139354747 a Psicologia Das Relacoes Interpessoais Almir Del Prette (1)
-
Upload
rebecca-lobo -
Category
Documents
-
view
164 -
download
4
Transcript of 139354747 a Psicologia Das Relacoes Interpessoais Almir Del Prette (1)
-
Almir Del Prette / Zilda A.P. Del Prette
.m itm , wmk t. >
* "
P S I C O L O G I A D A S
RELAES INTERPESSOAIS
V I V N 3
T R A B A. . ^ - -i R A O
M GRU
I
-
www.facebook.com/groups/livrosparadownload
www.slideshare.net/jsfernandes/documents
-
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Del Prette, AlmirPsicologia das relaes interpessoais : Vivncias para o trabalho em
grupo / Almir Del Prette, Zilda A.P. Del Prette. Petrpolis, RJ : Vozes, 2001.
Bibliografia.ISBN 85.326.2596-7
1. Habilidades sociais 2. Psicologia social 3. Relaes interpessoais 4. Trabalho em grupo I. Del Prette, Zilda A.P. I. Ttulo.
01.2861 CDD-158.2
ndices para catlogo sistemtico:1. Relaes interpessoais : Psicologia aplicada 158.2
-
Alm ir Del Prette Zilda A.P. Del Prette
PSICOLOGIA DAS RELAES
INTERPESSOAISVIVNCIAS PARA O TRABALHO EM GRUPO
EDITORA VOZES
Petrpolis2001
-
2001, Editora Vozes Ltda.
Rua Frei Lus, 100
25689-900 Petrpolis, RJ Internet: http://www.vozes.com.br
Brasil
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra po
der ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrnico ou mecnico, incluindo
fotocpia e gravao) ou arquivada em qualquer sistema ou
banco de dados sem permisso escrita da Editora.
Editorao e org. literria: Orlando dos Reis
ISBN 85.326.2596-7
Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes ttda.
-
Dedicamos este livro a todos aqueles que contriburam para que as relaes entre as pessoas se tornassem cada vez mais humanasem especial aos dois grandes mestres:
Jesus Cristo e Siddhartha Buda
-
SUMRIO
Pr l o g o , 11
1 - Pa r a d ig m a s e r e la e s in t e r p e s s o a is : osENFOQUES LINEAR E SISTMICO, 15
1. Os novos paradigmas, 16
2. Abordagens psicolgicas sobre as relaes interpessoais, 19
A explicao linear, 22
A explicaao sistmica, 25
2 - D esenvo lv im en to d a com petncia s o c ia l e re la e s in terpessoa is , 30
1. Critrios de competncia social, 33
2. ^ Desenvolvimento e socializao, 37
'^J\fam ia e a escola, 41
A influncia da mdia na socializao, 44
3 - Co n te x to s e d e m a n d a s de h a b il id a d e s so c ia is , 46
1. O contexto familiar, 48
Relaes conjugais, 49
'^fy.elaes pais-filhos, 51
^2 . 0 contexto escolar, 54
3. O contexto de trabalho, 56
. 4 - h ab ilid ad es soc ia is p a ra uma n ova SOCIEDADE, 58
Aprendendo a aprender: a automonitoria, 61
2. Habilidades sociais de comunicao, 63
Fazer e responder perguntas, 65
Gratificar e elogiar, 66
Pedir e dar feedback nas relaes sociais, 68
Iniciar, manter e encerrar conversao, 70
-
3. Habilidades sociais de civilidade, 72
4. Habilidades sociais assertivas de enfren.tam.ento: direitos e
cidadania, 73
Manifestar opinio, concordar, discordar, 76
Fazer, aceitar e recusar pedidos, 77
Desculpar-se e admitir falhas, 78Esfaeiecer reiaconame7ito a/etivo/sexuai, 79
Encerrar relacionamento, 80
Expressar raiva e pedir mudana de comportamento, 81
Interagir com autoridades, 83
lidar com crticas, 84
5. Habilidades sociais empticas, 86
6. Habilidades sociais de trabalho, 89
Coordenar grupo, 90
Falarem pblico, 91
Resolver problemas, tomar decises e mediar conflitos, 93
Habilidades sociais educativas, 94
7. Habilidades sociais de expresso de sentimento positivo, 97t' Fazer amizades, 98
j Expressar a solidariedade, 100
: Cultivar o amor, 101
5 - 0 USO DE VIVNCIAS EM PROGRAMAS DE TREINAMENTO DE HABILIDADES SOCIAIS, 103
1. O que vivncia?, 106
2. A estrutura das vivncias, 108
3. A utilizao das vivncias, 110
4. O facilitador de grupo: questes tcnicas e ticas, 114
6 - V iv n c ia s p a r a a p r o m o o d e h a b il id a d e ss o c ia is , 1161. O meu nome ..., 116
-
2. O nosso e o do outro, 117
3. Caminhar alterando ritmo e movimento, 119
4. Caminhos atravessados, 120
5. Crculos mgicos, 122
6. Conduzindo o outro, 125
7. Mundo imaginrio, 127
8. Nmeros poticos, 130
9. A descoberta do corpo, 132
10. Feedback: como e quando, 134
11. Complemento indispensvel, 137
12. O pndulo, 139
13. Quebra-gelo, 140
14. Direitos humanos e interpessoais, 141
15. Reconhecendo e comunicando emoes, 145
16. Dar e receber, 147
17. Relmpagos, 149
18. Perguntas sem respostas, 151
19. Olhos nos olhos, 154
20. Nem passivo nem agressivo: assertivo!, 156
21. Histria coletiva oral, 160
22. Contar e modificar histria, 162
23. A tarefa de Atlas, 164
24. O mito de Ssifo, 166
25. Vivendo o papel do outro, 169
26. Inocente ou culpado?, 171
27. Pea o que quiser, 174
28. Corredor brasileiro, 176
29. Nasce uma rvore, 178
30. Recolhendo estrelas, 180
-
31. Formando um grupo, 182
32. Trabalhando em grupo, 184
33. Buscando sadas, 185
34. Misto-quente, 189
35. A fumaa e a justia, 191
36. Entrada no cu, 194
37. Sua vez, outra vez, 196
38. Perdidos na ilha, 198
39. Regresso no tempo, 200
40. Avano no tempo, 202
7 - A NECESSIDADE DE NOVAS RELAES INTERPESSOAIS, 205
1. Novos fatos e suas conseqncias, 210
2. Propostas para um novo padro relacional, 212
Interdependncia, 217
Aceitao, 219
Solidariedade, 220
3. O desenvolvimento da sociabilidade e as novas relaes
interpessoais, 221
Referncias bibliogrficas, 223
-
PROLOGO
0 interesse pelos temas pertinentes qualidade das re
laes interpessoais parece refletir hoje uma preocupao
geral com problemas a elas associados: a violncia, o preconceito, a intolerncia, o desrespeito etc. No entanto, o leitor
interessado no assunto deste livro, ao procurar obras simila
res nas livrarias, praticamente nada encontrar, a no ser
que se dirija ao setor de importados onde, ento, principal
mente na seo de Psicologia, ir se deparar com vasta litera
tura. A predominncia da literatura estrangeira no significa que, entre ns, os problemas interpessoais no alcancem a
amplitude verificada nos demais pases e por isso no atraiam
a ateno dos pesquisadores. A constatao de que o investi
mento em pesquisa no pas ainda pequeno no esclarece muito. Supor que o pblico em geral tem pouco interesse ou
busca proteger-se atravs da indiferena pode tambm no
corresponder realidade, considerando o teor das matrias dos jornais, revistas e da mdia em geral que, insistentemen
te, veiculam esse assunto.
Em nosso campo, a Psicologia, observamos na ltima d
cada a presena constante dessa temtica e correlatas nos
principais congressos no pas. Os artigos sobre habilidades
sociais, desenvolvimento de relaes interpessoais, assertivi- dade e inteligncia social vm marcando presena freqente
nas pginas de nossas revistas cientficas, Em nossa Universidade, a equipe que trabalha com Treinamento em Habilida
des Sociais no consegue dar conta da demanda por pales
tras, cursos e solicitaes de programas nessa rea. Isso re
fora a idia de que h, de fato, um interesse crescente pela temtica abordada neste livro.
Nos contatos com pessoas que participam de nossos cur
sos e com leitores de nosso livro Psicoogia das habilidades sociais: terapia e educao, fomos incentivados a preparar este
-
novo traoamo, voitaao para uma exposio mais aerainaaa
de nossa prtica e, em particular, do mtodo vivencial que
desenvolvemos. Pedem-nos, inclusive, a apresentao de um
programa-padro para desenvolvimento de habilidades so
ciais. Relutamos bastante porque, sem entrar em maiores de
talhes, temos feito uma avaliao muito negativa das publica
es apressadas que buscam mercado colando-se s teorias e
aos temas em ascenso. Nossa resistncia foi minada pelos argumentos dos colegas, de que o leitor faz o seu prprio julga
mento, valorizando os trabalhos que se apiam em pesquisas
e publicaes que do suporte prtica. Outro argumento foi
que nosso mtodo vivencial j foi testado inmeras vezes e
que deveramos agora d-lo a conhecer ao pblico em geral.
Cedemos a esses arrazoados e preparamos com bastante cuidado este novo livro, escrito a quatro mos. Mesmo quando um de ns iniciava um captulo, o outro fazia a reviso e o
completava. Ao final, fizemos revises conjuntas com a espe
rana de atender expectativa e confiana dos leitores. No obstante definirmos esta obra na perspectiva do desenvolvi
mento das relaes interpessoais, muitas das idias aqui enfa
tizadas no aparecem em outros textos nossos e queremos
mencionar a importncia de vrios pensadores para a consoli
dao das idias aqui expostas: Edgard Morin, Humberto Ma- turana, Peter Trower, Michael Argyle, Fritjof Capra. Conside
rando a importncia de se explorar novos substratos de anli
se das relaes entre as pessoas, realizamos uma tentativa ini
cial de aplicao da viso sistmica na compreenso dessa temtica. Estamos conscientes de que essa anlise ainda no
est completa e permanecemos abertos s crticas dos leito
res buscando o aperfeioamento das idias aqui registradas.
Este livro pode ser dividido em duas partes. A primeira
compe-se dos quatro captulos iniciais. No primeiro, discu
timos as mudanas paradigmticas nas cincias em geral e, em particular, na Psicologia, situando os modos de pensar as
relaes interpessoais nos enfoques linear e sistmico. Nos
captulos seguintes, apresentamos as noes de desenvolvi
mento das relaes interpessoais, os conceitos fundamentais
-
v_ia a i c a , a aucuiDC u t u c i c u l c as i i d i u c~
mandas de desempenhos interpessoais e um sistema de organizao das habilidades sociais, em termos de requisitos e
complexidade com a descrio de cada uma delas.
