baptista (2008), corroborando com a
conceituação moderna, as políticas públicas dizem respeito a algumas questões relativas ao
Estado, ao pacto social, aos interesses e, consequentemente remete também ao poder. Para a
elaboração dessas políticas, diferindo do conceito de Dye, eles afirmam que o Estado torna-se
ativo, em um processo de construção de uma ação governamental para determinado setor, e
que, para tanto, fazem-se necessários recursos, arenas, ideias, atores e negociação. Por outro
lado, Mead (1995) define as políticas públicas como um campo de estudo das políticas em
que se analisam o governo a luz de grandes questões públicas.
Apesar de também existirem definições que evidenciam a importância das
políticas públicas em solucionar problemas encontrados nas questões sociais, alguns críticos
vão contra essa ideia, por superestimarem os aspectos racionais, ignorando a essência dessas
políticas, ou seja, a relação em torno das ideias e dos interesses que as rodeiam. Ao
centralizarem o foco de suas ações no governo, essas definições ignoram o aspecto
conflituoso e os limites inerentes às decisões governamentares e excluem a possibilidade de
participação e cooperação de outras instituições sociais com o governo (SOUZA C., 2003;
SOUZA C., 2006).
Em relação ao termo “saúde”, em 1948, este foi definido pela OMS como “Um
estado de completo bem-estar físico, social e mental, e não meramente a ausência de doença
ou enfermidade” (WHO, 1988, p.1). Desse modo, a saúde começou a ser expressa em termos
33
funcionais, como recurso que permite as pessoas terem uma vida individual, social e
economicamente produtiva. No contexto da I Conferência Internacional sobre Promoção da
Saúde, realizado em Ottawa, Canadá, em novembro de 1986, considerou-se a saúde como um
direito humano fundamental, sendo enfatizados alguns aspectos para a sua concretização,
como a paz, os recursos econômicos, a alimentação e o abrigo, um ecossistema estável e o uso
sustentável dos recursos, ou seja, fatores determinantes e condicionantes para a sua efetivação
(WHO, 1988).
A saúde atualmente, além de envolver todas essas questões condicionantes,
relaciona-se a outros aspectos além dos objetivos, como o corpo físico, diz respeito também a
fatores subjetivos que vão além do biológico, como questões psicossociais e culturais. Assim
sendo, na busca por uma atenção em saúde, se faz necessário uma mudança de paradigma na
concepção de mundo e na maneira de utilizar o conhecimento nessas práticas, que devem
estar voltadas para a promoção da saúde, que envolve a potencialização da capacidade dos
indivíduos e da comunidade em participar da sua própria busca por saúde, a partir de um
contexto que favoreça a sua concretização (BACKES et al., 2009).
Ao associarem-se os termos “política” e “saúde”, diversas definições de “políticas
de saúde” são encontradas, e algumas dessas remetem aos significados originais das palavras
isoladas. Paim (2003) declara que essa expressão “Política de Saúde” abrange tanto os
aspectos relativos ao poder em saúde, como questões de natureza, estrutura, relações,
distribuição e lutas, como aos ligados à formulação de leis, normas, planos e programas de
saúde. Ademais, no português a palavra “política” envolve ao mesmo tempo dimensões de
poder e das diretrizes e as intervenções planificadas, diferindo da língua inglesa, onde existem
dois vocábulos distintos para distinguir essas ideias: “politics” que refere-se ao exercício de
poder e “policy” relativa aos planos de ação. Nesse sentido, ainda de acordo com Paim, a
Política de Saúde pode significar diretrizes e planos de ação e, por outro lado, como disciplina
em Saúde Coletiva, abrange tanto as relações e o exercício do poder, como a criação e
condução de políticas de saúde.
Destaca-se também um conceito de relevância internacional e amplamente
difundido estabelecido pela OMS, que afirma que a política de saúde é:
34
Um posicionamento ou procedimento estabelecido por instituições oficiais
competentes, notadamente governamentais, que definem as prioridades e os
parâmetros de ação em resposta as necessidades de saúde, aos recursos disponíveis e
a outras pressões políticas. A política de saúde é frequentemente estabelecida por
meio de leis e outras formas de normatização, que definem as regras e os incentivos
que orientam a provisão de serviços e programas de saúde, assim como o acesso a
esses. A política de saúde é atualmente distinguida da política de saúde pública por
sua principal preocupação com os serviços de saúde e programas. Progresso futuro
em políticas de saúde pode ser observado através da medida em que também podem
ser definidos como políticas públicas saudáveis. Como a maioria das políticas
públicas, as políticas de saúde emergem a partir de um processo de construção de suporte as ações de saúde que se sustentam sobre as evidências disponíveis,
integradas e articuladas com as preferências da comunidade, as realidades políticas e
os recursos disponíveis (WHO, 1998, p.10-11).
Outra definição, presente em uma publicação do Ministério da Saúde, também
focaliza no papel do governo, responsabilizando-o pela aplicação e criação das políticas de
saúde, de forma a promover uma melhor qualidade em saúde para a população, mas, por outro
lado, abre espaço para a sua coparticipação. Segundo os autores as políticas públicas são:
As decisões de caráter geral, destinadas a tornar públicas as intenções de atuação do
governo e a orientar o planejamento, no tocante a um determinado tema, em seu
desdobramento em programas e projetos. [...] Com a explicitação formal dessas decisões, busca-se, também, permitir o acesso da população em geral, e dos
formadores de opinião em particular, à discussão, à implementação e à avaliação das
políticas (BRASIL, 1998, p.7).
No Brasil, as políticas públicas de saúde sofreram diversas mudanças ao longo da
história, entretanto, destaca-se o período conhecido como “Nova República” que se iniciou ao
fim da ditadura militar e início de uma redemocratização da política nacional. Nesse contexto,
vários planos econômicos foram elaborados na tentativa de conter a crise inflacionária vigente
até então, porém não obtiveram grandes êxitos e a realidade econômica e social continuou a
privilegiar os ricos, em detrimento do restante da população. No setor saúde, o processo em
busca de uma reforma sanitária, desencadeado por profissionais e intelectuais, estimulou a
realização da VIII Conferência Nacional de Saúde que, ao contrário das demais, não
apresentou um caráter técnico e sua temática abrangeu a discussão de princípios e diretrizes
para uma reforma sanitária brasileira: conceito ampliado de saúde, a saúde como um direito
de todos e dever do Estado, criação de um Sistema Único de Saúde (SUS), possibilidade de
participação popular e ampliação do orçamento social (BERTOLOZZI; GRECO, 1996;
PAIM, 2003).
A VIII Conferência, portanto, representou um grande avanço técnico e político ao
sugerir a construção do SUS. Nesse ínterim, o governo implementou uma “estratégia-ponte”
para a instituição do SUS propriamente dito, durante sua construção legal, denominado
35
Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), que preconizava a transferência dos
serviços de saúde para estados e municípios, definição de um gestor único, ampliação dos
serviços, entre outras diretrizes (BERTOLOZZI; GRECO, 1996; PAIM, 2003).
Nesse contexto, como consequência de todo um processo histórico, político e
social, foi elaborada em 1988 a Constituição Federal, que passou a reorientar as políticas
públicas de saúde brasileiras sob novas perspectivas, a partir dos princípios da universalidade,
equidade no acesso ao setor saúde, descentralização, integralidade das ações e participação da
comunidade, rompendo com a lógica vigente de proteção social baseada em um contrato
trabalhista e reconhecendo a saúde como um bem público e universal garantido a todos os
cidadãos brasileiros, sem nenhuma distinção (LUCCHESE, 2002).
No entanto, destaca-se que a constituição foi apenas um dos passos para o
desenrolar da Reforma no setor saúde, por esta ser verdadeiramente caracterizada como um
processo, e não como um fato pontual. Logo, após 1988, diante dos novos desafios, muitas
leis vieram complementar e organizar a real criação e implementação desse sistema único,
visando sua legítima efetividade ao longo dos anos, num processo de busca por qualidade e
plena universalização da assistência a saúde da população.
2.4 Direitos em saúde que beneficiam as crianças e os adolescentes com
mielomeningocele
Diante do exposto, observa-se que todo esse movimento pela democratização da
saúde, que envolveu o Brasil na segunda metade da década de setenta, favoreceu a construção
do projeto da Reforma Sanitária Brasileira, sustentado por uma base conceitual e por uma
produção teórico-crítica (FLEURY, 1997). Em meio a esse cenário, em 1988 foi elaborada a
Constituição Brasileira, que revolucionou ao assegurar no seu artigo 196 a saúde como:
Direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação
(BRASIL, 1988, art.196).
No contexto das pessoas com deficiências, ressalta-se que a discussão acerca dos
seus direitos precede essa constituição, entretanto de forma incipiente, havendo um maior
desenrolar na elaboração e implementação de políticas públicas de saúde para essa parcela da
população após 1988. Nessa perspectiva, a Constituição Federal inicialmente estabeleceu
alguns princípios, que foram sendo regulamentados posteriormente, como: o dever da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de cuidar da saúde, assistência pública e
36
legislação sobre a proteção e integração social das pessoas com deficiência; direito a saúde,
abrangendo o processo de reabilitação e a promoção de sua integração à vida em comunidade;
e a garantia de benefício financeiro mensal aos que comprovassem não possuir meios para a
sua sobrevivência (BRASIL, 1988).
A partir desses princípios, houve a necessidade de caracterizar-se legalmente as
pessoas com deficiência, para que houvesse a possibilidade de estabelecerem-se os critérios
de inclusão e exclusão em relação à concessão dos benefícios e serviços.
Desse modo, o conceito de deficiência foi definido como: “toda perda ou
anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere
incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal”, sendo
considerada pessoas com deficiência aquele que apresenta uma ou mais das seguintes
alterações: deficiência física, auditiva, visual ou mental (BRASIL, 1999).
Evocando os conceitos expostos, a criança com sequelas de mielomeningocele,
dependendo das características e do nível de sua lesão, poderá apresentar deficiências físicas
(definida como uma modificação completa ou parcial de um ou mais partes do corpo, com
consequente comprometimento da função física; não sendo incluídas alterações estéticas que
não acarretam prejuízo no desenvolvimento das atividades), e/ou mentais (definida como um
funcionamento intelectual muito inferior à média, sendo manifestado antes dos dezoito anos e
limitações pautadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas), o que as garante
legalmente o recebimento de alguns dos direitos das pessoas com deficiências, discutidos a
seguir (BRASIL, 1999; BRASIL, 2004a).
Na década de 1990, foi consolidado o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), que dispõe que as crianças têm o direito à proteção à vida e à saúde, através da
efetivação de políticas públicas que favoreçam o seu nascimento e desenvolvimento de
formas saudáveis e harmoniosas e em condições de vida dignas. É assegurado também, o
atendimento médico no SUS, por meio de um acesso universal e igualitário aos serviços de
promoção, proteção e recuperação da saúde. Referente às crianças com deficiências, como as
que apresentam sequelas de mielomeningocele, o estatuto ainda preconiza a garantia de um
tratamento em saúde especializado (BRASIL, 1990).
Posteriormente, o decreto n°3.298 de 1999 regulamentou a Lei n°7.853,
formalizando a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, que
consiste em um conjunto de orientações normativas com o intento de certificar o pleno
exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas com deficiências. Para tanto, essa
política teve como objetivos, entre outros, formar recursos humanos para um atendimento de
37
qualidade as pessoas com deficiência e garantir a efetivação dos programas de prevenção,
atendimento especializado e inclusão social (BRASIL, 1999). Assim sendo, as crianças com
qualquer tipo de deficiência deveriam receber um atendimento em saúde de forma específica
as suas particularidades, por meio de uma equipe especializada para assisti-las de maneira
mais qualificada.
Consoante esse decreto, a administração pública federal deveria favorecer o
estabelecimento de serviços de saúde regionalizados e descentralizados em todos os níveis de
complexidade, pautados na assistência e reabilitação das pessoas com deficiência, garantia do
acesso aos atendimentos públicos e privados de saúde, a um tratamento adequado e
atendimento domiciliar, e a criação de programas de saúde peculiares para essa parcela da
população, que poderiam ser desenvolvidos com o auxílio da comunidade (BRASIL, 1999).
São incluídos para a atenção dessas pessoas e seu processo de reabilitação, o
fornecimento de materiais e equipamentos que complementem o atendimento e aumentem as
oportunidades de independência e inclusão social, como órteses, próteses, materiais auxiliares
para o cuidado e higiene pessoal (necessários para promover sua autonomia e segurança),
medicamentos que contribuam para a estabilidade clínica e controle das incapacidades, além
de um tratamento e orientação psicológica que favoreça um pleno desenvolvimento da
personalidade da pessoas com deficiência e sua família (BRASIL 1999).
Entretanto, esse decreto não especificou de quem constituiria a responsabilidade
pelo fornecimento desses materiais, nem esclareceu que órgãos públicos do Ministério da
Saúde fariam o cadastro das pessoas que necessitam desses equipamentos, além de não
especificar que tipo de utensílios, medicamentos e aparatos seriam concedidos, nem sua
qualidade e frequência de distribuição.
Todavia, ressalta-se que em 1993, através da portaria n°146, o Secretário de
Assistência à Saúde já havia estabelecido algumas diretrizes gerais para a concessão de
próteses e órteses por meio da assistência ambulatorial, afirmando que a as Secretarias
Municipais e Estaduais de saúde, através de uma coordenação técnica nomeada pelo gestor
local, ficariam com a responsabilidade de coordenar, supervisionar, controlar e avaliar a
aquisição desses equipamentos. A sua indicação poderia ser feita por qualquer profissional
médico da especialidade relacionada ao instrumento e deveria ser encaminhada à comissão
técnica da unidade cadastrada, para realizar a efetiva análise, de acordo com os critérios
previamente elaborados pela Secretaria Estadual/Municipal de Saúde (BRASIL, 1993).
Em relação as políticas públicas de saúde e diretrizes construídas em prol das
pessoas com deficiências, o Ministério da Saúde recomenda, por meio de suas cartilhas de
38
orientação, que estas procurem uma unidade de saúde próxima a sua residência, ou a
secretaria municipal, ou ainda estadual de saúde, para receber orientações sobre os serviços
especializados que disponibilizam órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção, tais
como: aparelhos ortopédicos, cadeiras de rodas, bolsas de ostomia, aparelhos auditivos,
próteses visuais e outras (BRASIL, 2009a).
Visando zelar pela efetiva implantação dessas políticas, foi criado em 1999, no
âmbito do Ministério da Justiça, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de
Deficiência (CONADE), constituído paritariamente por representantes da sociedade civil e de
instituições governamentais, ainda em funcionamento atualmente (BRASIL, 1999).
Entretanto, ressalta-se não se saber ao certo como tem ocorrido na prática a sua efetivação e
real participação dos usuários com deficiências nesses conselhos, conforme preconizado em
lei.
No ano posterior, foi elaborada a lei n° 10.048, que também favoreceu essas
pessoas, por meio da criação do atendimento prioritário a alguns serviços, como o de
transporte público coletivo, instituições financeiras e estabelecimentos concessores de
atividades públicas, sendo assegurado um tratamento de forma diferente e imediata a essas
pessoas. Além disso, os logradouros, sanitários e edifícios públicos teriam que possuir
normas para a sua construção, de maneira a facilitar o acesso físico das pessoas com
deficiência a esses locais (BRASIL, 2000a).
Essa lei foi regulamentada apenas em 2004, através do decreto n° 5.296, que
também regulamentou a lei n° 10.098. Este estabeleceu as normas gerais e os critérios basais
para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência, através da eliminação de
barreiras e obstáculos nas vias e lugares públicos, no mobiliário urbano, na elaboração e
reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação (BRASIL, 2004a). Segundo
esse decreto, a acessibilidade e as barreiras são definidas no capítulo 3, artigo 8, como:
Acessibilidade: condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou
assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos
serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e
informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;
Barreiras: qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, a liberdade
de movimento, a circulação com segurança e a possibilidade de as pessoas se
comunicarem ou terem acesso à informação [...].
Mediante esse decreto, as crianças e os adolescentes com mielomeningocele
também podem ser beneficiados, pois essas mudanças e adaptações nos espaços públicos
também englobam os serviços de saúde, garantindo que essas pessoas possam acessar esses
ambientes e receber a assistência em saúde as quais necessitam. Ademais, com a prioridade
39
nos transportes públicos e no atendimento nos serviços de emergência, essas pessoas também
são favorecidas, sobretudo devido as suas frequentes idas e vindas aos serviços de saúde, por
lhes fornecer maior conforto na locomoção com o transporte público até a instituição e um
cuidado em saúde prioritário.
Complementando esses direitos, o decreto n° 3.691 de 2000, regulamentou a Lei
n° 8.899 de 1994, que fala acerca da concessão do passe livre no transporte coletivo
interestadual as pessoas com deficiências que comprovarem ser carentes financeiramente. A
partir do referido decreto, tornou-se obrigatória a reserva de dois assentos de cada veículo
pertencente às empresas permissionárias e autorizatárias, dos serviços convencionais, para as
pessoas com deficiência (BRASIL, 2000b). Aspecto muito relevante para os que residem em
municípios que ainda não possuem serviço especializado de saúde, como em muitos interiores
dos estados brasileiros, onde as pessoas com mielomeningocele precisam se deslocar para as
capitais ou municípios maiores localizados em outros estados para receberem um atendimento
específico e multiprofissional.
Outro importante marco foi à aprovação da proposta da Política Nacional de
Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência na 104ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional
de Saúde. Mediante esse fato, a portaria n° 1.060 de 2002, aprovou essa política, tendo como
foco a reabilitação do portador de deficiência, sua proteção em saúde e a prevenção dos
agravos que predispõem o surgimento das deficiências, através da formulação de um grupo de
ações articuladas entre diferentes setores da sociedade e a sua efetiva participação (BRASIL,
2002).
Essa política veio a contribuir com as demais, abordando aspectos exclusivos
sobre os direitos em saúde dessas pessoas, discutindo as medidas para a sua promoção,
reabilitação, atenção integral, por meio de um atendimento qualificado desde as unidades
básicas de saúde até o nível hospitalar terciário, e as responsabilidades dos gestores federais,
estaduais e municipais. Ademais, ela prevê um processo contínuo de avaliação, sendo, para
tanto, necessária à criação de parâmetros e indicadores, que somados aos dados gerados pela
avaliação dos planos e programas, possibilitaria o reconhecimento do grau de alcance dos
seus propósitos e dos impactos na qualidade de vida dessas pessoas (BRASIL, 2008).
Nesse contexto, em 2009 foi aprovado o Programa Nacional de Direitos Humanos
(PNDH), por meio do decreto de n° 7.037, que apresentou várias diretrizes para a efetivação
dos direitos da população, sendo que a de número sete tem como objetivo estratégico IV a
ampliação do acesso universal ao sistema de saúde de qualidade, através da expansão e
consolidação de programas de saúde com apoio diferenciado as pessoas com deficiência.
40
Além disso, esse programa também objetiva assegurar e desenvolver mecanismos para que
crianças sejam capacitadas a formular seus próprios juízos e possam opinar na criação das
políticas públicas voltadas para os seus direitos, garantindo sua participação nas conferências
que abordem esses assuntos (BRASIL, 2009b).
Somente a partir de 2011 houve um maior desenrolar das ações e estratégias em
benefício as pessoas com deficiência, a partir do decreto n° 7.612 que instituiu o Plano
Nacional da Pessoa com Deficiência - Plano Viver sem Limite. Após sua elaboração o decreto
de n°6.215 de 2007 foi revogado, pois este plano abrange uma ampla gama de novas
diretrizes e direitos. A proposta deste é fazer com que as políticas governamentais de acesso à
educação, inclusão social, atenção à saúde e acessibilidade realmente aconteçam na vida
dessas pessoas que apresentam limitações para o desenvolvimento de suas atividades. Esse
plano foi elaborado com a participação de mais de 15 ministérios e do CONADE, que
forneceu as contribuições da sociedade civil, e prevê um investimento total de 7,6 bilhões de
reais até o ano de 2014 (BRASIL, 2011c).
Esse plano também propôs diferentes ações, em diversas áreas do contexto de
vida dessas pessoas, como educação, trabalho, moradia, saúde, acesso, entre outras. Entre
estas, junto com o Plano foi criada a Secretaria Nacional de Acessibilidade e Programas
Urbanos (SNAPU), dentro do Ministério das Cidades, com o objetivo de promover a inserção
da temática acessibilidade urbana dentro dos projetos governamentais, através da instituição
de uma política nacional para implementar o que diversas leis já preconizavam há alguns
anos.
Em relação à tecnologia assistida, muitas vezes necessária, principalmente pelas
pessoas com deficiência física para que estes tenham suas limitações reduzidas com o auxílio
de um equipamento, aumentando sua autonomia, o Plano teve como metas o estímulo à
pesquisa nessa área e a criação de uma linha de crédito facilitado com juros subsidiados pelo
Governo Federal para aquisição desses produtos – o Banco do Brasil Crédito Acessibilidade,
onde qualquer cidadão pode ter o direito a sua aquisição para adquirir os produtos de
tecnologia assistida (BRASIL, 2011c).
Quanto aos direitos em saúde, o Governo Federal, através desse Plano, está se
propondo a aumentar o acesso e qualificar a assistência às pessoas com deficiência
(temporária ou permanente; progressiva, regressiva ou estável; intermitente ou contínua) no
SUS, focalizado na organização e atenção integral à saúde. Nesse sentido, foi criada em 2012
a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, que busca a construção de estratégias e
serviços para o atendimento às pessoas com deficiência em suas necessidades específicas de
41
saúde. Com essa Rede, preconizou-se o estabelecimento da articulação dos serviços de saúde,
com a garantia de ações de promoção à saúde, identificação precoce das deficiências,
prevenção dos agravos, tratamento e reabilitação (BRASIL, 2011c; DEFICIÊNCIA, 2013).
Entre as metas construídas, com o prazo até 2014, destacam-se: qualificação dos
serviços já existentes, de urgência e emergência, atenção básica e hospitalar, capacitação dos
profissionais de saúde da atenção básica, criação de 45 novos Centros Especializados em
Reabilitação (CER), visando ampliar o acesso, construção de oficinas ortopédicas e ampliação
da oferta de órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção, vinculados aos serviços de
reabilitação do SUS (BRASIL, 2011c).
Buscando facilitar a locomoção dessas pessoas aos CER, estabeleceram-se metas
para a obtenção de veículos para o transporte das pessoas com deficiência, que não possuem
condições de mobilidade e acessibilidade autônoma aos transportes públicos, ou que
apresentem grandes restrições de acesso a estes. Também objetivando a ampliação do acesso,
o plano compromete-se na inauguração de seis oficinas ortopédicas fixas e 13 itinerantes,
terrestres, fluviais ou em caminhões, todas vinculadas à rede de reabilitação do SUS, para que
sejam garantidas a indicação de dispositivos apropriados a cada indivíduo que necessite desse
suporte, além de serem adequados ao ambiente físico e social (BRASIL, 2011c).
Por constituir-se em uma proposta recente, que apresenta metas até o ano atual,
não se tem muitos dados concretos acerca de sua implementação, nem se a população possui
conhecimentos desses direitos em saúde e das estratégias do Plano Viver sem Limites.
Refletindo acerca dessa problemática, Interdonato e Greguol (2012) afirmam que na teoria as
políticas de saúde estão satisfatoriamente regulamentadas para atender aos indivíduos com
deficiência, entretanto, poucas pesquisas foram realizadas a fim de conhecer se a teoria condiz
com as práticas em relação a essa parcela da população.
Em relação ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) citado na constituição de
1988, este foi primordialmente regulamentado pelo decreto n° 1.744, de 8 de dezembro de
1995, que posteriormente foi revogado, e novo decreto de n° 6214 foi instituído em 2007,
garantindo o direito a um salário mínimo mensal, fornecido pelo Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS), à pessoa com deficiência, que comprovassem não possuir nenhuma renda para
prover sua subsistência e nem tê-la provida pelos seus familiares (BRASIL, 2007a).
Um novo decreto (n°7.617) criado em 2011, estabeleceu algumas alterações
acerca do decreto anterior, ao definir quais familiares seriam computados com relação ao
recebimento de renda mensal, que rendimentos seriam ou não considerados durante a
avaliação da real necessidade de fornecimento do benefício, entre outros critérios que
42
estabelecem que pessoas podem recebê-lo. A pessoa com deficiência foi definida como aquela
que apresenta impedimentos de longo prazo, de origem física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais relacionando-se com diversas barreiras podendo limitar sua participação plena e
efetiva na sociedade, com igualdade de condições com os demais indivíduos (BRASIL,
2011d).
Para fins de reconhecimento desse direito às crianças e aos adolescentes menores
de 16 anos, deve ser analisada a existência da deficiência e o seu impacto no desempenho das
atividades dessas pessoas, bem como as consequentes restrições na participação social,
adequadas com a idade.
Retomando o contexto da mielomeningocele, as crianças e os adolescentes com
essa enfermidade, além das prováveis deficiências físicas e cognitivas, possuem complicações
específicas, com destaque para a incontinência fecal e a urinária. Desse modo, apesar de
serem favorecidas com algumas das políticas públicas abordadas, em favor das pessoas com
deficiência, elas ainda carecem de um suporte para os seus problemas de saúde específicos.
Visando amenizar os desconfortos e limites impostos pela incontinência fecal,
tem sido instituída no Brasil uma proposta, já utilizada internacionalmente, de realização do
enema fecal domiciliar. Para tanto, as crianças e adolescentes recebem, juntamente com seus
familiares, um treinamento ambulatorial para tornarem-se capacitados a realizá-lo em casa,
eliminando ou reduzindo a necessidade de utilização de fraldas, que além de produzirem mau
cheiro com a presença das fezes, podem gerar um estigma nessas pessoas e ser um obstáculo
para a sua socialização. Entretanto existem apenas dois desses ambulatórios no Brasil, sendo
um desses localizado em Fortaleza, Ceará, em um hospital público terciário de referência
pediátrica, o que restringe o acesso a esse atendimento, suporte e orientação em níveis
nacionais (FROTA, 2012).
Ambas as incontinências proporcionam algumas dificuldades para essas crianças e
esses adolescentes, tanto em relação à necessidade de materiais adequados para realização
desses procedimentos em casa, como em relação às saídas de casa para exercerem suas
atividades de forma independente, como ir à escola, por tornarem-se diretamente dependentes
dos seus familiares, ou para realização da SVA e do enema, ou para a troca das fraldas e
higienização (SOUSA; BARROS, 2010).
Desse modo, observa-se como esses usuários e suas famílias ainda carecem de um
maior suporte do sistema público de saúde em relação a essas necessidades específicas,
revelando a precisão de implementação de novas políticas que forneçam apoio para esses
indivíduos e que sejam de fato instituídas e avaliadas as já existentes.
43
Outro aspecto que merece destaque no contexto das crianças e adolescentes com
mielomeningocele é o marcante e essencial papel da família como principal rede de apoio e
fonte de cuidado para essas pessoas, sendo fundamental destacar-se também que não existem
políticas públicas ou ações mais abrangentes direcionadas para o seu apoio (OTHERO;
DALMASO, 2009).
44
3 METODOLOGIA
3.1Tipo de estudo
Estudo de natureza exploratória, ancorando-se em uma abordagem qualitativa. A
opção pela metodologia qualitativa é consonante com Minayo (2010), para quem esta
abordagem se afirma no campo da subjetividade, com o universo de significados, crenças,
valores, entre outros, onde procuramos compreender uma determinada situação na perspectiva
dos indivíduos que a vivenciam. Leopardi (2002) corrobora com Minayo, afirmando que, na
pesquisa qualitativa, busca-se apreender um assunto na perspectiva das pessoas que o
vivenciam, ou parte da sua vida diária, seus sentimentos e desejos, bem como da perspectiva
do pesquisador.
A pesquisa qualitativa da ênfase a um nível de realidade que não pode ser
quantificado, trabalhando com um espaço das relações, dos processos e dos fenômenos de
maneira mais profunda, que não podem ser resumidos a variáveis. Constitui-se também como
um processo em espiral, onde se começa com a delimitação de um problema ou
questionamento acerca da realidade e termina-se com um resultado provisório, apto para
originar novas interrogações (MINAYO, 2003).
3.2 Cenário da pesquisa
A pesquisa foi realizada em um hospital público terciário de Fortaleza, referência
no cuidado à criança e ao adolescente no estado do Ceará, incluindo as pessoas com
mielomeningocele, que oferece assistência nas diversas especialidades médicas, como:
neurologia, cirurgia geral pediátrica, pneumologia, endocrinologia, geneticista, cardiologia,
nefrologia, gastroenterologia, oftalmologia, ortopedia, reumatologia, obstetrícia, plástica,
oncologia, dermatologia, infectologia, nutricionista, alergologia, imunologia, urologia, entre
outras.
Sua atuação contempla serviços de emergência clínica e cirúrgica, envolvendo
procedimentos de alta complexidade em oncologia, neurocirurgia, cirurgia cardíaca e crânio
facial, além de Unidades de Terapia Intensiva, Unidades Neonatais de Médio e Alto Risco e
serviços técnicos de diagnóstico e terapêuticos. Apresenta 306 leitos hospitalares, dos quais
42 são de terapia intensiva, internações eletivas e de emergência.
45
A instituição serve de campo de estágio para diversos cursos de graduação na
área da saúde e de residência médica em várias especialidades pediátricas. Logo, é um
hospital público que além de prestar serviços de atenção à saúde da criança, tem uma
importante participação na formação dos profissionais de saúde. Em 2006, foi certificado
pelos Ministérios da Educação e Saúde como Hospital de Ensino, ampliando suas
competências.
Destaca-se também, os vários programas de humanização implementados nesse
hospital, inclusive projetos pioneiros no Estado do Ceará, como o projeto “Cirurgia Segura”
que consiste em um trabalho integrado desenvolvido pelo serviço de Enfermagem e Terapia
Ocupacional, com vistas a proporcionar uma assistência humanizada e qualificada às crianças
com indicação de intervenção anestésico-cirúrgica. Além desse, existem outros programas em
funcionamento, como o “A hora e a vez da leitura”, destinado a atividades com as mães
acompanhantes, “Cidade da criança”, local com diversos espaços e brinquedos para que as
crianças e os adolescentes hospitalizados possam desfrutar de momentos de lazer, “Biblioteca
viva”, tendo como objetivo envolver profissionais, acompanhantes, crianças e adolescentes
internados no hábito da leitura, “Biblioterapia”, projeto que visa a contação de histórias para
crianças e adolescentes no leito de internação, entre outros.
Desde 2011 a instituição está em processo de expansão e organização estrutural, e
já teve uma ampliação no número de leitos de internação, aquisição de novos equipamentos,
implantação de novas unidades e serviços ambulatoriais. Dentre os avanços, destaca-se a
conquista do Núcleo Especializado em Tratamento Infantil da Incontinência Fecal (Netiif),
sendo a primeira unidade Norte-Nordeste e a segunda no Brasil a prestar essa assistência
(FROTA, 2012).
O público alvo do atendimento do Netiif são usuários que tenham submetido-se a
cirurgias de correção do ânus e reto, usuários com mielomeningocele e aqueles que tenham
sofrido algum trauma na região perineal. Após apenas nove meses desde a sua implementação
em dezembro de 2011, o núcleo formado por uma equipe multiprofissional (médico,
enfermeira e nutricionista) já havia obtido êxito com 23 crianças e adolescentes dos 27
atendidos, conseguindo torná-los, de forma artificial, continentes, o que tem proporcionado
uma melhor qualidade de vida para esses usuários, que conseguiram abandonar as fraldas
descartáveis (HIAS, 2012).
Além desse atendimento para as crianças e os adolescentes com
mielomeningocele, o hospital também realiza o tratamento e acompanhamento ambulatorial
desses usuários e de outras crianças e adolescentes, procedentes de todo o estado do Ceará,
46
através do setor denominado Ambulatório de Especialidades, que atualmente está localizado
em uma parte do hospital que já foi reformada e expandida, incluindo serviços de:
alergologia, gastrologia, neurologia, pneumologia, oftalmologia, ginecologia, reumatologia,
cirurgia pediátrica, pediatria, nefrologia, psicologia, nutrição, odontologia, neuropediatria,
urologia, genética e endocrinologia.
Este ambulatório foi o local de escolha principal para a busca dos participantes
dessa pesquisa, em virtude da grande demanda de usuários menores de 18 anos com
mielomeningocele assistidos nesse serviço de referência, em algumas especialidades
específicas.
3.3 Participantes da pesquisa
O estudo foi realizado com familiares responsáveis pelas crianças/adolescentes
com mielomeningocele que participavam do seu acompanhamento e tratamento no referido
hospital em estudo. Desse modo, considerou-se como criança, a faixa etária de até 12 anos de
idade incompletos, e adolescentes, a faixa entre 12 e 18 anos, de acordo com o ECA (1990).