Na segunda parte, composta pelos trs captulos finais,
trazemos ao leitor as bases do mtodo vivencial e uma estru
tura analtica para a organizao das vivncias em um pro
grama de interveno voltado para a promoo das habilidades apresentadas na seo anterior. Inclumos tambm a des
crio de quarenta vivncias a serem utilizadas em progra
mas de Treinamento de Habilidades Sociais. No captulo de encerramento, analisamos os problemas humanos em um
mundo globalizado, enfocando principalmente a questo das relaes interpessoais.
Muitas pessoas contriburam, direta ou indiretamente, para a realizao deste livro. Gostaramos de agradecer: aos
colegas, aos alunos que passaram pela disciplina Psicologia das Habilidades Sociais e enfrentaram conosco o desafio de aprender e promover novas formas de relacionamento. Agra
decemos particularmente s pessoas, que utilizaram seus
momentos de descanso lendo e dando sugestes que permiti
ram o aperfeioamento deste trabalho: Alcione Vital, Giova-
na Del Prette, Jos Fernando da Costa Vital, Lucas Del Prette,
Maria Eny R. Paiva, Mirella Lopez Martnez, Roseli G. Cavalcanti e Tnia Maria De Rose.
-
1PARADIGMAS E RELAES INTERPESSOAIS:
OS ENFOQUES LINEAR E SISTMICO
05 tempos em que vivemos, meu caro, no permitem que se lhes faa trapaa com a Psicologia.
Thomas Mann
Por que as pessoas se comportam da maneira como o fazem? Essa pergunta recorrente nos cursos de Psicologia, mas
no so os estudantes os nicos interessados em respond-la.
As mais diferentes respostas vm sendo dadas a essa questo
ao longo do tempo. Podemos supor duas vertentes gerais de
explicao para o comportamento das pessoas, ambas orien
tadas pelos paradigmas cientfco-culturais em vigor. A primei
ra vem sendo denominada de explicao linear e est associada ao paradigma newtoniano-cartesiano, tambm chamado
clssico. A segunda, com base no paradigma holstico, foi ba
tizada de sistmica, ou ainda de complexidade'1.
Segue-se um breve resumo dos dois paradigmas junta
mente com explicaes que orientam a anlise de questes
pertinentes compreenso das demandas e desempenhos in
terpessoais, foco de interesse deste livro.
1. Sobic cssc tema existem vrias referencias na lngua portuguesa, Entre outros, ver: Capra, F. (1982). O ponto de mutao. So Paulo: Cultrix; Di Biasi, F. (1995). 0 homem holstico. Pctrpolis: Vo2.es; Mariotti, H. (2000). As paixes do ego: complexidade, poltica e solidariedade. So Paulo: Palas Athena; Maturana, H. (1998).Da biologia psicofogio. Porto Alegre: Artes Mdicas.
15
-
x . K j iiu v u p itr a u ig m a
Kuhn2, em seu Livro A estrutura das revolues cientificas, analisou de forma bastante detalhada as transformaes que
estavam ocorrendo na esfera da cincia e seus paradigmas.
Outros autores tambm contriburam com essa anlise e,
cerca de trinta anos depois, fala-se hoje abertamente, sem nenhum temor, o que alguns diziam timidamente em um
passado no muito distante: compartimentalizao do saber, modeLos reducionistas, vises ps-positivistas da cin
cia, holismo etc.
Como em outras cincias, tambm na Psicologia o debate sobre paradigmas, epistemologia, objeto, metodologia etc.
ganha amplo espao nos dias atuais. A Psicologia pode ser entendida como uma cincia em estgio multiparadigm- tco3 que, at o momento, no superou essa caracterstica,
produzindo conhecimento multiforme com vrias matrizes
filosficas e tericas de difcil integrao.
H, no entanto, um esprito novo, uma nova maneira
de enfrentar questes atuais e antigas a respeito da episte
mologia, do valor heurstico da maioria das investigaes
e da cientificidade da Psicologia. Pode-se falar em uma ati
tude mais aberta para considerar posies divergentes e,
portantoj mais favorvel discusso entre pesquisadores com diferentes formaes. A perplexidade que tomou con
ta das cincias naturais com relao aos paradigmas e aos
debates que nela ocorreram possivelmente se converteu
em um sopro vivificador, inspirando os tericos e pesquisa
dores da Psicologia.
2. Kuhn,T.S. (1978). A estrutura das revolues cientificas. So Paulo: Perspectiva.
3. A questo controversa, j que, tomando por modelo as outras cincias, alguns autores situam a Psicologia, conforme perspectiva kuhniana, em um estgio pr-paradigma tico e outros cm estgio multiparadigmtico. Nossa posio est mais detalhada em: Del Prette, Z.A.P. e Del Prette, A. (1995). Notas sobre pensamento e linguagem em Skinncr e Vygotsky. Psicoo^ia: Reflexo e Crinca, 8, 147-164. Ver, tambm: Mastcrman, M. (1979). A natureza de um paradigma. Em: L. Lakatos e A. Musgrave (Orgs.), A crtica < o desenvolvimento do conhecimento. So Paulo: Cul- trix-Edusp.
16
-
e. no amoito da Psicologia social que o entrentamento
desse debate ganhou mais fora, em parte devido sua so
breposio e caracterizao nas vrias psicologias e, em
parte, porque os psiclogos sociais vm, h cerca de quatro
dcadas4, discutindo as crises na disciplina: de identidade,
de prtica profissional, de busca de articulao entre mkro-
teorias e outros temas correlatos.
No final da dcada de oitenta, aps vrias discusses em
diferentes simpsios, foi realizado na Europa um evento di
rigido para a temtica dos paradigmas, contando com a par
ticipao da maioria dos autores que j vinham discutindo
as questes referidas5. Naquele evento, alm de outras con
cluses, observou-se que na Psicologia Social coexistem
duas compreenses generalizadas da disciplina. Uma de
fende a Psicologia Social como uma cincia natural, supon
do que o comportamento seja regulado por mecanismos ca
usais internos a serem explicitados atravs de rigorosa investigao emprica com orientao metodolgica hipotti-
co-dedutiva. A outra d nfase induo e rejeita a causa-
o interna como varivel independente, mas aceita a in
vestigao emprica rigorosa, incluindo a a experimenta
o, ainda que no somente. Alguns autores, conforme Je-
suno6, propuseram uma sntese entre essas duas formas de
entender a Psicologia Social. Essa terceira posio, como
era de se esperar, carrega ainda certa ambigidade, no
sendo possve pelo momento a emergncia de uma sntese
acabada dessas duas vises predominantes.
Pesquisadores de outros campos da Psicologia tambm
se vem s voltas com esses problemas. Na Psicologia do De
senvolvimento, h algum tempo se tem feito crticas forma
4. Ver: Duck, S. (1980). Taking the past to heart: One of the futures of Social Psychology? Em: R. GilmourcS. Duck (Eds.), Tke development o f Social Psycholog)'. London: Academic Press.
5. Do-s nomes mais conhecidos na Psicologia Social no Brasil, podemos citar Stroc- be, Zajonc, Nutdn, DoLse, Moscovici, Harr, Gcrgen, Semin, Lcmaine e Kruglanski.
6. Jesuno, J.C. (1995). A Psicologia Social europia. Em: J. Vala e M.B. Mortteiro (orgs.), Psicologia Social. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian.
17
-
tradicional de investigao posLtivista ao aesenvojvimento
humano7. Altman e Rogoff8 fazem uma anlise da evoluo
dos modelos ao longo da histria da Psicologia dando desta
que a quatro vises de homem que influenciaram os pressu
postos epistemolgicos e metodologias de pesquisa na cin
cia psicolgica; a de trao, a interacionista, a organsmico-sis-
tmica e a transacional.
As duas primeiras so influenciadas pela viso positivis
ta. A de trao enfatiza a causalidade interna dos fenmenos
psicolgicos e a interacionista desloca a causaao para os es
tmulos do ambiente. Ambas tm, como suporte bsico, pelo menos na sua constituio, o experimentalismo de laborat
rio para o estudo de seu objeto. Na perspectiva sistmica, o
modelo causai deixa de ser linear (tipo funo) e passa a ser
visto em suas relroalimentaes circulares onde a idia de
causa e efeito substituda pela noo de reciprocidade
de influncia. Essa orientao holstca sendo possvel, no
entanto, focalizar partes do sistema ou subsistemas, man-
tendo-se a idia de uma certa clivagem observador-obser-
vado. A perspectiva transacional entendida por Altman e
Rogoff como o estudo das relaes em mudana entre as
pectos psicolgicos e ambientais, partindo da premissa de
que estes so inseparveis, incluindo-se o pesquisador como
parte do sistema a ser estudado. Nessas duas ltimas vertentes, a contextualizao dos dados e a busca de compre
enso so condies importantes do fazer pesquisa e a dife
rena principal entre ambas reside na nfase da ltima sobre a continuidade temporal, a historicidade e a transitorie-
dade dos fenmenos e na implicao do observador sobre o
conhecimento produzido.
7. Ver, por exemplo: Branco, A. e Ferraz -da Rocha, R. (1998). A questo da metodologia na investigao do desenvolvimento humano. Psicologia; Teoria c Pesquisa, 14 (3 ), 251-258; Bronfenbrenncr, V. (1977). Toward an experimental ecology of human development. American Psychologist, 32, 513-531.
8. Altman, I. e Rogoff, B. (1987). World view in Psychology: Trait, interactional, or- ganismic and transaccionai perspectives. Hm: D. Stokolse I. Altman (Eds.), Handbook o f enviromcntal psychology. New York: Wiley.
-
j-.rriDora simpuncaaa, acreaitamos que essa exposio seja
sulidente para mostrar um panorama geral do que ocorre
no mbito da Psicologia neste incio do sculo XXI. Ao lei
tor entusiasmado com as possibilidades dos novos para
digmas na Psicologia, recomendamos cautela e reflexo
sobre as psicologias enfeitadas com rtulo de holismos,
nova viso etc., pois que, freqentemente, muitos des-
srs trabalhos refletem apenas um discurso dissociado de qualquer investigao emprica sobre o objeto a que se re
lerem. A fala de Soczka9, ele prprio defensor de nova ori-
rntao (denominada de ecolgica) para a Psicologia Social,
jusdfica bem esse alerta:
O conhecimento -e reconhecimento - de que a realidade social uma totalidade serve muitas vezes de justificao para substituir a investigao cientfica do social pelo simples discurso interpretativo e vago acerca dessa mesma realidade.
Alm disso, a adoo de novos paradigmas e metodologi
as no significa o descarte dos conhecimentos produzidos por
investigaes orientadas sob outras vises, mesmo aqueles
que no alcanaram aceitao ou que aguardam a chegada
de novos tempos para serem revisitados. No se pode negar a
cumulacidade do conhecimento historicamente construdo
cm vrias reas da investigao psicolgica, ainda que seja
difcil a generalidade nas cincias humanas.
2. Abordagens psicolgicas sobre as relaesinterpessoais
O interesse da Psicologia pelas relaes interpessoais , pode-se dizer, to antigo quanto a prpria formao dessa
disciplina. Na Psicologia clnica, h uma longa tradio de
estudos sobre essa temtica nos mais diferentes referenciais, como o comportamental, o cognitivista, as orientaes psico-
dinmicas, as denominadas humanistas com base em Rogers
9. Soczka, L. (1995). Para uma pcrspcctiva ecolgica em Psicologia Social. Em: J. Vala e M.B. Monteiro (Orgs), Psicologia Social. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian.
-
e iviasiow* e, mais ik^ciilcijiciilc: auiua, C.R.,e Rosenberg, R.L (1977). Apcssoacnmo centro. So Paulo: EPU/EDUSP.
11. Ver, entre outros: Bateson, G. (1985). Pasos hacia una ecologia de la wente. Buenos Aires: Carlos Lobl; Grof, S. (1984). Psychologie transpersonnelle. Mnaco: Ro cher; Grof, C. eGrof, S. (1990). A tempestuosa busca do ser. Sic Paulo: Cultrix; La- ing. R. (1987). O eu dividido. Pctrpolis: Vozes; Walsh, R. e Vaughan, F. (Orgs.), Alm do ego: Dimenses transpessoais cm Psicologia. So Paulo: Cultrix/Pensamento; Wilber, K. (1989). Q espectro da conscincia. So Paulo: Cultrix.
12. O mtodo teraputico denominado de Treinamento Assertivo foi elaborado por dois terapeutas sul-africanos, radicalizados nos Estados Unidos: Wolpe e Lazarus. Ver: Wolpe, J.S. (1976). A prtica da terapia comportamentai So Paulo: Brasilien- se; Lazarus, A. (1977). Psicoterapia personalista: Uma viso alm do condicionamento. Belo Horizonte: Interlivros. O treinamento assertivo foi popularizado pelo livro Your perfect right, de Robert E. Alberti c Michael L. Emmons, que havia alcanado, em 1989, a20aedio c vendido 800 mil exemplares. O mtodo teraputico Treinamento de Habilidades Sociais teve sua origem com um projeto sobre habilidades: sociais coordenado por Michacl Argyle, durante quinze anos, na Universidade de Oxford, na Inglaterra. As obras pioneiras com traduo para a maioria dos pases europeus e Estados Unidos foram: Argyle, M. (1967). The Psychology o f interpersonal behaviour. London: Penguin e Argyle, M. e Trowcr, P. (1979). Person to person: Ways o f communicating. London: Multimedia Publications. Para melhor detalhamento da constituio c histria dessas reas, o leitor poder recorrer ao nosso artigo: Del Prette, Z.A.P. e Del Prette, A. (2000). Treinamento em habilidades sociais:
Panorama geral da rea. Em V.G.Haasc, R.. Rothe Neves, C.Kappler, M.L.M. Teodo- roe G.M.O- Wood (Eds.), Psicologia do Desenvolvimento: Contribuies interdiscipli- nares (p. 249-264). Belo Horizonte: Health.
20
- MLuamieiiLe, c ic s uujs iiiuvjiiiciiius aii_
-
nic] Golemanlb, onde o autor resenha os vrios conceitos e
teorias nessa temtica e resume as principais investigaes so
bre o desenvolvimento emocional, tambm contribuiu para
aumentar o interesse e a compreenso sobre as relaes in
terpessoais, principalmente por colocar em destaque as questes inerentes ao sentimento e emoo em suas ligaes com
a cognio e o comportamento.
As teorias e conceitos do campo terico-prtico das habi
lidades sociais e das relaes interpessoais possuem unia his
tria de conhecimento produzida sob a perspectiva linear, ra
ramente encontrando-se propostas de investigao ou de in
terveno em uma viso sistmica. A seguir, apresentaremos
ao leitor essas duas perspectivas, explorando possibilidades
identificadas em ambas e defendendo uma perspectiva sist
mica para a epistemologia e a heurstica na rea do THS.
A explicao linear
Em uma perspectiva linear, todos ns somos tentados a
explicar nossa maneira de agir considerando as possveis relaes causa-efeito com base na contgidade da ao com
eventos antecedentes e/ou conseqentes. Alm disso, leva
mos em conta os eventos internos, os quais tm sido nomea
dos de vontade, desejo, conscincia etc. A todo momento,
damos e recebemos explicaes do tipo: Fiz isso porque de me provocou', Sempre tive vontade de responder-lhe assim; Agi de acordo com a minha conscincia.
Em que pese a variabilidade dos termos utilizados, con
cordamos que a nossa maneira de ser e agir afetada por va
riveis do ambiente (caractersticas fsicas, sociais e/ou cul
turais de uma dada situao) e, tambm, por variveis in-
tra-individuais (crenas, percepes, sentimentos). Quando,
diante de uma mesma situao, observamos duas pessoas apresentarem respostas bastante diferenciadas, tendemos a
fazer alguns acrscimos em nossas explicaes, como por
exemplo: Ao ser ofendidoj Mrio reagiu altura porque cora
16. Goleinan, D. (1995). Inteligncia emocional. Rio dc Janeiro: Objetiva.
00
-
joso e Pedro calou-se, fo i pusilnime. Entre os profissionais da rea da Psicologia, as explicaes incluem um vocabulrio
mais elaborado sobre conceitos, fatores e processos psicol
gicos do tipo: um melhor treino de tolerncia frustrao, estado de excitao difusa, dessensibilizao diante de estimulao ameaadora, fortalecimento do ego. Independentemente do discurso, se leigo ou especializado, as explicaes oscilam
entre os determinantes endgenos e os exgenos.
Uma sntese entre essas explicaes vem sendo tentada
h muitas dcadas. Entre as muitas tentativas, merece aten
o, na Psicologia Clnica, a proposta de Ellis, cuja formao psicanaltica o levou a desenvolver uma abordagem terapu
tica por ele denominada de Terapia Racional-Emotva. Du
rante algum tempo, dedicando-se a auxiliar pessoas que precisavam de ajuda e a contribuir na formao de novos profis
sionais, Ellis foi colecionando informaes relevantes que o
levaram a considerar tambm a importncia das variveis
ambientais sobre o comportamento, tanto na base dos pro
blemas como na manuteno das melhoras obtidas pelos
seus clientes. Essa mudana de posio imps a necessidade
de alterar a designao de seu mtodo para Terapia Racional
Emodvo-Comportamental17.
No obstante a possibilidade de integrar alguns nveis de
anlise e com isso superar redues por demais restritivas sobre o objeto em estudo, essas snteses no correspondem a
um olhar holstico, permanecendo ainda em um paradigma
newtoniano. Nessa perspectiva, a Psicologia herda conceitos
e valores correspondentes aos das cincias exatas, tais como
regularidade, uniformidade, previsibilidade e controle. A ra
cional lgica a de que, se o universo possui uma estrutura material formada por tomos que se movimentam dentro de
leis fixadas nas dimenses espao-tempo, todos os processos
vivos, de alguma maneira, tambm assim podem ser definidos e enquadrados possuindo, portanto, leis gerais de funcio
namento. Caberia ento s cincias que estudam essas reali
17. Ellis, A. (1993). Changing Rational-Emotive Therapy (RET) to Rational Emoti
ve Behavior Therapy (REBT), Behavioral Therapist, 16(10), 257-258.
->o
-
dades objetivas descobrir tais leis, propondo enunciados de
regularidade e uniformidade que permitiriam fazer previ
ses mecnicas e probabilsticas sobre o comportamento dos
organismos. Logo, quanto mais decomposto e aprofundado o
conhecimento das partes, tanto maior seria o nosso conheci
mento sobre o todo.
Como essa forma de pensar produziu um avano extraor
dinrio ao ser aplicada mecnica, resultando na revoluo industrial, a suposio foi que o mesmo deveria ou poderia
acontecer quando empregada aos seres vivos. Foi na esteira
dessa premissa que o interesse cientfico pela compreenso do funcionamento humano dividiu, com o propsito de pos
teriormente integrar, algumas disciplinas que se ocupavam
do assunto e tambm criou outras. Das veteranas Filosofia,
Biologia, Psicologia, Psicanlise e Sociologia, a comparti-
mentalizao do saber se estendeu Etologia, Psicobiologia,
Sociobiologia, Neuropsicologia, no existindo sinais de que esse processo de fragmentao se interrompa a curto ou m
dio prazo. No h dvida de que essas cincias trouxeram informaes relevantes sobre o funcionamento dos organismos
em geral e do homem em particular. Essas informaes dinamizaram as cincias aparentadaSj projetando a Psicologia e a Psiquiatria como disciplinas aplicadas. Uma e outra descar
taram algumas de suas posies anacrnicas e assimilaram o discurso cientfico em moda, produzindo diferentes conheci
mentos e prticas, com pouco dilogo entre si.
Esse processo criou a especializao e a subespecializa-
o, isolando os pesquisadores. A multidisciplinaridade (v
rias disciplinas estudando o mesmo objeto) passou, ento, a ser empregada na produo do conhecimento. Da progre
diu-se para a interdisciplinaridade, buscando-se tambm o
dilogo entre pesquisadores com diferentes formaes. Alcanamos agora, pelo menos em termos de proposta, a transdis-
ciplinaridade, que preconiza a abolio das fronteiras entre as disciplinas e a cooperao entre os pesquisadores. Nesse
processo, no deveria haver disciplinas (cincias) menores
ou com aratus mais elevados. Assim considerando, o conheci-
-
mento transitaria de uma disciplina a outra, sendo aprimora
do e resultando no enriquecimento das disciplinas em si mesmas at que elas prprias fossem abolidas.
Isso tudo? Embora haja um desencanto generalizado rom a cincia, uma frustrao com as promessas no reali
zadas do marxismo e uma grande desconfiana com os pres
sgios de bem-aventurana da globalizao, muito se obte
ve at o presente momento. Poder-se-ia acrescentar, entretanto, que todas as realizaes obtidas atravs da viso linear
no foram capazes de solucionar os problemas atuais, justi
ficando outras alternativas que vm sendo construdas ao longo do tempo.
A explicao sistmica
Um sistema pode ser entendido como uma combinao ordenada de partes que interagem para produzir um resulta
do. A viso sistmica constitui uma tentativa de compreen
der a influncia recproca entre as partes d um sistema Xsus subsistemas) e entre sistemas e seu entorno. Todo-subsiste
ma possui relativa autonomia, mas , ao mesmo tempo, componente de sistemas mais amplos. A decomposio de um
sistema em subsistemas (ou a recomposio destes em siste
mas mais amplos) depende da perspectiva de investigao do observador.