Inicialmente pensou-se em realizar-se o estudo com 12 familiares. Para tanto, os
critérios de inclusão foram: o familiar responsável pela criança ou adolescente estar presente
durante o acompanhamento e tratamento no hospital, ser o acompanhante de rotina aos
serviços de saúde, de forma a compartilhar informações com um maior teor de detalhes
quanto ao objeto em estudo, e apresentar disponibilidade de tempo para participar da
pesquisa. Os critérios de exclusão foram: os familiares apresentarem algum déficit mental que
prejudicasse a sua participação nas entrevistas e terem pouco conhecimento acerca do
cotidiano da criança ou do adolescente.
Ao adentrar-se no campo em busca dos familiares, a princípio os pesquisadores
encontraram algumas dificuldades para identifica-los, pois, tanto o Ambulatório de
Especialidades, como o serviço de terapia ocupacional e fisioterapia, não organizavam suas
agendas através das patologias dos usuários, desse modo, estes não sabiam ao certo quando
localizar uma criança ou adolescente com mielomeningocele.
Assim sendo, procurou-se o Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME) do
hospital, setor responsável pela marcação das consultas. Entretanto também seria um caminho
dispendioso, devido ao desconhecimento dos pesquisadores acerca dos nomes e prontuários
dos usuários com mielomeningocele. A estratégia utilizada, portanto, pelas pesquisadoras foi
de estar presente nos horários das principais especialidades relacionadas à patologia, em
47
consequência as suas complicações: nefrologia, urologia, neuropediatria e neurocirurgia.
Obteve-se êxito e, ao final da pesquisa, atingiu-se um total de 17 familiares, havendo duas
recusas para participação da pesquisa, permanecendo 15 pessoas, sendo delimitado o término
da coleta com base no grau de aprofundamento das informações fornecidas.
3.4 Estratégias e técnicas para a coleta das informações
A coleta foi realizada no período de setembro de 2013 a fevereiro de 2014 em dois
momentos diferentes. Na primeira etapa, foram realizadas visitas ao ambulatório de
atendimento às crianças e aos adolescentes com mielomeningocele, onde foram desenvolvidas
observações sistemáticas do serviço e das atividades realizadas. Nessa fase, utilizou-se um
roteiro com alguns tópicos para facilitar e guiar as observações e um diário de campo, onde
foram registradas as informações pertinentes ao estudo.
Essa fase foi de grande importância para os pesquisadores, facilitando sua
aproximação com a instituição, os participantes do estudo e as atividades realizadas no
serviço. Ressalta-se que a observação sistemática além de ser realizada nessa primeira etapa
de forma exclusiva, também ocorreu simultaneamente a fase de entrevistas.
Salienta-se que durante esse período, apesar dos profissionais de saúde não
fazerem parte dessa pesquisa, foi possível entrar-se em contato com alguns dos que exerciam
atividades a crianças e adolescentes com mielomeningocele no referido hospital, sendo
possível compreender-se melhor o funcionamento desse serviço, através de suas experiências
de atendimento, o que complementou a discussão dos resultados.
Na observação sistemática ou dirigida, detalham-se previamente alguns aspectos a
serem observados. Os tópicos são formulados de acordo com o objeto em investigação na
pesquisa e a partir de alguns aspectos exploratórios da realidade empírica. Desse modo, de
acordo com os objetivos delimitados, estabelece-se o conteúdo dessa atividade de observação,
ainda que após o seu início perceba-se a necessidade de realização de mudanças (MINAYO,
2010).
Para a realização da observação sistemática é imprescindível a utilização de um
diário de campo, onde são feitos os registros nas cenas e situações percebidas. Nesse material,
o pesquisador faz todas as anotações relevantes observadas, acerca de conversas,
comportamentos, atitudes, gestos e expressões que se relacionem a temática estudada
(MINAYO, 2010).
48
Na segunda etapa foram realizadas entrevistas com os familiares acompanhantes
das crianças e dos adolescentes, em um espaço reservado e silencioso, antes ou após as
consultas, da maneira que fosse mais cômoda para os participantes. Inicialmente, pensou-se
em buscar estratégias para que, preferencialmente, as crianças e os adolescentes não
estivessem presentes no momento das entrevistas, para evitar possíveis intimidações nos
familiares, entretanto foi inviável devido ao espaço e tempo para a realização das entrevistas.
Por outro lado, não percebeu-se haver intimidação por parte dos familiares, que demonstraram
sentirem-se a vontade para falar sobre suas experiências.
Utilizamos um roteiro de entrevista semiestruturada com dois itens, sendo o
primeiro de caracterização da criança e do adolescente (idade, sexo, número de irmãos,
posição entre irmãos, escolaridade, serviços de saúde que faz acompanhamento e tratamento,
complicações durante o tratamento, número de internações, uso de tecnologia assistida), do
familiar acompanhante (grau de parentesco, sexo, idade, escolaridade, estado civil, ocupação,
procedência) e da família (renda e organização familiar).
O segundo item foi composto pelas seguintes questões e perguntas norteadoras:
Fale acerca da sua experiência cotidiana no cuidar de uma criança/um adolescente com
mielomeningocele desde o seu nascimento; 2) Fale acerca da experiência de vocês na busca
pelos serviços de saúde e o atendimento da criança/adolescente nesses serviços desde o seu
nascimento (hospitais, serviços especializados, unidades básicas; 3) Existem nesses espaços
adaptações estruturais para que a criança/adolescente consiga entrar no serviço? Qual a
localização da Unidade Básica de Saúde, serviços especializados e hospital mais próximo da
sua casa? Como tem sido a locomoção até esses serviços? 4) Fale acerca de treinamentos para
cuidar da criança/adolescente em casa que vocês tenham recebido; 5) A senhora/senhor sabe
se existem direitos em saúde para as crianças e aos adolescente com mielomeningocele
(durante a realização dessa pergunta foram dadas explicações sobre o que seria “direito” para
facilitar a compreensão dos participantes). Pode citá-los? Quais vocês têm adquirido? Como
conseguiu adquiri-los? 6) Quais os benefícios financeiros ou auxílios no cuidado à
criança/adolescente vocês recebem? Todas as entrevistas foram gravadas em gravador digital
e transcritas somente pelas pesquisadoras.
Durante a realização das entrevistas foram feitas, de forma contínua, pré-análises
dos depoimentos, visando com base no aprofundamento e grau de recorrência e divergência
das informações fornecidas delimitar-se o momento de finalização.
49
3.5 Estratégia para a análise das informações
O material empírico produzido, a partir das entrevistas, foi transcrito na íntegra e
organizado em arquivos individuais. Na análise das informações, foram seguidas as etapas
recomendadas pela Análise Categorial Temática de Bardin (2011), que funciona através de
operações de desmembramento de um texto em unidades e categorias, de acordo com
reagrupamentos analógicos. Dentre as diferentes formas de categorização, a investigação
através de temas (análise temática), é considerada eficaz e rápida na perspectiva de aplicarem-
se discursos simples e diretos (significações manifestas).
Para tanto, são seguidas três etapas: pré-análise; exploração do material;
tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. A pré-análise é decomposta em três
atividades: 1) Leitura flutuante, momento em que acontece o primeiro contato direto com os
achados da pesquisa, aonde o pesquisador progressivamente vai apropriando-se do conteúdo;
2) Análise dos documentos: o universo dos documentos é selecionado, sendo feita a
constituição do corpus, o que implica seguir as regras de exaustividade (achados contemplam
todos os aspectos existentes no roteiro), representatividade (a amostra é parte representativa
do universo inicial), homogeneidade (obedecer a critérios específicos de escolha quanto aos
aspectos abordados) e pertinência (as informações analisadas sejam adequadas aos objetivos);
3) Formulação das hipóteses e objetivos: a hipótese é uma afirmação desenvolvida
provisoriamente a que é proposta a sua verificação e o objetivo é a finalidade a que os
pesquisadores se propõem; 4) A referenciação dos índices e a elaboração de indicadores: os
índices podem ser a menção explicitada em uma mensagem; 4)A preparação do material: os
achados são editados para a análise.
A segunda etapa, de exploração do material, é composta por operações de
decomposição, enumeração ou codificação, a partir de regras formuladas previamente,
visando à definição das categorias. A codificação seguiu os seguintes passos de acordo com
Bardin: recorte das unidades temáticas (núcleos de sentido que conferem significado aos
aspectos analisados no estudo) enumeração, escolha das categorias (classificação e
agregação).
A terceira e última fase, de tratamento dos resultados obtidos e interpretação, os
dados são tratados de modo a serem válidos e significativos. Nessa fase, o pesquisador realiza
inferências e interpretações, relacionando-os com o referencial teórico inicial, ou pode gerar
novas dimensões teóricas e interpretativas, a partir da leitura do material, no intuito de
destacar as principais informações encontradas na pesquisa e expô-las de forma clara. As
50
categorias devem possuir as seguintes qualidades: exclusão mútua, homogeneidade,
pertinência, objetividade e fidelidade, produtividade.
Após a análise final dos dados com a elaboração dos temas centrais, sintetizou-se
as seguintes categorias temáticas: O cotidiano de crianças e adolescentes com
mielomeningocele e suas famílias; O acesso de crianças e adolescentes com
mielomeningocele na Rede de Atenção à Saúde do SUS; Os direitos em saúde das crianças e
dos adolescentes com mielomeningocele: entraves e avanços.
3.6 Questões éticas da pesquisa
Destaca-se que a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do
referido hospital sob parecer número 401.189 e teve a anuência da gerência do Ambulatório
de Especialidades. Também foram preconizadas as normas da Resolução 466/2012 do
Conselho Nacional de Saúde, que determina o respeito à autonomia dos sujeitos, a
beneficência, a não maleficência e a justiça (BRASIL, 2012a). Todos os participantes foram
informados sobre o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), apresentado nos
apêndice, sendo orientados acerca dos objetivos da pesquisa, dos riscos e benefícios, da
possibilidade de poderem desistir da sua participação em qualquer momento e que não teriam
nenhum ônus. O TCLE consistiu de duas vias que foram assinadas, sendo uma entregue ao
participante e a outra mantida pelo pesquisador.
Na pesquisa qualitativa, como em outras abordagens, o respeito ao anonimato e
sigilo são particularmente importantes. Em pequenos espaços sociais, em geral, através de
alguns descritores é possível identificar os participantes. Algumas precauções foram adotadas
a fim de proteger a identidade dos participantes, profissionais citados nas falas, instituições de
saúde e municípios de procedência dos entrevistados. Assim, identificamos os entrevistados
por outros nomes e substituímos os nomes de pessoas, serviços e localidades citados nas falas
por letras, omitindo seus verdadeiros nomes, como preceitua a ética em pesquisa.
51
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES, DAS CRIANÇAS E DOS
ADOLESCENTES
4.1.1Apresentação dos familiares
No total, 15 responsáveis pelas crianças e pelos adolescentes participaram da
pesquisa, sendo que destes, 14 eram mães e apenas um era pai. O quadro abaixo faz uma
breve apresentação de cada uma dessas pessoas, de acordo com a idade, estado civil,
escolaridade, profissão, número de filhos e a posição do filho com mielomeningocele entre os
demais.
QUADRO 1 – Caracterização dos responsáveis. Fortaleza, CE. 2014.
Nome Idade
Estado civil
Escolaridade Profissão Total de filhos
Posição do filho
Procedência
Jane 45 Casada ESC Professora 2 Segundo RMF
Léa 18 União
Estável
EMI Estudante 1 Único Fortaleza
Mara 35 Casada EFI Dona de
casa
2 Segundo RMF
Marta 46 Solteira EFI Agricultora 6 Sexto IEC
Naomi 33 Casada Analfabeta Dona de
casa
5 Quinto IEC
Penha 30 Casada EFI Dona de
casa
2 Primeiro IEC
Ezequias 26 Casado EMC Agricultor 2 Primeiro IEC
Priscila 39 Solteira EFI Dona de
casa
3 Terceiro RMF
Raquel 30 Casada EFI Dona de
casa
3 Terceiro RMF
Rafaela 27 Casada EMC Dona de
casa
1 Único RMF
Rebeca 35 Solteira EFI Dona de
casa
5 Quinto IEC
Sandra 42 Casada EFC Dona de
casa
2 Segundo Fortaleza
Samara 31 União
Estável
EFI Agricultora 4 Segundo IEC
Safira 41 Casada EFI Agricultora 3 Terceiro IEC
Lídia 35 Solteira EFI Dona de
casa
5 Quinto RMF
LEGENDA: EFI – Ensino Fundamental Incompleto; EFC – Ensino Fundamental Completo; EMC – Ensino
Médio Completo; ESC – Ensino Superior Completo/ IEC – Interior do Estado do Ceará; RMF – Região
Metropolitana de Fortaleza.
52
As mães foram predominantes no estudo, aspecto este que corrobora com a
literatura, ao revelar que elas são as principais cuidadoras e acompanhantes das crianças com
necessidades especiais de saúde (CIPRIANO; QUEIROZ, 2008; ELIAS; MONTEIRO;
CHAVES, 2008; PAVÃO; SILVA; ROCHA, 2011; ASTOLPHO; OKIDO; LIMA, 2014). No
que diz respeito à faixa etária, observa-se que esta variou de 18 a 46 anos de idade, havendo
um predomínio de participantes entre 30 e 40 anos (10), sendo a média de 34 anos, revelando
pessoas que podem apresentar maiores experiências de vida.
Em relação ao grau de escolaridade, mais da metade havia cursado o Ensino
Fundamental Completo ou Incompleto (8), com apenas uma pessoa analfabeta e uma que
havia cursado o Ensino Superior Completo. Esse baixo nível escolar, influenciou na
compreensão dos responsáveis em relação aos questionamentos realizados durante a pesquisa,
por meio das entrevistas, e capacidade para respostas com maior grau de aprofundamento,
aspectos que foram discutidos nas categorias posteriores.
Quanto ao estado civil, a maioria dos responsáveis eram casados ou viviam em
união estável (11), aspecto este que esteve relacionado a dinâmica familiar após a chegada da
criança, havendo a possibilidade do companheiro(a) auxiliar a família financeiramente e, em
alguns casos, contribuir com os cuidados. No que diz respeito à ocupação, houve um
predomínio de pessoas que não exerciam atividades laborais formais, realizando atividades
apenas de cuidado do domicílio e dos filhos, com enfoque na criança e no adolescente com
mielomeningocele, que revelou ser a justificativa para a impossibilidade de se exercer um
trabalho formal. Quatro pessoas possuíam empregos informais na agricultura e uma estava
afastada do seu trabalho como professora, devido a questões de adoecimento.
Em relação ao número filhos e a posição da criança e do adolescente com
mielomeningocele, a maioria (12) possuíam mais de um filho, e, entre esses, nove dos com
mielomeningocele eram os mais novos. Aspecto este relevante ao pensar-se que, para a mãe,
vista como a principal cuidadora, o número de filhos poder influenciar nos cuidados a criança
e ao adolescente com mielomeningocele, por aumentar suas responsabilidades domésticas e
carga de trabalho.
No que concerne à procedência, apenas dois residiam na capital do Ceará,
Fortaleza, havendo um predomínio de pessoas que residiam no interior do estado (7) e Região
Metropolitana (6). Desse modo, a pesquisa possibilitou ter-se uma visão mais ampliada acerca
de como tem ocorrido o acesso e o atendimento de usuários menores de 18 anos com
mielomeningocele em diferentes municípios do estado do Ceará, além de revelar a distância a
53
que estas famílias precisam pecorrer para levar seus filhos até o hospital de referência
pediátrica na capital do estado, para o seu acompanhamento.
No tocante a renda familiar, considerando-se o salário mínimo de 724,00 reais, de
acordo com o Decreto 8.166 de 2013, a maioria (10) vivia com um a dois salários mínimos
mensais (BRASIL, 2013a). Destaca-se que o BPC das crianças e dos adolescentes no valor de
um salário mínimo, teve sua importância bastante evidenciada nas falas dos entrevistados,
como de vital relevância para o suprimento das famílias e cuidado com a saúde e tratamento
dessas pessoas com necessidades especiais de saúde.
Nessa perspectiva, destaca-se que de acordo com Brandão, Fujisawa e Cardoso
(2009), o estado socioeconômico pode interferir negativamente na situação nutricional de
crianças com mielomeningocele, conforme mostraram os seus achados.
Outra importante fonte de renda dessas famílias, ressaltando-se o desemprego dos
seus membros, o afastamento do trabalho em virtude dos cuidados contínuos a
criança/adolescente com mielomeningocele e as atividades informais, que não possuem
garantia de um salário mensal, foi o Bolsa-Família. Este faz parte de um programa do
Governo Federal, que teve início em 2004, por meio da Lei nº 10.836, funcionando por meio
da transferência direta de renda para famílias em condições de pobreza e extrema pobreza
Esse estudo encontrou falas de alguns participantes revelando a importância deste
auxílio para a sua sobrevivência, devido ao fato de constituir-se em alguns casos a única fonte
de renda das famílias e as baixas condições de empregabilidade no interior do estado do
Ceará.
4.1.2 Apresentação das crianças e dos adolescentes com mielomeningocele
O quadro na página a seguir faz a caracterização das crianças e dos adolescentes
com mielomeningocele filhos dos 15 familiares entrevistados, quando a idade, o sexo, a
escolaridade, as principais sequelas, o tipo de deambulação (conforme descrição no
referencial teórico) e equipamento de tecnologia assistida utilizada.
54
QUADRO 2 – Caracterização das crianças e dos adolescentes. Fortaleza, CE. 2014.
Nome Idade Sexo Escolaridade Principais
Sequelas
Deambulação Tecnologia
Assistida
Débora 8 anos F 2° ano IU, IF, Marcha não
funcional
Órtese nas pernas
Hannah 3 meses F ________ SD SD Não utiliza
Jardine 1 ano e
3 meses
F ________ IU SD Não utiliza
Sulamita 2 anos e
6meses
F Não estuda IU Não caminha Não utiliza
Susana 13 anos F 3°ano IU, IF Não caminha Cadeira de rodas
Talita 4 anos F Não estuda IU,
constipação
Não caminha Não utiliza
Bejamim 5 anos M Não estuda IU, IF Não caminha Não utiliza
Calebe 9 meses M ________ SD SD Não utiliza
Daniel 2 anos e 5 meses
M Não estuda IU, IF Não caminha Cadeira de rodas
Verônica 5 anos F Não estuda IU, IF Não caminha Cadeira de rodas e
órtese pernas e
braços
Davi 10 anos M 4°ano IU, IF Marcha não
funcional
Cadeira de rodas
Gabriel 9 anos M 3°ano IU Marcha não
funcional
Órtese nas pernas,
andador e cadeira
de rodas
Zilá 12 anos
e 2
meses
F 7° ano IU, IF Não caminha Cadeira de rodas
Dara 6 anos F 1°ano IU, IF Não caminha Cadeira de rodas e
órteses nas pernas
Ester 1 ano e
3 meses
F ________ IU SD Cadeira de rodas
LEGENDA: IU – Incontinência Urinária; IF – Incontinência Fecal; SD – Sem Diagnóstico; F –
Feminino; M – Masculino.
Dentre eles prevaleceu o sexo feminino (10). Quanto à idade, esta variou de três
meses até 13 anos, com a seguinte distribuição por faixa etária: três meses até três anos (6),
quatro a oito anos (5) e nove a treze anos (4). Logo, levando-se em consideração o ECA
(1990), participaram 13 crianças e dois adolescentes. Apesar de terem sido uma minoria, as
entrevistas com os responsáveis por estes adolescentes contribuíram de forma significativa
para os achados da pesquisa, não sendo excluídos, portanto, do estudo.
No que diz respeito à escolaridade, das nove crianças e adolescentes que estavam
dentro da faixa etária obrigatória (a partir de quatro anos), para estarem matriculados no
ensino educacional, seis frequentavam a escola (BRASIL, 2013b). Os motivos principais para
55
que os pais não tivessem matriculado seus filhos, segundo os seus relatos, estavam
relacionados às sequelas da mielomeningocele, como a dificuldade de caminhar, e os déficits
cognitivos associados a hidrocefalia que levavam os familiares a acreditarem que a escola não
serviria para os seus filhos, e por não haverem escolas com suporte físico e estrutural que
dessem oportunidade para a criança/adolescente estudarem adequadamente.
Nesse sentido, destaca-se que, de acordo com as Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, o atendimento educacional especializado as pessoas de quatro a 17 anos com
deficiência, deve ser gratuito e estabelecido de forma preferencial na rede regular de ensino
(BRASIL, 2013b). Reforça-se ainda, que segundo o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa
com Deficiência, deve ser garantida uma educação inclusiva as pessoas com deficiência, por
meio de equipamentos gratuitos de educação acessíveis a elas (BRASIL, 2011c).
Em relação às complicações decorrentes da mielomeningocele, observou-se, entre
os que já haviam sido detectadas algumas das sequelas (13), grande prevalência de crianças e
adolescentes com incontinência urinária e/ou fecal, aspecto que corrobora com a literatura, ao
apresentar estudos que também revelaram em seus resultados uma alta prevalência de defeitos
renais e vesicais nas pessoas com mielomeningocele, com destaque para a bexiga
neurogênica, o que requer a realização do esvaziamento intermitente por meio do cateterismo
vesical (SBRAGIA et al. 2004; BERGAMASCHI; FARIA; SANTOS, 2012).
Quanto às complicações de locomoção, quatro ainda não haviam sido
diagnosticadas em relação às alterações, devido a faixa etária, oito não deambulavam e três
possuíam uma marcha não funcional, ou seja, deambulavam com dificuldade, necessitando da
cadeira de rodas ou outros suportes para satisfazer todas as suas necessidades. Já em relação à
movimentação dos membros superiores, duas apresentavam dificuldade em locomovê-los.
Desse modo, percebe-se a alta prevalência de pessoas com mielomeningocele que possuem
alterações locomotoras, aspecto este que repercute diretamente no seu cotidiano e atividades
de vida (COLLAGE et al., 2008).
Nesse sentido, destaca-se a importância dos equipamentos que auxiliam essas
pessoas na movimentação de seus membros superiores e inferiores, para a realização de suas
atividades diárias. No estudo, oito utilizavam cadeiras de rodas, quatro órteses nos braços e/ou
pernas, e um fazia uso de andador. Ressalta-se que alguns, mesmo necessitando desses
materiais, não os utilizavam devido a dificuldade de acesso ao recebimento destes e não terem
condições financeiras de os adquirirem, questões também discutidas nas categorias
posteriores.
56
Dentre outras complicações menos frequentes, observou-se, a partir dos relatos
dos responsáveis: pneumonia (1), defeitos na formação da estrutura cardíaca (1) e ausência de
comunicação verbal (2) (havendo apenas reprodução de sons) e convulsão (2).
Quanto às internações hospitalares desde o nascimento da criança/adolescente até
o momento da pesquisa, dos 13 responsáveis que falaram sobre o assunto, percebeu-se que 10
crianças/adolescentes foram submetidos entre uma a cinco internações e três a mais de 10. De
fato, a literatura enfatiza as comuns internações hospitalares dessas pessoas, no intuito de
serem realizadas cirurgias ou tratamentos mais contínuos, em virtude das deficiências,
hidrocefalia e demais sequelas (ELIAS; MONTEIRO; CHAVES, 2008).
No tocante ao acompanhamento terapêutico, seis recebiam assistência em serviços
de reabilitação do SUS ou filantrópicos, com atendimento de fisioterapia, e/ou terapia
ocupacional, sete em um hospital de referência nacional em reabilitação, três pela Estratégia
de Saúde da Família (ESF) e todos eram acompanhados no Ambulatório de Especialidades do
hospital onde a pesquisa foi desenvolvida.
57
4.2 O COTIDIANO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM
MIELOMENINGOCELE E SUAS FAMÍLIAS
Figura 2 - Criança com mielomeningocele Dara. Fortaleza,
CE. 2014.
58
4.2.1 Experiência da família ao nascimento da criança com mielomeningocele
Para a maioria das famílias, a descoberta da mielomeningocele ocorreu somente
após o parto do recém-nascido, apesar das gestantes fazerem um acompanhamento completo
no pré-natal, realizando, durante este, exames de ultrassonografia para o monitoramento do
crescimento e formação fetal.
Na minha gravidez eu fiz três ultrassons, mas não deu para descobrir, se deu eles não me disseram, porque a primeira ultrassom que eu bati ela tava de
costas, e se deu para ver não disseram nada (Léa).
Fiz o pré-natal aos nove meses, mas só foi descoberto quando ela nasceu
(Penha).
Não descobriram no pré-natal, eu fiz as ultrassons normais, fiz a morfológica
e o médico não falou, se ele viu, ele não falou (Mara).
Aspecto que corrobora com o estudo realizado por Araújo et al. (2012),
desenvolvido em outra cidade do nordeste brasileiro, onde o diagnóstico da mielomeningocele
só foi identificado pela ultrassonografia em 21% dos casos pesquisados, embora todas as
gestantes haverem tido realizado o pré-natal e feito pelo menos um exame ultrassonográfico
durante a gravidez, o que evidenciou a importância de uma melhor discussão acerca do acesso
a serviços de maior qualidade e grau de complexidade.
Como se verifica nessas falas, algumas das mães consideraram a possibilidade de
ter havido um diagnóstico precoce, porém não terem sido informadas sobre o problema
congênito em seus filhos. Circunstância esta que gerou sentimento de revolta em uma das
mães, por esta acreditar que durante o pré-natal e realização das ultrassonografias, foi possível
a observação da má-formação, entretanto ocorreu omissão médica acerca de sua comunicação,
fato este que impossibilitou a realização de procedimentos e a tomada de medidas que
visassem à redução das sequelas e correção mais ágil da mielomeningocele.
[...] a única coisa que eu fiquei chateada e se eu pudesse me encontrar com ela foi a
doutora do pré-natal, porque ela não me contou. [...] eu poderia ter ficado
preocupada, ter ficado com medo, mas eu poderia ter procurado um jeito de ajudar a minha filha, porque hoje já tem, não sei se você já viu, uma vez eu já assisti na
televisão uma cirurgia feita na barriga da mãe, a criança nasceu perfeita como se não
tivesse nada e com mesmo problema dela. A criança na barriga da mãe foi
descoberto com quatro meses, ai com quase seis meses fizeram a cirurgia na barriga
da mãe mesmo e quando ela nasceu com nove meses a criança nasceu perfeita
(Mara).
De fato, uma monitorização mais adequada da gestação, por meio do diagnóstico
de problemas congênitos de forma precoce, permitiria a realização de um parto com maior
59
nível de atenção e/ou desenvolvimento de reparações, quando possível, ainda intra-útero
(REIS; SANTOS; MENDES, 2011; ARAÚJO et al., 2012).
Acerca desse tipo de cirurgia uterina, esta representa um marco na correção da
mielomeningocele, e pesquisa recente, de grande magnitude, desenvolvida nos Estados
Unidos, em três centros de cirurgia materno-fetal, que comparou a correção antes e após o
nascimento, revelou resultados significativamente satisfatórios acerca de sua eficácia, por
minimizar a ocorrência de algumas sequelas, como hidrocefalia, herniação cerebelar e
dificuldades motoras, possibilitando maior chance dos pacientes conseguirem deambular
(ADZICK et al., 2011).
Ressalta-se que a sobrevida das pessoas com mielomeningocele estão
relacionadas com o grau das complicações, sendo, portanto, relevante a estimulação do
diagnóstico e tratamento o mais precocemente possível, visando a redução das incapacidades
(MEDEIROS et al., 2011).
A redução dessas sequelas pode afetar diretamente no cotidiano da pessoa com
mielomeningocele e de sua família, fornecendo melhores condições para que ela desenvolva
com mais autonomia suas atividades de vida diária, gerando, consequentemente uma melhor
qualidade de vida. Entretanto, nenhum dos participantes do estudo teve a possibilidade de
realizar essa cirurgia e poucos tiverem a informação quanto ao adoecimento do feto durante a
sua gestação.
Nesse contexto, observou-se que nascimento da criança ocasionou em algumas
famílias grande surpresa e abalo emocional em seus membros, por lidarem com o
desconhecido, novo e diferente, principalmente quando a mãe já havia gestado anteriormente
crianças “normais”, sem alterações congênitas. O estranhamento se deu desde o pós-parto,
antes mesmo de serem informadas sobre a mielomeningocele, por experienciarem situações
diferentes das já vivenciadas nos outros partos.
É uma experiência diferente, muito diferente, porque eu tenho dois filhos e eles são
normais, nasceu normal. Logo no dia que eu tive ela foi diferente, porque levaram
ela pra uma sala, quando passo a anestesia, que me botaram na cama de recuperação
ela já não veio pra mim, eu já estranhei, porque eu não sabia o que era
mielomeningocele, eu não sabia. Até hoje, eu vim descobrir por causa dela, eu não
tinha e nem imaginava o que era isso (Mara).
No estudo de Carvalho et al. (2006), corroborando nossos achados, também
identificou-se que os familiares das crianças com mielomeningocele vivenciaram situações
traumáticas após o nascimento e diagnóstico, com sentimentos de angústia e choque com o
inesperado adoecimento do filho.
60
As situações do parto e pós-parto revelaram-se bastante difíceis e assustadoras
para as mães, ao terem que lidar simultaneamente com a notícia do adoecimento da criança,
com um diagnóstico totalmente desconhecido para elas, com o afastamento brusco do recém-
nascido para ser submetido a cuidados intensivos e com a informação da transferência para
um hospital de referência, muitas vezes localizado em outro município, para a realização da
cirurgia de reparação na criança.
Não sabia [que a criança tinha mielomeningocele], quando eu ganhei ela, as meninas
sem querer me dizer e sem levar a menina pra mim ver, ai eu, “ei traz a menina,
todo mundo com seus meninos no berço, e cadê a menina?” Ai elas “não a menina
não pode vim não”, porque ela não pode vim? “não porque ela tá lá na incubadora, porque ela nasceu com um problema”, “que problema?” “não mulher, não é nada
não, ela nasceu com” ai ela foi e disse a mielo, um negócio chamado mielo, mas que
não era essas coisas demais não, “só que você vai ficar aqui no hospital, pra quando
surgir uma vaga em Fortaleza, você ir”. Ai eu disse assim, “e uma coisa dessa não é
grave ainda?” (Marta).
A comunicação inadequada entre profissionais de saúde e a mãe, e a ausência de
informações após o parto, quanto aos reais motivos do seu afastamento de seu filho, além da
carência de um suporte emocional e esclarecimento acerca do adoecimento e tratamento,
foram evidenciados nessa fala, revelando o despreparo da equipe de saúde para lidar de forma
humanizada com o binômio mãe e filho.
Nesse contexto, destaca-se o estudo realizado por Figueiredo et al. (2013a), ao
discutirem, por meio dos seus achados, que de fato as mães têm a necessidade de serem
informadas acerca tanto do adoecimento de seus filhos, quanto sobre os procedimentos a que
estes serão submetidos. Porém, muitas vezes, as informações fornecidas pela equipe de saúde
não são compreendidas adequadamente pelas mães, e, outras vezes a orientação nem sequer
ocorre, por os profissionais preocuparem-se muito mais na realização de procedimentos
técnicos, distanciando-se do cuidado humanizado a mãe e a criança.
Além disso, observou-se também, que foi repassado para a mãe dados errôneos
quanto à mielomeningocele, sendo dito para ela que o adoecimento da criança era um
problema “simples” de saúde, sem repercussões importantes, ou seja, que não haviam razões
para a mãe preocupar-se. Sugere-se que esta circunstância tenha ocorrido ou por falta de
conhecimento do profissional de saúde acerca do defeito congênito, ou por este ter tido receio
de comprometer emocionalmente a mãe. Entretanto, independente dos reais motivos, o
comportamento desta profissional revelou-se como um ato inapropriado, antiético e
desumano.
Nessa perspectiva, ressalta-se ainda, que algumas puérperas não foram orientadas
acerca do que aconteceria com o recém-nascido, e qual seria o percusso que elas teriam que
61
fazer com a criança para ser realizada a correção da mielomenigocele, dentre outras
explicações, o que também contribuiu para o sofrimento dessas mulheres, que lidavam com
circunstâncias totalmente novas e desconhecidas, sem receberem muitas informações e
atenção ante as suas angústias e demandas de saúde no pós-parto.
Acrescido a todas essas adversidades, uma das entrevistadas ao chegar ao hospital
de referência para a realização da reparação cirúrgica no recém-nascido, foi submetida a
condições estruturais insatisfatórias e insalubres, sendo alocada no corredor do hospital,
devido a grande demanda e lotação do serviço, sem receber informações dos profissionais de
saúde, o que abalou emocionalmente essa mãe, como mostra a fala a seguir:
Quando eu cheguei aqui, ave Maria, só fiz muito foi chorar. Eu fiquei no corredor, numa cama velha, um bocado de mosquito me mordendo lá, eu sentada numa
cadeira [...] tinha acabado de ganhar menino, e sentada numa cadeira, e a menina
chorando e eu sem saber de nada, que nunca tinha vindo aqui, ai chegou uma
enfermeira e disse “mulher, essa mulherzinha não pode ficar aqui não, ela é do
interior, ela numa situação dessa, de dieta, eu vou ajeitar um leito pra ela”, ai foi que
me levou lá pra um quarto (Marta).
O acompanhamento de um filho doente durante a sua internação é um processo
doloroso para as mães, que passam a vivenciar tudo juntamente com a criança, enfrentando as
adversidades e fornecendo apoio para a sua recuperação. Nessa perspectiva, a humanização
no ambiente hospitalar torna-se fator essencial, fazendo-se necessário que os profissionais de
saúde respeitem as particularidades de cada genitora e criança, ouvindo-os, esclarecendo suas
dúvidas, além de buscar a manutenção de uma relação de respeito e ética, centrada no vínculo
entre profissional-paciente (FIGUEIREDO et al., 2013b).
Outra participante da pesquisa, também desvelou o sofrimento enfrentado no
decorrer desse processo, durante o período que acompanhou a internação da criança no pré e
pós-operatório, através de sentimentos de tristeza expressos por meio do choro. Estes se
acentuaram com o afastamento e a saudade dos outros filhos que ficaram em casa e com a
difícil notícia acerca das sequelas da mielomeningocele e riscos operatórios, anunciados pelo
profissional médico de maneira desumanizada.
Quando ele nasceu ele tinha um caroço, quando chegou [ao hospital de referência
pediátrica] ele se operou. O doutor disse: “ou ele morre ou então ele fica aleijado”.
Ai eu disse: “seja o que Deus quiser, ele ficando alejado ou não, eu quero é que ele
fique bom”. Ele era bem pequenininho, você dizia que ele não ia escapar. Ai operaram, eu passei um mês com ele aqui no hospital, sofrendo com ele, chorava de
dia e de noite lembrando dos outros, porque nesse tempo os outros eram pequenos
também (Rebeca).
A notícia da doença congênita no recém-nascido é um momento singular e
delicado, em virtude dos familiares não estarem preparados, durante a gestação, para a
chegada de um filho com problemas de saúde, doenças muitas vezes raras e pouco conhecidas
62
pela população, o que produz medo e dúvidas frente ao inesperado. Nesse meio, ante a
necessidade de repassar para a família as informações acerca do adoecimento, torna-se
relevante que o profissional de saúde esteja sensível às angústias da família, atento ao grau de
escolaridade e compreensão destes, bem como ao momento mais adequado para que estas
informações sejam repassadas.
Um maior detalhamento acerca de informações complexas sobre a doença pode
ser muitas vezes desnecessário, com explicações técnicas relacionadas às complicações, como
as relatas pelo profissional médico na fala acima, conforme declaram Figueiredo et al
(2013a), devido à própria circunstância física e emocional que a mãe lida no puerpério e por
esses dados poderem muito mais confundir os familiares nesse momento, do que esclarecê-
los. Frente a esses aspectos, acredita-se que, antes de tudo, o profissional de saúde deva
acolher essa família e buscar orientá-la da forma mais clara e menos técnica possível,
fornecendo-lhe primordialmente suporte emocional e um cuidado humanizado, mas também,
realizando explicações, de acordo também com os anseios dos familiares e seus
questionamentos que forem surgindo.
As mães antes da alta hospitalar receberam orientações sobre a necessidade de
acompanhamento por toda a vida no serviço de referência pediátrica onde a pesquisa se
desenvolveu, em virtude das possíveis sequelas que seus filhos poderiam apresentar.
Após a alta, a chegada da criança no domicílio gerou grandes alterações no
cotidiano da família, que muitos vezes precisou reestruturar sua organização para fornecer
todos os cuidados necessários e contínuos a criança. Situação essa desafiadora para as
famílias, que apresentaram sentimentos de medo e insegurança diante das sequelas da
mielomeningocele, constituindo-se em um aprendizado cotidiano, como mostra a fala a
seguir:
Não foi muito fácil pra mim conseguir, porque a gente não esperava ele nascer desse
jeito, mas aos poucos a gente vai aprendendo, a cada dia que passa, pra hoje ele
estar vivo com a gente. Mas dizer que foi fácil nos primeiros dias, primeiros meses,
primeiros anos, foi difícil demais. A gente não tinha o conhecimento, mas com a
graça de Deus estamos com ele aqui contando a história (Ezequias).
A literatura revela resultados semelhantes, conforme apresentou Guerini et al.
(2012), onde os familiares de crianças com necessidades especiais de saúde, incluindo a
mielomeningocele, relataram que após o nascimento e a descoberta do adoecimento da
criança e de sua necessidade de cuidados contínuos, suas vidas sofrerem grandes alterações,
porém, estes acreditavam que todo o esforço era válido para favorecer uma melhor qualidade
de vida aos seus filhos.
63
De fato, corroborando esses achados, um estudo revelou que os pais de crianças
com adoecimento crônico percorrem longos desafios para superarem seus medos e despreparo
diante da notícia da anomalia em seus filhos, aprendendo com o tempo a conviver com o
novo, diferente e a lidar com os preconceitos de uma sociedade que rotula as pessoas com
deficiências (CARVALHO et al., 2006).
Assim, apesar das poucas orientações recebidas quanto aos cuidados e
adoecimento da criança, as famílias revelaram não medir esforços para fornecer-lhes atenção
a todas as suas necessidades, buscando proporcionar-lhes melhores condições de vida.
4.2.2 Cuidando de pessoas com necessidades especiais de saúde
A maneira como as famílias lidaram com a chegada da criança no lar e
necessidade dos cuidados contínuos variou entre os entrevistados. Para alguns, não houve
nenhum estranhamento diante das deficiências e consequentes dependências nas atividades de
vida diárias, entretanto, para outros, o cuidar de uma criança com necessidades especiais de
saúde gerou medo, principalmente devido ao pouco conhecimento sobre a doença, tratamento
e sequelas.
Eu não acho nenhuma [dificuldade], ele tá bem (Raquel).
Para mim é normal, desde que ela nasceu eu é que cuido dela, pra mim já é normal,
nunca rejeitei [...] (Rafaela).
[...] eu tenho medo de cuidar dele, porque ele é uma criança especial, diferente das
outras (Ezequias).
A experiência da mãe e demais familiares no cuidado a criança com adoecimento
crônico é evidenciada pela busca por maior compreensão acerca do problema de saúde, suas
causas e efeitos a longo prazo, bem como por sentimentos de insegurança e desconfiança.
Desse modo, a alta hospitalar é vista como algo marcante na vida da mãe, por ser o início de
um percusso de aprendizado e de novas apropriações em relação aos cuidados (OKIDO et al.,
2012).
A rotina da família, principalmente a da mãe, por ser a principal cuidadora,
reorganiza-se diante das novas responsabilidades e constantes demandas da criança, conforme
se observou em um dos itens de caracterização da organização familiar presente no roteiro das
entrevistas, tanto em relação aos cuidados, como de um acompanhamento contínuo aos
serviços de saúde, de reabilitação e relacionados às sequelas da mielomeningocele. Assim
sendo, um dos membros da família apropria-se desse papel, passando a assistir a criança,
64
deixando suas atividades profissionais formais e/ou estudantis, e, por contrapartida, outros
membros passam a exercer a função de mantenedor do lar financeiramente e demais
necessidades da família.
Eu sozinha, porque às vezes meus meninos estão em casa e tem dia que não estão.
Eu fico sozinha pra cuidar dele e tudo. Cuido da casa, cuido dele (Rebeca).
Fico só cuidando dela (Penha).
Cuido dela e da casa, e às vezes ainda vou, quando tem a roça perto, dou umas
cutucada por lá (Safira).
Só faz as coisas [cuidados do lar] se ela tiver dormindo [...] porque ela não fica
quieta (Marta).
Corroborado com nossos achados, estudo realizado por Costa et al. (2012)
encontrou que, dos 15 cuidadores de crianças com mielomeningocele, 14 eram suas mães e
uma era a avó. Ademais, a quase totalidade desses participantes (12) também não exercia
atividades laborais, pelo fato de dispenderem muito tempo exercendo atenção contínua à
criança.
Nesse contexto, conforme os achados de Cipriano e Queiroz (2008), as mães
comumente passam a desempenhar atividades domésticas nos tempos livres, quando não estão
cuidando da criança/adolescente, sendo a fonte principal de renda da família proveniente do
esposo/companheiro ou do benefício recebido pelo filho, como também foi identificado nos
dados dessa pesquisa.
Pôde-se observar que em algumas situações todos os membros da família
buscavam contribuir e auxiliar, de acordo com os seus limites e disponibilidade, com os
cuidados desempenhado pela mãe à criança e ao adolescente, de forma que também se
sentiam participantes nesse processo, como mostram as falas a seguir:
[...] quando eu saio, a minha menina, a de 14 anos, ela já banha, já troca (Samara).
Meu marido ajuda muito, é um excelente pai. O irmão não desgruda dela (Jane).
Vou mandar uma menina minha que mora mais eu para cuidar dela lá [na escola]
(Marta).
Meu filho trabalha, faz faculdade agora, não tem tempo. Mas quando eu preciso, que
ele tá em casa ele faz (Sandra).
Achado este que diferiu dos resultados encontrados em outra pesquisa, onde,
embora quase todas as participantes do estudo fossem casadas, essa condição não foi vista
pelos autores como capaz de influenciar no recebimento de ajuda para os cuidados a criança,
sendo todas essas atividades e responsabilidades desenvolvidas apenas pela mãe (CIPRIANO;
QUEIROZ, 2008).
65
Por outro lado, Okido et al. (2012), ao estudarem crianças com doenças crônicas,
observaram que, de fato, muitas alterações ocorrem na dinâmica familiar após a chegada de
uma criança com necessidades especiais de saúde, na medida em que a principal cuidadora
passa a ser a mãe, em tempo integral, o que pode gerar dificuldades financeiras e necessidade
que outros membros exerçam a função de provedores do lar. Além do mais, companheiros
e/ou filhos mais velhos passam a ser coadjuvantes nos cuidados a criança.
Destaca-se que diferentes formações familiares participaram desse estudo, dentre
elas, algumas constituídas apenas pela mãe e o filho doente, outras pela mãe, a criança e
outros filhos mais velhos ou não, e ainda, casos que a mãe passou a conviver, juntamente com
a criança, com outro companheiro e o filho deste. Em muitas situações, nenhum membro da
família possuía emprego, havendo uma dependência total do BPC para a sobrevivência e
manutenção dos cuidados, já que a mãe não possuía nenhum suporte familiar para executar os
cuidados, sendo impedida de possuir atividades laborais formais.
É só em casa [que eu fico], porque eu não posso trabalhar com esse menino. Eu trabalhava assim no roçado [agricultura], mas ai, eu não posso trabalhar porque tem
ele pra cuidar (Rebeca).
Não tem quem faça [os cuidados], ninguém, só sou eu mesmo, por isso que eu nem
posso trabalhar (Sandra).
Efetivamente, constatou-se que vida da cuidadora passa a centrar-se na criança e
no adolescente com doença crônica, assim, na maioria das vezes, a mãe afasta-se de suas
atividades externas ao domicílio para poder ficar em casa com a criança/ adolescente, dando-
lhe toda atenção necessária, com os cuidados de higiene corporal e dental, alimentação, troca
de fralda e vestimenta, entre outros.
Sou eu pra tudo, banho ele, ele senta numa cadeira sabe, eu levo a cadeira, às vezes
ele diz assim ‘mãe eu to todo sujo’, eu pego e vou lavar ele. Eu troco de fralda,
limpo ele quando ele faz cocô, eu cuido dele bem (Rebeca).
Ela usa fralda descartável, eu banho ela, tiro da cadeira, boto na cama, depois arrumo ela quando vai pra escola, coloco na cadeirinha dela de novo, dou o almoço,
ajeito ela, passo a colônia, escovo ela, escovo os dentes, penteio o cabelo, porque
tudo tem que ser eu mesmo (Naomi).
Outros estudos corroboram esses achados, revelando que a doença crônica passa a
exigir das famílias uma organização diferenciada, no intuito de prover as necessidades de
saúde e outras demandas da criança e do adolescente, passando por constantes mudanças, de
acordo com as alterações no quadro clínico. Assim, efetivamente, as mães, como cuidadoras
dominantes, abdicam de suas rotinas e atividades, enfocando-se integralmente nos cuidados
aos filhos com necessidades especiais de saúde (ELIAS; MONTEIRO; CHAVES, 2008;
SOUSA E. et al., 2013).
66
Além dessas atividades, o cuidador ainda precisa estar disponível para deslocar-se
com a criança e o adolescente frequentemente aos serviços de saúde, devido ao
acompanhamento de reabilitação e com as especialidades médicas relacionadas às sequelas, e
em outros locais, como a escola e lugares para o lazer.
A minha vida é ela. Eu fico imaginando se não tivesse acontecido isso comigo
[tumor na garganta, está de licença trabalhista], porque ela vive no hospital. É muito
difícil trabalhar e cuidar. (Jane)
A gente sempre passeia com ela na praça só. Até que antigamente na escola tinha,
mas agora não ta tendo mais não [passeios] (Samara).
Nessa perspectiva, a doença e a prática cuidadora ultrapassam a esfera individual
da pessoa cronicamente adoecida, atingindo todos os membros de sua família, especialmente
o cuidador principal. Desse modo, é comum a apreciação de expressões de mães que se
sentem sobrecarregadas ante a tantas responsabilidades e funções, fundamentadas na criança e
no adolescente com necessidades especiais de saúde (OKIDO et al., 2012).
Algumas dificuldades relatadas pelas mães frente a essa rotina relacionavam-se
principalmente ao peso e tamanho da criança e do adolescente, o que tornava o cuidado mais
difícil ao longo dos anos, principalmente por ter que locomover-se com eles no braço, na
maioria das atividades, idas aos serviços de saúde e outros locais necessários, devido aos
obstáculos para levar a cadeira de rodas.
Tenho [dificuldade], porque assim, ela tá crescendo, e não senta [sozinha]. “A
senhora sempre leva no braço?” Sempre (Penha).
[Tudo] no braço [...] muito peso, é meio difícil. Não é todo mundo que pega ela. Eu
tenho que deixar ela na escola e buscar, porque não é todo mundo (Samara).
Aspectos semelhantes foram observados no estudo de Cipriano e Queiroz (2008),
onde as mães de crianças com mielomeningocele expressaram dificuldades no cuidar, bem
como cansaço físico e mental, por utilizarem todo o seu tempo para atender as demandas
necessárias dos filhos, promovendo-os atenção nutricional, cuidados com higiene, estímulos
ao seu desenvolvimento, dentre outras funções.
Salienta-se que, diante das principais sequelas, como deficiências físicas, déficits
de sensibilidade, incontinência urinária e fecal, as atribuições das mães acentuam-se, bem
como suas responsabilidades e esforço na tentativa de fornecer aos filhos uma continuidade
do tratamento em saúde no domicílio e proporcionar-lhes uma melhor qualidade de vida.
4.2.3 Repercussões da mielomeningocele na vida das crianças e dos adolescentes
67
Para os familiares das crianças e dos adolescentes, apesar de muitas vezes nem
sequer compreenderem a doença e as sequelas que acometem ou acometerão seus filhos,
conforme percebeu-se nos relatos, estes vão aprendendo a lidar com essas pessoas com
necessidades especiais de saúde e vão superando os entraves do medo inicialmente existentes
ante a notícia logo após o nascimento. Entretanto, os desafios continuam sendo reais no
cotidiano dessas famílias e da criança/do adolescente, em meio a uma sociedade que não está
preparada para acolher aqueles que não fazem parte do padrão considerado “normal” pela
população.
A incontinência urinária, bexiga neurogênica e/ou problemas mais graves
nefrológicos foram sequelas destacadas nas falas dos entrevistados, repercutindo grandemente
na vida das pessoas com essa deficiência, por gerar maiores dependências de cuidados e de
acompanhamento em saúde. Nesse sentido, observou-se que todas as crianças e os
adolescentes usavam fraldas ao sair de casa, como nota-se a seguir:
[...] Teve esse problema de fazer urina direto, instante em instante. Se ela rir, ela urina, se ela tiver alegre ou com raiva é se urinando direto (Naomi).
[...] faz xixi na fralda, tá acostumado já. Se ele vai ao médico tem que ir de fralda, se
ele vai pra casa da minha mãe, eu tenho que levar as fraldas dele (Rebeca).
Ele faz na fralda mesmo [...] ai tem dia que ele vai [para a escola] e chega bem enxutinho, e tem dia que ele chega muito mijado (Rebeca).
Apesar de umas das mães ter comentado que para o seu filho o uso da fralda
constamente para ir a qualquer lugar seja algo normal, o qual este já está acostumado,
acredita-se que estas sejam questões bem peculiares, as quais sejam necessárias pesquisas que
busquem desvelar a forma como a própria criança ou o adolescente lidam com essas sequelas,
dependência de higiene e uso contínuo de fraldas. Principalmente quando estes tem contato
com outras pessoas, como na escola, onde o preconceito, bullying, são frequentes
(BEZERRA, 2012) .
Percebeu-se que a criança e o adolescente normalmente só são higienizados pela
mãe, não aceitando, em grande parte das situações, que outras pessoas realizem a troca da
fralda no ambiente escolar. Como muitas vezes é inviável para a cuidadora acompanhar os
filhos nesse local, a troca só ocorre no retorno para casa após o término da aula, o que faz com
que a criança e o adolescente, às vezes, passem longos períodos com acúmulo de urina nas
fraldas, o que pode gerar mau cheiro, estranhamento pelos colegas e até dermatite por fraldas,
a depender do tempo.
De fato, a falta de controle vesicoesfincteriano é vista como prevalente entre as
pessoas com mielomeningocele (CIPRIANO; QUEIROZ, 2008; SÁ et al., 2010; GAÍVA;
68
CORRÊA; SANTO, 2011; BORBA et al., 2012), o que as leva a necessitarem da utilização
de fraldas, e, no caso das crianças e dos adolescentes, por dependerem dos pais para a
realização da troca e higiene, podem em determinadas circunstâncias terem que permanecer
com a mesma fralda longos períodos, o que compromete sua higiene (ASSIS; MARTINEZ,
2011).
A incontinência urinária leva em muitos casos a necessidade de realização da
SVA/Cateterismo Vesical de Alívio (CVA), como mostram diversos estudos, com a função de
prevenir a ocorrência de complicações, como infecções urinárias relacionadas à saída
incompleta da urina da bexiga e problemas renais, além de ser uma alternativa para controlar
a incontinência (SBRAGIA et al., 2004; CORNEGÉ-BLOKLAND et al., 2011; COSTA et
al., 2012).
Ela tem bexiga neurogênica [...] eu faço o cateterismo (Penha).
Passo a sonda, ele tinha uns quatro meses quando começou. De quatro em quatro
horas (Sandra).
Tem que passar a sonda, desde quando nasceu. [...] Aqui disseram que tinha que
passar diariamente, de três em três horas (Samara).
O cuidado é meio redobrado porque recentemente ela fez um tratamento no HR, e
tem que tomar o medicamento e fazer o cateterismo cinco vezes ao dia, que é botar
sonda (Lidia).
Como se pode observar, a realização desse procedimento requer grande
comprometimento por parte do cuidador e responsabilidade quanto às demandas nos horários
previamente estabelecidos para a realização da SVA, o que aumenta, assim, o número de
tarefas a serem realizadas no cuidado a criança e, até mesmo ao adolescente, por ter sido visto
nessa pesquisa que nenhum deles realizava sozinho essa atividade. Dessa forma, observa-se
acima o desabafo de uma das mães, ao falar que “o cuidado é meio redobrado (Lídia)”,
revelando o grande desgaste e esforço físico desempenhado pelas cuidadoras.
Além disso, para algumas esse procedimento foi visto com receio, mesmo tendo
sido treinadas por profissionais bem capacitados, elas expressaram medo ante a realização da
técnica no domicílio.
Recebi treinamento. Eu tinha muito medo de passar a sonda. O médico veio uma vez
e disse que ela só ia sair [do hospital] quando eu aprendesse a passar (Jane).
Já me orientaram pra mim passar [SVA], mas eu não tenho coragem [...] foi o povo
aqui do hospital mesmo, foi [prescrito] pelo médico (Naomi).
Ratificando nossos achados, um estudo que investigou os pensamentos e
sentimentos de cuidadores familiares sobre a realização do SVA em crianças com
mielomeningocele, apresentou que todos os familiares expressaram aspectos negativos a
69
respeito desse procedimento. Essa conotação negativa relacionou-se a palavras como medo,
mal, complicado e difícil, durante a realização da técnica na criança (COSTA et al., 2012).
Desse modo, acredita-se que durante os treinamentos, deva-se esclarecer aos
cuidadores quanto as suas dúvidas e medos ante ao procedimento, orientando-os sobre a
importância deste para a criança e o adolescente, e dando-lhes oportunidades de realizá-lo
ainda no hospital quando sentirem-se prontos para fazê-lo, sem pressioná-los, como
observado na primeira fala, quanto à “obrigação” de desempenhar essa técnica.
Outra sequela da mielomeningocele destacada pelos entrevistados foi a
incontinência fecal, e, entre uma minoria, constipação. De acordo com a literatura, essa
incontinência pode afetar o equilíbrio emocional e social das pessoas com essa complicação,
que podem tentar omitir essa circunstância, por gerar embaraço social (LEITE; POÇAS,
2010).
[Para fazer o] cocô ela usa fralda direto, vai de fralda [para escola], e lá, se ela sujar,
ou fizer cocô as meninas limpam [educadores] (Safira).
Também na fralda [as evacuações]. Passa à tarde com ela [usando a fralda na
escola], quando ele chega é que troca, porque ele não deixa ninguém trocar. Só eu
quem troco ele (Rebeca).
Pra fazer cocô ela toma um remedinho, porque ela tem dificuldade, é muito durinho
sabe, ai tem que dar um remedinho (Penha).
Assim, a criança e o adolescente com mielomeningocele utilizam a fralda tanto
em virtude da incontinência urinária, como em decorrência das sequelas de evacuação
intestinal. Em relação às repercussões para essas pessoas, observa-se por meio dessas falas,
que estas podem estar relacionadas ao sexo e a idade da criança. A filha de Safira possuía
apenas seis anos de idade e, para ela, outras pessoas diferentes da mãe e/ou familiares
poderiam fazer sua higiene e troca da fralda na escola. Porém, para o filho de Rebeca, que
possui dez anos, esse procedimento somente poderia ser feito pela mãe, por possivelmente
envergonha-se que outras pessoas tenham acesso a sua intimidade.
Nesse contexto, evidencia-se que devido às sequelas miccionais da
mielomeningocele, a sexualidade adentra o cotidiano das pessoas com essa patologia desde
muito cedo na infância, em virtude dos cuidados requeridos, o que pode gerar visões erradas e
estigmatizantes, posteriormente, na adolescência e juventude desses indivíduos (SOARES;
MOREIRA; MONTEIRO, 2008). Além do mais, destaca-se ainda que sentimentos de
ansiedade podem ocorrer entre eles, nas situações a qual sejam submetidos a independência
da família, devido a essas pessoas desde o nascimento terem poucas experiências autônomas
que contribuam para a construção de suas identidades com segurança (SOARES et al., 2006).
70
Ainda nessa perspectiva, destaca-se a importância do Netiif, anteriormente
descrito, por ser um departamento existente no hospital onde a pesquisa foi desenvolvida que
tem enfoque na incontinência fecal, visando tornar as pessoas com essa sequela continentes
artificialmente, após a utilização de uma técnica de esvaziamento intestinal domiciliar. Assim,
esta tende a contribuir consideravelmente na vida dessas pessoas, gerando maior
independência do uso das fraldas e melhor qualidade de vida.
A técnica consiste na administração via retal de um enema, solução salina, em
quantidades e com substâncias variáveis, uma vez ao dia, de forma que seja induzido
esvaziamento das fezes, e, dessa maneira, seja possível a saída do domicílio sem a utilização
de fraldas. Por outro lado, destaca-se que a técnica pode ter resultados variáveis entre
diferentes pessoas, havendo treinamentos e avaliações prévias rigorosas no intuito de terem-se
resultados mais eficazes (BISCHOFF et al., 2009).
Uma das crianças do estudo é acompanhada pelo Netiif, como mostra a fala a
seguir:
Ela usa fralda, pois não tem segurança que não vai fazer cocô, ela não vai pra escola
sem fralda. [...] Assim, quando é mais distante, como shopping, eu coloco fralda,
mas não era pra colocar, pois ela faz o esvaziamento todo dia das fezes (Jane).
Apesar de ser participante desse serviço de incontinência fecal e já ter passado
juntamente com a sua mãe por um treinamento com uma equipe especializada, a criança ainda
sente-se insegura em sair de casa sem a utilização de fraldas, revelando aspectos particulares e
individuais para a sua eficácia e a necessidade de que não apenas a mãe seja orientada, mas
que a própria criança entenda o funcionamento dessa técnica, a depender da idade, e opte por
sua realização, de maneira que se sinta mais segura e participante no seu próprio tratamento.
Outra sequela bastante prevalente e com grandes repercussões na vida das
crianças e dos adolescentes foi à deficiência física, consistindo-se na impossibilidade de
caminhar ou de realizá-lo sem auxílio:
Não [anda] [...] eu deixo ela no chão, mas é porque eu não tenho como tá com ela no
braço direto. Só se eu comprasse uma cadeira de rodas e colocasse ela na cadeira de
rodas direto (Marta).
Não [anda] (Samara).
Não [anda], eu acho que é por causa do peso dele, porque ele é muito pesado. Ai ele
diz que dói o joelho dele. Ele consegue andar se segurando nas paredes (Rebeca).
As incapacidades físicas variam de acordo com a altura da mielomeningocele, nos
níveis sacral, lombar e torácico, sendo que quanto mais alto, maior é o comprometimento
motor e, consequentemente, as limitações no desempenho funcional das atividades de vida
71
diária (COLLANGE et al., 2008). A maioria das alterações relaciona-se a dificuldade em
permanecer numa posição ortostática e deambular (BORBA et al, 2012). Nesse sentido, a
utilização de órteses, andadores e cadeira de rodas pode contribuir consideravelmente para a
locomoção dessas pessoas e autonomia, em alguns casos, como se observa nas falas:
Ele usa a cadeira de rodas e ele se arrasta [no domicílio] (Rebeca).
Usa andador (Sandra).
Não [caminha], ela tem cadeira de rodas (Safira).
Sim sabe [andar com cadeira de rodas sozinho] (Samara).
De acordo com a OMS (2011), no Relatório Mundial Sobre a Deficiência, um
dispositivo de tecnologia assistida contribui para o aumento da independência das pessoas
com deficiência, melhorando sua capacidade funcional, sendo exemplos destes: muletas,
cadeira de rodas, próteses e órteses.
Desse modo, é importante que esses indivíduos tenham acesso a esse tipo de
equipamento, sendo que, para tanto, faz-se necessária à efetivação das políticas públicas já
existentes para pessoas com deficiência física, discutidas no referencial teórico, tais como a
Portaria n°116 de 1993, que garante a concessão de dispositivos de tecnologia assistida pelo
SUS, mediante fluxo pré-estabelecido, as pessoas com deficiências, como: cadeira de rodas,
muletas, e andadores (BRASIL, 1993).
Outra consequência da lesão medular na mielomeningocele, evidenciada nessa
pesquisa, foi o déficit de sensibilidade nos membros inferiores:
As crianças com mielomeningocele tem problema de sensibilidade, e cria feridinha
no pé. No momento ela está sem andar, não sei se foi um calo. Ela pisava e
machucou, só que ela não sentia, ai foi agravando (Jane).
Ela já levou duas queimadurinhas. Nós íamos de moto ai ela derrubou o sapato,
queimou ela duas vezes. Porque assim, o sapato cai e ela não sabe dizer (Safira).
A criança e o adolescente em razão dessa sequela tem o risco de adquirir lesões
nos membros inferiores e úlceras por pressão (ROCCO; SAITO; FERNANDES, 2007;
SOUSA; BARROS, 2010), quando colocadas por muito tempo sentadas em posição viciosa,
sendo importante, portanto, que os profissionais de saúde orientem os cuidadores dessas
pessoas acerca da necessidade de examinar diariamente os seus membros, em busca de
alterações, da mudança de posição sentada prolongada e colocação de calçados bem
posicionados e confortáveis, de maneira a prevenir possíveis lesões nos pés.
Logo, notou-se que ante a todas essas complicações, a mielomeningocele gerou
desafios no cotidiano das crianças e dos adolescentes, bem como de suas famílias, que
72
necessitarão estar bem orientados acerca de como lidar com cada uma delas, de modo a
contribuir para que essas pessoas atinjam uma vida adulta com maior independência e
autonomia. Por outro lado, os familiares também precisam receber suporte para conseguir
enxergar seus filhos além dessas deficiências, vendo suas capacidades e estimulando-as,
sendo, deste modo, a base para a sua inclusão na sociedade.
73
4.3 O ACESSO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM
MIELOMENINGOCELE NA REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE DO SUS
Figura 3 - Criança com mielomeningocele Davi . Fortaleza, CE. 2014.
74
Após o nascimento, todos os recém-nascidos da pesquisa foram encaminhados
para hospitais de referência em neonatologia, onde ocorreu a realização da cirurgia de
correção da mielomeningocele. Desde então, foram encaminhados para o ambulatório do
hospital onde a pesquisa foi desenvolvida, passando a serem acompanhados nesse serviço.
Destaca-se ainda, que dentro da rede de serviços de saúde do SUS, as crianças e
os adolescentes usufruíam de Unidades Básicas de Saúde (UBS), clínicas de reabilitação,
hospitais municipais de nível secundário e de um hospital de reabilitação de referência
nacional.
Nesse sentido, a presente categoria visa discutir o acesso de saúde as crianças e
aos adolescentes com mielomeningocele nessa rede, com destaque para o atendimento, a
capacitação dos profissionais e resolutividade dos serviços, estrutura física e organizacional,
distância e deslocamento até eles.
Salienta-se que apenas dois responsáveis disseram existir instituições de apoio em
saúde a esses usuários, sendo a primeira uma associação medular e cerebral, composta por
familiares e profissionais de saúde, onde ocorrem reuniões, conversas e orientações,
localizada no interior do estado; e outra, uma casa de apoio próxima ao hospital de referência
pediátrica, que oferece hospedagem e alimentação aos usuários mais carentes.
4.3.1 Unidades Básicas de Saúde
Evidenciou-se que esses serviços são subutilizados pelos participantes da
pesquisa, havendo a busca apenas para a vacinação de seus filhos, recebimento de materiais e
medicações, bem como quando estes apresentam queixas de saúde consideradas por eles
como mais simples.
Eu quase não uso o posto de saúde, é mais para receber material (Jane).
Só vou lá dar as vacinas dela (Léa).
Porque é assim, por exemplo, quando ela tá gripada, eu vou lá com ela, consulta ela
e pego o remédio e ela fica boa (Naomi).
A consulta com a enfermeira pra pegar remédio que elas dão, pomada [...] (Raquel).
Achados esses que corroboram com Barroso et al. (2008), ao avaliarem a
qualidade dos serviços ofertados em duas UBS, onde estes encontraram que a maioria dos
usuários buscavam essas unidades visando apenas o recebimento de medicações,
apresentando assim, ainda uma visão medicalocêntrica e curativista desse serviço de saúde.
75
No que diz respeito aos indivíduos com necessidades especiais de saúde, de
acordo com Othero e Dalmaso (2009), as pessoas que apresentam deficiências geralmente
buscam as UBS a procura de demandas bem específicas, como atestados para o Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS) ou para conseguirem passe livre nos transportes públicos,
aspectos estes que não foram observados nessa pesquisa. Além disso, os autores destacam
ainda que, muitas vezes, há uma carência de ações nessas unidades com enfoque nessas
pessoas, que, portanto, são em grande parte das situações encaminhadas para atendimento
especializado e de reabilitação em outros serviços.
Destaca-se ainda que alguns dos entrevistados também relataram que frente a
qualquer queixa de saúde da criança e do adolescente, estes buscavam preferencialmente e de
imediato o serviço hospitalar terciário onde se desenvolveu o estudo, e onde eles são
acompanhados ambulatorialmente, existindo portanto, uma maior confiança por parte da
família nesse serviço, como observa-se a seguir:
O posto de saúde perto da minha casa pro atendimento do Bejamim só frequentava quando era vacina dele, quando ele era mais bebezinho, de lá pra cá mais não. [...] o
atendimento dele mesmo quando doente, nesse posto de saúde, eu nunca fui.
Atendimento de febre, vômito essas coisas, sempre venho pra cá [HP] (Ezequias).
Tem [posto de saúde]. É difícil eu ir porque quando ele adoece, eu já venho logo pra
cá [HP], porque aqui tem os médicos. É muito difícil [ele ir para posto de saúde], só
se for uma gripe uma coisa assim, mas quando ele tem febre, febre alta [...] (Sandra).