Se, na viso linear, o esforo pela superao da dicoto
mia e do reducionismo, atravs da integrao de diferentes anlises e da contextualizaao do objeto nas investigaes,
no significa uma mudana paradigmtica, tambm na pers
pectiva sistmica a decomposio do sistema em subsistemas
no constitui uma contradio s suas premissas. Alm disso,
a possibilidade de decomposio no implica em sua substi
tuio pela abordagem linear nem em uma idenrificao com ela. Em outras palavras, a viso sistmica no se prope
como alternativa irreconcilivel a outras formas de compre
enso do mundo. A relao entre esses modelos, como a en
tendemos, no se assenta na dicotomia do isto ou aquilo, porm na posio concilivel do isto c tambm aquilo.
-
Ao talarmos das limitaes do experimentalismo de labo
ratrio em Psicologia Social, no antecipamos nenhuma no
vidade. Apenas repetimos o que outros18 apontaram, embora
faamos coro com o sentimento de insatisfao. A hipersim-
plificao do ambiente do laboratrio, a incerteza dos sujei
tos quanto possibilidade de interpretao correta dos pa
dres normativos de desempenho, a relao atemporal entre
os sujeitos e entre estes e o pesquisador configuraram uma artificialidade tal que contribuiu para muitas das objees
recorrentes, familiares aos estudiosos da rea. Alguns pes
quisadores construram, criativamente, no laboratrio, ambientes anlogos s situaes da sociedade. Essas investiga
es trouxeram um impacto formidvel, ganhando densidade de denncia e, desse modo, contriburam para uma refle
xo sobre vrias instituies: a cultura que desenvolvem, os
valores sobre quais se organizam, os papis que esses valores
exercem, os seus efeitos positivos ou negativos etc.
Estendendo a reflexo para a temtica das relaes inter
pessoais em uma perspectiva sistmica, a decomposio
do desempenho social em diversos nveis de habilidades
(molares ou amplas e moleculares ou restritas), supon
do-as sempre em um contnuo e no em uma relao dico
tmica, faz sentido se, e apenas se entendermos o desem
penho como conjunto de subsistemas do indivduo inte
grados ao seu ambiente. O ambiente no se refere apenas a
situaes especficas, mas tambm a contextos como famlia,
escola, sociedade, cultura.
Qualquer programa visando o desenvolvimento de habi
lidades sociais, de carter remediativo ou preventivo deve,
nesta perspectiva, possibilitar ao participante uma compre
enso de suas dificuldades interpessoais para alm do pensa
mento linear, ou seja, para alm da causao imediata dos fatores intra-individuais ou localizados nas variveis da situa
18. Ver: Gcrgcn, RJ. (1973). Social Psychology as history. Jorjuici of Personality and Social Psychology, 26,309-330; Harre, R. (1980). Making Social Psychology scientific. Em G. Gilmoui c S. Ouck (Eds.), The development of Social Psycholog)'. London: Acadcmic Press.
-
i^ o. Pessoas-chave cm sua vida seriam ento reconstrudas"
no ambiente teraputico a partir de sua percepo que, nessa
nova perspectiva, tende a se refinar. A entrada simblica des
ses significantes no programa obedece aos princpios defini
dos em nosso trabalho anterior19, de respeito aos direitos hu
manos e de equilbrio nas relaes de poder.
O risco do pensamento linear, aplicado ao contexto tera
putico, o de tomar o outro como responsvel pelas dificul
dades do cliente que apresenta a queixa e, da, supor que cnbe ao processo desenvolver habilidades deste para lidar
com aquele. Simplificando, tende-se a cair no pressuposto vencer/derrotar, inerente sociedade capitalista. Uma viso
sistmica implicaria em considerar ambos como necessitados
de ajuda e a relao como um processo de vrios componen
tes. O pensamento subjacente que orienta essa viso o de co
locar o outro, de quem o cliente se queixa, sejam pais, mes,
filhos, ou qualquer outro significante, como participantes ati
vos da relao, tanto em pensamento (crenas) como em sen
timentos e comportamentos.
Focalizar o processo teraputico em apenas um dos p
los, desconsiderando a relao existente entre subsistemas,
leva ao risco de ceder armadilha da lgica da organizao
social capitalista, que a de preparar um para vencer o outro (ser mais competente). Nessa forma de olhar o problema, pa
rece no existir lugar para respeito e compaixo. No h,
nesta linha de pensamento, a possibilidade da terapia desen
volver habilidades no cliente para que este auxilie o outro a
ser feliz sem usar o poder coercitivo e de prover, a ambos, recursos para encontros saudveis, preenchidos por relaes
igualitrias, fraternas e amistosas. E, no entanto, o que poderia ocorrer em uma perspectiva sistmica, uma vez que am
bos, cliente e seu entorno (incluindo me, pai ou outra pes
soa envolvida), seriam considerados integrantes de um siste
ma mais amplo, reconhecendo-se que alteraes positivas
19. Del Prcttc, Z.A.P. c Del lJrcttc, A. (3999). Psicologia das Habilidades Scciais: te
rapia e educao. Peirpolis: Vozes.
07
-
em um subsistema so geradoras defeedback para o prprio e produzem tambm mudanas em outros subsistemas.
Um sistema representado por vrios componentes ou
subsistemas interligados e interdependentes, em uma din
mica prpria, dirigida a manter a sua organizao. Tome
mos, por exemplo, os chamados fatores intra-indviduas,
cognio e emoo. Ambos se afetam e afetam a maneira
com que a pessoa reage aos estmulos do ambiente (que
pode ser o comportamento de outro indivduo), caracterizando-se como subsistemas. Para entender uma parte, por
exemplo, a emoo, preciso raciocinar de forma ampla e,
ainda, incluir outros subsistemas, por exemplo, a famlia. A
forma como cada sistema se organiza definidora de suas
caractersticas e mudanas nas partes podem no atingir a
totalidade, a menos que ocorram nos chamados pontos de
alavancagem20, difceis de serem completamente definidos a priori, considerando-se as especificidades de cada sistema. No mximo, pode-se identificar possibilidades, mas sempre
com uma boa dose de incerteza. A trade pensamento-senti-
mento-ao pode ser considerada como subsistemas do siste
ma humano. Qualquer processo teraputico ou educacional
precisa levar em conta a articulao entre esses subsistemas
e a possibilidade de identificar pontos de alavancagem em
pelo menos um deles.
Os sistemas humanos so determinados pela forma como seus componentes se relacionam entre si e isto lhe confere a
estrutura. Pode-se dizer, nessa perspectiva, que as estruturas
sempre se diferenciam, porque seus componentes possuem
uma dinmica prpria (forma de relao, normas e regras).
Por isso uma determinada realidade pode ser percebida de
maneira diferente em diferentes momentos e por diferentes
pessoas. Isso implica reconhecer que a realidade pode ser ob
jetiva, mas a percepo dela sempre subjetiva. O exerccio
20. Pontos de alavancagem so os elos mais frgeis, porm impon antes de um sistema que, ao serem mobilizados, podem produzir mudanas na totalidade. Ver, por exemplo: Marioui, H. (2000). As paixes do ego: complexidade, polkica e solidariedade. So Paulo: Palas Athcna (p. 86).
-
de perceber-se e perceber o outro pode ser aperfeioado pelo
feedback que os sistemas provm; entretanto, cada indivduo sempre manter a sua prpria percepo da realidade. O poe
ta rabe Kalil Gibran21 fala sobre isso com rara beleza. O tre
cho que segue bem ilustrativo
O astrnomo poder falar-vos dc sua compreenso do espao,mas no vos poder dar sua compreenso.Porque a viso de um homem no empresta suas asas a outro homem.
Esse panorama geral de raciocnio serviu de base para a
anlise e sntese (decomposio e composio) das habilidades sociais, a identificao de demandas e contextos e a for
mulao da proposta do mtodo vivencial como instrumento de integrao dos subsistemas emoo, sentimento e compor
tamento, em um programa de habilidades sociais sob a pers
pectiva sistmica.
21, Gibran, K.G. (1972). 0 profite. Rio de Janeiro; Expanso Editorial,
nn
-
DESENVOLVIMENTO DA COMPETNCIA SOCIAL E RELAES INTERPESSOAIS
O essencial saber ver,Saber ver sem estar a pensar,Saber ver quando se v E nem pensar quando .se v Nem ver quando se pensaMas isso (triste de ns, que trazemos a alma vestida) Isso exige um estudo profundo,Uma aprendizagem de desaprender.
Fernando Pessoa
2
O Treinamento em Habilidades Sociais (THS), expres
so recorrente ao longo desse livro, abrange uma rea origi
nalmente associada Psicologia Clnica e do Trabalho, mas
que se estende, atualmente, Psicologia Social, Educacional,
do Desenvolvimento, Evolutiva etc. Inicialmente concebido
como um mtodo teraputico1, o estatuto atual do THS per
mite consider-lo tambm como uma rea de investigao
tanto emprica quanto terica.
As pesquisas no campo do THS tm mostrado que as pes
soas socialmente competentes tendem a apresentar relaes
pessoais e profissionais mais produtivas, satisfatrias e duradouras, alm de melhor sade fsica e mental e bom funcio
namento psicolgico. Por outro lado, os dficits em habilida
des sociais esto geralmente associados a dificuldades e con-
1. Ver: Del Prcttc, Z.A.P. c Del Prctte, A. (2000). Treinamento cm habilidades sociais: Panorama geral da rea. Cm V.G. Haase, R. Rothe-Ncvcs, C. Kappler, M.L.M. Tcodoro, c G.M. 0. Wood (cds.), Psicologia tio Desenvolvimento: contribuies inter- rLsciplinares (p. 249-264). Belo Horizonte: Health.
30
-
litos na relao com outras pessoas, por qualidade de vida
e a diversos tipos de transtornos psicolgicos.
O termo habilidades sociais se diferencia tanto do termo
desempenho social como de competncia social2. O desem
penho social refere-sc emisso de um comportamento ou
seqncia de comportamentos em uma situao social qual
quer. J o termo habilidades sociais refere-se existncia de
diferentes classes de comportamentos sociais no repertrio
do indivduo para lidar de maneira adequada com as deman
das das situaes interpessoais. A competncia social tem
sentido avaliativo que remete aos efeitos do desempenho so
cial nas situaes vividas pelo indivduo. Muitas vezes, uma
pessoa possui as habilidades, mas no as utiliza no desempe
nho por diversas razes, entre as quais a ansiedade, crenas
equivocadas e dificuldade de leitura dos sinais do ambiente.
Na dinmica das interaes, as habilidades sociais fazem
parte dos componentes de um desempenho social competente. A competncia social qualifica, portanto, a proficincia de um desempenho e se refere capacidade do indivduo de or
ganizar pensamentos, sentimentos e aes3 em funo de
seus objetivos e valores articulando-os s demandas imedia
tas e mediatas do ambiente4.
As relaes entre ao, razo e emoo, recorrentes na
Psicologia, tm sido objeto de interesse tambm de outras
cincias, especialmente da neurologia. Os sentimentos po
dem depender de um sistema de mltiplos componentes que
2. Ver ODonohue, W. c Krasner, L. (1995). Psychological skills training. Em W. ODonohue c L. Krasnci (Eds.), Handbook of psychological skills training: Clinical techniques and applications (p. 1-19). New York: Ally'll and Bacon.