Devido à criança e ao adolescente serem atendidos desde o nascimento por
profissionais desse hospital de referência, ocorreu à formação de um vínculo entre eles, como
percebido em alguns relatos, onde os cuidadores acreditam muitas vezes que por seus filhos
apresentarem uma doença crônica, todas as suas queixas de saúde devam ser atendidas por
esses profissionais que já os conhecem, possuem capacitação especializada e os atendem em
um serviço considerado de grande qualidade e resolutividade.
Entretanto, destaca-se a importância das UBS, por serem serviços com grandes
potencialidades para promover ações às famílias de crianças e adolescentes com doenças
crônicas, através do fator vínculo entre a equipe de saúde e essas famílias, por localizar-se no
mesmo território em que estes residem, e ter toda uma organização baseada na integralidade e
humanização entre profissionais e usuários, sendo aspectos considerados diferenciais, por
permitir uma maior aproximação entre estes e maior possibilidade de intervenção pelos
profissionais, no intuito de promover a saúde dessas pessoas e das crianças com necessidades
especiais de saúde (SOUSA et al., 2013).
Logo, como estratégia para promover uma maior aproximação dessas famílias as
UBS, acredita-se que seja necessária uma maior busca ativa das equipes para com as crianças
76
e os adolescentes com doenças crônicas no seu território de adscrição, visando acompanhá-los
também a nível primário, promovendo reabilitação, inclusão social, resolutividade as suas
queixas de saúde que podem ser atendidas nesse serviço, referenciando-os para outros setores
mais adequados quando necessário, sendo um espaço de orientação e acolhimento as famílias,
além de suporte as demandas dessa parcela da população.
Outro entrave que também contribui para a subutilização desse serviço
relacionou-se ao pouco nível de conhecimento dos profissionais de saúde diante da chegada
da criança/adolescente com mielomeningocele nessas instituições, além da baixa
resolutividade as suas demandas, havendo o encaminhamento independente do seu problema
de saúde, devido ao desconhecimento acerca da doença crônica e suas sequelas, como
mostram as falas:
No Município B, a saúde pro Bejamim lá é um mistério. O Bejamim tem
hidrocefalia e mielo, quando eu chegava na assistência de saúde lá, ave Maria, o
posto de saúde é um mistério o problema que ele tinha, “ai isso ai aqui ninguém não
sabe o que isso, é uma criança diferente das outras e não pode cuidar disso, ele vai
ter que ir pra Fortaleza, porque essa febre dele ai. [...]”. Não tem sido fácil por causa
desse preconceito ou então porque eles mesmos não sabiam lá no Município B, na
cidade que eu moro [...] tudo tem sido só aqui em Fortaleza mesmo (Ezequias).
No posto eles não têm [conhecimento sobre a mielomeningocele] [...] lá ninguém
nunca ouviu falar (Raquel).
Quando eu cheguei ao Município A e levei para o posto de saúde, os profissionais
não sabiam nem o que era (Jane).
A primeira fala revela que os princípios da universalidade do acesso e
integralidade do atendimento foram rompidos, na medida em que o serviço de Atenção
Primária impõe obstáculos para o atendimento da criança, recusando-se a recebê-la,
apresentando uma resposta as suas demandas baseada apenas na cronicidade do seu
adoecimento.
Nesse sentido, segundo uma publicação da Organização Pan-Americana de Saúde,
uma das mudanças que se faz necessária na atenção a saúde, é a de um modelo centrado na
doença, prescritivo, para outro centrado na pessoa, em suas singularidades, contexto
socioeconômico, fazendo uma conexão entre suas questões de adoecimento objetivas e
subjetivas (MENDES, 2012).
É importante ainda destacar que é um direito de todos os cidadãos brasileiros,
independente de suas características genéticas, condições socioeconômicas, e de conviver ou
não com alguma patologia ou deficiência, receber uma assistência de saúde acolhedora e
isenta de qualquer tipo de discriminação, visando a promoção de um tratamento com
qualidade igual para todos, respeitando, entretanto, as suas singularidades (BRASIL, 2011e).
77
Para tanto, os profissionais de saúde precisam ser conscientizados acerca dessas
questões, dispensando, assim, cuidados as crianças e aos adolescentes com deficiências e
doenças crônicas, com a mesma qualidade dirigida aos demais, e realizando ainda um serviço
com ética e respeito a todos os usuários, compreendendo os direitos, a autonomia e as
necessidades específicas dessa parcela da população (BRASIL, 2009c).
Salienta-se também que por uma falha e ausência de resolutividade na Atenção
Primária (AGUILERA et al., 2013), em situações de urgência e de adoecimento agudo, leva,
diversas vezes, a uma grande busca e lotação de pessoas sem urgências, ou com urgências
moderadas, nos ambulatórios e grandes hospitais, sobrecarregando os serviços, e reduzindo
também a sua resolutividade (MENDES, 2012).
Nessa perspectiva, uma pesquisa revelou a importância da continuidade do
atendimento da criança com mielomeningocele após a alta hospitalar nas UBS, por meio de
uma inter-relação entre hospital e atenção básica, compartilhando e complementando os
cuidados a criança, com o enfoque também em sua família. Na pesquisa, foram
desenvolvidas, conjuntamente, estratégias com o intuito de favorecer a autonomia da criança,
sua inserção social, potencializando sua independência e condições de autocuidado. Assim
sendo, a criança teve a garantia de um cuidado mais integral e completo, por meio do acesso a
toda a RAS, desde o nível primário, ambulatorial, até níveis mais complexos de reabilitação e
hospitalares, o que favoreceu a melhoria de sua qualidade de vida (MEDEIROS et al., 2011).
No que diz respeito à falta de conhecimento e capacitação desses profissionais de
saúde, nota-se o despreparo profissional das equipes da ESF, pois, apesar de não constituir-se
em um serviço com enfoque especializado, este abrange toda a população, devendo acolhê-la
independente de suas comorbidades. Ademais, os profissionais de nível superior, médicos,
odontólogos e enfermeiros, precisam ser constantemente atualizados, por meio de uma
educação permanente, no intuito de proporcionar um melhor atendimento a toda comunidade.
Destaca-se ainda a fala de outras mães, que revelaram que a pouca utilização da
UBS, se dava, segundo elas, por este ser um serviço com pouca assistência a ser ofertada e
com carência de profissionais médicos. Apontando, possivelmente, uma baixa qualidade da
atenção básica próxima a suas residências, que não tem exercitado na sua totalidade as
funções a que lhe foi proposta.
Às vezes, tem dias que eu levo logo ela para o hospital. Porque às vezes o posto não
tem quase nada, não tem muita coisa a oferecer, não tem um médico (Safira).
Tem [UBS], mas lá é tão assim [...] tem semana que tem doutor, tem semana que
não tem (Marta).
78
Corroborando esses achados, um estudo que avaliou a percepção de usuários da
atenção básica de Fortaleza-CE acerca da qualidade na produção do cuidado em saúde,
encontrou que para estes a qualidade se relacionava a ter acesso às medicações, mais
profissionais de saúde na unidade e o cumprimento dos horários de atendimento (ARRUDA;
BOSI, 2012).
Ainda nessa perspectiva, com resultados semelhantes, uma pesquisa que avaliou a
satisfação de usuários de serviços públicos de saúde em cinco municípios de São Paulo,
revelou a grande deficiência destes quanto aos recursos humanos e físicos, constituindo-se em
carências mais acentuadas nos pequenos municípios, o que se torna uma barreira para o
atendimento da população, agravada devido à necessidade desta ter que buscar outros serviços
nos grandes centros urbanos, distantes muitas vezes de suas residências nas localidades do
interior (MOIMAZ et al., 2010).
De fato a contratação de profissionais médicos para trabalharem na rede pública
de saúde dos pequenos municípios e em regiões mais pobres tem sido uma dificuldade no
Brasil, o que tem promovido grande rotatividade nos serviços, reduzindo as possibilidades de
formação de vínculos com os usuários (AGUILERA et al., 2013).
No que diz respeito às prevalentes falas dos participantes que enfatizam apenas os
profissionais médicos, autores discutem que efetivamente a população tem exercido uma
supervalorização nas consultas médicas, sendo indiferente ao trabalho do restante dos
profissionais de saúde da ESF, o que fragiliza o funcionamento da Atenção Primária e dos
seus atributos, tais como: educação em saúde, prevenção de agravos e promoção da saúde
(AGUILERA et al., 2013).
Em contrapartida, divergindo dos relatos anteriores, algumas das mães revelaram
satisfação com o atendimento recebido pelos profissionais de saúde na Atenção Primária, ante
as queixas de seus filhos:
Bem tem o CIES [Centro Integrado de Educação e Saúde], quando eu precisei, me
atendeu muito bem, teve uma doutora que atendeu muito bem ela (Mara).
Conhecem [a doença], a doutora que tem lá é bem boazinha (Marta).
É ótimo o atendimento de lá. Também não tenho o que dizer não, é ótimo (Naomi).
Essa “satisfação” revelada por esses entrevistados, deve ser discutida com
prudência, em virtude de ser um aspecto subjetivo, e muitas vezes, o simples fato de
receberem um atendimento em saúde, já ser considerado por alguns participantes como algo
bom, de qualidade e satisfatório. Sendo esquecidas questões como a infraestrutura dos locais
79
de atendimento, os recursos materiais presentes, a duração das consultas, acessibilidade, entre
outras.
Torna-se relevante salientar-se que os achados da pesquisa são provenientes de
residentes de diversas localidades de todo o estado do Ceará, o que revela uma disparidade na
forma como o atendimento tem sido ofertado a crianças e adolescentes com
mielomeningocele na atenção básica em saúde, apesar de ter sobressaído questões que
demonstraram a baixa qualidade do atendimento, em virtude da carência de recursos humanos
qualificados e materiais, e baixa resolutividade desses serviços.
Na perspectiva de que o acesso a um atendimento em saúde dentro da rede é um
direito de toda a população, evidenciou-se o fato de uma das crianças dessa pesquisa residir
em uma localidade rural onde inexiste qualquer serviço de saúde, ocorrendo de forma incerta
à visita de uma equipe de saúde na região, procedente do município a qual faz parte.
Logo, quando a criança ou seus familiares necessitam de assistência, estes
precisam buscá-la em municípios maiores, que possuem serviço hospitalar de nível
secundário e UBS. Entretanto, devido a distância, a mãe precisa conseguir algum meio de
transporte particular para chegar até essas unidades de saúde, com vizinhos e/ou parentes:
Lá não tem rede de saúde para nós. Às vezes vai médico lá pras casas. Quando ele
[criança com mielomeningocele] precisa, a gente tem que levar [...] é longe, é longe,
tem que arranjar um carro, uma moto (Rebeca).
Assim, observa-se a dificuldade de acesso que essa criança precisa lidar, mediante
a necessidade de qualquer atendimento de saúde, mesmo em face da cronicidade do seu
adoecimento e sequelas da mielomeningocele. Desse modo, em pequenas localidades como
esta, o suporte de equipes de saúde deveria ser contínuo e frequente, através das visitas
domiciliares e/ou do fornecimento de transporte, nas situações mais graves, quando não existe
essa possibilidade pela família, de maneira a preconizar a legislação brasileira, que garante o
acesso a todos as pessoas com deficiências aos bens e serviços de saúde sem discriminação
(DEFICIÊNCIA, 2013).
Nessa perspectiva, enfatiza-se que é preconizado por meio do Decreto nº 6. 949 de
2009, que o atendimento em saúde deve ser fornecido às pessoas com deficiências o mais
próximo possível aos seus domicílios, incluindo os casos em que estes residem na zona rural,
como na situação dessa participante do estudo (BRASIL, 2009c).
Outras mães também falaram acerca da distância da UBS até suas residências:
Fica distante, eu vou de carro [...] é obrigado a gente fretar o carro quando é pra sair
com ela (Naomi).
É distante, vamos de moto (Safira).
80
Fica um pouquinho longe, mas o carro da saúde vai pegar (Penha).
Devido à longa distância, a família depende de transporte para chegar até a UBS,
que é fornecido somente por alguns municípios. Desse modo, nas regiões onde o transporte
público não é concedido, os gastos da família aumentam, por precisarem contratar automóveis
particulares para levar a criança e o adolescente até um atendimento básico em saúde, quando
não possuem meios de transporte próprios.
Por outro lado, para quase metade dos participantes, a UBS localizava-se com
certa proximidade aos seus lares, havendo a possibilidade de irem a pé até o serviço, levando
a criança e o adolescente nos braços, ou caminhando com o seu auxílio, ou ainda com o
suporte de cadeira de rodas:
Fica muito pertinho não [...] mas dá [para ir andando] (Léa).
É uns três quarteirões (Mara).
É lá perto de casa. Eu levo na cadeira de rodas (Samara).
O acesso até o posto é de calçamento, mas dá para ir a pé (Jane).
Apenas uma das mães falou sobre a estrutura física das ruas no caminho a UBS,
por não ser asfaltado, nem existirem calçadas adequadas, o que torna a ida com cadeira de
rodas inviável. Entretanto, como estratégia, a mãe leva a criança caminhando, por esta
conseguir locomover-se com auxilio. Nesse sentido, apesar de pouco ter sido falado sobre o
assunto pelos participantes, pode-se observar a importância da acessibilidade nos itinerários
até a UBS, já que muitos não possuem transporte particular e deslocam-se a pé para esses
serviços.
Logo, enfatiza-se a existência há mais de uma década de uma lei que estabelece
padrões para a promoção da acessibilidade as pessoas com deficiência ou mobilidade
reduzida, comentada no referencial teórico, por meio da redução, entre outros, de obstáculos
nas vias públicas e no mobiliário urbano. Dessa forma, o planejamento e a urbanização dessas
vias deveriam ser construídos visando à acessibilidade dessas pessoas, com destaque para os
itinerários e as passagens de pedestres, seguindo as normas na Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT) (BRASIL, 2000c).
Ademais, o Decreto 5.296 de 2004 preconizou que, para promover essa
acessibilidade deveriam ser seguidas, além dessas normas técnicas, condições
preestabelecidas, com destaque para a construção de calçadas para a circulação das pessoas
com deficiência física, por meio de adaptações, e o rebaixamento destas por meio de rampas
81
acessíveis ou através da elevação da via pública para a travessia em nível dos pedestres
(BRASIL, 2004a).
Um estudo realizado por Siqueira et al. (2009), revelou a alta inexistência de
calçadas que favorecessem o deslocamento de pessoas com deficiência até as UBS, em 66,7%
dos casos pesquisados. Assim sendo, os autores consideraram que os projetos de urbanização
das vias e espaços públicos deveriam ser planejados de maneira a visar à garantia do direito
de movimentarem-se seguramente as pessoas com deficiências ou mobilidade reduzida.
Nessa busca por facilitar o acesso dessas pessoas ao serviço básico de saúde, tem
destaque, como estratégia, à realização de visitas domiciliares pela equipe de saúde, quando a
família, devido às dificuldades procedentes das deficiências e condições socioeconômicas,
impossibilita-se de levar a criança/adolescente até a unidade. Entretanto, uma minoria tem
acesso a essas visitas, havendo situações em que os familiares tiveram que posicionar-se a
favor dos seus direitos e exigi-los na UBS, para alcançar, por fim, o atendimento de saúde da
criança.
[...] eu que não me desloco da minha casa para ir ao posto, mas o pessoal do posto
vai na minha casa [...]. Por enquanto tá sendo bom, no começo não era tão bom,
porque eles não iam visitar em casa, a fisioterapia dela só era aqui em Fortaleza,
sendo que podia fazer lá e eles não faziam. Agora como mudou de equipe, mudou de prefeito, essas coisas todas, já ta melhorando. Eu não sei daqui pra frente, sabe como
é, em todo lugar é assim (Rafaela).
Hoje, a médica, a enfermeira e o agente comunitário vão na minha casa, isso há mais
ou menos um ano. Foi só depois que o meu marido foi lá e fez maior barraco, falou
que tinha um filho especial e que não ia ninguém na casa visitar (Jane).
Observou-se também, que em um dos municípios a realização das visitas
domiciliares variam de acordo com os grupos políticos no governo, não existindo uma
continuidade de um modelo assistencial em saúde, o que quebra a qualidade do atendimento
recebido pela criança, ao longo das mudanças de gestão, constituindo-se em uma falha dentro
da RAS.
As visitas domiciliares permitem uma maior aproximação dos profissionais de
saúde com as famílias, crianças e adolescentes com doença crônica e o meio em que estes
vivem, permitindo uma maior compreensão das realidades de cada usuário, suas dificuldades
e angústias, de modo a favorecer uma melhor identificação acerca de suas necessidades, e,
assim, desenvolver uma assistência mais particularizada e com maior qualidade (MARCON et
al., 2007; SOUSA et al., 2013).
Estudo evidenciou que as visitas domiciliares contribuem positivamente para a
formação de vínculo entre profissionais de saúde e usuários, o que tende a favorecer o
82
andamento do tratamento fornecido. Além disso, os usuários e seus familiares sentem-se mais
valorizados ao receberem as visitas da equipe multiprofissional da UBS, mostrando-se mais
abertos as orientações e apresentando com maior facilidade suas dúvidas e medos
(CANHESTRO et al., 2005).
Assim observa-se o importante papel da visita domiciliar no cuidado as crianças e
aos adolescentes com mielomeningocele, por proporcionar-lhes maior acesso a RAS a nível
primário, melhores condições para que a equipe interdisciplinar da atenção básica forneça-
lhes um cuidado integral, particularizado e humanizado, além de ser uma situação onde os
profissionais de saúde podem exercer a educação em saúde para essas pessoas cronicamente
adoecidas e suas famílias, atentando-se as condições socioeconômicas, estruturais e
relacionais em que estes vivem.
Outra importante estratégia criada na Atenção Primária, diz respeito aos Núcleos
de Apoio à Saúde da Família (NASF), criados em 2008 com o intuito de auxiliá-la, ampliando
sua abrangência, regionalização, resolutividade e territorialização. É composto por uma
equipe de profissionais de diversas áreas, divididos em tipos diferentes de NASF, tais como:
fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais, entre outros,
que atuam conjuntamente a equipe de ESF, expandindo a assistência prestada aos usuários
(BRASIL, 2009d).
Ela é acompanhada por uma equipe em casa, é fisioterapia e fono, clínico também.
Toda semana vai a terapeuta, ai as vezes tem semana que vai a terapeuta e vai um
fisio, agora toda semana é a terapeuta que vai certeza, os outros não, vão de 15 em 15 dias, de mês em mês (Rafaela).
Desse modo, o NASF possibilita as crianças e aos adolescentes com deficiências
um recebimento de uma assistência integral e de reabilitação no seu município de residência,
facilitando o seu acesso a esse tipo de cuidado em saúde, através das equipes vinculas as
UBS, como foi percebido por meio de alguns relatos de familiares, apesar de terem sido falas
de uma minoria dos participantes.
Assim sendo, observa-se a importância da ampliação dessas estratégias a nível
primário em saúde, visando contribuir para um maior acesso dessa parcela da população
cronicamente adoecida a uma assistência em saúde de qualidade no seu território de
adscrição.
No que diz respeito à estrutura física da unidade de saúde, referente à presença de
rampas, corrimões, banheiros adaptados a pessoas que usam cadeiras de rodas e local
adequado para a higiene e troca, também é parte intrínseca ao acesso a esses serviços pelos
usuários com sequelas de mielomeningocele, sendo aspecto comentado pelos participantes,
83
havendo grandes variações estruturais nas diferentes UBS dos municípios. Uma minoria dos
participantes relataram aspectos positivos referentes à estrutura, conforme mostram as falas.
O posto agora é novo, aí tem adaptação (Jane).
Tem [rampa], e agora tá passando por uma adaptação, reforma [...] é [adaptado o
banheiro], e agora tá com a reforma, ai vai melhorar mais ainda (Sandra).
Tem [rampa, adaptação] (Samara).
Muitos dos relatos revelaram que as unidades de saúde estavam passando por
reformas e reestruturações físicas, e que, a partir de então, passaram a apresentar rampas,
banheiros adaptados e maiores e locais para a troca das crianças. De fato, a legislação
brasileira exige que todas as edificações públicas devem assegurar a acessibilidade as pessoas
com deficiência ou mobilidade reduzida, ressaltando, desde 2004, que as construções,
reformas e ampliações de edificações públicas devem garantir no mínimo um acesso a parte
interior destas, com passagens internas livres de obstáculos que dificultem os deslocamentos
(BRASIL, 2004a).
Além do mais, as áreas de circulação externas e internas devem possuir rampas
nos desníveis, ou equipamentos mecânicos para o deslocamento vertical, e essas edificações
públicas também devem possuir sanitários adaptados, em relação aos equipamentos e
acessórios, e acessíveis às pessoas com deficiências, na quantidade de pelo menos uma cabine
por sexo em cada pavimento, com entrada independente dos demais sanitários coletivos
(BRASIL, 2004a).
Por outro lado, muitos entrevistados revelaram a ausência dessas estruturas que
facilitam o acesso das crianças e dos adolescentes com deficiência física e necessidades
especiais de saúde, ou presença apenas parcial, como por exemplo, haviam rampas, mas não
existiam banheiros adaptados, ou o contrário. Revelando, assim, o ainda presente descaso com
essas pessoas e a legislação brasileira, que há mais de uma década exige tais mudanças.
O pessoal lá tira ele nos braços, tem uma rampazinha pra subir. O banheiro do posto
lá é muito pequeno, não dá para entrar cadeira de rodas. Eu pego e levo ele andando,
ele anda pouco tempo, agarrado nas paredes, se arrastando. Quando eu vou com ele
o carro encosta mesmo na porta, fica mesmo na calçada, aí lá a gente desce com ele
e vai segurando ele (Rebeca).
Não tem [rampas], não tem cadeira adaptada pra ela, o banheiro adaptado não tem
(Penha).
Os postos de saúde não tem adaptação pra criança do tipo dele, que tem que tá
trocando fralda direto, não tem fraldário, não tem rampa pra entrar [...] o banheiro
também não tem pra cadeirante (Priscila).
84
Mesmo para aqueles que possuem alguma capacidade para caminhar, o acesso as
UBS têm sido difícil, havendo a necessidade de funcionários e familiares os auxiliarem a
caminhar, segurando-os, ou levando-os no colo, em virtude da ausência de corrimões e
cadeira de rodas nesses serviços. Ademais, ao irem para essas unidades, essas pessoas são
impossibilitadas de usarem os sanitários, ou utilizam-nos com muita dificuldade, por
possuírem entradas estreitas, ausência de adaptações e locais para a troca e higiene.
Ressalta-se que a maioria realiza a SVA com horários pré-determinados, havendo
a necessidade de espaço e estruturas higiênicas nos sanitários para que a técnica possa ser
realizada adequadamente. Sem essas condições, a criança e o adolescente não dão seguimento
ao tratamento quando precisam de atendimento nas UBS, e precisam utilizar fraldas, sendo
trocados apenas no retorno as suas residências, situação que pode gerar constrangimento a
esses usuários.
A precariedade estrutural dessas instituições ocorre em diversos municípios,
muitas vezes por haver a sua instalação em locais inapropriados, como a utilização de casas
residenciais para o funcionamento do serviço de saúde, onde não há um ambiente adequado e
construído previamente com o objetivo de atender a população (AMARAL et al., 2012).
Reafirmando os resultados encontrados, recente pesquisa que verificou a
acessibilidade de pessoas com deficiência física em um UBS do Mato Grosso, também
encontrou a existência de muitas fragilidades na estrutura desse serviço, impedindo a
transitabilidade desses usuários. Não haviam corrimões, apesar da existência de rampas, nem
banheiros adaptados e com passagem livre para as pessoas que usam cadeira de rodas
(NASCIMENTO, 2012).
Evidencia-se ainda, pesquisa multicêntrica desenvolvida em UBS de sete estados
brasileiros da região sul e nordeste a qual encontrou que 59,8% dos prédios eram inadequados
as pessoas com deficiência física. Em síntese, em 63% não haviam rampas, e nas que
existiam, 72,8% não eram acompanhadas de corrimãos, e em 95% dos corredores também não
haviam. Ademais, em 77,4% dos banheiros inexistiam portas que garantissem o acesso, com
espaço inapropriado para cadeira de rodas em 75,8%. Além disso, uma minoria das unidades
oferecia cadeira de rodas aos usuários. (SIQUEIRA et al., 2009).
Há a necessidade, portanto, de que durante a elaboração de projetos para a
construção e reforma desses serviços de saúde seja pensado nas particularidades humanas das
pessoas com deficiências e doenças crônicas, como a mielomeningocele, de forma a haver a
possibilidade de mudança na atual realidade brasileira e cotidiano dessas pessoas, que lutam
85
rotineiramente em busca de um atendimento em saúde acessível e com qualidade as suas
demandas (NASCIMENTO, 2012).
Assim, a atenção básica do Ceará precisa passar por reestruturações, tanto em
relação as suas condições físicas, de forma a permitirem uma maior acessibilidade as pessoas
com deficiência, quanto em relação a capacitação dos recursos humanos e maior provisão de
materiais. Além disso, esses serviços precisam exercer ações de promoção a saúde, que fazem
parte da sua essência como serviços localizados com maior grau de proximidade a população,
as pessoas cronicamente adoecidas, através de educação em saúde, visitas domiciliares, entre
outras estratégias outras estratégias
4.3.2 Serviços de Reabilitação
No Brasil, preconiza-se que devem ser organizados, fortalecidos e ampliados os
serviços e programas que visam à habilitação e reabilitação, para possibilitar que as pessoas
que possuem algum tipo de deficiência alcancem maior nível de autonomia e capacidade
física, social, profissional e mental, de forma a promover sua inclusão. Além disso, deve-se
buscar a promoção da capacitação dos profissionais de saúde de forma continuada, para que
estes estejam preparados a atuar nesses serviços (BRASIL, 2009c).
Para esse estudo, considerou-se como serviços de reabilitação, as clínicas públicas
ou entidades filantrópicas que forneciam todos ou pelo menos um dos seguintes atendimentos:
fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional. Destaca-se que uma minoria das crianças e
dos adolescentes dessa pesquisa recebia esse tipo de acompanhamento, apesar de já terem tido
até aproximadamente os três anos de idade e, após essa faixa etária, passaram a não mais
serem atendidas em nenhum serviço de reabilitação.
Dos que ainda usufruíam desses serviços, a maioria recebia atendimento de
entidades filantrópicas de apoio a crianças com necessidades especiais de saúde, ou
vinculadas a universidades privadas. Sendo que estes serviços só eram ofertados na cidade de
Fortaleza, e um na região metropolitana.
Ele faz tratamento no NAMI, foi através de uma doutora quando ele nasceu, ela me
transferiu pra lá (Priscila).
As fisioterapias dele são lá no CADEE (Raquel).
Foi através daqui, me deram um número e eu liguei, marcaram uma avaliação,
porque aqui [HP] ela só fez até os três anos, o NAVE, porque aqui só pode até os
três anos. Eles me deram dois endereços. Eu liguei logo pro Bem-me-quer e consegui, é aqui em Fortaleza, é fisioterapia também, fono e TO [Terapia
Ocupacional] (Rafaela).
86
O NAMI é o Núcleo de Atenção Médica Integrada pertencente a uma
universidade privada de Fortaleza, e tem como missão desenvolver atividades de atenção em
saúde de nível secundário, por meio da promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e
reabilitação, de forma multiprofissional, no intuito de melhorar a qualidade de vida dos seus
usuários (UNIFOR, 2014). Já o Bem-me-quer é um serviço filantrópico que oferece
fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, dentre outras atividades de reabilitação, as
crianças com necessidades especiais de saúde, não sendo encontrado nenhum site com
maiores informações acerca dessa instituição.
O CADEE é o Centro de Apoio e Desenvolvimento de Educação Especial,
renomeado em 2012 para Centro de Integração Escola, Saúde e Assistência Social (CIES),
que fornece atividades integradas pela Secretaria de Saúde, Assistência Social e Cidadania e
de Ciência, Tecnologia, Trabalho, Emprego e Empreendedorismo de um município da região
metropolitana de Fortaleza. O serviço tem obtido destaque, por visar à integração social de
pessoas com necessidades especiais de saúde e sua melhor qualidade de vida (DIVERSA,
2013).
A chegada aos três serviços se deu através de encaminhamentos de profissionais
da saúde que acompanhavam essas crianças e esses adolescentes. Entretanto, a iniciativa de
encaminhá-los não seguiu uma rotina ou protocolo institucional, partindo da própria decisão
desses profissionais em referenciá-los ou sugerir que eles procurassem esses serviços. Desse
modo, muitos dos filhos dos participantes da pesquisa não recebiam nenhum tipo de
acompanhamento desse tipo, nem haviam sido orientados ou encaminhados a procurar esses
atendimentos.
Apenas dois entrevistados que residiam no interior do estado relataram o
acompanhamento, por meio do SUS, de fisioterapia aos seus filhos:
Eu faço a fisioterapia dela mesmo em casa, eu faço em casa e faço também por conta
do SUS [...] duas vezes, na segunda e na quarta (Marta).
É uma clínica que tem [de fisioterapia], é pública [...] é duas vezes por semana
(Safira).
Considerando esse contexto, enfatiza-se que o tratamento precoce e contínuo da
mielomeningocele por meio de serviços de reabilitação, independente do nível de
comprometimento neurológico, torna-se essencial para as pessoas com essa patologia, visando
à promoção de sua autonomia e qualidade de vida (ROCCO; SAITO; FERNANDES, 2007a;
SANTOS et al., 2007)
87
A fisioterapia e demais serviços de reabilitação, como a terapia ocupacional, são
fundamentais para as crianças e os adolescentes com mielomeningocele, devido as
complicações dessa doença e consequentes repercussões na vida dessas pessoas e de suas
famílias. Para tanto se precisa de uma avaliação individualizada e multiprofissional, para que
seja construído um plano terapêutico específico e mais eficaz, que traga melhorias no
cotidiano desses indivíduos (BRANDÃO; FUJISAWA; CARDOSO, 2009).
O processo reabilitatório é comumente longo, oneroso, sem a possibilidade de
cura, ou cura total dependendo do quadro clínico. Todavia, apesar de em alguns casos os
usuários não conseguirem andar, ou movimentar-se totalmente, as atividades de reabilitação
contribuem significativamente para melhorar a qualidade de vida dessas pessoas,
possibilitando-as uma melhor utilização de seu corpo na realização de suas atividades diárias,
mesmo com o comprometimento locomotor (SOUSA; BARROS, 2010).
Observou-se, entretanto, que apesar da absoluta relevância desse
acompanhamento reabilitatório para a melhoria do quadro clínico, dependendo do grau de
repercussão neurológica, independência, e consequente melhor qualidade de vida para as
crianças e os adolescentes com mielomeningocele, apenas poucos dos filhos dos participantes
dessa pesquisa tiveram acesso a esses serviços.
Essa circunstância contraria o que é preconizado como direito às pessoas com
deficiência física, por meio da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência, onde se declara que a estes devem ser garantidas serviços voltados a sua
reabilitação, em articulação com serviços sociais, profissionais e educacionais (BRASIL,
1999).
Os poucos participantes do estudo, os quais seus filhos eram acompanhados
nesses serviços, relataram certa distância de suas residências até estes, havendo a necessidade
de utilização do transporte público, quando existente no município, particular ou ofertado pela
prefeitura, nas situações em que as demais opções eram inacessíveis, e ainda a ida pé, como
pode ser observado a seguir:
O serviço de fisioterapia eu pego ônibus, não é perto (Jane).
Eu ando no carro de feira [pau-de-arara], vou só até a cidade mesmo. De lá eu vou a
pé. [...] Longe, quando eu chego lá já to morrendo de cansada, longe. [...] Assim,
quando eu não quero ir a pé, eu pago um moto táxi que vai deixar a gente lá (Marta).
Eu que tenho que levar na clínica de moto, ai não tem como levar a cadeira (Safira).
A prefeitura vai pegar e me deixar (Raquel).
88
Muitos dos serviços de reabilitação estão localizados nos grandes centros urbanos
e municípios maiores, distantes, muitas vezes, dos usuários que residem em pequenas
localidades e municípios menores, o que se torna um entrave para que as pessoas com
necessidades especiais de saúde recebam esse atendimento tão necessário para o seu
tratamento. Além do mais, nem todos os municípios possuem transporte público, e muitas
famílias não possuem transporte próprio e adequado para levar a criança e o adolescente.
Pesquisa desenvolvida em Teresina, que avaliou a satisfação de usuários acerca
dos serviços de fisioterapia, revelou que na visão destes o acesso a esses serviços atendia as
suas demandas, sendo o principal transporte utilizado o público coletivo. Essa avaliação
positiva no acesso, que diferiu dos achados desse estudo, esteve relacionada à localização das
clínicas em região central da cidade, no mesmo município de procedência de todos os
participantes. Por outro lado, uma minoria dos usuários relataram dificuldades no acesso
relacionadas a questões de locomoção e carências financeiras (MACHADO; NOGUEIRA,
2008).