3. Os term os pensamento, componentes cognitivos e cognio tm sido utilizados de forma intcrcambivel c no sero objeto dc diferenciao nesta obra. 0 mesmo se aplica aos ccrmos sentimento, emoo e afeto c, tambm conao, ao c comportamento, os trs ltimos referindo-se ao desempenho aberto e publicamente observvel. O termo desempenho usado cm um sentido abrangente, incluindo aspec
tos comportamcntais, cognitivos e afetivos.
4. Trowcr chama a esses componentes de blocos construtores do desempenho social. Ver: Trowcr, P. (199S). Adult social skills: State of die art and future directions. Em W. ODonohue c L. Krasner CEds.), Handbook o f psychological skilb training: Clinical techniques and applications (p. 54-80), New York: Allyn and Bacon.
-
sao importantes na regulaao biolgica e, por outro lado, a
razo dependeria de sistemas cerebrais que podem tambm
processar sentimentos5. Essa posio contraria a noo carte
siana com a qual nos acostumamos,, ou seja, a de compreen
der a razo parte do organismo. Defende-se, aqui, que a
anlise das relaes interpessoais deve levar em conta a tra
de pensamento, sentimento e comportamento, independen
temente de estes se apresentarem de forma coerente ou incoerente no desempenho do indivduo em uma dada situao.
A coerncia entre cognio, emoo e comportamento
usualmente designada pelos termos autenticidade, sinceridade e honestidade. No seu oposto, encontram-se as pala
vras dissimulao, falsidade e mentira. Pode-se dizer que uma
pessoa coerente quando, tanto quanto possvel, seus pensa
mentos e sentimentos se refletem em suas aes e interaes
com as demais.
Considerando-se a educao para algumas prticas culturais, a grande maioria das pessoas no consegue evitar al
gumas incoerncias'; So as chamadas mentiras sociais como,
por exemplo, os convites que no expressam verdadeiros de
sejos e os falsos elogios: passe l em casa...; espere um pouco para o jantar; no incmodo nenhum; seu caf est delicioso; no est gorda, parece at ter emagrecido. Observa-se, tambm, a conteno na expresso de certos sentimentos ou
pensamentos com o propsito de preservar a auto-estima do
outro ou evitar constrangimentos desnecessrios e conse
qncias indesejveis.
Tanto a incoerncia como a coerncia entre sentimentos,
pensamentos e aes podem ser aprendidas. A aprendiza
gem da incoerncia se d principalmente atravs de trs pro
cessos que, quase sempre, incidem sobre a expresso mais do
que. sobre, a experincia subjetiva de pensar e sentir: a) a ob
servao e a imitao de padres de dissimulao de outrem;
b) a punio para a expresso verdadeira de sentimentos e
5. Ver: Damsio, A. (1994/1998). O erro de Descartes: Emoo, razo ec crebro humano. So Paulo: Companhia das Lctrasj Sacks, A. (1999). homem que confundiu sua mulher com um chapu. So Paulo: Companhia das Letras.
-
pensamentos; e c) a recompensa para a expresso no verda
deira de sentimentos e pensamentos. Inicialmente a incoe
rncia pode gerar desconforto e ansiedade, dificultando mais
ui rida a expresso de sentimentos verdadeiros. Por outro Indo, esse desconforto pode ser abrandado e desaparecer to-
l:ilmente quando a prpria pessoa passa a justificar a sua ma
neira de agir, obtendo, com isso, satisfao por mentir, jul-
jiindo-se muito esperta. Em outras palavras, ela desenvolve
um esquema de auto-reforamento que, como se sabe, bas- linte poderoso na manuteno de padres de ao.
1. Critrios de competncia socialOs encontros sociais no ocorrem no vazio. Eles se do
cm determinados contextos e situaes especficos e so regidos por normas da cultura mais ampla ou da subeultura.
Portanto, alm da dimenso pessoal (conhecimentos, senti
mentos, crenas), o uso competente das habilidades sociais depende tambm da dimenso siruacional (contexto onde
ocorrem os encontros, status do interlocutor, presena/au
sncia de outras pessoas etc.) e da cultural (valores e normas do grupo).
Defendemos a idia de que as pessoas socialmente competentes so as que contribuem na maximizao de ganhos e
na minimizao de perdas para si e para aquelas com quem
interagem. Assim, considerando a dimenso pessoal e os con-
lextos situacional e cultural, o desempenho socialmente com
petente aquele que - fundado na coerncia entre os subsis
temas, afetivo, cognitivo e conativo - expressa uma leitura adequada do ambiente social, ou seja, decodifica corretamente os desempenhos esperados, valorizados e efetivos
para o indivduo em sua relao com os demais. Alguns autores6 diferenciam as habilidades cognitivas (de percepo so
cial e processamento de informao) das habilidades com-
portamentais (verbais e no verbais), atribuindo s primei
6. Ver, por exemplo: Trower (1995), anteriormente citado; Bedell, J.R., e Lennox, S.S. (1997). Handbook for communication and problem-solving skill training. New York: John Wiley e Sons.
-
ras a funo de definir, organizare guiar o desempenho social
e s segundas, a de implementar a direo definida peos
processos cognitivos. A maioria dos autores, no entanto, no
faz essa diferenciao, agrupando os dois conjuntos como
habilidades sociocognitivas ou, simplesmente, como habili
dades sociais. Isto se aplica noo de timing7, essencial nas relaes interpessoais, que implica, simultaneamente, em
processos de percepo e desempenho observvel.
Em termos de efetividade, possvel atribuir competn
cia social aos desempenhos interpessoais que atendem aos
critrios de: a) consecuo dos objetivos da interao; b) ma
nuteno ou melhora da auto-estima; c) manuteno e/ou
melhora da qualidade da relao; d) maior equilbrio de ga
nhos e perdas entre os parceiros da interao; e) respeito e ampliao dos direitos humanos bsicos8. Embora todos es
ses critrios no sejam usualmente atendidos em uma mesma
situao, pode-se afirmar que quanto mais deles so atendidos simultaneamente, maior competncia social pode ser
atribuda ao indivduo.
Os objetivos de uma interao social podem ser os mais
variados9: transmitir ou obter conhecimentos, informaes
ou compreenso; solicitar mudana de comportamentos, ati
tudes, crenas ou estado emocional do outro; obter produtos
desejados; supervisionar atividades; manter conversao tri
vial. Supor que uma pessoa socialmente competente sempre atinge seus objetivos nas interaes com as demais uma no-
7. A noo de rmng diz respeito sensibilidade para identificar o momento apropriado a determinado desempenho e para omiti-lo quando as condies do contexto assim o indicarem.
8. EmoutTOs trabalhos, apresentamos os conceitos de direitos humanos e de equil
brio de refora dores como critrios ou princpios que podem servir de orientao ao atendimenLo clnico ou interveno psicolgica. Ver, por exemplo: Del Prette, A.; Del Prette, Z.A.P. c Castelo Branco, U. V. 0-992). Competncia social na formao do psiclogo. Paidia: Cadernos de Educao, 2 (fev.), 40-50; Del Prette, A. (1982). Treinamento comportumental em gmpo junto populao imo dinica de baixa renda: Uma attlisc descritiva dc procedimento. Dissertao de Mestrado em Psicologia Clnica. Pontifcia Universidade Catlica dc Campinas, So Paulo.
9. Ver: Argvle, M. (1967/1994). Psicologia, dei comportamiento interpersonal. Madrid: Alianza Universidad.
-
i;;in equivocada. Embora a consecuo dos objetivos espera
dos seja um dos indicadores do desempenho socialmente
competente, este no um critrio a ser considerado isolada
mente. Uma pessoa pode., devido a outros fatores, no atingir os objetivos pretendidos na interao e, ainda assim, ser
considerada competente sob os demais critrios. Por outro
liido, ela pode atingir os objetivos de uma forma que no se
ria considerada competente sob os demais critrios, por
1'xemplo, por meio da agresso e da coero que prejudicam imediatamente, ou em mdio prazo, a qualidade da relao,
;i auto-estima e o equilbrio de poder.
A auto-estima relaciona-se com os pensamentos e senti
mentos elaborados pelo indivduo a partir de seus comporta
mentos e das conseqncias deste no ambiente. Esses sentimentos sero tanto mais positivos quanto maior a segurana
cia pessoa de estar fazendo o que acredita mais correto, mais
justo, mais adequado, mesmo que no atinja os objetivos. Atin
gir os objetivos gera satisfao e uma auto-avaliao positiva,
inas, quando isso ocorre s custas de humilhao, autodepre-
dao, falsas promessas, intimidao etc., pode, devido in
coerncia entre pensamentos e aes, reverter em prejuzos
para a auto-estima. A exceo a essa regra refere-se s pessoas
psicologicamente doentes incluindo-se, aqui, as extremamen
te ambiciosas e cnicas. Por outro lado, sacrificar os prprios objetivos ou priorizar as necessidades e direitos do outro, em
detrimento dos prprios, comportando-se de forma passiva,
usualmente tambm afeta a auto-estima e a autoconfiana trazendo a mdio ou mesmo a curto prazo insegurana e re
laes sociais insatisfatrias para o indivduo.
A manuteno ou melhoria da qualidade das relaes in
terpessoais um indicador de competncia social associado,
tambm, ao compromisso com a relao. A nossa compreen
so de compromisso semelhante de Hinde10. Para esse au
tor, o compromisso na relao se resume:
10. Vcr: llindc, R.A. (1981, p. 14). The bases of a science of interpersonal relationships. F.m S. Duckc R. Gilmour (F.dsO, Personal Relationships 1: Studying personal relationships. New York: Academic Press.
-
...extenso pela qua] os parceiros aceitam a continuidade da relao ou dirigem seu comportamento no sentido dc assegurar essa continuidade ou otimizar suas propriedades.
Duas pessoas, coerentes no pensar, sentir e agir, tendem
a pautar-se pela honestidade nas relaes, garantindo confi
ana mtua e troca de estimulao positiva, fortalecendo
dessa maneira o compromisso entre elas.
Um dos critrios mais difceis de avaliao objetiva o do equilbrio de reforadores e de poder nas relaes, pois
h muitos componentes subjetivos associados percepo
de ganhos e perdas entre os participantes de uma intera
o. Teoricamente, se um dos participantes obtm relati
vamente maiores ganhos e sofre menores perdas do que o(s) outro Cs) pode-se falar em desequilbrio e, ao contr
rio, verifica-se o equilbrio quando todos obtm o mximo
de ganhos e o mnimo de perdas, em perodo de tempo mais
ou menos semelhante. Isso produz uma circularidade posi
tivamente reforadora, ou seja, com grande probabilidade
de automanuteno da relao. As falhas na competncia social podem produzir ruptura nessa circularidade positiva,
criando oportunidade para o aparecimento de comporta
mentos aversivos, com conseqncia negativa para um ou
ambos os envolvidos. Mesmo ocorrendo esforos no sentido
de revitalizar a positividade da relao, algumas rupturas
podem ter um carter excessivamente prolongado, induzin
do deteriorao do relacionamento, principalmente quan
do um dos participantes obtm relacionamentos alternativos
mais satisfatrios.