Preconiza-se na legislação que os serviços de reabilitação devam apoiar a inclusão
das pessoas com deficiência dentro da sua comunidade, sendo disponibilizados de forma
gratuita pelo SUS e estejam presentes com o maior nível de proximidade no seu território de
abrangência, incluindo a zona rural (BRASIL, 2009c).
A Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência do SUS, apresentada
anteriormente, que se constitui pela Atenção Básica, Atenção Especializada em Reabilitação e
Atenção Hospitalar de Urgência e Emergência, em relação à reabilitação, preconiza a
elaboração de estabelecimentos de saúde com referência regulada, que funcionassem de
acordo com as bases territoriais, fornecendo serviços especializados (DEFICIÊNCIA, 2013).
Nesse sentido, os CER ganharam destaque, sendo um local de atenção em saúde
ambulatorial com enfoque na reabilitação, onde são realizados diagnósticos, tratamentos,
adaptações, concessão de materiais, entre outros, de forma articulada com os demais serviços.
O CER deve contar com o apoio de veículos adaptados para garantir o acesso aos usuários na
Rede (BRASIL, 2012b). Com a construção do Plano Viver sem Limites (BRASIL, 2011c), a
meta é que até o ano de 2014 sejam implantadas várias CER, com 88 veículos acessíveis a
estes (DEFICIÊNCIA, 2013).
Esses serviços são essenciais para a população com deficiência, entretanto nessa
pesquisa, nenhum dos usuários menores de 18 anos participava de algum tipo de atendimento
nos CER, não tendo sido relatadas nenhuma experiência pelos familiares acerca dessas
instituições. Assim, acredita-se que a sua implementação ainda esteja em andamento no
89
estado do Ceará, restrita a determinadas localidades, ou que nenhum dos participantes do
estudo receberam referenciamento dos profissionais de saúde para tais unidades.
Desse modo, torna-se necessário uma maior discussão sobre o assunto, de forma
que os gestores de saúde alcancem alternativas juntamente com o governo, usuários,
profissionais de saúde e demais setores do sociedade em busca de encontrarem-se estratégias
para que essas crianças e esses adolescentes com necessidades especiais de saúde tenham
efetivado o seu direito de acesso a serviços de reabilitação, essenciais para a melhoria das
suas funções cotidianas.
No que diz respeito à estrutura física desses serviços de reabilitação citados pelos
responsáveis, apesar de serem locais que atendem em sua grande maioria pessoas com déficits
de mobilidade, os ambientes não eram adaptados, ou eram apenas de forma parcial para
recebê-las, como mostram as falas a seguir:
A clínica é de fisioterapia, mas mesmo assim não tem nenhuma acessibilidade. Tem
uns degraus, não tem rampa. [...] Tem muitas crianças que vão em cadeiras de rodas,
os banheiros não são adaptados (Jane).
Tem rampa, mas não tem quase como ficar lá, é bem apertadinho para ficar no
estabelecimento; não tem [cadeira de rodas]. [...] Tem banheiro lá, mas é estreitinho,
pequeninho; tem no hospital perto (Safira).
Na primeira fala, nota-se a estranheza da mãe com a estrutura da clínica sem
nenhum tipo de adaptação e acessibilidade, mesmo havendo muitos usuários que necessitam
utilizar cadeira de rodas para locomoverem-se nesse espaço. Na segunda fala, apesar da
existência de rampa para facilitar a entrada no serviço, este se apresenta como inapropriado
fisicamente para funcionar como uma clínica de fisioterapia; inclusive os usuários que
utilizam cadeira de rodas precisam deslocar-se para o hospital municipal próximo para usarem
o sanitário, já que o presente na clínica é inviável, devido ao tamanho e ausência de
adaptações para o uso.
Percebeu-se, desse modo, a carência desses serviços, em relação a sua estrutura
física e aos equipamentos de tecnologia assistida, como a cadeira de rodas, que poderiam ser
disponibilizados para facilitar os deslocamentos desses usuários, em virtude da dificuldade de
levar suas próprias cadeiras até esses locais, em algumas situações. Nesse sentido, há a
necessidade de uma reestruturação dessas unidades de reabilitação, visando promover
condições de acesso satisfatórias a população que apresenta deficiências e que residem nos
municípios do interior do estado.
4.3.3 Hospitais Municipais Secundários
90
Do mesmo modo que as UBS, os hospitais municipais de nível secundário do
Ceará possuíam pouca utilização em relação a busca por atendimento das crianças e dos
adolescentes com mielomeningocele, em razão de serem serviços menores, com atendimento
generalista e, algumas vezes, pouco resolutivos no que diz respeito a esses usuários em
adoecimento crônico.
A procura desses hospitais ocorreu frente a queixas de saúde das crianças e dos
adolescentes que, na perspectiva de seus familiares, não iriam necessitar de internação, por
serem situações simples, ou quando estes acreditavam que os problemas de saúde não possam
ser solucionadas nas UBS, conforme mostram as falas:
Assim, pra internar ela eu não levei ainda [...] quando eu vejo que ela tá gripada,
com febre, ai eu levo, mas é só consulta mesmo (Marta).
Às vezes assim quando ele adoece eu levo (Rebeca).
Tem lá o posto de saúde e também tem o hospital. Só se ela tiver doente que eu levo
pro hospital (Penha).
Lá é bom, só não tem especialista, não tem pediatra. O médico atende adulto,
criança (Safira).
Em geral, de acordo com o revelado na última fala, a maioria dos profissionais
atuantes nesses pequenos municípios não são especialistas em uma área de atuação, como a
pediatria. Além do mais, de acordo com alguns autores, a carência de equipes de saúde é um
dos principais problemas enfrentados por estas populações, o que pode estar relacionado ao
fato de a maioria dos profissionais residir em grandes cidades, deslocando-se para os
interiores apenas alguns dias na semana e/ou nos casos de emergência. Ademais, muitas
dessas pequenas localidades não possuem condições de ofertar remunerações que atraiam
profissionais de saúde, o que reduz o nível das contratações (MOIMAZ et al., 2010).
Nesse sentido, quando necessitam de atendimentos mais específicos, com
especialistas, a população é referenciada para os serviços localizados nos municípios maiores,
de forma receberem a assistência em saúde a qual necessitam, o que pode gerar mais
dificuldades para essas famílias de crianças e adolescentes com necessidades especiais de
saúde, em relação ao transporte até esses locais.
Uma das mães revelou sua insatisfação com o serviço hospitalar municipal,
devido aos profissionais de saúde terem dado pouca credibilidade ao seu relato quanto ao
adoecimento de seu filho, mostrando-se pouco resolutivo e acolhedor, além de negligente
frente ao quadro convulsivo da criança, o que levou a mãe a procurar serviços privados de
saúde em busca de atendimento qualificado a criança.
91
A convulsão ela sentiu em casa, eu fui e levei ela, ai disseram que não era convulsão
não, “aqui é birra”, ai eu disse “O que é birra?” “é menino assim quando cai mole de
raiva, com raiva”, ai eu disse “não, aqui mesmo não é raiva.” Eu fui pra casa, decidi
que ia pagar uma consulta pra ela, pra saber o que era isso, porque não pode, de vez
em quando dá. Ela não podia chorar que ficava toda morena, roxa, roxa. Ai eu levei
pro Dr. X, um doutor bom que tem lá, ai ele disse assim, “aqui é convulsão, você
tem que dar esse remedinho aqui controlado pra ela”. Passou esse remédio pra ela e
eu to dando, não teve mais nada (Marta).
O que tem sido visto em muitos serviços de saúde, é a presença de atendimentos
ainda enfocados apenas no processo de queixa-conduta, automatizando a relação entre
profissionais de saúde e usuários, havendo uma valorização maior do quadro clínico e
adoecimento, e, desse modo, o acolhimento e a formação de vínculos acabam sendo
desprezados nessa relação (COELHO; JORGE, 2010).
Nessa perspectiva, ressalta-se ainda que a qualidade dos serviços de saúde não
está vinculada apenas a acessibilidade física, mas também ao processo comunicacional e de
interação entre profissionais e usuários, de forma a manter essas pessoas cientes do
planejamento acerca do seu atendimento e das condutas a serem realizadas visando solucionar
suas queixas de saúde (FRANÇA; PAGLIUCA, 2008).
Alguns dos hospitais municipais no interior do estado do Ceará parecem estar
pouco preparados para atender crianças e adolescentes cronicamente adoecidos, com
profissionais de saúde devidamente qualificados para recebê-los, acolhendo-os,
diagnosticando-os, tratando-os e referenciando-os para serviços de maior ou menor
complexidade, quando de fato necessário.
A despeito desse assunto, aponta-se pesquisa desenvolvida com Sousa e Braga
(2008), onde os discursos dos participantes revelaram que não têm ocorrido alterações
significativas nos serviços públicos de saúde do Ceará, com destaque para a ausência de
acessibilidade, descumprimento legislativo e discriminação as pessoas com deficiências, ao
contrário do que tem sido visto em outros estados brasileiros, que tem avançado frente às
políticas públicas de saúde a essa parcela da população.
Por outro lado, uma das mães relatou a satisfação com o atendimento no hospital
municipal, principalmente devido ao acompanhamento de reabilitação realizado com
fisioterapeutas nesse serviço, semanalmente.
A fisioterapeuta é ótima. [...] Lá no interior, é no hospital mesmo. Às vezes eu levo
umas duas, três vezes só, porque só é pra alongar o quadril [...] o ortopedista passou
(Samara).
Em virtude dessas atividades de fisioterapia serem localizadas no mesmo
município em que essa família reside, isso tem facilitado o acesso e a continuidade do
92
atendimento, pois, desse modo, a mãe e o adolescente não precisam deslocar-se grandes
distâncias até municípios maiores, ou a capital Fortaleza, para receber um tratamento de
qualidade e que contribua para a sua reabilitação.
Em relação ao acesso até esses serviços, destaca-se que as famílias precisam
utilizar algum meio de transporte, normalmente pago, ou concedido por parentes, devido à
ausência de transporte público coletivo nesses interiores e longa distância das pequenas
localidades até os municípios que possuem serviços hospitalares.
Ele tem esses problemas, às vezes quando ele adoece, adoece assim, sente uma dor
de barriga [...] eu vou atrás de carro. Ainda bem que a minha irmã tem um carro, ela
vai comigo, eu dou só a gasolina (Rebeca).
Só quando ela precisa [...] fica distante um pouco. [vou] de mototáxi, eu boto ela
sentada no meio [risos] (Samara).
Alguns desses meios de transporte conseguidos pela família são inapropriados
para levar a criança e o adolescente, por não proporcionarem condições de segurança aos seus
passageiros, como revela a segunda fala, a qual a mãe leva a adolescente de 12 anos entre ela
e o motoqueiro, na tentativa de segurá-la, já que esta não possui movimentação nos membros
inferiores, havendo o risco de queda e acidentes. Entretanto, essa maneira de deslocar-se se
constitui na única alternativa da família, quando esta necessita levar a adolescente até uma
assistência em saúde hospitalar.
Desse modo, compreende-se haver a necessidade, da mesma forma que para o
acesso as UBS, de um posicionamento por parte dos gestores municipais e estaduais, visando
ofertar condições seguras de acesso a sua população com deficiência aos serviços de saúde,
oferecendo-os em sua região, ou em municípios circunvizinhos, por meio de contratos em
saúde intermuniciais ou outras estratégias.
No tocante a estrutura física desses serviços, apesar dos poucos relatos dos
participantes, devido a apenas uma minoria usufruir desses hospitais no intuito de atender as
crianças e aos adolescentes com mielomeningocele, percebeu-se que estes se apresentam
adequados a recebê-los, havendo satisfação em relação ao ambiente físico, conforme as falas:
Tem rampa, lá o banheiro é bom, é grande, ele é atendido logo também, lá recebe ele
muito bem (Rebeca).
Lá tem a cadeira de rodas, tem uma rampazinha. [...] agora tem [um banheiro
adaptado], porque o prefeito deixou o banheiro bem espaçoso, porque antigamente
era bem pequeninho, não tinha condições (Samara).
Assim, de forma a facilitar o acesso dessas pessoas e os deslocamentos internos,
observou-se o predomínio de hospitais bem estruturados, e alguns que passaram por reformas,
havendo a presença de rampas, banheiros espaçosos e adaptados, e com o fornecimento de
93
cadeira de rodas aos seus usuários. Ademais, uma das mães revelou a prioridade no
atendimento nesse serviço, conforme preconiza a legislação a favor das pessoas com
deficiência, o que facilita e favorece o seu atendimento (Brasil, 2000a).
4.3.4 Hospital de Reabilitação de Referência Nacional (HR)
Esse hospital, localizado em Fortaleza, faz parte de uma rede nacional de hospitais
de reabilitação, geridos pela Associação das Pioneiras Sociais (APS), uma entidade de serviço
social autônomo sem fins lucrativos e de direito privado. Logo, constitui-se em uma
instituição pública, porém não estatal.
Essa Associação tem como objetivos gerais: fornecer serviço médico com enfoque
no sistema locomotor; formar recursos humanos e estimular a construção de conhecimento
científico; produzir informações em epidemiologia, gestão, custos e controle de qualidade;
executar atividades de educação e prevenção, no intuito de reduzir as causas das principais
enfermidades tratadas por essa rede de hospitais (RSHR, 2014).
Em relação ao hospital localizado no estado do Ceará, este foi inaugurado em
2001, e é dedicado ao atendimento de reabilitação do público adulto e infantil, através de
serviços ambulatoriais e unidades de internação, não atendendo situações de urgência e
emergência.
Pelos relatos, foi possível perceber que o atendimento prestado nesse hospital é
composto por uma equipe multidisciplinar, com médicos, enfermeiros, fisioterapeutas,
nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, entre outros trabalhadores da saúde, havendo
um enfoque maior na equipe de fisioterapia, de acordo com os familiares. Por outro lado, a
instituição também realiza diversos exames, principalmente quando o usuário vai ser atendido
pela primeira vez no serviço, de maneira a guiar a elaboração do plano terapêutico.
A atividade que está sendo desenvolvida pro Bejamim é a fisioterapia. [...] A
fisioterapeuta ensina como deve fazer a fisioterapia dele em casa mesmo, no dia-a-
dia, pra ele ficar melhor (Ezequias).
É mais a parte de exames que ele faz lá. Tem fisioterapia, mas ele fazia a fisioterapia
só até os três anos, depois de três anos ai ele não fez mais não. Mas tem
acompanhamento com a fisioterapeuta (Sandra).
Lá é a fisioterapeuta, pediatra, a psicóloga [...] (Safira).
De acordo com os participantes dessa pesquisa, as atividades fisioterápicas
ocorrem de forma contínua até os três anos de idade, dependendo do usuário, sendo que após
esse período a criança e o adolescente continuam a ser assistidos pelos fisioterapeutas, através
94
de consultas ocasionais. Ademais, os cuidadores são orientados acerca da importância da
realização de movimentos e técnicas de estimulação nos filhos, no domicílio, sendo
capacitados pela equipe de reabilitação desse hospital para desempenharem essas atividades.
Observou-se também que o acompanhamento desenvolvido por essa instituição
não possui uma frequência pré-estabelecida. Desse modo, após os exames e atendimentos
iniciais, a família pode ser contactada a qualquer momento quanto à necessidade de um novo
atendimento e ida até o hospital, para avaliações, consultas, orientações, entre outras
atividades.
É acompanhada no HR, só que é difícil chamarem ela lá. Fiz o cadastro e chamam,
mas é difícil chamarem.[...] Sete meses, oito meses, às vezes a gente tem que ligar
pra eles tarem chamando. [É atendida] pela equipe todinha que tem lá (Rafaela).
Eu só fui uma vez pra lá e passei 18 dias, mas ai não chamaram mais (Samara).
Não tem frequência, é às vezes, uma vez no mês, às vezes duas vezes, de três em três
meses. Eles ligam, marcam (Safira).
Desse modo, não há uma permanência do atendimento prestado, ou continuidade,
em alguns casos, e este serviço acaba funcionando como um suporte dentro da RAS,
complementando o acompanhamento desenvolvido pelo hospital de referência pediátrica e
outras instituições de saúde.
Percebeu-se ainda que algumas das crianças e dos adolescentes atendidos pela
fisioterapia, iniciaram a utilização de órteses, visando, entre outras funções, contribuir para a
mobilização de membros e/ou melhor desenvolvimento de suas atividades, sendo que a
própria instituição as forneceu para algumas dos participantes do estudo.
Ele usa essa órtese, tudo é a fisioterapeuta que passa (Sandra).
Eu vim semana passada e ontem já vim de novo. Porque ela ia fazer a órtese, tinha
que ficar três dias, pra ir lá, ir provando [...] nós fomos e viemos nessa semana pra
receber (Safira).
Nessa perspectiva, para Santos (2010), o atendimento fisioterápico para pessoas
com mielomeningocele, apresenta especificidades de acordo com a faixa etária, pois as
necessidades desses indivíduos variam ao longo dos anos. Há um consenso, entretanto, que
esse tratamento de reabilitação possua elevada importância, em busca de promover sua maior
independência e amenização dos sintomas, principalmente quando desenvolvido por meio de
um acompanhamento multidisciplinar.
Ademais, a utilização de órteses tem contribuído para a possibilidade de aquisição
da marcha em pessoas com mielomeningocele (BRANDÃO; FUJISAWA; CARDOSO,
2009), conforme demonstra um estudo realizado por Santos et al. (2013), onde crianças com
95
nível de lesão lombar alto utilizando órteses longas apresentaram essa possibilidade, com
variação, entretanto, no período de permanência da utilização dessa tecnologia assistida, já
que muitos passam a preferir a cadeira de rodas, ao longo dos anos, por razões variáveis.
Outra atividade desenvolvida no HR foi o treinamento dos familiares para a
realização da SVA no domicílio, após a realização de exames e avaliação médica quanto a sua
real necessidade. Das nove crianças e adolescentes que realizavam esse procedimento, a
maioria havia recebido orientação por profissionais de saúde deste hospital (6).
Também recebi treinamento no HR pra fazer o cateterismo dele [...] foi uma médica
lá no HR (Ezequias).
É eu aprendi lá no HR [SVA], aqui [HP] eles não me orientaram não (Sandra).
Eu passei 15 dias lá no HR, foi pra fazer o acompanhamento, quando ela foi fazer o
cateterismo, que eu tive estagiar, que eu mesmo que faço, e outra vez também, que a minha menina estagiou, ela faz, outra vez ela veio também (Safira).
[...] mas assim, no HR eles querem adaptar, pra ensinar ela mesma passar, lá eles
ensinam também (Samara).
Para a realização dessas orientações, a família e a criança/adolescente ficam
internados nessa instituição durante aproximadamente duas semanas, de forma a serem
capacitados adequadamente quanto à realização de maneira segura e correta da SVA. Outros
familiares, além do cuidador oficial, também podem passar pelo treinamento, inclusive a
própria criança ou o adolescente, dependendo da idade e do desejo em aprender, de forma a
promover sua maior autonomia e capacidade de autocuidado.
Nessa perspectiva, estudo realizado por Costa et al. (2012), revelou que muitos
cuidadores apresentam dúvidas quanto a possibilidade da criança e do adolescente realizem o
autocateterismo, por acreditem na grande dependência destes aos seus cuidados, apesar de
reconhecerem a importância que estes aprendam a realizar a SVA sozinhos. Os resultados não
se relacionaram a idade da criança e do adolescente, pois houve cuidadores de crianças na
faixa etária de um ano que acreditaram nessa possibilidade de autocateterismo com êxito, já
outras de adolescentes com 12 anos, que não revelaram essa possibilidade.
As famílias parecem subestimar as capacidades das pessoas com deficiências e/ou
adoecimento crônico, conforme análise das falas dessa pesquisa, fornecendo-lhes um cuidado
superprotetor, que mais gera dependência a terceiros, do que os estimula a aprimorarem suas
habilidades e desenvolverem outras, o que poderia repercutir positivamente na sua vida adulta
e relações socioprofissionais futuras, favorecendo a sua inclusão social.
Segundo Nóbrega et al. (2012), todas as crianças com adoecimento crônico
precisam de uma maior atenção e cuidados específicos as suas queixas em saúde, todavia, isto
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não justifica a ocorrência de superproteção por parte dos familiares, o que pode repercutir
negativamente no seu desenvolvimento.
Os profissionais de saúde tem importante papel frente a essa orientação e suporte
familiar. Percebeu-se que esse serviço de reabilitação tem iniciado atividades desse tipo,
oferecendo oportunidade para que a própria criança e o adolescente desenvolvam ações de
autocuidado. Ademais, o hospital também foi fonte de informações importantes para as
famílias, em relação a orientações nutricionais, sobre a mielomeningocele e a realização de
cuidados no domicílio, como se observa nas falas:
Eu vim aprender mesmo muita coisa sobre mielomeningocele no HR. [...]
Orientações de alimentação foi lá (Jane).
Recebi [treinamento] lá no HR, a gente vai pro HR, a nutricionista, ensina como
deve ser o alimento dele [...] (Ezequias).
Tinham várias palestras [sobre mielomeningocele] no HR (Safira).
Apesar de uma minoria ter recebido acompanhamento e orientações nutricionais,
com destaque para esse serviço, por ser o que realizou essa atividade com maior prevalência,
sabe-se acerca de sua importância, em virtude do risco de obesidade e, em alguns casos, de
desnutrição em pessoas com mielomeningocele (COELHO et al., 2009; BRONZERI et al.,
2011). Nesse sentido, destaca-se ainda o estudo desenvolvido por Silvério, Sant’Anna e
Oliveira (2005) que revelou a ocorrência de hipersensibilidade em estruturas orais nessas
pessoas, recusa alimentar e presença de náusea ou desconforto em grande parte das crianças
de sua pesquisa, o que pode prejudicar uma correta alimentação.
De maneira geral, os cuidadores mostraram-se satisfeitos com o atendimento
fornecido pela referida instituição de saúde, devido a qualidade do atendimento prestado e das
diversas orientações fornecidas pela equipe de saúde multiprofissional, aspecto este que
corrobora com o estudo desenvolvido por Silva et al. (2012), onde mães de crianças que
haviam sido atendidas em serviços pediátricos, mostraram-se satisfeitas com as consultas
realizadas, entre outras razões, em virtude de terem conseguido ampliar seus conhecimentos
sobre o quadro de adoecimento de seus filhos.
Logo, apreende-se que o HR possui importante papel dentro da Rede de Cuidado
às Pessoas com Deficiências, por ser uma instituição que trabalha com serviços de alta
complexidade e qualidade em reabilitação, equipes multiprofissionais e uma estrutura que
permite a oferta de um atendimento especializado para as crianças, adolescentes e adultos
com necessidades especiais de saúde.
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Entre os entrevistados, houve unanimidade também acerca da satisfação com a
excelente estrutura física do HR, por apresentar todas as adaptações necessárias a pessoas
com deficiência e espaços que favorecem os seus deslocamentos, conforme mostram as falas:
Lá é o melhor hospital que eu já passei na vida (Lidia).
O HR todo tem adaptação (Jane).
É ótimo lá, é hospital de primeiro mundo (Sandra).
Lá no HR é muito bom, acho que deveria todo hospital ser daquele jeito. Todo
mundo trata a gente bem, muito bom [...] tem rampa, tem o lugar direitinho para
fazer o cateterismo; se a gente tiver o material faz, se não, eles dão. [...] No HR na
hora que a gente chega já tem [cadeira de rodas] (Safira).
[...] eu acho que teria que ter umas cadeiras que nem as que têm no HR, adaptadas
(Rafaela).
A instituição, portanto, preza pela ambiência preconizada no SUS de sua
edificação, que se refere à lida com os espaços físicos como locais de interações sociais e
profissionais, devendo proporcionar condições para uma atenção acolhedora, humanizada e
resolutiva (BRASIL, 2010).
Notou-se ainda que a instituição disponibiliza cadeira de rodas a partir de sua
entrada, para que seus usuários locomovam-se em todos os compartimentos com maior
possibilidade de acesso, condizendo com sua conceituação como hospital de referência
nacional, além de fazer parte de uma das maiores redes de reabilitação do mundo. Ademais,
apresenta banheiros adaptados e preparados adequadamente para que a família realize a SVA
na criança e no adolescente, sendo ofertado todo o material, quando necessário, para que haja
continuidade no tratamento dessas pessoas.
A forma como as famílias chegaram até esse hospital, foram, em sua maioria, por
iniciativa própria, sem haver a necessidade de encaminhamentos de outros serviços,
principalmente após ouvir excelentes recomendações provenientes de outros cuidadores,
familiares de crianças/adolescentes com doenças crônicas e de alguns profissionais de saúde,
consoante com as falas:
Meu marido ligou pro HR, porque eles não recebem se chegar lá. Aí com um mês
eles retornaram para marcar uma consulta pra ela [...] Eu não fui encaminhada,
decidi ligar, pois ouvi falar que eles atendiam essas pessoas (Jane).
Através de outra mãe com mielomeningocele e hidrocefalia (Priscila).
Eu cadastrei ele, ai chamaram, ele tinha dois meses quando eu cadastrei ele. Foi uma
mãezinha daqui, eu conheci ela aqui, e o filho dela tinha mielomeningocele. Ela
disse que lá era muito bom, que eu ligasse para lá para cadastrar. Foi o que eu fiz
(Sandra).
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Fui eu mesmo que liguei. A fisioterapeuta, disse que era um hospital muito bom, que
já tinha atendido outros pacientes de lá. Ai ela me deu o número e eu liguei.
(Samara)
Para ter acesso, portanto, ao HR, qualquer indivíduo pode entrar em contato por
telefone com a instituição, sem a necessidade de um referenciamento por parte de um
profissional de saúde, e, após avaliações iniciais, haverá ou não a inclusão do usuário, a partir
de critérios pré-estabelecidos específicos desse serviço. Assim, apesar de toda população ter a
possibilidade de acessá-lo, não é garantido o atendimento a todos, pois a instituição seleciona
aqueles a que irão receber os seus atendimentos, organizando a sua grande demanda.
No que diz respeito ao acesso físico, referente à locomoção até essa instituição,
aqueles que residiam no interior e que ainda faziam algum tipo de tratamento no HR, já que
alguns haviam recebido atendimento apenas durante um curto período, todos conseguiam
transporte do município ou auxílio financeiro para tal, e os que moravam em Fortaleza
conseguiam utilizar o transporte público de forma gratuita, através do passe-livre.
Para vim para Fortaleza eu venho de ônibus. Eles dão a passagem, a minha e a do
pai (Safira).
Assim, do HR às vezes eu não consigo [transporte municipal], porque o HR liga pra
mim hoje para eu já levar amanhã, mas se o HR ligar hoje para eu levar próxima
semana eu consigo, porque também lá é marcado, mesmo sabendo que ela precisa,
tem outras crianças que precisam também, aí é tudo marcado. Quando são as
consultas dela aqui, eu ligo marcado uma semana antes, aí toda vida tem (Rafaela).
Conforme a segunda fala, a mãe refere que apesar de ter acesso ao transporte do
seu município, há dificuldade de conseguir utilizá-lo quando o atendimento é no HR, devido à
marcação das consultas ocorrerem, algumas vezes, somente nas vésperas, e a organização do
transporte municipal funcionar por meio de uma agenda, onde são feitas programações com
antecedência para as consultas de todas as pessoas da região. Nesse sentido, torna-se
importante que essa instituição conheça as reais condições socioeconômicas dos seus
usuários, de forma rever sua forma de organização dos atendimentos, no intuito de facilitar o
acesso destes as consultas.
Por outro lado, destaca-se a importância da Lei n°0057 de 2008 de Fortaleza, que
assegurou a gratuidade ao transporte público coletivo às pessoas com deficiência, que não
estejam empregadas no mercado formal, e sejam favorecidas do BPC ou do Programa Bolsa
Família. Para adquirirem esse direito, há a necessidade de um cadastramento na Empresa de
Transporte Urbano de Fortaleza (ETUFOR), para o recebimento dos cartões de gratuidade.
Ressalta-se que a pessoa portadora do cartão possui o direito a um acompanhante, que
também possui a gratuidade do transporte.
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Salienta-se que uma minoria das crianças e dos adolescentes dessa pesquisa
estavam sendo ou já haviam sido tratados nessa instituição, provavelmente por falta de
encaminhamento por parte de outros serviços de atenção em saúde, ou desconhecimento dos
profissionais acerca do funcionamento dessa instituição e relevância na reabilitação dessas
pessoas. Desse modo, o acesso a ela foi reduzido, não em consequência da organização do
hospital, mas por falta de orientação aos familiares e cuidadores sobre a possibilidade de seus
filhos também serem atendidos nesse local, como uma complementação da atenção já
recebida nos demais serviços da RAS.
Desse modo, compreende-se a importância da ampliação dos serviços de
reabilitação e do acesso aos já existentes, além de um aumento no quadro de profissionais,
objetivando a garantia de um cuidado integral, através de diferentes especialidades, as pessoas
com deficiências. Nesse contexto, poderia haver uma maior resolutividade desses serviços,
que se encontram em níveis de menor complexidade na RAS, o que, consequentemente,
reduziria a necessidade de altos investimentos nos hospitais terciários (AMARAL et al.,
2012).
Destaca-se ainda que os achados dessa pesquisa, referentes a esse hospital de
reabilitação, foram limitados, já que esta foi desenvolvida em outra instituição de referência
pediátrica. Assim sendo, informações mais aprofundadas sobre o HR requerem a realização
de novos estudos nesse local.
4.3.5 Hospital Pediátrico de Referência (HP)
A pesquisa foi realizada nessa instituição, desse modo, houve a possibilidade de
entrar-se em contato com alguns profissionais de saúde e desenvolverem-se algumas
observações sistemáticas, conforme descrito na metodologia, o que permitiu, por meio do
entrecruzamento dos métodos, aprofundar os achados acerca do seu funcionamento
organizacional e atendimento, da sua estrutura física e do acesso até este.
A maioria das crianças e dos adolescentes do estudo logo após o nascimento foi
encaminhada para este hospital, onde realizaram a cirurgia de reparação da
mielomeningocele. Os demais foram operados em outras instituições de referência em
obstetrícia e neonatologia do Ceará. Entretanto, independente do local de reparo, todos
passaram a ser acompanhados no HP, através do Ambulatório de Especialidades.
Aspectos estes que corroboram com Borba et al. (2012), ao declararem que o
primeiro tratamento a essas pessoas é o fechamento da lesão da mielomeningocele, no intuito
100
de reduzir os agravos ao tecido e suas repercussões, minimizando também possíveis processos
infecciosos. Após as cirurgias necessárias, a terapêutica passa a envolver um seguimento
clínico por toda a vida, em decorrência das diferentes possibilidades de complicações.
Alguns dos filhos dos participantes também tiveram acesso ao Núcleo de
Orientação e Estimulação ao Lactente (NOEL) dessa instituição, composto
predominantemente por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos, e que atua
com crianças até três anos de idade, que apresentam alterações neurológicas, congênitas e
malformações.
Outro setor existente na instituição que também atua com crianças e adolescentes
com mielomeningocele é o Netiif, já comentado anteriormente, com abordagem a
incontinência fecal, sendo composto por uma equipe interdisciplinar, formada por uma
enfermeira estomaterapeuta, um cirurgião pediátrico, nutricionista, psicólogo e assistente
social.
Apesar dessa diversidade de setores, observou-se haver pouca integração entre
estes, principalmente em relação aos profissionais do ambulatório em relação ao Netiif, já que
muitas das crianças e dos adolescentes dessa pesquisa apresentavam incontinência fecal,
entretanto nunca haviam sido encaminhados para esse setor, e nem sequer seus pais sabiam
acerca do seu funcionamento na instituição. Apenas uma criança já havia sido acompanhada
por este núcleo e passado por um treinamento juntamente com sua mãe.
No que diz respeito ao atendimento desenvolvido ambulatorialmente as crianças e
aos adolescentes com mielomeningocele, as frequências das consultas variam de acordo com
a gravidade dos usuários, presença de complicações e estabilidade clínica, conforme mostram
os relatos:
É atendida de três e três meses e o médico passou pra seis em seis meses por conta
dela não ter nenhuma complicação (Mara).
Aqui depende, a neuropediatria já ta só de seis em seis meses, o neuro, agora que ele
fez cirurgia, acho que vai ficar de dois em dois meses. Quando ela tiver bem já
aumenta o prazo (Rafaela).
Quanto menos transtornos ocorrerem durante o tratamento, maior é o prazo para
novas consultas com as especialidades. Entretanto, para uma das mães, existe uma longa
distância entre os atendimentos, com grandes períodos de espera entre as consultas, o que para
ela parece ser inadequado, devido à complexidade das sequelas que sua filha apresenta, o que
tornaria necessário um acompanhamento mais rigoroso e contínuo:
Eu só acho que o prazo é muito grande. Seis, sete meses, oito meses [...] mesmo ela
estando bem, uma criança com hidrocefalia e mielo, eu acho que era pra vim pelo
menos de dois em dois meses, de três em três meses (Rafaela).