Os direitos interpessoais correspondem aplicao, na
interao social, dos direitos humanos bsicos, entendendo-se que eles so vlidos para todos e que cada direito cor
responde a um dever: o direito de expressar nossas opinies corresponde ao dever de respeitar as opinies dos demais; o
direito de pedir o que se quer implica o dever de respeitar o
gireito de recusa do outro e assim por diante.
-
2. Desenvolvimento e socializaoA Psicologia do Desenvolvimento pode ser caracterizada
por um pluralismo conceituai e metodolgico que, historica
mente, evoluiu das posies organicistas e ambientalistas para uma viso mais ampla do ciclo vital contemplando tam
bm as perspectivas etolgica, ecolgica e histrico-cultural .
As concepes atuais sobre o desenvolvimento humano des
tacam o papel das interaes organismo-ambiente, especial
mente o ambiente social, sobre as mudanas relativamente
duradouras que ocorrem, tanto nas caractersticas da pes
soa como no padro de suas interaes com o ambiente. As
interaes sociais tm sido entendidas como um importante
fator do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento
socioemocional dos indivduos, A anlise do desenvolvi
mento humano, visto como trajetria no linear de mudanas ao longo do ciclo vital, enfatiza os processos din
micos de construo, reconstruo e plasticidade das ca
ractersticas individuais em transao contnua com as ca
ractersticas do ambiente. O desenvolvimento ocorre, portanto, em um sistema dinmico de interaes que determi
nam e so determinadas por outras, sob influncia das carac
tersticas gentico-constitucionais e psicolgicas adquiridas
ao longo dessas interaes, bem como das condies fisiolgicas presentes e das caractersticas imediatas e mais amplas
do ambiente atuai12.
De um ponto de vista abrangente, grande parte do ambi
ente sociocultural, entendendo-se o cultural como produto
historicamente acumulado das relaes dos homens entre si
e com a natureza. A ao recproca (interao) entre o indiv
duo e seu ambiente sociocultural est na base da construo
de relaes sociais13, continuamente afetando e sendo afeta -
11. Ver: Palcios, J. (1995). Introduo psicologia evolutiva: Histria, conceitos bsicos e metodologia. Em: C. Coll, J. Palcios c A. Marchesi (Orgs.), Desenvolvimento psicolgico e educao: Psicologia evolutiva (p. 9-26). Porto Alegre: Artes Mdicas (Volume 1).
12- Ver Novak, G. (1996). Developmental psychology: Dynamical systems and behavior analysis. Reno: Nevada: Context Press.
13. Ver: Hindc, R.A. (1981). Obra j citada neste captula.
-
das por suas cognies, emoes e ao. O esquema que se
gue mostra os principais processos envolvidos no desenvolvi
mento das relaes interpessoais.
O desenvolvimento da sociabilidade humana pode ser
entendido como o conjunto de modificaes que ocorrem, ao
longo do ciclo vital, na qualidade e natureza das relaes e
interaes com as outras pessoas e, concomitantemente, nos
processos cognitivos, afetivos e conativos a elas associados14.
Cognio, emoo e conao podem ser entendidos como componentes de um sistema nico, que transacionam entre si e
com o ambiente social15. Diante de uma situao, social nova,
h uma percepo social ou seja., o indiydua a interpreta comcramadora, amistosa, ambgua ou familiar (cognio), simultaneamente sente medo, curiosidade ou raiva (emoo)
e reage abertamente a ela (conao). No possvel isolar es
ses processos16.
Considerando os processos cognitivos, a socializao da
criana inicia-se pelo reconhecimento que ela faz das pessoas
14. Ver: Lpez,F. (1995). Desenvolvimento social e da personalidade. Em: C. Coll,
J. Palcios c A. Marchesi (Orgs.), Dcsenvoivi mento psicolgico e educao: Psicologia evolutiva (p. 81-93). Porto Alegre: Artes Mdicas (Volume 1).
15. Ver: Lega, LJ, Caballo, V.E. c Ellis, A. (1997). Teoria yprctica de la terapia racional emotivo-conductital. Madrid: Siglo XXI dc Espana.
16. Antnio Damsio apresenta uma argumentao fundamentada de que os processos emocionais c racionais no podem ser isolados c que a emoo serviu evolutivamente dc base para o desenvolvimento de processos cognitivos importantes no
plano pessoal social. Ver: Damsio, A, (1994/199S), obra j citada neste captulo,
-
c das demandas das situaes possibilitando a diferenciao
entre conhecidos e estranhos que se relacionam ao desenvol
vimento da identidade social, atravs de autocategorizao
c categorizao dos demais em termos de gnero, idade, papel
social etc. incluindo o reconhecimento de si e dos comporta
mentos dela esperados. Essa cognio social importan
te para a aquisio de padres comportamentais de auto-
cuidado, auto-apresentao, comportamentos pr-sociais e
opositivos e de outras habilidades (principalmente regras
de convivncia). Com relao afetividade, ocorre a for
mao de vnculos que se iniciam com as figuras de apego do ambiente familiar e se generalizam para outras pes
soas, associada experincia com as diferentes emoes.
Os trs processos (cognitivo, afetivo e comportamental) es
to presentes no desenvolvimento das habilidades de reso
luo de problemas impostos pelo ambiente social e que
exigem habilidades de discriminar e responder a estmulos
sociais e, simultaneamente, aos prprios eventos internos
(pensamentos e sentimentos).
Incidentes no ambiente social ou exigncias da subcultu-
ra grupai podem prejudicar o desenvolvimento harmonioso
dos padres acima referidos, favorecendo a aquisio de esti
los disruptivos (anti-sociais) nas relaes interpessoais, ge
rando conseqncias indesejveis para o indivduo e seu en
torno. Por outro lado, a competncia em habilidades sociais,
particularmente as assertivas ou de enfrentamento, tem sido
vista como fator de proteo e resilincia para um funcionamento psicossocial adaptativo do indivduo diante dos fato
res de risco que se apresentam em sua histria de vida17.
O desenvolvimento pode ser considerado deficitrio quan
do permanece aqum do esperado para o grupo demogrfi-
co-cultural em que o indivduo est inserido. Quando a falta
de determinadas habilidades sociais se torna crtica, pode ca-
17. Sobre faLores dc risco c proteo, vulnerabilidade e rcsilicncia associados ao desenvolvimento socioafettvo c ao desenvolvimento geral, ver, por exemplo: Haggerty, R.J., Sherrod, L.R., Garmczy, N. e Rutter, M. (orgs.), C1996). Stress, risk and resilience in children and adolescents: Processes, mechanisms and inteiventions. Cambridge: Cambridge University Press.
on
-
verbal desenvolve-se posteriormente observando-se, a partir dos seis meses, que os sons e as palavras vo se aprimorando
at chegar ao manejo da fala significativa. A habilidade de
expressar sentimentos muito importante para o desenvolvi
mento saudvel. Alguns pais inadvertidamente bloqueiam a
expresso de sentimentos, punindo, ignorando ou no lhe dando importncia e, ainda, exagerando na ateno seletiva
a formas inapropriadas de express-los.
To logo quanto possvel, a criana necessita aprender a
conhecer seus sentimentos, primeiramente atribuindo-lhes
~s nornTconsensualmente aceitos. Por exemplo, nomeia-se
medo quando certas reaes fisiolgicas, psicolgicas e motoras ocorrem, tais como sudorese, batimento cardaco ace
lerado, tremores, abrir demasiadamente os olhos ou cobri-los, correr e esconder-se, procurar proteo junto aos
pais etc. A alegria corresponde a um outro conjunto de rea
es e assim por diante^Alm dJdentificao, ela deve
prender a lidar com os sentimentos de forma adequada, ou
seja."sabef que pode sentir raiva, inclusive de seus pais, re
conhecer gue invejou o colega cujo trabalho fo{"premiado e
admitir que tambm ama e sente compaixo por um animal
ferido ou por algum que no tem o que comer. Essa uma
aprendizagem_feita penosamente pela maioria .dos-adttltos, mas jjgtes^ap ajudarem os filhos^jjodem minimizarjhes as dificuldades desse processo, tornand3~ni"saudvel aven
tura de autodesoberta.
As relaes pais-filhos vm sendo discutidas, na literatu
ra especializada, em termos de estilos parentais caracteriza
dos com base em suas estratgias de controle, responsivida- de e afetividade19. Muitos estudos associam os estilos paren
tais (por exemplo, autoritrios, negligentes ou democrti
cos) ao desenvolvimento das habilidades sociais e da compe-
19. Ver: Glasgow, K., Dornbusch, S., Troyer, L., Steinberg, L. e Ritter, P. (1997).
Parenting styles, adolescents'attribunons and educational outcomes in nLne heterogeneous high schools. Child Development, 68, 507-509. Entre os poucos estudos da literatura nacional sobre essa temtica, pode-se destacar: Pacheco, J.T.B., Teixeira, M.A.P. e Gomes, W.B. (1999). Estilos parentais e desenvolvimento de habilidades
sociais na adolesccncia. Psicoogia: Teoria t Pesquisa, 15(2), 117-126,
-
tencia sociai aas crianas e uusjuvcua, iuciuiih.l1Uu
es com auto-estima, condutas pr-sociais e empatia, auto
controle e agressividade dos filhos. As relaes entre irmos
e com os demais parentes, a se incluindo as relaes interge-
racionais, constituem uma fonte adicional de satisfao, mas
tambm de muitos conflitos potenciais. Os conflitos entre ir
mos podem, em muitos casos, representar oportunidades de
experimentao de habilidades de enfrentamento, com maior controle das possveis conseqncias indesejveis. As habili
dades sociais contribuem para minimizar conflitos e maximi
zar a satisfao nas relaes familiares.
_Ao ingressar na escola, a criana constri novos conheci-
mentos amplaflda-saa-compreenso social. As relaes com companheiros da mesma idade, mais velhos ou mais novos,
so essenciais nesse processo. As brincadeiras e os jogos so
experiencias significativas para a apreenso da organizao
social, a aprendizagem de regras, a identificao de habilida
des associadas aos diferentes papis e, portanto, para o de
senvolvimento da competncia social. As demandas do con
texto escolar e do grupo de companheiros induzem tambm
ao raciocnio pr-social e moral e tomada de perspectiva
que constituem uma base importante para o desenvolvimento
de vrias habilidades, especialmente a de empatia. Alm da
nfase no desenvolvimento da linguagem e na assimilao
das estruturas de comunicao verbal, importantes para a
competncia social, as relaes com os colegas estabelecem
um conjunto de condies que podem modelar as caractersticas do desempenho social do indivduo. As relaes de
amizade, o status social adquirido no grupo, as experincias
de aceitao e rejeio e as preferncias que nele se formam
esto relacionados com os comportamentos de cooperao,
ajuda, seguimento de regras, controle de raiva e agressivi
dade e outros indicadores de competncia social nessa fase.