101
Essa inquietação quanto ao atendimento pode estar relacionada à própria
insegurança existente entre as famílias de crianças com doenças crônicas, em virtude do medo
quanto ao seu futuro, às incertezas quanto ao seguimento da doença e suas possíveis
repercussões, como a possibilidade de agravamento do quadro e morte (NÓBREGA et al.,
2012). Desse modo, a família como integrante do processo de cuidar, carece de orientações
que a instrumentalizem e deem suporte para tais ações, na medida em que precisam
compreender a complexidade do tratamento, terapêutica e adoecimento, e entender, assim, o
que se passa com a criança, de forma a alcançarem maior autonomia e possibilidade de
controle emocional (ARAÚJO et al., 2009).
Em relação aos profissionais que realizam os acompanhamentos nesse
ambulatório, apesar de ser composto por diversas especialidades, atendendo a diferentes
demandas de seus usuários, observou-se que as crianças e os adolescentes com
mielomeningocele não eram assistidos por toda a equipe multidisciplinar, sendo
acompanhados em grande parte por um único ou poucos profissionais desde o seu
nascimento, sem haver encaminhamentos para outras especialidades dentro do mesmo
ambulatório, o que tem fragmentado o cuidado a essas pessoas, que possuem diferentes
sequelas e necessidades relacionadas à mielomeningocele, entre outros aspectos
biopsicossociais particulares.
O que tem trabalhado aqui no HP, na parte mais da hidrocefalia e da mielo [...] só
dos rins dele, como é que tá a bexiga dele, como é que ela tá funcionando. A
hidrocefalia, o neurocirurgião só tá trabalhando a respeito da válvula pra saber se ela
tá bem, se ela não está. E o resto, a questão física dele, as pernas, os movimentos das
pernas e dos braços e do raciocínio dele, como vai ficar, aqui ninguém ainda tá
trabalhando não (Ezequias).
Quem atende aqui é a doutora B, é só ela (Rebeca).
Desse modo, o enfoque do cuidado as crianças e aos adolescentes com
mielomeningocele, tem ocorrido preferencialmente na doença, nos órgãos mais afetados por
esta, como a bexiga e os rins, e nas complicações associadas ao implante de Derivação
Ventricular nos casos de hidrocefalia associada. Assim sendo, o atendimento prestado vai
contra o princípio da integralidade da atenção em saúde, sendo ainda voltado ao modelo
medicalocêntrico e curativista, que na teoria já deveria ter sido extinto.
Corroborando, de acordo com Machado et al. (2007), o modelo grandemente
praticado na saúde consiste em ações fragmentadas, com enfoque na realização de atos,
havendo um predomínio de uma desarticulação entre as diferentes queixas dos usuários. Em
102
busca de alternativas para a mudança desse cenário atual, faz-se necessário um novo
referencial, baseado no compromisso com a vida, ética, recuperação e promoção da saúde.
Nesse sentido, salienta-se que grandes têm sido os avanços nas pesquisas com o
corpo humano, havendo consideráveis aprofundamentos acerca dos tratamentos e
conhecimentos fisiopatológicos, o que tem levado a centralização dos interesses em saúde a
aspectos orgânicos dos seres humanos, tornando-se secundária a visão dos usuários como
seres psicossociais, bem como suas experiências particulares e subjetivas de adoecimento,
apesar das frequentes e atuais discussões teóricas acerca da humanização do cuidado (SILVA
et al., 2012).
Destaca-se ainda que apesar da multidisciplinaridade existente no serviço,
observou-se a ausência de interdisciplinaridade, que vai além de uma soma ou justaposição de
saberes sobre objetos em análise, onde as disciplinas se interrelacionam e comunicam-se umas
com as outras, construindo interações fortes baseadas em trocas e articulações entre diferentes
atores (MENDES; LEWGOY; SILVEIRA, 2008).
A comunicação entre os membros de uma equipe multiprofissional torna-se
essencial, na medida em que contribui na busca por um planejamento terapêutico adequado a
cada usuário e suas famílias, e realização de condutas eficazes e específicas, gerando maior
resolutividade do cuidado (ANDRADE et al., 2013).
Nesse sentido, para que seja alcançada uma prática em saúde baseada na
integralidade, faz-se preciso a efetivação de um trabalho em equipe entre os profissionais de
saúde, por meio de estratégias que propiciem a ocorrência do diálogo e troca de informações
entre estes. Assim, a integralidade é compreendida como a efetivação de um cuidado onde se
percebe o usuário de forma integral, como um sujeito social, político, histórico, que está
inserido em um contexto familiar e convive em uma comunidade, com determinada base
territorial (MACHADO et al., 2007).
As crianças e os adolescentes com mielomeningocele, diante das diferentes
alterações fisiopatológicas e necessidades individuais, podem precisar de cuidados
nutricionais, psicológicos, ortopédicos, de reabilitação, de enfermagem, urológicos, renais,
gastrointestinais, neurológicos, cirúrgicos, entre outros. Portanto, torna-se insuficiente estes
serem acompanhados por apenas uma única especialidade médica durante toda a vida,
recebendo orientações reduzidas e fragmentadas quanto aos seus cuidados domiciliares e
queixas de saúde. Um trabalho em equipe interdisciplinar tem a possibilidade de oferecer uma
assistência mais qualificada e integral a essas pessoas, favorecendo sua reabilitação e
proporcionando-lhes uma melhor qualidade de vida.
103
Cada disciplina possui seus saberes específicos, sendo capacitada para atender
uma determinada especialidade. Ao percebe-se outras alterações e necessidades diferentes da
sua área de atuação, o profissional de saúde precisa procurar dialogar com outros atores
envolvidos no atendimento dessas pessoas, encaminhando-os para outros serviços e
profissionais, quando preciso, compartilhando-lhes informações acerca do usuário, suas
particularidades e os cuidados anteriormente prestados.
A observação da escassez desse tipo de trabalho em um serviço de referência em
pediatria, formado por um ambulatório altamente qualificado e com projetos como o NOEL,
Netiif, entre outros, revela uma fragilidade interna no serviço, com uma carência de
integração entre os profissionais de saúde e os setores, ou por questões de gerenciamento e
organização interna, ou por falta de capacitação e conhecimento dos profissionais sobre as
diferentes especialidades e programas existentes na instituição, e que porventura podem
apresentar uma visão de cuidado ainda fragmentada, tecnicista e individualizada.
De maneira geral, nos depoimentos das famílias entrevistadas predominou falas
de satisfação em relação ao hospital, em virtude da resolutividade, rapidez no atendimento,
complexidade estrutural, oferta dos exames necessários aos seus filhos e possuir profissionais
de qualidade.
Eu não tenho o que dizer, não sei como um hospital é bom desse jeito, o que precisar aqui tem, tem medico, enfermeira, tudo, tudo que a pessoa precisa aqui dentro do
hospital aqui tem (Naomi).
Aqui eu acho excelente [...] muito bom o atendimento aqui, eu gosto daqui, gostei
muito desse hospital (Raquel).
É ótimo. Não é que nem os outros cantos que às vezes eu vou com ela, eu chego
aqui e sempre eu sou atendida logo, procuram saber como ela esta, vão fazer logo os
exames, eu gosto do tratamento aqui por causa disso, porque não vão esperar, é
chegou vai logo fazer os exames todos pra saber o que é que tem (Lidia). Eu pagava um plano de saúde para ela, mas tudo que eu preciso tem aqui, ai deixei
de pagar (Jane).
A proposta do SUS é garantir serviços com esse nível de qualidade a toda a
população, ofertando profissionais capacitados através de equipes multiprofissionais, todos os
exames necessários para um correto diagnóstico e tratamento, sem a necessidade de longos
períodos de espera para a sua realização, e um acompanhamento contínuo com excelência a
pessoas cronicamente adoecidas. Assim sendo, diante desses aspectos, essa instituição
caracteriza-se dentro do SUS como um hospital de referência no cuidado a crianças e
adolescentes, apesar de ainda estar em fase de organização e aperfeiçoamento, visando, em
longo prazo, fornecer cada vez mais serviços adequados à população.
104
Nessa perspectiva, enfatiza-se a qualidade do atendimento prestado pelos
profissionais de saúde, de acordo com os familiares, seu grau de aperfeiçoamento e
capacidade em lidar com essas crianças e esses adolescentes com necessidades especiais de
saúde, conforme mostram as falas:
Eu acho bom, eles são tudo responsáveis os profissionais, pelo menos os que
atendem ela, eu me dou super bem com eles (Léa).
Eu acho que os médicos daqui são muito bons (Raquel).
Desde o dia que minha filha se internou pra fazer a cirurgia da correção da coluna,
pra fechar o local, desde esse dia eu agradeço muito, porque ela foi muito bem
atendida por todos os médicos. Assim, toda vez que ela precisa, se for pra caso de
emergência ela vem pra cá, eles atendem muito bem porque ela é paciente daqui
(Mara).
Alguns autores afirmam que de fato, as pessoas com doenças crônicas lidam com
um cotidiano baseado em constantes atendimentos e acompanhamentos, visando reduzir as
complicações e prolongar os momentos de equilíbrio no seu organismo, circunstâncias essas
que podem repercutir em todas as dimensões de suas vidas. Assim, torna-se realmente
indispensável que os profissionais de saúde mudem suas posturas na atenção a esses
indivíduos, sendo formados e capacitados para lidar com essas peculiaridades existentes à
condição crônica, como foi possível observar nessa pesquisa (NOBREGA et al., 2013).
Outro estudo, desenvolvido por Franco e Campos (1998), que avaliou um serviço
pediátrico ambulatorial, e que apesar de ter sido realizado há alguns anos, ainda tem sido
referência para a discussão sobre a qualidade desse tipo de atendimento, também revelou,
confirmando os achados apresentados, que a formação de vínculos entre profissionais,
familiares e usuários ocorre com mais facilidade nos ambulatórios de especialidades, quando
comparado aos ambulatórios gerais, apesar da quantidade de áreas as quais estes são
atendidos, em virtude da longitudinalidade da assistência fornecida, o que contribui para a
formação de interações mais fortes.
Para alguns dos participantes, a qualidade do serviço e dos profissionais de saúde
foi associada à melhoria do quadro dos seus filhos e/ou estabilidade clínica, com a redução de
complicações e da necessidade de internações hospitalares.
[...] entendo [as orientações], tá ótimo, ele melhorou bastante depois que passou pra cá (Sandra).
Eu acho que eles têm um conhecimento muito bom, porque se não eu acho que o
estado do Bejamim poderia ter ficado pior ainda. Mas graças a Deus o Bejamim está
bem (Ezequias).
105
A qualidade da relação entre os profissionais e às famílias e os usuários menores
de 18 anos com mielomeningocele, baseada no respeito desses trabalhadores, também foi
destacada pelos participantes, revelando o grau de responsabilização existente pelos
profissionais quanto à situação destes, por demonstrarem sempre prontidão e resolutividade
em suas ações, sendo executadas todas as atividades possíveis dentro da instituição para a
melhoria da saúde dessas pessoas.
Eles cuidam muito bem, eles ficam preocupados (Naomi).
Eles tratam a gente muito bem, depois que a gente chega na sala, quando eles vão
analisar o paciente, graças a Deus tem sido bem (Ezequias).
O hospital daqui eu não tenho o que dizer nada não, porque toda vida receberam bem
ele. Aqui é bom demais, eles atendem bem ele, eles são legais (Rebeca).
Essas questões corroboram com Nóbrega et al. (2013), ao discutirem que quando
sobrevém um atendimento resolutivo as crianças cronicamente adoecidas, ocorrendo uma
escuta ativa as suas reais necessidades, os seus cuidadores apresentam maior facilidade em
partilharem o seu cotidiano, anseios e fragilidades com esses profissionais de saúde, que unem
o desempenho clínico a criança e sua família e a capacidade de ouvi-los qualificadamente,
gerando uma atenção mais humanizada.
Logo, uma assistência a essas pessoas de forma integral necessita envolver
também seus familiares, atendendo suas necessidades ante a vivência do adoecimento crônico
juntamente com a criança e o adolescente. Para tanto, um aspecto imprescindível na relação
entre a equipe de saúde e os familiares é o fornecimento de informações sobre o adoecimento
de seus filhos, tratamento e todas as situações de atendimento a que estes são submetidos
(ARAÚJO et al., 2009).
Apenas uma mãe mencionou sobre o período de espera no ambulatório até o
momento das consultas, revelando não ser este um problema, na medida em que para ela, o
importante é sua filha receber o atendimento, independente do momento.
Quando eu venho, eu só venho assim, porque eu cheguei já hoje de madrugada, ai eu volto já hoje. Então a qualquer momento que atenda ela tá bom, porque eu só saio de
noite (Marta).
A maioria (13) das crianças e dos adolescentes reside em outros municípios do
estado, distantes dessa instituição de saúde a qual são acompanhadas. Para os familiares, em
meio as grandes dificuldades existentes no sistema público de saúde para se ter acesso a um
serviço de qualidade e específico as suas demandas, com a oportunidade de realizar todo o
tratamento, diagnóstico e reabilitação necessários, o fato de terem alcançado a possibilidade
de levarem seus filhos para esse serviço já é o suficiente para estarem satisfeitos,
106
independente, muitas vezes, da forma a que serão atendidos, das consultas serem rápidas e
superficiais ou do tempo de espera.
Foi possível observa-se algumas consultas nesse ambulatório, havendo variações
entre os profissionais em relação à qualidade do atendimento e responsabilização com o
estado de saúde da criança e do adolescente. Em alguns casos, os profissionais realizaram as
consultas com considerável rapidez, revelando pouca atenção e escuta as queixas das famílias,
não sendo percebida a realização de exames físicos no usuário ou avaliações mais profundas.
Destaca-se, entretanto, que estas questões não podem ser generalizadas, na medida em que
foram visualizadas as consultas de poucos profissionais de saúde e que em alguns casos
também percebeu-se grande atenção por parte destes, que prestavam longos atendimentos a
cada usuário consultado, solicitando exames de urgência, entre outras atividades necessárias.
Nessa perspectiva, pesquisa que avaliou consultas pediátricas revelou que a
maioria das acompanhantes estava satisfeita com os atendimentos anteriores e dentre os
motivos para a avaliação positiva, destacou-se, entre uma significativa quantidade de mães, a
simples ausência de eventos indesejados, pois estas pareciam temer encontrar dificuldades
para o atendimento de seus filhos, em consequência de ser um serviço público de saúde.
Assim, a não ocorrência de situações desagradáveis foi suficiente para que estas estivessem
satisfeitas com o serviço, menosprezando, dessa forma, os recursos físicos, humanos e
matérias que podem influenciar diretamente na qualidade do cuidado (SILVA et al., 2012).
A partir dessas questões, leva-se a refletir que a população desconhece muitas
vezes os seus reais direitos, entendendo o serviço público de saúde como algo que o governo
decidiu conceder a eles, visão paternalista da saúde, não compreendendo que é um
atendimento custeado pela sociedade, sendo o direito a saúde assunto constitucional, um
dever do Estado, e não algo fornecido de forma voluntária, ou por compaixão. Assim sendo,
simplesmente por receberem atendimento em saúde, não importando a forma como este
ocorre, a população sente-se muitas vezes satisfeita, qualificando os serviços como
adequados, conformando-se com o recebido, sem buscar melhorias ou mudanças, em algumas
situações.
Quanto aos deslocamentos das famílias até esse serviço, para aquelas que residem
em Fortaleza, o transporte público municipal tem sido uma das principais escolhas para ida
até o HP, sendo em alguns casos utilizado transportes particulares, como o táxi, ou de
familiares/vizinhos, quando em período de chuva, ou devido a lotação do transporte público
coletivo.
107
Alguns dos participantes que vem para Fortaleza provenientes de outros
municípios também utilizam o sistema público de ônibus, ao terem que deslocarem-se das
rodoviárias ou residência de parentes até o hospital. O que revela ser este um importante meio
de transporte para essas famílias, que sobrevivem, na grande maioria das vezes, apenas com o
BPC da criança/adolescente.
Lá de onde eu moro pra cá é longe. Eu pego ônibus para a Parangaba e de lá eu pego
outro pra vim pra cá (Léa).
Venho de ônibus, pego o ônibus no Município X, ai desço ali [rodoviária], a gente
pega o táxi, paga pra nos deixar (Rebeca).
Pego dois transportes, dois ônibus, um de lá de casa [outro município] e outro lá do
terminal da Parangaba (Raquel).
O transporte hoje eu vim de táxi porque tava chovendo e pra pegar ônibus de manhã,
chovendo, pra vim pra cá, pra ir para o terminal, aliás, é tudo lotado e o motorista
não quer parar porque tá lotado (Sandra).
Observa-se a dificuldade de acesso ao transporte público, havendo situações em
que este se encontra lotado de tal forma, que não há possibilidade de mais nenhum passageiro
adentrar no ônibus, o que acaba tornando-se um obstáculo para que as famílias consigam levar
as crianças e os adolescentes até o serviço de saúde.
Em relação à gratuidade desse transporte, observou-se que apenas um dos
participantes apresentava o Passe-Livre disponibilizado pela Prefeitura de Fortaleza
(FORTALEZA, 2008), conforme discutido anteriormente, e nenhum recebia auxílio para o
deslocamento dentro da cidade, de acordo com as falas:
Eu toda vida pago minha passagem, a Débora não paga porque é pequena. [...] Não
tem auxílio para passagem não (Jane).
Recebo um cartãozinho, o passe livre. Se eu tiver com ele eu não pago nada
(Sandra).
Paga, porque assim tem que ter o passe livre, e ela não tem. Nunca me indicaram
nada assim pra mim tirar. Assim, a assistente social tira mais é do idoso, eu nunca
vejo assim tirar de criança nem nada. Eu nem perguntei ainda (Samara).
Há uma carência de orientações acerca da possibilidade de gratuidade no
transporte coletivo as pessoas com deficiências, e da forma como as famílias devem se portar
para realizarem o cadastro e conseguirem apropriar-se desse direito, bem como os critérios
necessários para adquiri-lo.
Como grande parte dos participantes sobrevivem com um salário mínimo mensal,
a ausência do passe-livre e os obstáculos no acesso ao transporte público coletivo podem
torna-se barreiras para o deslocamento dessas pessoas, consoante estudo desenvolvido por
108
Amaral et al. (2012), onde os autores evidenciaram a necessidade de aperfeiçoamento
ambiental e de transporte, visando favorecer a locomoção das pessoas com deficiência física e
mobilidade reduzida, de maneira a contribuir na realização de suas atividades cotidianas de
vida, da mesma forma como o restante da população consegue desenvolver.
Em relação à estrutura dos ônibus para a acomodação de pessoas que usam
cadeira de rodas e apresentam deficiências, percebeu-se que a maioria, de acordo com os
cuidadores, apresentam as adaptações necessárias, com espaço reservado para cadeira de
rodas e o equipamento mecânico de elevação para a entrada no veículo, porém, em algumas
situações, apesar de apresentá-los, estes se encontram sem manutenção, impossibilitando sua
correta utilização.
Porque sempre tá quebrado [dispositivo de elevação da cadeira de rodas], se tiver
quebrado, alguns motoristas conseguem subir, alguns não, vão embora e dizem que
tá quebrado. Eu peço pra colocar, digo que ajudo a colocar, e eles “não tá quebrado,
posso não”(Sandra).
A maioria tem [local adaptado para cadeira de rodas], é na cadeira, ai tem um cinto,
a gente passa o cinto. Quando tá quebrado o jeito é eu segurar. Uma vez ele ia
virando, porque ele tava sem cinto, porque estava quebrado, ai quando o motorista
fez assim, a curva, se eu não segure e pessoal que tava perto ele tinha caído
(Sandra).
Acho melhor ficar com ela [segurando] do que trazer a cadeira, às vezes tem
elevador no ônibus que a gente entra e às vezes não. Tem vezes que tem, mas os que
não tem é ruim trazer a cadeira por isso (Safira).
Desse modo, o transporte público não tem fornecido condições seguras e
apropriadas para a locomoção da criança e do adolescente com mielomeningocele, apesar de
estarem seguindo parcialmente o preconizado na legislação acerca da necessidade de
adaptações, conforme o Decreto 5.296 de 2004, ao afirmar que no Art. 34:
Os sistemas de transporte coletivo são considerados acessíveis quando todos os seus
elementos são concebidos, organizados, implantados e adaptados segundo o
conceito de desenho universal, garantindo o uso pleno com segurança e autonomia
por todas as pessoas.
Os achados corroboram com a pesquisa de Elias, Monteiro e Chaves (2008) no
Rio de Janeiro, onde estes encontraram que alguns ônibus, metrôs e trens também não
possuíam estrutura para permitir o acesso a população com deficiência, além de haverem
circunstâncias em que os motoristas não param para que as mães subam com seus filhos e
suas cadeiras de rodas, os inviabilizado de usufruírem de seus direitos de acesso aos meios
públicos de transporte.
Ainda no sentido de cumprir o preconizado por lei, as empresas de transportes
coletivos devem reservar assentos identificados para pessoas com deficiência (BRASIL,
109
2000a). Nesse sentido, também se observou uma falha no seu cumprimento, em algumas
situações:
Mas é muito ruim pra vim com ele, porque vem lotado. Teve um dia que a gente
veio, ele veio em pé, o pessoal vê o sofrimento da gente e não dá a cadeira. Tem
deles que dão, quando é uma pessoa do coração bom, quando não é, ai quando o
ônibus vem lotado a gente fica assim na frente deles, para as pessoas não pisarem
nele, é um sofrimento pra gente vim de lá pra cá (Rebeca).
Se não veem as perninhas dela, não dão o canto no ônibus. Uma vez ela veio do
Município P em pé até a Parangaba e ninguém deu o lugar. [...] O motorista às vezes
me bota na frente (Jane).
A criança e o adolescente acabam sendo submetidos a condições inadequadas, não
sendo respeitado pela população o direito ao assento preferencial, para que estes possam
deslocar-se em condições minimamente adequadas e seguras. Assim, os familiares têm que
segurar o filho com deficiência, para que este consiga manter-se em pé até a chegada ao
serviço de saúde. Destaca-se ainda, que devido a todas essas condições, torna-se difícil para a
família transportar a cadeira de rodas, razão a qual se veem obrigados a contratarem
transportes particulares para terem condições adequadas de levar seus filhos ao
acompanhamento em saúde.
Para aqueles que residem em outros municípios, observou-se que a maioria
consegue vim para o hospital por meio de um transporte ofertado por estes, como ônibus,
carros, entre outros, que trazem para os serviços de saúde de maior complexidade a população
que necessita de um atendimento mais especializado, ou para pessoas com necessidades
especiais de saúde que são acompanhadas em Fortaleza.
Eu venho transferida pela secretaria do Município A, de microonibus (Naomi).
Vem no ônibus (Samara).
Hoje eu consigo com o secretário, é da prefeitura. Antes eu e a Verônica vínhamos pra cá duas vezes na semana, e não tinha o carro duas vezes, ai eu escolhia ou a terça
ou quinta. Hoje se for preciso ela vim a semana todinha, eu consigo carro pra ela
vim a semana todinha (Rafaela).
Até alcançarem pelo município o transporte, algumas famílias passaram por
dificuldades, buscando em secretarias e demais departamentos do governo até conseguirem o
direito de levarem essas crianças e esses adolescentes até um serviço de saúde de qualidade,
como foi possível percebe-se na terceira fala da mãe acima. Em outras situações, o transporte
é ofertado, entretanto não existe uma estabilidade quanto a sua disponibilidade, assim, a
família não tem uma garantia de que irá conseguir estar presente em todas as consultas,
buscando alternativas para o transporte:
Às vezes eu vinha na topic da saúde, que vem pra cá pro HP, e pros outros hospitais
e deixa os pacientes. Ai eu vinha na topic, só que as topic agora, eu mandei minha
110
irmã saber, botar meu nome lá, tava lotado, não deu pra vim, é só uma topic, venho
poucas vezes. Ai às vezes eu venho mais é pago, sem condições sem nada (Rebeca).
Uma pesquisa utilizada ainda hoje por diversos autores, para discutir acerca da
qualidade do atendimento prestado em serviços de pediatria, também encontrou alguns
obstáculos semelhantes para o acesso dos usuários aos serviços de atendimento ambulatorial,
com destaque para a longa distância e a necessidade de custeio dos transportes, somado a
inadequação dos horários desses meios de locomoção, como ônibus e ambulâncias FRANCO;
CAMPOS, 1998).
Também se observaram circunstâncias em que a família não tinha condições para
se deslocar até o hospital municipal, local de saída do transporte para a vinda até Fortaleza, o
que se constituiu em mais um entrave para essas pessoas, conforme se observa na fala:
É direito é, mas a gente corre atrás e ficam botando dificuldade. Porque o certo
quando eu morava na outra casa, ele mandava a ambulância ir me buscar de manhã
até o hospital, ai do hospital eu já pegava outro transporte pra vir pro hospital aqui.
Mas agora eles não querem mais buscar em casa, eles querem que eu vá a pé, o
hospital é longe (Lidia).
Outra estratégia utilizada pelos municípios para que sua população tivesse acesso
a esses serviços é a oferta da passagem por meio do transporte rodoviário intermunicipal.
Eu venho de ônibus, a minha passagem ele [município] dá, agora da acompanhante
ele não dá, porque era pra dar (Marta).
Para vim para Fortaleza eu venho de ônibus. Eles dão a passagem, a minha e a do
pai (Safira).
Alguns dos entrevistados falaram acerca da dificuldade em deslocarem-se até o
serviço de saúde sem a presença de outro adulto que pudesse os auxiliar, pois muitos levam a
criança e o adolescente nos braços, ficando a mercê de conseguirem cadeiras de rodas no
serviço. Ao precisarem utilizar o sanitário, ou realizar a SVA e/ou higienização da criança e
do adolescente, entre outras atividades, e durante a própria utilização do transporte público,
no revezamento em segurá-los, bem como as bagagens, torna-se complicado desenvolvê-los
sem auxílio.
Usa [cadeira de rodas] em casa, mas sempre que eu venho pra cá eu nunca trago,
porque tem que desmontar ela toda, eu prefiro trazer uma pessoa comigo e essa
pessoa me ajudar (Rafaela).
Agora para vim pra cá é pago, porque vem uma amiga minha comigo, ai eu tenho
que pagar a passagem dela. Porque assim, é ruim a gente chegar aqui e não ter quem deixar ela para ir ao banheiro, para dar um banho nela [...] se a gente trouxer uma
pessoa é bom porque fica com ela, sozinha não tem como (Marta).
De fato, o desgaste com as vindas para o HP são intensas, e acentuam-se devido
ao longo período em que muitos passam na instituição, esperando todos os que vieram no
111
mesmo veículo receberem o atendimento e realizarem os exames, assim, muitos chegam no
início da manhã e voltam apenas ao final do dia. Entretanto, apenas em algumas situações tem
sido possível a vinda de um acompanhante, nos casos em que o transporte é do próprio
município, nos demais casos a família também acaba tendo que custear sua passagem.
Apesar de terem sido a minoria no estudo (3), encontraram-se famílias que não
conseguiram ainda, de maneira nenhuma, a garantia de um transporte ou o recebimento de
uma passagem para o acompanhamento em Fortaleza, o que se torna uma barreira para o
acesso até o serviço público de saúde de referência, como se pode observar nas falas a seguir:
Eu estava deixando de vim mais por conta do transporte, porque o carro estava no
prego, a gente vem no carro do irmão dele, só que agora ajeitou e a gente está vindo
com frequência e quando não vem com o carro do irmão dele, a gente dá um jeito de
pagar, se a gente tiver dinheiro uma pessoa pra vim deixar ou ele pega o carro de
algum amigo e vem, a gente está fazendo de tudo pra não faltar mais, porque teve
um mês no máximo, quase um mês e meio que a gente faltou muito (Mara).
Eu vim no carro da minha irmã agora, mas quando eu venho, eu venho dormir na
casa do meu cunhado aqui em Fortaleza. Ai só pra nós vim de ônibus eu que pago.
Ai pra nós ir pra casa do meu cunhado, ai tem que pagar um táxi, dá 200 reais tudo. Porque ninguém não pode com ele [peso]. [...] É difícil minha filha, o sofrimento
meu é grande pra gente vim pra cá, as vezes ele perde a consulta, as vezes a doutora
passa carão nele, porque eu não tenho condição de tá vindo aqui direto. Eu só vim
pra consulta dele, porque ela vai entrar de férias e minha irmã disse assim ‘tu coloca
só a gasolina’. Ai eu botei só a gasolina do carro pra gente vim. Se eu fosse vim,
filha de Deus, como era que eu ia arranjar 200 reais? (Rebeca).
Esses achados corroboram com outros estudos, onde também foi observado que a
ida da população até os serviços de saúde de referência era difícil, por muitos fazerem parte
das camadas mais pobres da sociedade e residirem distantes dessas instituições nos
municípios maiores, o que trazia obstáculos ao acesso a um tratamento adequado. Dentre as
dificuldades, alguns autores também destacaram a impossibilidade das famílias em custear o
transporte para o usuário e os acompanhantes, e a necessidade dos municípios terem que
disponibilizá-los (ELIAS; MONTEIRO; CHAVES, 2008; AGUILERA et al., 2013).
A ausência desse transporte gratuito contribuiu diretamente para que as crianças e
os adolescentes não tivessem uma continuidade do seu atendimento, prejudicando sua
assistência em saúde, tão primordial ante a diversidade de sequelas e complicações associadas
à mielomeningocele. A família acaba tendo mais um gasto, com gasolina, transporte
rodoviário, além de tantos outros já realizados no cuidado cotidiano a essas pessoas, com
fraldas, alimentação, algumas medicações, táxis, utilizando uma renda mínima alcançada
graças ao BPC, primordialmente.
Em alguns estados brasileiros já existem leis que garantem o acesso gratuito no
transporte intermunicipal para pessoas com deficiências, como Minais Gerais, Rio de Janeiro
112
e Rio Grande do Sul, sendo chamado de Passe-livre Intermunicipal, com detalhamentos
particulares nas normativas dos diferentes estados. No Ceará existe apenas uma proposta de
lei, que ainda não foi aprovada, que preconiza a concessão de gratuidade no transporte
coletivo intermunicipal do estado, as pessoas com deficiências que comprovem ser carentes
financeiramente. Sua aprovação viria a contribuir notadamente para os usuários com
mielomeningocele, por proporcionar condições para que estes, independente de seu município
de procedência, alcancem condições de acesso aos acompanhamentos em um hospital de
referência no seu atendimento.
A assistência desenvolvida por esta instituição é uma das mais importantes para a
criança e o adolescente, por ser desenvolvida por uma equipe que os acompanhada desde o
nascimento, o que gera uma continuidade das ações, sendo um serviço de referência no
Estado para o cuidado a essas pessoas até os 18 anos de idade incompletos. Assim sendo,
torna-se de extrema importância uma maior discussão acerca de estratégias e melhorias que
contribuam em todas as questões evidenciadas acima, de maneira a favorecer um acesso
seguro, gratuito e de qualidade ao atendimento em saúde.
Em relação à estrutura do HP, com destaque para o Ambulatório de
Especialidades, local onde a pesquisa foi desenvolvida, e o seu entorno, percebeu-se tanto por
meio da observação sistemática, como através das falas dos participantes, que esse setor da
instituição, por fazer parte de uma recente ampliação e reforma, possui rampas desde a sua
entrada com corrimões, apesar de estarem ausentes nas demais paredes e corredores,
sinalizações por meio de placas orientando a chegada aos diferentes espaços e banheiros com
estrutura interna adaptada para pessoas que utilizam cadeira de rodas.
É aqui tem as rampas ali para subir pra cá (Léa).
Tem um banheirinho aqui fora que tem [adaptação]. Lá na entrada tem a rampa pra subir, têm duas rampas, uma no meio e outra no começo, e no banheiro tem os
bichinhos pra segurar [corrimão] (Mara).
Não é tão estretinha a porta não [referente ao sanitário]. [...] tem [rampa], por onde
eu ando eu vejo, não sei se todos os setores são assim (Rafaela).
Na sala de espera e recepção do ambulatório é possível observar a presença de
piso antiderrapante, amplo espaço, existência de um fraldário com duas pias e um espaço para
higiene e troca, um banheiro com chuveiro e sanitário sem adaptação, um sanitário masculino
e outro feminino adaptados para usuários de cadeira de rodas, com a presença de corrimões.
Destaca-se ainda, haverem sempre funcionários com a função de orientação e
esclarecimentos, identificados com a roupa “Posso Ajudar?”, contribuindo para um melhor
113
acolhimento aos usuários e organização do atendimento, conforme foi possível ver através das
observações sistemáticas.
Entretanto, a demanda do serviço é sempre intensa, principalmente no turno da
manhã, havendo consideráveis lotações nesse espaço, que mesmo sendo grande, acaba
tornando-se inadequado para a deambulação, conforme destacou uma mãe:
Só não tem muito espaço por causa das pessoas, é muita gente (Sandra).