A influncia do grupo de companheiros, especialmente se as
sociada a outros fatores de risco, pode, tambm, induzir
comportamentos anti-sociais e outras condutas disruptivas com
prometendo o desenvolvimento de relaes interpessoais sa
tisfatrias e desejveis.
-
j h f c v * * * fcv* o v V r k t i i i ^ i c y > c i L /
Dois outros personagens vm ganhando proeminncia
na ocupao do tempo da criana: a televiso e o computa
dor. A cada dia que passa, avolumam-se as informaes so
bre a influncia deles no comportamento das crianas e dos
adultos. Em 1998, a ONU (Organizao das Naes Unidas)
realizou pesquisas sobre as emissoras de televiso aberta no
Brasil. Analisando 71 horas de desenhos animados, encon
trou uma ocorrncia de 20 crimes a cada 60 minutos de pro
gramao. Alm disso, verificou que a violncia nos dese
nhos e filmes assusta menos as crianas do que a do cotidiano, exibida no noticirio das emissoras. Uma das concluses
que a influncia da televiso est diretamente associada ao
tempo de exposio e qualidade da programao disponvel. Se os relacionamentos que vem so de carter agressi
vo, elas podem, em algumas situaes, exibir o mesmo com
portamento de seus heris ou dolos.
Com relao Internet, algumas pesquisas recentes20 mostram que considervel percentagem de jovens vem reduzin
do a quantidade e a qualidade de suas interaes face a face
e adquirindo hbitos de internautas que podem resultar em
isolamento social. Contrapondo-se a essa informao, alguns
tm respondido que a Internet um espao privilegiado para se fazer amizades e, inclusive, conhecer pessoas que no so
encontradas nos locais habituais de freqncia dos jovens.
Isto de fato verdadeiro e poderia ser melhor utilizado pelos
pais e pela escola. Todavia, essa resposta no invalida os da
dos de que: a) com a Internet um grande nmero de jovens reduziu suas possibilidades de contato social direto; b) o
contato social atravs da Internet difere significativamente da interao face a face; c) na interao face a face, as pesso
as se expem mais (o self verdadeiro fica mais disponibilizado) e, ao se darem a conhecer, tambm passam a obter maior
20. O jornat O Estado de S. -Paulo, DE 17/02/2000 (Caderno Geral A-13), apresentou reportagem bastante detalhada sobre pesquisas conduzidas por vrias universidades americanas sobre o hbito de internautas das crianas c adolescentes. Desconhecemos pesquisas conduzidas no Brasil a esse respeito.
44
-
conhecimento de si, uma vez que recebem/eedftac/ [.retroali
mentao)21 sobre seus desempenhos reais; d) o relaciona
mento via Internet exacerba a fantasia (a comear pelo pseudnimo) e reduz as oportunidades de um conhecimento ver
dadeiro incluindo-se, a, a impossibilidade de observao di
reta do desempenho em situaes sociais reais.
Outro instrumento poderoso sobre o qual a maioria dos
pais no dispe (por vrios motivos) de muito controle, so
os games. Na dependncia do tempo de exposio e do tipo de estimulao, esses jogos so eliciadores de um estado di
fuso de excitao e incitadores potenciais da agressividade.
A maioria desses jogos possui personagens (reais ou simbli
cos) violentos, destrutivos, impulsivos, guiados pela norma
retaliativa (olho por olho, dente por dente), fornecendo mo
delos de comportamento bastante inadequado para o desenvolvimento da competncia social.
Apesar desses problemas, esses instrumentos eletrnicos podem ser utilizados como aliados no desenvolvimento da
qualidade das relaes interpessoais. J existem, por exem
plo, games educativos, disponveis no mercado de alguns pases22 destinados a ajudar pas e professores na educao das
crianas para a convivncia social. importante que os pes
quisadores brasileiros se interessem pela produo desse tipo de material til na educao, adequando-os nossa realida
de cultural e disponibilizando mais essa alternativa aos pais
e educadores em geral.
21. O termo feedback pode ser literalm-cntc traduzido por retroalimentao. Nas cincias humanas, e em particular na Psicologia, o uso do termo em ingls amplamente conhecido e aceito, razo por que tambm se manter esta forma ao lo ago do
livro.
22. Ver, por exemplo: Social skiflgamf Learning to get along with people. Game board and supllies by PCI Educational Publishing; FUchars, K. e Pal Ion, M, Cause and tiffect Card Games. Two Decks of Game Cards and Other Game Supplies. Published by Psychological Corp. Esses games podem ser acessados era http://www.idyllar- bor.com/gamcs/M369.HTM.
45
-
CONTEXTOS E DEMANDAS DE HABILIDADES SOCIAIS
Eu mesmo,Se transponho o umbral enigmtico,Fico outro ser,De mim desconhecido.
C. Drummond de Andrade
Os diferentes contextos dos quais participamos contribuem, de algum modo, para a aprendizagem de desempe
nhos sociais que, em seu conjunto, dependem de um repert
rio de habilidades sociais. A decodificao dos sinais sociais, explcitos ou sutis, para determinados desempenhos, a capa
cidade de selecion-los e aperfeiodos e a deciso de emi
ti-los ou no so alguns dos exemplos de habilidades apren
didas para lidar com as diferentes demandas das situaes
sociais1 a que somos cotidianamente expostos.
O termo dem anda pode ser compreendido como oca
sio ou oportunidade diante da qual se espera um determinado desempenho social em relao a uma ou mais pessoas.
As demandas so produtos da vida em sociedade regulada
pela cultura de subgrupos. Quando algumas pessoas no con
seguem adequar-se a elas (principalmente as mais importantes) so consideradas desadapiadas provocando reaes de
vrios tipos. O exemplo mais extremo o do fbco social que
1. Ver; Argyte, M., Fumham, A. c Graham, J.A. (1981). Social situations. Cambridge: Cambridge University Press.
-
MHO consegue Itspoiiuei is u c l h i i j .i j i m i . i p u i u u u u \ . * u i j u j
contextos, isolando se no grupo familiar e, mesmo neste, mantendo um contato social bastante empobrecido.
Quando, por alguma razo, um contexto prov aprendi
zagem de determinadas habilidades sociais, mas no cria opor
tunidade para que sejam exercidas, as necessidades afetivas
;i elas associadas podem no ser satisfeitas. Em nossos pro
gramas de desenvolvimento de relaes interpessoais com
universitrios, os estudantes freqentemente apresentam di
ficuldade de expressar carinho (apesar do desejo de faz lo)
porque, em suas famlias, seus pais no incentivam e nem
mesmo permitem "essas liberdades.
Ao nos depararmos com as diferentes demandas sociais,
precisamos inicialmente identific-las (decodific-las) para,
em seguida, decidirmos reagir ou no, avaliando nossa com
petncia para isso. A identificao ou decodificao das de
mandas para um desempenho interpessoal depende, critica
mente, da leitura do ambiente social, o que envolve, entre
outros aspectos:
1 a) ateno aos sinais sociais do ambiente (observao e
escuta);
b) controle da emoo nas situaes de maior complexi
dade;
c) controle da impulsividade para responder de imediato;
d) anlise da relao entre os desempenhos (prprios e
de outros) e as conseqncias que eles acarretam.
No muito fcil identificar os sinais que, a cada momen
to, indicam demandas para desempenhos excessivamente ela
borados. Por exemplo, quando o ambiente social extrema
mente ameaador, pode provocar ansiedade, requerendo
respostas de enfrentamento ou fuga que variam na adequa
o s demandas. Em outras palavras, como se o indivduo dissesse a si mesmo:
S Aqui esperado que eu... (leitura do ambiente social ou das demandas);
-
iise da prpria necessidade de reagir a uma demanda);
S Acho melhor no dizer nada agora... (deciso quanto a apresentar ou no um desempenho em determinado momento).
Diferentes tipos de demandas interpessoais podem apa
recer sob combinaes variadas. Algumas combinaes, no
entanto, parecem tpicas de contextos especficos e reque
rem conjuntos de habilidades sociais que podem ser cruciais
para a qualidade dos relacionamentos a desenvolvidos. O
contexto mais significativo da vida da maioria das pessoas o familiar. Alm deste, podem-se destacar, como inerente
vida social na maior parte das culturas, a escola, o trabalho,
o azer, a religio e o espao gera] de cotidianidade (ruas,
praas, lojas etc.). Segue-se uma anlise dos contextos familiar, escolar e de trabalho que, no obstante suas especifi-
cidades, contemplam tambm muitas das habilidades sociais
requeridas nos demais.
1. O contexto familiarA vida familiar se estrutura sobre vrios tipos de relaes
(marido-mulher, pais-flhos, entre irmos e parentes) com
uma ampla diversidade de demandas interpessoais. O de
sempenho das habilidades sociais para lidar com elas pode
ser uma fonte de satisfao ou de conflitos no ambiente fami
liar. Dada a inevitabilidade de conflitos2, o carter saudvel
de muitos deles depende da forma de abord-los e resol
v-los3, o que remete, em ltima instncia, competncia so
cial dos envolvidos.
2. Ver: Johnson, D.W. c Johnson, R.T. (1996). Conflict resolution and peer mediation programs in elementary secondary schools: An overview of the research. Review of Educational Research, 66(4), 459-506.
3. Ver: Barclcy, D.R. e Houts, A.C. (1995). Parenting skills: A review and development analysis of training contcnt. Em W. ODonohuc cL, Krasner (Eds.), Handbook o f psychological skills training. Cfim'rai techniques and applications. Boston: AJIyn and Bacon.
-
kaoes conjugais
Embora, na sociedade atual, as pessoas j possuam um
razovel conhecimento de seu parceiro antes de optarem
por uma vida em comum, mesmo assim, com o passar do
tempo, pode ocorrer a deteriorao de alguns comporta
mentos mutuamente prazerosos (reforadores) e o apareci
mento ou maximizao de outros de carter aversivo. Em
um relacionamento novo, cada pessoa procura exibir ao outro o melhor de si mesma, mas, ao longo do tempo, o cotidi
ano domstico pode alterar drasticamente esse repertrio.
Alm disso, a maioria das pessoas, ao se casarem, possuem al
gumas idias romnticas sobre o amor4 que, alm de no se
concretizarem, dificultam a identificao e o enfrentamento
das dificuldades conjugais.