Em relação aos sanitários, houve controvérsias no que diz respeito à entrada a
todos estes, no caso dos usuários de cadeira de rodas, pois apesar de serem adaptados,
possuem portas que dificultam o acesso, de acordo com uma entrevistada, fala que diferiu de
outros participantes, que afirmaram não haver essa dificuldade.
É grande o banheiro. Agora o banheiro que eu fui ali com ele, não deu para entrar
porque era estreia a porta, ai levantei ele e fui com ele andando [...] ele consegue
andar se segurando nas paredes, só que eu tive que segurar porque o chão tava
molhado, pra ele não cair (Rebeca).
Essa divergência pode estar relacionada ao tamanho da cadeira de rodas utilizada
e idade da criança/adolescente, pois o filho da participante acima possuía grande estatura e
aparente obesidade, o que pode ter dificultado o acesso aos sanitários. Por outro lado, o
referido banheiro pode estar localizado em setores não reformados pela instituição, e que
ainda possuem sanitários sem adaptação.
Entretanto, o fato é que o acesso deve existir para todas as pessoas, sem
discriminação alguma, com condições para que aqueles que utilizam cadeiras de rodas ou
possuem mobilidade física reduzida possuam condições de deslocarem-se adequadamente nos
serviços de saúde e nos seus sanitários, de maneira a satisfazer suas necessidades humanas
básicas.
Destaca-se ainda que, devido à precisão da realização periódica da SVA entre
algumas das crianças e dos adolescentes com mielomeningocele, ser importante a existência
de um ambiente limpo e adequado para o seu desenvolvimento nesse serviço, principalmente
devido ao extenso período de permanência no ambulatório, desde a chegada para a consulta
até o retorno a suas residências, sobretudo no interior do estado.
Nessa perspectiva enfatiza-se a expressão de uma das mães:
Tem o espaço, só que eu não me garanto, porque tenho medo de infecção, de não tá
bem cuidado. [...] eu não acho muito adequado, porque tem umas pessoas que são
limpas, têm outras que não. Às vezes a pessoa vai no banheiro, tem até urina e mais
alguma coisa no chão. O pessoal parece que não zela pelo que tem. [...] Hoje mesmo
eu fiz aqui [consultório], a menina colocou um paninho limpinho, num reservadinho
desses que não tava tendo atendimento. E as vezes lá na sala do curativo (Safira).
114
Apesar de ser possível a realização do procedimento nos sanitários comuns, a
angústia da mãe é pelo fato de, devido as grandes demandas no serviço, estes encontrarem-se
mal higienizados, o que torna a SVA insegura para todos os usuários do ambulatório que
dependem dessa técnica para realizarem o esvaziamento vesical, o que inclui também pessoas
com outras patologias além da mielomeningocele.
Essa realidade também foi observada em um estudo desenvolvido em 2006, no
referido hospital, por Cipriano e Queiroz (2008), onde estes encontraram que muitas das
famílias sentiam-se constrangidas por não terem condições de promover aos seus filhos um
cuidado adequado no serviço, em virtude do usuário ser submetido a lugares inadequados a
SVA, situação esta considerada desumada pelos autores.
Outra questão evidenciada nas falas, diz respeito à necessidade de uma oferta mais
ativa do HP de cadeiras de rodas, e que estas sejam adequadas as diferentes demandas dos
usuários, em virtude do serviço atender a grande diversidade de pessoas com doenças
crônicas. Ademais, torna-se inviável, na maioria das vezes, que as famílias levem até a
instituição a própria cadeira da criança e do adolescente, por todas as dificuldades de acesso
discutidas anteriormente.
No colo [...]. Aqui tem cadeira de rodas, só que a cadeira de rodas que tem não serve
pra ela, porque tem que ser uma cadeira de rodas adaptada, eu acho que teria que ter
umas cadeiras que nem as que tem no HR [...] ela que não sabe sentar, segurar o
pescoço (Rafaela).
Aqui não, nunca procurei, eu levo no braço. Agora no HR tem, na hora que a gente
chega já tem (Safira).
Hoje eu não trouxe porque eu disse “não quando a gente chegar lá tem cadeira de rodas”. Certo que teve mesmo, eu falei com um rapaz ali, aqueles que fica na
portaria, eu falei com ele, ai o rapaz disse “espere ai senhora, vem já a cadeira de
rodas”. O rapaz mesmo foi pegar lá no carro, trouxe ele e tudo, toda vida eu consigo.
É mais difícil pra gente trazer [a cadeira dele], é mais peso (Rebeca).
Observa-se que houve divergência entre as falas quanto à disponibilidade das
cadeiras de rodas. Entretanto, pode-se notar que as famílias precisam procurar no serviço o
equipamento, que não é ofertado logo na entrada, juntamente durante o seu processo de
acolhimento na recepção. Assim, algumas famílias acabam sem nem sequer saber da
possibilidade de consegui-las, por falta de orientação e posicionamento mais ativo do serviço
quanto a isso.
De acordo com Moimaz et al. (2010) a política de acolhimento aos usuários dos
serviços de saúde deve ser implementada de acordo com as recomendações do HumanizaSUS,
ou seja, incluindo todos os trabalhadores, desde a pessoa que fica na entrada, guardas e vigias,
até os profissionais de saúde nos consultórios. Assim, logo ao adentrar na instituição, a
115
família já seria abordada quanto as suas dúvidas, buscas e acerca da necessidade de cadeira de
rodas para a criança e o adolescente, acolhendo-os adequadamente.
De forma geral, a estrutura desse serviço tem fornecido condições de acesso para
as crianças e os adolescentes com mielomenigocele, principalmente a partir das reformas
recentemente desenvolvidas na instituição, e novas ampliações. Desse modo, os novos
espaços estão todos sendo construídos preconizando a normas técnicas necessárias, no intuito
de favorecer a inclusão das pessoas com deficiência e facilitar o seu acesso.
4.3.6 Entraves e desafios na Rede de Atenção à Saúde aos usuários menos de 18 anos
com mielomeningocele
Para que essa rede funcione com efetividade, deve haver uma integração entre
todos os serviços discutidos anteriormente, no caso das crianças e dos adolescentes com
mielomeningocele, por terem sido os setores compartilhados pelas famílias, como intrínsecos
no cuidado a essas pessoas em seu cotidiano.
Nesse sentido, destaca-se que a integralidade da assistência em saúde se dá, entre
outros aspectos, fundamentalmente por meio do referenciamento dos usuários dentro da rede
regional e interestadual de atenção em saúde (BRASIL, 2011a).
Entretanto, observaram-se falhas no encaminhamento/referenciamento dos
usuários menores de 18 anos com mielomeningocele entre os serviços que os acompanham,
não havendo um compartilhamento de saberes acerca destes e complementação dos cuidados
prestados, de maneira a fornecer uma assistência de fato integral e contínua.
Dentro dos próprios serviços de referência foi possível perceber-se uma
incompletude no que diz respeito ao atendimento dessas pessoas, na medida em que, apesar
de haverem equipes multiprofissionais, estas não compartilhavam os cuidados, ou discutiam
suas disciplinas entre si, nem referenciavam para outros renomados programas dentro dessas
instituições, que poderiam fornecer um cuidado mais completo e integral a esses usuários, que
muitas vezes recebem um atendimento restrito a poucas, ou apenas uma especialidade médica,
com enfoque em órgãos ou sequelas específicas, o que foge consideravelmente do atual
modelo de atenção à saúde, baseado em uma visão completa dos sujeitos.
Uma das mães, que há dez anos acompanha seu filho nos serviços de saúde, ao ser
questionada se alguma vez ela teria sido informada acerca da existência de alguma técnica ou
procedimento que permitiria que seu filho realize o esvaziamento intestinal em casa,
116
tornando-o mais independente do uso de fraldas, ou acerca da presença do Netiif do HP, esta
revelou total desconhecimento, como mostra sua fala:
Não, não. [...] A doutora só sabe mesmo é da urina dele, como ela passou um exame
pra ele fazer. Ela passou até um remédio pra ele, que ele toma (Rebeca).
Assim, diferente muitas vezes das reais necessidades dos usuários, as consultas
com os profissionais de saúde tem sido pontuais, marcadas pelo direcionamento aos sintomas
clínicos agudos apresentados pelas crianças e os adolescentes, com uma terapêutica baseada
em grande parte dos casos na queixa-conduta e prescrição medicamentosa (NOBREGA et al.,
2013).
Ademais, por meio dos relatos, encontrou-se também que tem ocorrido
divergência entre as ações de diferentes instituições de saúde que acompanham esses usuários,
com orientações e condutas que, ao invés de completarem-se, comunicando-se entre si, são
contrárias, muitas vezes confundindo os familiares, como no caso da real necessidade de
utilização da SVA nas crianças e nos adolescentes.
Lá no HR indicaram a sonda, aqui a doutora B disse que não tinha necessidade,
porque ela faz o xixi na fralda. Ela vai pedir uma ultrassonografia pra ver se
realmente não precisa, eu estou aguardando fazer a ultrassom (Rafaela).
[...] uma semana foi pra aprender a colocar sonda e foi lá no HR, porque aqui, o
médico uma vez eu perguntei, ele disse que ela não precisava usar sonda, mas
quando chegou lá e ela fez os exames que eu nunca tinha visto, ai constou que
precisava passar sonda (Lidia).
Nessa perspectiva, corroborando esses achados, Astolpho, Okido e Lima (2014),
ao estudarem a rede de atenção a crianças com necessidades especiais, também encontraram
falhas na integração e articulação entre os serviços de saúde e outros de caráter especializado.
Havendo muitas vezes desconhecimento entre estes acerca dos atendimentos prestados e até
mesmo de sua existência, o que tornava os cuidados desenvolvidos por cada instituição
atividades isoladas.
Assim, os serviços acabam desenvolvendo atividades semelhantes, paralelas, com
as mesmas especialidades clínicas, o que não complementa ou fornece suporte de um para
com outro, havendo um confronto que pode ser prejudicial para o cuidado a essas crianças e
esses adolescentes, podendo comprometer a confiabilidade e segurança nos profissionais de
saúde, por parte dos familiares, por não saber em qual serviço confiar. As seguintes falas dos
participantes revelam esses aspectos:
117
Realmente eu vim descobrir o que ela tinha, que ela não tinha possibilidade de andar
quando eu fui pro HR, porque ela tava fazendo cirurgia, no joelho, fez no pé, e não
voltou ao normal. Foi no tempo que eu fui pro HR e médico falou que não
adiantava, que eu só fazia se eu quisesse, mas que possibilidade dela andar não
tinha. Porque lá fizeram um check up geral dela. Porque aqui [HP] eles ainda davam
esperança dela andar, mas não teve como. [...] porque o médico passou um aparelho
aqui, ai eu falei “doutor esse aparelho não serve pra ela’, porque a gente botava as
moletinhas e ela caia pra frente, não segura, porque o problema dela é da cintura pra
baixo. Ai ele disse ‘não, dá sim, tem que fazer bastante exercício”, ai eu disse “não
funciona”, ela tava com uma dor na coluna, não tem condições (Samara).
[...] até porque ele ainda não tinha tido a consulta com Dr. C [do HP], ai depois que
ele já tava no HR, tava marcada já a consulta com Dr. C, é porque custa, marca com
um mês, com três meses é que você vem conseguir consulta aqui. Ai quando ele
veio para o doutor, já tava orientada no HR [SVA] (Sandra).
Essas questões podem estar relacionadas a uma fragilidade na comunicação entre
esses diferentes serviços, por ausências de registros e de um interrelacionamento entre os
profissionais de saúde e gestores. Essa falha comunicacional e de articulação pode influenciar
na qualidade da assistência prestada, tornando o processo de referenciamento entre as
instituições difícil, comprometendo o seguimento e a continuidade dos cuidados
(ASTOLPHO; OKIDO; LIMA, 2014).
Segundo Sousa et al. (2013) existem lacunas dentro do sistema de saúde público,
no que diz respeito as questões de referência e contra-referência, pois estas tem revelado-se
ineficientes, conforme eles observaram na sua realidade estudada, havendo pouca interação na
rede e entraves na comunicação entre a ESF e os demais níveis de atenção em saúde.
Esses entraves existentes dentro da RAS, na assistência a crianças e adolescentes
com mielomeningocele, carecem de maiores discussões, com o envolvimento da comunidade,
dos familiares, profissionais de saúde e gestores, de forma a haver um melhor estruturamento
e organização da atenção em saúde, que também deve estar interligada com outros setores da
sociedade. Assim, deve atuar com base no envolvimento de todos e tornando-se de fato um
meio de interações fortes que busca contribuir para que essas pessoas alcancem melhores
qualidades de vida, dentro de uma rede que fornece esse suporte de forma concreta e factível.
118
4.4 OS DIREITOS EM SAÚDE DAS CRIANÇAS E DOS ADOLESCENTES
COM MIELOMENINGOCELE: ENTRAVES E AVANÇOS
Figura 4 - Adolescente com mielomeningocele Zilá. Fortaleza, CE. 2014.
119
4.4.1 Conhecimentos e orientações acerca dos direitos
Os direitos existentes na legislação brasileira que beneficiam as crianças e os
adolescentes com mielomeningocele foram identificados no referencial teórico dessa
pesquisa. Por outro lado, a partir das falas dos familiares, foi possível compreender como tem
ocorrido a orientação, aquisição, os entraves e desafios para que estes se apropriem
efetivamente dos benefícios preconizados.
Quando a população tem conhecimento acerca das políticas públicas, torna-se
mais consciente e autônoma para julgar situações, desempenhar condutas e exercer seus
direitos, de forma a haver a possibilidade de desempenhar mais ativamente o seu papel dentro
da sociedade, como cidadãos (SANTOS et al., 2011). De forma geral, observou-se que as
famílias possuem pouca ou nenhuma informação acerca dos direitos que seus filhos possuem,
sendo o BPC um dos mais citados, conforme mostram as falas:
Sei não (Naomi).
É aquela coisa, a gente que mora no interior é sempre mais atrasado, não conheço
muito bem não [direitos] (Ezequias).
Só o pouco que eu sei é que ele tem direito a um beneficio (Priscila).
Sei não [...] eu sei que ela tem o benefício, e eu sei também que o dinheiro dela é pra
cuidar dela (Marta).
O benefício financeiro é um dos direitos mais importantes para essas famílias, por
a maioria não possuir subsídios para sustentar os seus membros, devido ao afastamento do
emprego formal, principalmente frente às necessidades da criança e do adolescente com
mielomeningocele, que demandam grandes despesas para os seus cuidados, tratamento e
acompanhamento aos serviços de saúde.
Esses achados divergem parcialmente com o encontrado em outra pesquisa
realizada no Ceará, com pessoas com deficiências, onde se observou que estes apresentavam
certo conhecimento acerca dos seus direitos e que avaliavam a atenção a que lhes era
fornecida na prática como precária (SOUSA; FRAGA, 2008). Ressalta-se, entretanto, que o
estudo foi desenvolvido com os próprios adultos com deficiências, que possuíam período
maior de experiência na luta pelos seus direitos.
O direito ao recebimento de materiais para os cuidados também foi comentado
pelos familiares, que destacaram acreditar que as crianças e os adolescentes deveriam ser
beneficiados de fraldas pelo governo, por ser um material bastante utilizado, que requer
grandes investimentos mensais para a sua aquisição.
120
Já me falaram que ela tem direito de receber todos esses materiais que ela usa, fralda
[...] (Penha).
Eu acho que é de receber fralda [...] eu ainda não falei, aqui será que se eu falar eles
dão? (Rebeca).
Eu acho assim, essas fraldas dela, porque eu pago mais de 100 reais nas fraldas dela,
sai muito caro (Samara).
Entretanto, a legislação brasileira não garante a oferta desse material específico
para a população com necessidade especial de cuidados em saúde. Apesar disso, podem ser
estabelecidas portarias, leis ou decretos a nível municipal ou estadual que garantam esse tipo
de fornecimento. Destaca-se ainda que no Ceará, não foram encontradas esse tipo de
normativa. O que existem, na verdade, são serviços comerciais que oferecem descontos na
compra e entidades filantrópicas que podem oferecer esse material a população necessitada.
Outros direitos em saúde enfatizados, que corespondem as políticas públicas
existentes foram: o recebimento de órteses, medicamentos, materiais para a realização da
SVA, de acesso e de um atendimento de qualidade nos serviços de saúde, com prioridade;
também foram salientados o direito a educação, ao lazer e a um transporte para a escola e aos
locais de atendimento em saúde.
O único direito que eu creio que ela tem, acho assim, tipo essa órtese dela, eu acho
que o prefeito, o vereador, alguém tinha obrigação de dar pelo menos a metade
(Rafaela).
Um atendimento melhor nos cantos, porque é meio complicado [...] (Samara).
A saúde, em primeiro lugar a saúde, a educação, transporte [...] remédio, fralda,
material do cate [SVA] (Sandra).
Direito de acessibilidade, o benefício, direito de todo suporte material, direito de
transporte, acho que só [...] direito a uma educação adequada (Jane).
Em relação a esse maior grau de conhecimento dessas mães, não pareceu haver
grande relação entre o seu grau de escolaridade e a idade da criança ou do adolescente. Pois
ao longo dos anos, os familiares poderiam ir adquirindo maiores informações acerca desses
direitos. Entretanto, esses aspectos não foram uniformes entre os entrevistados, havendo
alguns com filhos pequenos e baixo grau escolar, que possuíam mais conhecimento do que
outros cuidadores de adolescentes, e vice-versa.
O grau de informação pareceu estar mais relacionado à forma, quantidade e teor
das orientações fornecidas. Do mesmo modo que a maioria desconhecia os direitos das
crianças e dos adolescentes cronicamente adoecidos, poucas foram as orientações e
treinamentos estabelecidos por profissionais da saúde, havendo um enfoque maior em relação
121
ao BPC, onde os familiares foram orientados acerca de que ações tomarem para terem acesso
a este benefício de direito dos filhos com deficiências.
A Dra. J, antes deu sair daqui, ela me deu um atestado, me explicou tudinho como
era, que eu procurasse o benefício, que ela ganhava (Marta).
Foi o medico que me deu o laudo e disse que eu tinha direito, ai eu procurei o INSS
(Priscila).
Até agora só soube do benefício e foi à doutora que me falou (Mara).
Observou-se que entre os profissionais de saúde, o médico foi o principal
responsável pelas orientações acerca dos direitos, talvez em virtude de ser ele quem deve
elaborar o atestado, com o laudo do problema de saúde do usuário, para que as famílias
consigam adquirir o benefício no INSS, tendo tido assim, maior destaque em relação ao
fornecimento de informações sobre o BPC.
Para que os usuários tenham de fato acesso aos seus direitos, sendo asseguradas as
políticas públicas em seu favor, torna-se imprescindível uma maior divulgação acerca de sua
existência, de modo a fazê-los serem conhecidos pelos profissionais de saúde e pela
população (SANTOS et al., 2011).
O serviço social, apesar de ser um setor que está relacionado a esse tipo de
orientação, foi citado por uma pequena minoria dos entrevistados. Nesse sentido, destaca-se
que de acordo com a lei de regulamentação profissional, dentre as competências dos
assistentes sociais está orientar grupos populacionais e indivíduos no intuito de identificar
recursos e de utilizá-los na defesa e no atendimento de seus direitos (CFSS, 2011). Todavia,
por meio das experiências dos participantes dessa pesquisa, não se percebeu grande atuação
desses profissionais em relação à orientação sobre os direitos das crianças e dos adolescentes
com mielomeningocele, na maioria das instituições de saúde.
Porém, um serviço apresentou considerável destaque como de grande importância
em relação às orientações para as famílias, indo além de apenas informá-las sobre os
benefícios, por fornecerem-lhes outros dados acerca dos vários direitos que seus filhos
possuem, sendo que nesse local a atuação do serviço social obteve destaque, diferenciando-se
dos demais, como nota-se nas falas:
Foi no HR, transporte, fralda, medicamento, porque eles não davam nada [no
município], [a assistente social do HR] que fez eu ir procurar. [...] me deram até um
papelzinho, mas eu não lembro tudo (Safira).
O HR me deu um papel com tudo o que ela precisava e as leis que tem na
constituição. Aí eu levei para a prefeitura, isso está com uns quatro anos. Até lá eu
não recebia nada, eu comprava. Ela passou muito tempo usando antibiótico e remédio para os rins. Muito tempo eu comprava, ai o HR me orientou a ir na
secretaria. Ele me deu uma lista com todos os direitos, foi a minha salvação (Jane).
122
Desse modo, percebe-se que o HR teve um papel essencial da vida dessas
famílias, que mesmo já tendo seus filhos acompanhados em serviços de referência pediátrica
desde o nascimento, não haviam sido orientados sobre todos direitos que estes possuíam, o
que gerou grandes desafios no cotidiano dessas pessoas, que se viam obrigadas a despender
altos valores com a compra de materiais para o tratamento com a SVA, de medicações
essenciais ante as sequelas, entre outros insumos necessários para o cuidado diário,
desconhecendo os seus reais direitos.
Uma das mães revelou o longo período de aproximadamente quatro anos, até que
esta tivesse acesso às informações sobre as políticas públicas a que sua filha poderia ser
beneficiada, bem como o que ela poderia fazer para alcançar os seus direitos legalmente.
Enfatiza-se, portanto, que apesar do BPC ser de grande importância e auxílio para essas
famílias, outras orientações também são fundamentais para estas que lidam com diferentes
sequelas da mielomeningocele, com necessidades peculiares de cuidados e acompanhamento
em saúde de seus filhos.
Assim sendo, o benefício sozinho é incapaz de suprir todas as demandas dessas
crianças e desses adolescentes, revelando a magnitude da importância desses familiares serem
capacitados sobre a legislação, de forma clara e em linguagem simples, para que estes
compreendam que direitos poderão ser beneficiados, de forma a proporcionar a essas pessoas
possibilidade de viverem com melhor qualidade.
O HR oferece as famílias de crianças e adolescentes que recebem atendimento na
instituição um documento que apresenta todos os direitos que as pessoas com deficiências e
doenças crônicas possuem, destacando a legislação que garante cada um deles. Para tanto o
serviço social, ou outros profissionais, realiza uma completa explanação às famílias,
esclarecendo suas dúvidas, bem com instruindo-os sobre que ações realizar e quais serviços
procurar para terem acesso a eles.
Outras fontes de informações para essas famílias foram os próprios parentes, com
maior grau de escolaridade e orientação, outros responsáveis por pessoas com necessidades
especiais, a mídia televisiva e instituições de apoio em saúde, havendo uma situação em que a
mãe afirmou já saber sobre alguns direitos, tendo ido, por decisão própria, buscar o laudo com
a médica para conseguir o BPC, conforme mostram as falas:
Eu soube, acho que foi assistindo televisão, ai eu perguntei se ele [médico] podia dar
[atestado], ai ele disse que dava (Safira).
Às vezes quem me orienta mais é minha irmã. Ela fica dizendo para eu ir atrás [...]
(Rebeca).
123
Não foi ninguém, eu que sabia, peguei o laudo com a Dra. S, eu pedi a ela e ela me
deu. Hoje em dia todo mundo sabe dos seus direitos (Sandra).
Lá tem uma associação, é muito boa, a metade das coisas que eu aprendi até hoje foi
através da associação medular e cerebral que tem no Município H, ai a gente entrou
nessa associação, tem o presidente que é uma pessoa muito legal, ele tem ensinado
muito coisa, através dele foi que eu entrei nesses direitos, nesses poucos direitos que
eu to sabendo (Ezequias).
Nesse contexto, salienta-se que outra pesquisa encontrou dados semelhantes, ao
revelar que 33,75% dos responsáveis por pessoas em adoecimento crônico receberam
informações relacionadas a alguns benefícios na sala de espera de serviços de saúde, por meio
de conversa com outros familiares, e 12,5% através da mídia (ELIAS; MONTEIRO;
CHAVES, 2008).
No que diz respeito a essas redes informais de orientação, um estudo realizado
com jovens brasileiros que possuem espinha-bífida revelou que estes se respaldavam nessas
redes, através de amigos, para terem conhecimento acerca dos seus direitos, o que acarretou
em sérios problemas, em virtude da aquisição de informações errôneas e muitas vezes
desatualizadas. Por outro lado, os jovens americanos contavam com escolas, instituições de
saúde e associações para a aquisição dessas informações, que tornavam-se mais acessíveis e
confiáveis, facilitando a conscientização dos seus direitos dentro da sociedade (SOARES;
MOREIRA; MONTEIRO, 2008).
Em relação a essas informações adquiridas sem a orientação de profissionais,
observou-se que a maioria também se enfocava no benefício financeiro, que tem sido de
conhecimento de grande parte da população, e assim, o acesso a este tem sido facilitado,
sendo uma das orientações primárias a que estas famílias passam a conhecer e a buscar
apropriar-se, em virtude de constituir-se em um auxílio essencial para essas famílias que
convivem, sua maioria, com baixo nível socioeconômico.
Nessa perspectiva, enfatiza-se, conforme discutido no referencial teórico, que
existem outras leis, decretos e portarias que abordam direitos de pessoas com deficiências e
doenças crônicas que podem estar beneficiando as crianças e os adolescentes com
mielomeningocele, e contribuindo para sua inclusão na sociedade, aumentando o seu grau de
autonomia e favorecendo a realização de suas atividades de vida diária com condições
mínimas de sobrevivência.
Outra fala também revelou o descaso que tem ocorrido por parte dos serviços e
profissionais de saúde, em relação ao fornecimento dessas informações sobre os direitos de
forma adequada e clara, porventura devido ao próprio desconhecimento e ausência de
124
capacitação dos trabalhadores da saúde, sobre a existência dessas políticas que contribuem
para esses usuários.
Quando eu sai daqui, a nefrologista só me deu um papel com o número da sonda
para eu comprar (Jane).
Apesar de haverem normativas que garantam o recebimento desse tipo de material
terapêutico, com base em alguns pré-requisitos, a especialista orientou a mãe a comprá-lo.
Desse modo, por muitos anos essa família enfrentou grandes obstáculos financeiros para
conseguir fornecer um tratamento e cuidados adequados à criança, por desconhecimento dos
direitos já preconizados na legislação brasileira há décadas.
Nessa perspectiva, de acordo com Soares, Moreira e Monteiro (2008), no Brasil
existem leis que garantem direitos mínimos as pessoas com deficiências, entretanto estas são
pouco conhecidas por grande parte da população, o que afeta sua eficácia e aplicabilidade.
Acredita-se que os profissionais de saúde que acompanham esses usuários com
doenças crônicas desde o seu nascimento devem ser a principal fonte de orientação para as
famílias, esclarecendo-lhes sobre questões do cuidado diário, tratamento, adoecimento,
processo de reabilitação e, também, acerca dos benefícios que estes têm direito e que visam
contribuir para uma melhor qualidade de vida dessas crianças, dos adolescentes e de suas
famílias, conscientizando-os como cidadãos e ampliando o seu grau de compreensão acerca
das políticas públicas de saúde.
Entretanto, o que tem sido visto dentro das instituições de saúde, são profissionais
pouco comprometidos com o SUS, seus princípios e com os usuários, tornando-se urgente a
necessidade de uma reformulação acerca da sua formação em saúde, de forma a buscar-se
mudar os modelos assistenciais vigentes, a partir de cursos que visem formar pessoas
tecnicamente competentes para cuidar de forma humanizada, ética, responsável e com
qualidade (ERDMANN et al., 2008).
Pesquisa semelhante encontrou que a maioria (87,5%) dos responsáveis por
crianças e adolescentes com espinha-bífida haviam recebido orientações relacionadas a alguns
benefícios legais dentro de serviços de saúde, entretanto apenas pouco mais da metade
receberam-nas através de profissionais da saúde, revelando um índice insatisfatório, já que o
estudo foi desenvolvido em um centro de referência, onde teoricamente a equipe de saúde
deveria estar mais capacitada para informar os usuários e familiares. Assim, torna-se
necessário uma maior ênfase nas ações sociais entre esses profissionais, para que estes sejam
fomentados a divulgar o conhecimento dentro do seu contexto de atendimento (ELIAS;
MONTEIRO; CHAVES, 2008).
125
Acredita-se que para tanto haja a necessidade de capacitação desses profissionais
de saúde, a partir dos cursos de formação profissional, por meio de disciplinas que debatam as
o SUS e suas políticas públicas, e, também, através de uma educação permanente efetivada
em todos os serviços da RAS.
4.4.2 Direitos em saúde alcançados: facilidades e obstáculos
Dentre os direitos em saúde existentes na legislação brasileira, os familiares
relataram aqueles aos quais vivenciaram no seu cotidiano, expressando suas dificuldades e a
experiência em sua busca, aspectos estes discutidos nessa subcategoria. Duas mães falaram
acerca da satisfação com a prioridade nos serviços de saúde as quais seus filhos estavam tendo
acesso, o que tornava o atendimento mais rápido:
É muito bom lá [UBS]. Assim que sai a ficha dele, eles dizem logo: “esse daqui é deficiente” ai deixam logo ele entrar, ele entra logo. Eles já conhecem ele (Rebeca).
Aonde ele chega ele tem prioridade (Sandra).
Por outro lado, outra mãe comentou acerca do seu desejo em que seu filho tivesse
um melhor atendimento nos serviços, com direito a prioridade na assistência em saúde:
É meio complicado, lá ninguém vê a prioridade não, e agora tá ficando mais difícil,
chega lá pra fazer exame tem que pegar uma fila enorme. Não tem prioridade lá,
nem idoso, nem criança. Mas uma vez eu falei ali no ambulotário com a atendente.
Ai ela disse “não minha filha, não tem prioridade não, porque todo mundo é igual, é
criança”, e realmente a gente tem que entender que tudo é criança (Samara).
Observa-se que essa mãe possui um conhecimento impreciso acerca do direito ao
atendimento prioritário, por acreditar ser para todas as crianças, quando de fato, de acordo
com o decreto 5.296 de 2004 o atendimento prioritário envolve tratamento diferenciado e
imediato às pessoas com deficiências ou mobilidade reduzida, idosos, lactentes, gestantes e
pessoas com criança de colo, sendo que nos serviços de saúde públicos ou privados de
emergência, irá depender de uma avaliação médica que priorize antes os casos mais graves e
com necessidades de atendimento mais urgentes.
Apesar dos familiares desconhecerem, esse tratamento diferenciado também
envolve, entre outras questões, a presença de assentos preferenciais sinalizados, mobiliário e
atendimento na recepção adaptados a usuários de cadeira de rodas, área para embarque e
desembarque de pessoas com deficiência, sinalizações para a orientação ambiental dessas
pessoas e divulgação visível sobre o atendimento prioritário (BRASIL, 2004a). Entretanto,
nenhum desses aspectos foi comentado pelos participantes da pesquisa, que revelaram ter
conhecimentos superficiais sobre os seus direitos.
126
Desse modo, a atendente desse serviço de saúde de referência pediátrica agiu de
forma contrária ao preconizado por lei, além de fornecer uma informação inadequada para a
mãe, ao afirmar que por ser um atendimento infantil, não seria válido o direito da criança e do
adolescente com deficiência de terem prioridade, questões essas inexistentes nas políticas de
saúde.
Outro importante aspecto exposto pelos familiares foi em relação à busca pelo
recebimento de materiais para o cuidado diário das crianças e dos adolescentes, essenciais no
seu tratamento, tais como sondas, gazes, soro fisiológico, anestésicos tópicos, luvas, entre
outros utilizados para a SVA domiciliar.
Assim, no começo eu não recebia [material SVA], eu comprava, porque a sonda não tinha no meu interior, mas agora já tá tendo e eu recebo [...] eu recebo na secretaria
de saúde (Penha).
Teve um tempo ai que eu não tava recebendo. O material dele do cate [SVA], sonda,
gaze, luva, coletor, porque tava mudando de prefeito, era outra administração,
passou até o meio do ano [seis meses sem receber] (Sandra).
Recebe, a secretaria de saúde fornece, só que tem tempo que não recebe, passa dois,
três meses sem receber e quando ele recebe ainda falta algumas coisas, sempre falta
alguma coisa (Ezequias).
Existem dificuldades para a correta provisão desses materiais pelos municípios,
através das secretarias ou instituições de saúde, em uma frequência adequada e na quantidade
necessária para a realização dos procedimentos. Ademais, até conseguirem apropriar-se
desses direitos, muitas famílias precisaram custear sua compra por alguns anos, devido a
questões políticas, como mudanças de governo, ou por precariedade da assistência em saúde
no interior do estado, com escassez de recursos materiais.
Esses entraves no recebimento apropriado dos materiais pode repercutir no
tratamento dessas crianças e desses adolescentes, gerando prejuízos, com consequente piora
no seu quadro clínico e necessidade de atendimento em saúde, levando até uma possível
internação hospitalar, o que gera riscos para essas pessoas, sofrimento para os familiares e
altos custos para o governo, o que poderia ser prevenido através da oferta eficaz desses
insumos.
Destaca-se ainda que os princípios, as diretrizes e a legislação do SUS devem ser
preconizados independente de questões eleitorais, políticas e mudanças governamentais.
Assim, a qualidade da assistência em saúde à população, tanto nos grandes como nos
pequenos centros urbanos e localidades rurais, deve ser fornecida de forma contínua,
buscando-se sempre melhorias e o funcionamento da RAS, tendo em vista a promoção da
saúde, através de um cuidado integral, humanizado e resolutivo.
127
De fato, muitas tem sido as dificuldades existentes para a concretização dos
princípios preconizados nas políticas de saúde enfocadas nas pessoas com deficiências,
questão esta crítica, de acordo com alguns autores, principalmente quando se observa que a
legislação dirigida a essa população existe desde 1989, tendo sido detectadas mudanças ainda
insipientes no panorama nacional (INTERDONATO; GUEDOL, 2012).
Nessa perspectiva, salienta-se ainda que uma das crianças dessa pesquisa, até o
momento de realização das entrevistas, ainda não havia conseguido receber esses materiais no
município a qual reside, conforme se observa no desabafo inconformado da mãe:
Ela fez um tratamento no HR, ai vai fazer o cate [SVA], mas eu to tendo dificuldade
lá no interior porque tem que conseguir essas coisas pelo governo e já faz mais de
um mês que eu dei entrada nessas coisas e ainda não recebi, ai ta parado o
tratamento dela, já passaram isso pra não ter mais complicação com a saúde dela,
porque já ta um pouco complicado [...]. É meio cruel, muito cruel, tudo é difícil,
nada que a gente vai atrás a gente consegui, a gente anda, anda e não encontra de
nada, eu já cheguei até falar com eles lá, procurar o fórum, vou falar com o promotor
pra vê se eles agem. Porque dois meses, três meses, já é muito tempo pra pessoa ter
tratamento urgente (Lidia).
Conforme se percebe pela fala, muitos têm sido os obstáculos para que esta
família consiga apropriar-se do direito da criança de receber os materiais necessários ao seu
tratamento, tendo buscado em vários setores do seu município, com autoridades e secretarias,
porém, sem êxito, após aproximadamente três meses de longas buscas. Essa criança, portanto,
tem tido seu tratamento comprometido em virtude da ausência de material adequado para a
SVA, apesar de ser um procedimento de grande importância para a sua estabilidade clínica.
É importante destacar que na legislação brasileira, não existem normativas
específicas para a concessão do material para a SVA, o que existe de fato é pouco superficial
e está presente no Decreto n°3.298 de 1999, apresentado no referencial teórico, ao declarar
que na assistência integral as pessoas com deficiências e seu processo de reabilitação estão
incluídas a concessão de órteses, próteses, e matérias auxiliares ao seu cuidado, entre outros,
que visam proporcionar maior independência e inclusão.
Desse modo, devido à legislação ser pouco clara e específica, para conseguir o
recebimento dos materiais para SVA, muitas famílias buscam a justiça, através de fóruns e
defensorias públicas, na tentativa de conseguirem dar continuidade ao tratamento de seus
filhos, alcançando êxito na maioria das vezes, apesar de ser um procedimento vagaroso.
A judicialização da saúde é um processo que tem sido discutido por algumas
pesquisas atuais e está relacionado a uma ampla questão de busca e reivindicação por bens e
direitos nas cortes, no que diz respeito a materiais, atendimento em saúde, hospitalização,
medicamentos, entre outros, respaldados pelo direito à saúde constitucional (DINIZ;
128
MACHADO; PENALVA, 2014). Aspecto este que foi encontrado nesse estudo por meio dos
relatos dos familiares, que, após orientação, recorriam a todas as entidades governamentais e
jurídicas em busca do provimento de insumos, com base em prerrogativas existentes na
legislação que preconizam o direito a saúde e o recimento de matérias auxiliares aos cuidados,
entre outros.
Ressalta-se que os insumos disponibilizados atualmente pelo SUS podem ser
consultados através da “Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e
Materiais Especiais do SUS”, disponível no site do DATASUS (http://sigtap.datasus.gov.br/),
atualizado periodicamente, de acordo com a aprovação de novas portarias. Apesar da
considerável quantidade relatada nesse sistema, ainda está a quem das necessidades impostas
pelas sequelas da mielomeningocele, como dos materiais destacados para a SVA, sendo
ofertado, de acordo com essa tabela, apenas materiais de uso para sondas de demora.
Os participantes também revelaram que os gastos com a compra de fraldas
descartáveis é muito grande, devido a alterações no controle esfincteriano, o que torna
necessária a sua utilização contínua. Uma minoria das famílias já havia conquistado o direito
de recebê-las no seu município de origem, apesar de também ser um processo dificultoso para
a entrega adequada:
Fralda, eles dão pelo município (Safira).
Ela tem mielo e era pra ela receber fralda também, era pra serem 150 fraldas, tão me
mandando 14. Se viesse pelo menos a metade eu aceitaria, mas só 14 (Rafaela).
Fralda eu quem compro, a fralda é muito cara e eu não tenho condição. [...] O mais
caro não é nem o remédio, são as fraldas (Rebeca).
Salienta-se também que não existe na legislação normas que garantam a oferta
específica das fraldas para pessoas que comprovadamente necessitem utilizá-las e não
possuem condições financeiras para adquiri-las, conforme discutido na subcategoria anterior,
havendo, entretanto, a possibilidade de que os estados e municípios optem por iniciativas
próprias, por meio de legislações a nível local que preconizem essas questões, ou
simplesmente fornecer esses materiais através de organizações não governamentais ou
entidades filantrópicas.
Entretanto, destaca-se novamente, que as políticas de saúde discutidas
anteriormente deixam em aberto a possibilidade de alcançar-se o seu recebimento
juridicamente, já que são materiais essenciais ao cuidado dessas pessoas cronicamente
adoecidas e as famílias não apresentam condições socioeconômicas de adquiri-las em alguns
casos.
129
No que diz respeito ao recebimento de medicamentos, houveram divergências
entre os achados, por algumas famílias ainda não estarem recebendo-as, apesar de serem
essenciais no tratamento da criança e do adolescente com necessidades especiais de saúde,
principalmente no que diz respeito às alterações urinárias.
Recebo a medicação aqui no HP, e as outras eu recebo lá. Quando falta ai eu
compro. Essa medicação que eu pego no HP já faltou por duas vezes, é um salário a
medicação dela, ai eu tenho que comprar. Cada caixa é 227 reais (Penha).
Eu fui atrás, ai eles ficaram dando a fralda, o medicamento e as passagens. Às vezes
atrasa um pouco, ai eu compro em outra cidade (Safira).
O remédio eu quem compro, é um remédio para controlar a urina, é trinta reais o
vidro do remédio (Rebeca).
Nesse sentido, reafirma-se que dentro do processo de reabilitação também está
incluído o provimento de medicações que contribuam para a estabilidade funcional e clínica
das pessoas com deficiências, auxiliando-as a limitar as incapacidades, através do controle
dos fatores que as promovam (BRASIL, 1999).
Outras pesquisas corroboram esses achados, ao apresentarem que as famílias de
crianças com doenças crônicas recebiam os medicamentos nas UBS, porém alguns
precisavam ser comprados e em outras situações havia a necessidade de busca judicial para a
sua aquisição (MARCON et al., 2007; OKIDO et al., 2012).
Em relação à oferta de medicamentos pelo SUS, existem diversas portarias,
decretos e leis que abordam a temática, de forma a regular sua realização, com destaque para
a Portaria n°3.916 de 1998, que aprovou a Política Nacional de Medicamentos. Destaca-se
também o decreto n°7.508 de 2011, ao declarar que o acesso à assistência farmacêutica
universal e igualitária pressupõe que usuário seja assistido pelo SUS, a medicação ter sido
prescrita por profissional de saúde desse sistema, a mesma estar em conformidade com a
Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) e os Protocolos Clínicos e
Diretrizes Terapêuticas, ou de acordo com relações complementares a nível local, e a
dispensação ocorrer em unidades indicadas pelo SUS.
Logo, os profissionais de saúde prescritores precisam estar capacitados acerca
desses protocolos e diretrizes, bem como cientes a respeito das medicações atualmente
ofertadas pelo SUS, inclusive para pessoas com doenças crônicas, de forma a melhor receitá-
las e orientar as famílias quando ao direito de adquiri-las gratuitamente.
Algumas medicações têm sido adicionadas a lista de oferta, após a luta de
familiares, usuários e profissionais de saúde, em busca de conseguirem dar continuidade ao
tratamento de pessoas com necessidades especiais de saúde, com base na legislação do SUS
130
que preconiza que a saúde a população é dever do Estado Brasileiro. Esses medicamentos
também podem ser visualizados através da “Tabela de Procedimentos, Medicamentos,
Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS”.
Do mesmo modo, é possível encontrar os equipamentos de tecnologia assistida a
que o SUS disponibiliza, conforme requisitos pré-estabelecidos legalmente. Nesse sentido,
também houveram divergências quanto ao seu recebimento e formas de aquisição.
Muitas crianças e adolescentes conseguiram o recebimento de órteses e andadores
através do HR, apesar de outras, mesmo também sendo acompanhadas nessa instituição, não
haverem recebido. Desse modo a oferta é imprecisa por esse serviço, bem como para o tipo de
material a ser fornecido.
A órtese e o andador o HR que deu (Jane).
A [órtese] dos pés eu recebi lá no HR, a das mãos eu comprei (Rafaela).
A fisio do Bem-me-quer [indicou a órtese], no HR não dão, aqui não dão [HP], não
trabalham com isso, eu comprei. É um direito até mesmo porque é uma coisa pra
usar direto e daqui a uns seis meses, vou ter que mandar fazer de novo (Rafaela).
Outras formas de aquisição foram através de entidades filantrópicas, UBS,
Secretaria de Saúde do Estado, através de doações, políticos, entre outras maneiras:
Foi um vereador que me deu [a cadeira de rodas] (Rebeca.)
Essa cadeira foi que deram, foram as pessoas, porque eles viram a situação dela, ai
foram e arrumaram essa cadeira, arrumaram mais duas com essa daí (Naomi).
Tem [cadeira de rodas], foi pela Secretaria de Saúde do Estado. O HR fez o pedido
ai eu fui lá, ai com dois anos ela recebeu (Samara).
Entretanto, essas formas também variaram, não havendo locais específicos para a
distribuição, e cada família buscava onde era orientada a ir, ou onde acreditava ser um local
em que pudesse conseguir os equipamentos de auxílio à locomoção ou estabilização dos
membros de seus filhos.
Na pesquisa de Okido et al. (2012), foi encontrado que a mãe de uma criança
dependente de tecnologia assistida também recorria ao auxilio de conhecidos para conseguir
suprir as necessidades da família, como políticos com influencia dentro do seu município.
Algumas famílias não conseguiram de maneira nenhuma esses materiais, vendo-se
obrigadas a ter que desempenhar mais esse gasto, mesmo diante de tantos outros já realizados
no cotidiano de idas aos serviços de saúde e compra de outros insumos.
De acordo com a Cartilha de Atenção à Saúde da Pessoa com Deficiência no
Sistema Único de Saúde (2010), para receber órteses, próteses e meios auxiliares de
131
locomoção pelo SUS, deve-se procurar a secretaria municipal, estadual ou unidades de saúde,
em busca de informações sobre os serviços especializados que fornecem esses equipamentos.
Contudo, na prática, observou-se que a oferta desses materiais não tem ocorrido
de forma organizada pelo SUS, havendo muitas famílias que ainda desconhecem seus direitos,
não sendo beneficiadas desses equipamentos de suma importância para as crianças e os
adolescentes com deficiências e nem estarem sendo informadas acerca deles nos serviços em
que estes são acompanhados.
De fato, após o conhecimento sobre quaisquer das políticas públicas existentes,
através de diferentes fontes de informação, as famílias fazem tudo o que lhes é possível para
alcançá-los efetivamente, visando proporcionar uma melhor qualidade de vida para as
crianças e os adolescentes, frente a tantas adversidades provenientes do seu adoecimento
crônico.
É isso ai tem [benefício financeiro], porque a gente correu atrás, porque conheceu
que tinha direito. Transporte pra se locomover pra cidade a procura da saúde dele, a
gente conheceu que ele tem direito de ir atrás, os medicamentos, pra receber na
secretaria de saúde, a gente conheceu que ele tinha o direito, ai a gente correu atrás
(Ezequias).
Eu recebo a medicação e a sonda só. As fraldas eu até coloquei na justiça também, eu coloquei os medicamentos, a sonda e as fraldas, mas eles dizem que a fralda o
estado não dá, não sei se não tem verba. Eles dizem que não tem. [...] Recebo tudo,
recebo porque eu coloquei na justiça, porque eles não queriam dar de jeito nenhum
(Samara).
Eu fui atrás do direito, que eles não queriam dar (Safira).
Nota-se consideráveis dificuldades existentes no cotidiano de busca desses
materiais pelos familiares, obstáculos esses que variam nos diferentes municípios do estado, e
que impulsionam essas pessoas a buscarem nas autoridades e sistema judiciário formas de
consegui-los, com sucesso na maioria das situações, após longos processos e desgastes das
famílias.
Esses desafios existem por possíveis falhas das políticas, quando o insumo
desejado já é preconizado em uma política pública, entretanto não é possível sua aquisição ou
é, mas de maneira inadequada na esfera administrativa, ou devido a problemas de
incompreensão das políticas durante o seu processo de operacionalização. Assim sendo, a
judicialização ocorre como via de alternativa para a aquisição de um direito em saúde, ou
ainda como interferência inadequada do judiciário ante ao andamento da legislação (DINIZ;
MACHADO; PENALVA, 2014).
132
Em relação ao BPC, quase todos os participantes da pesquisa já haviam
conseguido adquiri-lo, apesar de também terem existido diversos empecilhos na conquista
desse direito.
A Dra. B, antes deu sair daqui, ela me deu um atestado, me explicou tudinho como
era, que eu procurasse o benefício, que ela ganhava. Ai o Dr. J, eu também pedi
outro papel desses, ai eu botei no INSS, ai veio negado. Ai eu coloquei no
advogado, foi pago, ele pegou a metade do dinheiro, mas veio, passou bem um ano
para vim, mas veio (Marta).
Deu certo, mas ainda fui umas três vezes lá [INSS], e ele disse que tava muito difícil deu conseguir. Aí na última vez veio (Rebeca).
Foi precisar ir na justiça. Eu fui lá no fórum na cidade, ai demorou 15 dias, ai saiu o
benefício nosso (Safira).
Destaca-se que todas as famílias acima estavam dentro dos critérios exigidos por
lei para o recebimento do BPC, tais como: não possuírem outros benefícios de seguridade
social, a criança e o adolescente apresentarem deficiências que limitem ou restringem suas
atividades e possuírem renda mensal bruta familiar, dividida entre os membros da família,
inferior a um quarto do salário mínimo (BRASIL, 2011d).
No estudo de Elias, Monteiro e Chaves (2008), único encontrado na literatura
semelhante a esta pesquisa, por buscar compreender como tem sido o acesso a alguns direitos
de pessoas com mielomeningocele, os participantes também revelaram algumas dificuldades
no recebimento do benefício, havendo a necessidade dessas pessoas terem que se deslocar até
o local de concessão diversas vezes, até finalmente conseguirem.
Apenas duas mães ainda não estavam recebendo o benefício, uma devido à
criança ainda possuir poucos meses de idade, e apesar de já ter sido bem orientada por
profissionais de saúde, ainda não havia buscado esse direito; a outra revelou não estar dentro
dos critérios exigidos para ter-se acesso ao recebimento do beneficio, conforme mostram as
falas:
Não tá recebendo ainda [criança possui três meses] (Léa).
Ainda não, porque eles, se tiver um salário em seu nome, alguma renda no seu nome, eles negam (Priscila).
A situação financeira dessas famílias, que possuem poucas condições de
subsistência, pode interferir na qualidade de vida de todos os seus membros, principalmente
daqueles que apresentam necessidades especiais de saúde, por influenciar na realização do seu
tratamento e recebimento de cuidados (CIPRIANO et al., 2009).
Importa ainda refletir-se que a criação de legislações são insuficientes para
promover efetivamente a inclusão social das pessoas com deficiência, pois para que isso
133
ocorra faz-se preciso um maior discernimento da sociedade acerca desses indivíduos,
reconhecendo suas potencialidades e compreendendo que estes apenas buscam alcançar
condições materiais e humanas que lhes possibilitem viver do mesmo modo que os demais
cidadãos (SILVA et al., 2012).
Nesse sentido, observou-se a necessidade de maior capacitação dos profissionais
de saúde, para que estes tenham conhecimento acerca das políticas públicas de saúde e, dessa
forma, sejam capazes de agir promovendo a saúde da população, através de estratégias de
orientação, tornando-os conhecedores dos seus direitos e compreendendo que ações
desenvolver para conseguir alcançá-los, de forma a buscar, com maior autonomia, sua melhor
qualidade de vida.
134
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio dos achados dessa pesquisa foi possível compreender as experiências e o
cotidiano de famílias de crianças e adolescentes com mielomeningocele, desde a notícia do
adoecimento destes no pós-parto, momentos que foram permeados por sentimentos de medo e
angústia ante ao novo e desconhecido, principalmente em virtude da escassez de suporte
emocional e de orientações adequadas por parte dos profissionais de saúde, até a chegada ao
domicílio com a necessidade de reorganização do ambiente familiar para acolher o novo
membro com necessidades especiais de saúde.
As rotinas da família reorientaram-se, na medida em que a criança e o adolescente
passaram a depender dos seus cuidados contínuos para a realização de suas atividades de vida
diária, tendo em vista as diferentes sequelas decorrentes da malformação congênita. A mãe,
vista como a principal cuidadora, abdicou de suas atividades externas ao lar para assistir ao
filho cronicamente adoecido, tomando para si essa responsabilidade, vivenciando juntamente
com ele os desafios de lidar com deficiências e buscar superá-las.
Diante da necessidade de um acompanhamento permanente em saúde, essas
crianças e esses adolescentes depararam-se com alguns obstáculos no acesso aos servidos da
Rede de Atenção à Saúde do SUS, que se mostraram pouco integrados, promovendo uma
assistência fragmentada a essas pessoas, com ausência de diálogo entre os profissionais de
saúde dos diferentes níveis de atenção.
Apesar da atenção primária ser o serviço com maior grau de proximidade
territorial dessas pessoas, principalmente por residirem no interior do estado, foi subutilizado
pelos participantes, havendo a sua busca prioritariamente para o recebimento de vacinas e
medicações. Além disso, pareceu estar pouco preparado para acolhê-los, em virtude de sua
estrutura física que não favoreceu o acesso a pessoas com deficiências, carência de recursos
materiais e de equipes de saúde, funcionando de forma pouco resolutiva para as demandas dos
usuários cronicamente adoecidos.
Os serviços de reabilitação, apesar de essenciais na assistência em saúde a essa
parcela da população, tiveram acesso restrito, por apenas uma minoria dos participantes
estarem recebendo esse tipo de atendimento. Além do mais, também apresentaram estruturas
inapropriadas para o deslocamento interno desses usuários, com ausência de adaptações que
favorecessem sua acessibilidade.
135
Por outro lado, uma instituição de reabilitação de maior porte, referência nacional
nesse tipo de atendimento, apresentou-se satisfatória para todos os usuários, com estrutura
física, recursos humanos, materiais e tecnológicos qualificados para assisti-los de forma
complementar dentro da rede, apesar de constituir-se em serviço onde poucos tiveram acesso,
em virtude da ausência de encaminhamento e orientação as famílias quanto a possibilidade de
atendimento.
No que diz respeito ao hospital terciário pediátrico de referência no Estado no
cuidado a crianças e adolescentes, onde todos os filhos dos participantes realizavam
acompanhamento, percebeu-se que apesar das dificuldades, a maioria das famílias tem
conseguido ter acesso dos seus municípios de origem até essa instituição, através da oferta de
transporte fornecido por estes ou de um auxílio financeiro para o deslocamento rodoviário.
Para as famílias, o atendimento recebido pelos profissionais de saúde nesse
serviço tem sido de qualidade e satisfatório. Entretanto, destaca-se que foi possível observar
algumas fragilidades, como a ausência de um atendimento interdisciplinar entre as
especialidades e de referenciamento interno entre os setores, havendo um cuidado pouco
integral, baseado primordialmente em órgãos e algumas sequelas da mielomeningocele,
mesmo frente a diferentes necessidades biopsicossociais dessas pessoas e de suas famílias.
Assim, percebeu-se a necessidade de uma maior discussão acerca dessa Rede de
Atenção à Saúde, de modo que esta possa funcionar de forma a integrar efetivamente os
diferentes serviços, interrelacionando-se com outros setores da sociedade, como escolas,
associações, grupos religiosos, entre outros, visando à promoção da saúde de crianças e
adolescentes cronicamente adoecidos.
Nesse sentido, sugere-se que sejam criadas estratégias para uma atuação mais
ativa da atenção básica as famílias e crianças e os adolescentes cronicamente adoecidos,
revelando, assim, a sua importância no seu processo de cuidado; que sejam ampliados os
serviços de reabilitação no interior do Estado e que as vias públicas nos itinerários dentro da
rede e instituições de saúde sejam reestruturadas de forma a fornecer acessibilidade às pessoas
com deficiência.
A pesquisa também possibilitou a compreensão acerca dos entraves encontrados
pelas famílias na busca por conseguir apropriar-se dos direitos em saúde de seus filhos com
deficiência. Nesse sentido, a carência de orientações acerca das políticas públicas existentes
no Brasil, que favorecem essas pessoas, promoveu muitos desafios no cotidiano dessas
famílias, que revelaram apresentar altos gastos com a compra de medicamentos, materiais de
higiene, equipamentos de locomoção e outros insumos necessários ao tratamento da criança e
136
do adolescente, em consequência do desconhecimento sobre os seus direitos e dos obstáculos
impostos para a sua aquisição no sistema de saúde.
Desse modo, torna-se necessária uma maior orientação para as famílias acerca
desses direitos, principalmente pelos profissionais de saúde que lidam continuamente com
esses usuários, instruindo-os sobre que ações realizar e em que serviços devem ir para
alcança-los. Por outro lado, é imprescindível que as políticas públicas sejam efetivadas em
todas as regiões, nos pequenos e grandes municípios, promovendo o acesso da população com
necessidades especiais de saúde a todos os materiais e equipamentos os quais estes são
dependentes frente às deficiências.
No Brasil, há mais de duas décadas tem sido elaboradas diferentes políticas
públicas de saúde em favor das pessoas com deficiências, que preconizam de forma fascinante
diferentes estratégias que visam incluí-las e promover sua melhor qualidade de vida.
Entretanto, a sua mera existência legal tem sido insuficiente ante a falhas na sua
implementação, de forma que elas não tem alcançado de fato aqueles que mais necessitam.
As crianças e os adolescentes com mielomeningocele possuem necessidades
particulares de cuidado, em meio a diferentes sequelas físicas e cognitivas, o que as faz
depender dessas políticas públicas, apesar de não serem especificas para esse adoecimento
crônico, na busca por acesso a serviços públicos de saúde adequados, com uma estrutura
física, material e humana que atenda as suas necessidades de forma humanizada e resolutiva,
bem como de conseguirem condições para realizarem as suas atividades cotidianas assim
como os demais cidadãos brasileiros, por meio do acesso a transportes públicos, escolas, e
todos os demais setores da sociedade, incluindo-se e possuindo suporte para viverem com
melhor qualidade.
A pesquisa apresentou algumas limitações, por ter ouvido apenas familiares de
crianças e adolescentes com mielomeningocele e terem sido realizadas observações
sistemáticas apenas em uma única instituição de saúde, em busca de compreender os objetivos
traçados, o que poderia ter tido um maior grau de aprofundamento caso fosse possível
investigar presencialmente os demais serviços e ter a possibilidade de interação com gestores,
profissionais de saúde e órgãos responsáveis pela implementação das políticas públicas de
saúde no Estado.
Apesar das limitações, destaca-se que a pesquisa conseguiu alcançar os seus
objetivos, permitindo-se ter uma visão geral acerca de diferentes municípios do Estado do
Ceará, a respeito de como tem ocorrido o atendimento e acesso aos serviços de saúde, em
todos os níveis de atenção, as pessoas com deficiências provenientes da mielomeningocele,
137
bem como as suas experiências na busca pela a aquisição dos seus direitos existentes nas
políticas públicas. Salienta-se, entretanto, a necessidade de uma continuação acerca das
discussões apenas iniciadas nesse estudo, que não se concluem nessa pesquisa e que, por
outro lado, fomentam novas iniciativas e métodos para o seu maior grau de aprofundamento e
contribuição para a sociedade.
138
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152
APÊNDICES
153
APÊNDICE A - Instrumento para coleta de dados
Roteiro de Entrevista Semi-Estruturada I – Entrevista com o familiar
Entrevista n°:___ Data:_____/_____/_____
1 Identificação
1.1 Responsável e família
Grau de parentesco:
Sexo/ Idade:
Escolaridade:
Estado civil:
Ocupação:
Procedência:
Renda familiar:
Composição e
organização
familiar:
1.2 Criança ou Adolescente
Sexo/ Idade:
Naturalidade/ Hospital:
Número de irmãos/ Posição:
Escolaridade:
Serviços de saúde que faz
acompanhamento/tratamento:
Complicações durante o
tratamento:
N° de internações:
Uso de tecnologia assistida:
154
2 Questões norteadoras
1) Fale acerca da sua experiência cotidiana no cuidar de uma criança/um adolescente
com mielomeningocele desde o seu nascimento.
2) Fale acerca da experiência de vocês na busca pelos serviços de saúde e o atendimento
da criança/adolescente nesses serviços desde o seu nascimento (hospitais, serviços
especializados, unidades básicas;
3) Existem nesses espaços adaptações estruturais para que a criança/adolescente consiga
entrar no serviço? Qual a localização da Unidade Básica de Saúde, serviços
especializados e hospital mais próximo da sua casa? Como tem sido a locomoção até
esses serviços?
4) Fale acerca de treinamentos para cuidar da criança/adolescente em casa que vocês
tenham recebido;
5) A senhora/senhor sabe se existem direitos em saúde para as crianças e aos
adolescente portadores de mielomeningocele (durante a realização dessa pergunta foram
dadas explicações sobre o que seria “direito” para facilitar a compreensão dos
participantes). Pode citá-los? Quais vocês têm adquirido? Como conseguiu adquiri-los?
6) Quais os benefícios financeiros ou auxílios no cuidado à criança/adolescente vocês
recebem?
155
APÊNDICE B - Instrumento para coleta de dados - Roteiro para Observação
Sistemática
Roteiro n°:___ Data:_____/_____/_____
1. Aspectos para observação:
1.1 Infraestrutura hospitalar
- Acessibilidade ao serviço;
- Vias de circulação interna;
- Banheiros para portadores de deficiência/ espaço para higienização da criança;
- Corrimão para auxiliar na locomoção;
- Cadeiras de rodas;
- Cadeiras suficientes para usuários e acompanhantes;
1.2 Sala de espera
- Quantidade de usuários;
- Atividades realizadas;
- Folders para orientação;
- Atitudes da Atendente/ secretária;
- Atitudes dos usuários e acompanhantes;
1.3 Relação profissionais e usuários/acompanhantes
- Vínculo terapêutico;
- Escuta;
- Usuário e acompanhante tem suas dúvidas esclarecidas;
- Empatia/ Respeito/ Ética;
- Tempo do atendimento;
- Orientações/ Atividades Realizadas.
156
APÊNDICE C - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Familiares
A mielomeningocele acarreta diversas complicações e deficiências para as
crianças e os adolescentes, que devido a esses fatores precisam de um acompanhamento
contínuo durante toda a vida. Para isso, o serviço público de saúde deve estar disponível
e acessível para elas e suas famílias, fornecendo-lhes suporte e cuidado. A partir desse
entendimento, essa pesquisa tem o intuito compreender o cotidiano de crianças e
adolescentes com mielomeningocele e suas famílias; compreender as suas experiências
de acesso na rede de atenção à saúde (primária, secundária e terciária); analisar, através
da experiência de familiares, o seu conhecimento e os direitos existentes e
implementados na atenção a essas pessoas com mielomeningocele. Para realizarmos
esse estudo precisamos que o senhor (a) responda algumas perguntas, que serão
gravadas, sobre como tem sido o tratamento da criança/adolescente e outros aspectos da
experiência da família, por isso, gostaríamos de convidá-lo (la) a participar dessa
pesquisa de forma voluntária
O Sr. (Sra.) poderá recusar-se em qualquer momento a responder alguma
pergunta ou desistir de participar e retirar seu consentimento entrando em contato com a
responsável pela pesquisa pelo telefone (85) 99578707. Sua recusa não trará nenhum
prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição. O Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido é feito em duas vias, no qual o Sr. (Sra.) terá uma
cópia. O Sr. (Sra.) não terá nenhum custo ou quaisquer compensações financeiras.
As informações serão usadas para publicação em revistas, monografias e/ou
livros, mas os seus nomes serão omitidos. Essa pesquisa poderá trazer alguns benefícios
futuros, pois essas informações poderão servir para uma melhor discussão sobre os
assuntos pesquisados e de suporte para que possa ser aperfeiçoada e implementada uma
melhor assistência para a criança/adolescente com mielomeningocele. Também poderá
gerar riscos mínimos, como o constrangimento, porém, caso ocorra, a entrevista será
interrompida.
Pesquisadora Sarah Vieira Figueiredo
Universidade Estadual do Ceará – UECE. Endereço: Av. Paranjana, 1700, Campus do
Itaperi, Fortaleza-CE. Telefone: 3101-4212 (Centro de Estudos Hospital Infantil Albert
Sabin).
TERMO DE CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIDO
Declaro estar ciente da pesquisa proposta e estar de acordo em participar,
sabendo que poderei desistir dela a qualquer momento, sem sofrer qualquer punição ou
prejuízo.
Fortaleza, ________________________ de ________.
__________________________________________
Assinatura do Pesquisador
__________________________________________
Participante da pesquisa
DIGITAL
157
APÊNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Fotografia
A mielomeningocele acarreta diversas complicações e deficiências para as
crianças e os adolescentes, que devido a esses fatores precisam de um acompanhamento
contínuo durante toda a vida. Para isso, o serviço público de saúde deve estar disponível
e acessível para elas e suas famílias, fornecendo-lhes suporte e cuidado. A partir desse
entendimento, essa pesquisa tem o intuito compreender o cotidiano de crianças e
adolescentes com mielomeningocele e suas famílias; compreender as suas experiências
de acesso na rede de atenção à saúde (primária, secundária e terciária); analisar, através
da experiência de familiares, o seu conhecimento e os direitos existentes e
implementados na atenção a essas pessoas com mielomeningocele. Para realizarmos
esse estudo, precisaremos de algumas fotografias do serviço e das situações de
atendimento a esses usuários, para complementar a discussão sobre a temática dessa
pesquisa. Para tanto, é necessária a sua autorização para que essas fotografias possam
ser tiradas, pois poderão conter sua imagem e/ou da criança ou adolescente sob sua
responsabilidade. Destacamos que todos os rostos possivelmente presentes nas fotos
serão desfocados, para que não seja possível a identificação.
O Sr. (Sra.) poderá desistir em qualquer momento de participar dessa pesquisa
e retirar seu consentimento entrando em contato com a responsável pela pesquisa pelo
telefone (85) 99578707. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o
pesquisador ou com a instituição. O termo de consentimento livre e esclarecido é feito
em duas vias, no qual o Sr (a) terá uma cópia. O Sr (a) não terá nenhum custo ou
quaisquer compensações financeiras.
As fotos serão usadas para publicação em revistas, monografias e/ou livros,
mas os seus nomes serão omitidos. Essa pesquisa poderá trazer alguns benefícios
futuros, pois os resultados encontrados poderão servir para uma melhor discussão sobre
os assuntos pesquisados e de suporte para que possa ser aperfeiçoada e implementada
uma melhor assistência para a família e criança/adolescente portador de
mielomeningocele. Também poderá gerar riscos mínimos, como o constrangimento,
porém, caso ocorra, a entrevista será interrompida.
Pesquisadora Sarah Vieira Figueiredo.
Universidade Estadual do Ceará – UECE. Endereço: Av. Paranjana, 1700, Campus do
Itaperi, Fortaleza-CE.Telefone: 3101-4212 (Centro de Estudos Hospital Infantil Albert
Sabin).
Fortaleza, ________________________ de ________.
___________________________________________
Assinatura do Pesquisador
___________________________________________
Participante da pesquisa
DIGITAL
158
ANEXOS
159
ANEXO A – Parecer do comitê de ética em pesquisa
160
161
162
ANEXO B – Autorização do chefe do serviço
163
ANEXO C- Declaraçaõ de pré-anuência