Considerando o conceito de compromisso (referido no
Captulo 2), crucial para o caso das relaes conjugais, a qua
lidade desse relacionamento depende, criticamente, de quanto os cnjuges investem na sua continuidade e otimizao. O
auto-aperfeioamento de ambos em habilidades sociais conju
gais garante, em parte, esse compromisso. No entanto, quan
do apenas um dos parceiros alcana um desenvolvimento so-
cioafetivo rpido, diferenciando-se excessivamente do outro, ele pode reavaliares prprios ganhos na relao como insatis
fatrios e dispor-se busca de relacionamentos alternativos,
provocando a sua ruptura. Uma fonte de ruptura ocorre, por
tanto, quando h uma ausncia de compromisso com a pr
pria relao e/ou com o desenvolvimento do outro.
Em uma reviso da literatura de pesquisas sobre Terapia
Conjugal, Gottman e Rusche5 identificaram algumas habilidades essenciais para a qualidade do relacionamento conju
gal, destacando aquelas associadas aprendizagem e ao con-
4- Gottman, J. e Rushe, R. (1995). Communication and social skills approaches to treating ailing marriages: A recommendation for a new marital therapy called "Minimal Marital Therapy1 (p. 287-305). Em W. QDonohue e L. Krasner (Eds.), Handbook o f psychological skills training: Clinical techniques and applications. Boston: Allyn and Bacon.
5. Gottman, J. e Rushe, R. (1995), obra ja cicada.
-
liuic uuo usiciuu^ dJCLivui quti uestMJLaueiim cunrutos e reau-
zem a capacidade de processamento de informaes. Tais
habilidades incluem: acalmar-se e identificar estados de des
controle emocional em si e no cnjuge, ouvir de forma no
defensiva e com ateno, validar o sentimento do outro, re
organizar o esquema de interao do casal de modo a romper
o ciclo queixa-crtica-defensividade-desdm. Acrescentam,
tambm, a este conjunto, a habilidade de persuadir o cnjuge a no tomar nenhuma deciso enquanto o estado de excita
o psicofisiolgica estiver sem autocontrole adequado.
Freqentemente, um dos cnjuges expressa pensamen
tos e sentimentos de forma explosiva, extrapolando nas
queixas e crticas. Se a reao do outro seguir na mesma di
reo, gera descontrole de ambos e uma alta probabilidade
de manuteno do ciclo descrito acima, o que tende a piorar
ainda mais a situao. Da a importncia da habilidade de
acalmar o outro. Ouvir no defensivamente permite que o
cnjuge exponha por completo o seu pensamento e pode
servir para validar seu sentimento (empatia). Adicionalmen
te, a fala calma facilita a organizao do contedo da mensa
gem, aumenta a probabilidade de clareza e, conseqentemente, de compreenso, tendo o efeito provvel de acalmar.
As situaes de conflito geralmente exigem outras habilida
des como as de admitir o erro, desculpar-se ou pedir mudan
as de comportamento.
Existem casais que so bastante atenciosos com amigos,
colegas de trabalho e pessoas que lhes prestam servio e, no entanto, deixam de dar essa mesma quantidade de ateno
ao cnjuge. A maioria que age assim parece no ter a inten
o de colocar o cnjuge em segundo plano, porm acaba
por negligenciar um elemento importante do relacionamen
to, ignorando situaes e oportunidades para exercer a habi
lidade de dar ateno.
Muitas vezes, a imagem idealizada, ou real no comeo do
reLarionamento, de uma pessoa bem-humorada, amvel, ca
rinhosa etc. vai se desvanecendo, gerando insatisfao e de
sinteresse. Bom humor, gentileza mtua, carinho e ateno
-
precisam ser cuitivaaos no couaiano aa reiaao. ^ara isso, e
muito importante a habilidade de prover conseqncias
positivas quando o cnjuge apresenta esses comportamen
tos. A sinceridade, no entanto, fundamental, caso con
trrio poder parecer que h pretenso de manipulao.
H um velho adgro popular que cai bem nesta situao:
amor com amor se paga. Em muitas situaes em que o comportamento do outro caminha na direo de desempe
nhos favorveis qualidade do relacionamento, pode ser im
portante que os cnjuges explicitem claramente esses aspec
tos, por meio da habilidade de dar feedback positivo. Da mesma maneira, pedir feedback uma habilidade que favorece uma avaliao conjunta.
So muitos os problemas resolvidos diariamente por apenas um dos membros da dade conjugal em assuntos
que afetam a ambos. Esses problemas, ou so corriqueiros,
ou possuem tal urgncia que demandam aes imediatas.
O partilhar decises pelo casal produz, no entanto, um
equilbrio nas relaes de poder, na medida que ambos de
cidem e so, igualmente, responsveis pelo xito ou fracas
so de todo empreendimento.
Um subgrupo particularmente relevante de habilidades
sociais conjugais representado pelas de relacionamento n
timo. Nesta categoria, os desempenhos sociais possuem ca
ractersticas singulares, com o padro no verbal tendo um
peso considervel na interao. O contedo (o que se diz), a forma (como se diz) e a ocasio (quando se dz) so compo
nentes importantes e precisam ser bem dosados e ajustados
s preferncias das pessoas envolvidas. Isso significa que re
quisitos no fundamentais em outros contextos ganham, aqui,
um estatuto especial como, por exemplo, as discriminaes
sutis das mensagens enviadas em cdigos e elaboradas no processo de interao.
Relaes pais-filhos
As relaes pais-filhos possuem um carter afetivo, edu
cativo e de cuidado que cria muitas e variadas demandas de
-
naDioaaaes sociais, u.exercicio aessas iaDiLiaaaes , em ge
ral, orientado para o equilbrio entre os objetivos afetivos
imediatos e os objetivos a mdio e longo prazo de promover
o desenvolvimento integral dos filhos e prepar-los para a
vida. Argyle* identifica trs estratgias bsicas pelas quais os
pais educam seus filhos: a) por meio das conseqncias (re
compensas e punies), b) pelo estabelecimento de normas,
explicaes, exortaes e estmulos e c) por modelao. Cada uma dessas estratgias baseia-se em aes educativas
que supem um repertrio elaborado e diversificado de habi
lidades sociais dos pais.
medida que crescem, os filhos desenvolvem interesses, idias e hbitos que podem gerar conflitos familiares. Nem
sempre fcil para os pais a identificao dos sinais que
apontam para a iminncia de um conflito entre eles e os fi
lhos ou para os estgios iniciais de um comportamento re
provado no contexto dos valores familiares. Inversamente,
tambm difcil identificar os estgios iniciais de um compor
tamento desejvel que pode estar sendo mascarado pela pre
dominncia de outros indesejveis. Na maioria das vezes,
presta-se mais ateno aos comportamentos que perturbam
ou quebram normas estabelecidas. Com freqncia os pais
buscam interromper esses comportamentos com medidas
punitivas ou corretivas que produzem resultados pouco efe
tivos porque os suprimem apenas momentaneamente e, ain
da, podem gerar vrios sentimentos negativos, como a raiva,
o abatimento, a revolta7 etc.
Essas situaes constituem ocasio para o exerccio de
um conjunto de aes educativas que podem alterar drasti
camente a qualidade da relao e promover comportamen
tos mais adequados dos filhos. A literatura enfatiza a impor
tncia de apresentar feedback positivo para os desempenhos
6. Argyle, M. (3967/1994). Psicologia dei componamicnto interpersonal. Madrid: Alianza Universidad.
7. Ver: Silva, A.T.B. (2000), Problemas de comportamento e comportamentos socialmente adequados: Sua relao com as habilidades sociais educativas dos pais. Dissertao de Mestrado. Programa de Ps-Graduao em Educao Especial. Universidade Federal dc So Carlos, So Carlos, SP.
-
considerados aaequaaos tao ogo eies ocorram, mugiai e iui-
necer conseqncias positivas incentivam e fortalecem de
sempenhos incipientes que, em etapas posteriores, sero man
tidos por suas conseqncias naturais. A maioria dos pais faz
isso quando est ensinando os filhos a andar, falar ou ler,
mas costuma negligenciar a apresentao de conseqncias
positivas quando se trata de comportamentos que conside
ram obrigao como estudar, organizar-se, demonstrar gen
tileza, apresentar iniciativa na soluo de pequenos proble
mas pessoais etc.
Muitos pais queixam-se de que, especialmente na adoles
cncia, os filhos se tornam esquivos, buscando maior contato
com os companheiros do que com eles. A adolescncia , sem
dvida, um perodo de grandes conquistas e descobertas por
parte dos jovens, podendo produzir inquietao aos pais. o
momento de experimentar as novas possibilidades cogniti
vas e o despertar sexual, mas tambm um perodo de grande
labilidade emocional, dadas suas alteraes hormonais. Em
qualquer etapa, mas particularmente nesta, so importantes
vrias outras aes educativas como as de combinar normas
e regras de convivncia coerentes com os valores familiares e estabelecer consenso sobre padres de conduta a serem as
sumidos por todos. Em outras palavras, decidir com os filhos como traduzir valores em comportamentos, o que implica em dilogo e nas habilidades a ele inerentes.
Assim como muitas situaes requerem o autocontrole
dos sentimentos evitando-se agravar conflitos potenciais,
outras podem requerer sua expresso. Em tais casos, embo
ra a demanda aparea sem se anunciar, a expresso de raiva
ou desagrado requer controle emocional se o objetivo for educativo mais do que meramente de descarga emocional.
A habilidade dos pais de expressar raiva e
desagrado fornece modelo de autocontrole. Quando esses
sentimentos so gerados por comportamentos dos filhos que
violam os acordos e as normas combinados, a situao pode
requerer a habilidade de defender os prprios direitos em
uma viso de reciprocidade.
-
jiju iiiuLLus monienios aa rejaao pais-mnos, ocorrem cri
ticas de ambos os lados. A maioria de ns tem facilidade em
fazer crticas que apenas humilham as pessoas, mas dificul
dade em apresentar as construtivas. Alm disso, a habilidade
de desculpar-se pode ser importante para diminuir ressenti
mentos e induzir atitudes construtivas em relao dificul
dade vivida.
2. O contexto escolarA Educao uma prtica eminentemente social que am
plia a insero do indivduo no mundo dos processos e dos produtos culturais da civilizao. A escola um espao privi
legiado, onde se d um conjunto de interaes sociais que se
pretendem educativas. Logo, a qualidade das interaes so
ciais presentes na educao escolar constitui um componen
te importante na consecuo de seus objetivos e no aperfei
oamento do processo educacional.
O discurso oficial sobre os objetivos e metas da institui
o escolar, preconizado e continuamente reafirmado em termos de formao para a vida e para a cidadania, j inclui, na
turalmente, a articulao entre aprendizagem e desenvolvi
mento. O desenvolvimento socioemocional no pode ser ex
cludo desse conjunto, especialmente quando se observa, nos dias atuais, uma escalada de violncia atingindo crianas e
jovens e manifestando-se, inclusive, no contexto escolar. H,
portanto, uma concordncia quase unnime sobre a necessi
dade de aprimoramento das competncias sociais de alunos,
professores e demais segmentos da escola.
Mas necessrio destacar a importncia de uma clara
compreenso sobre que tipo de habiLidadcs efetivamente
contrib