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  • Almir Del Prette / Zilda A.P. Del Prette

    .m itm , wmk t. >

    * "

    P S I C O L O G I A D A S

    RELAES INTERPESSOAIS

    V I V N 3

    T R A B A. . ^ - -i R A O

    M GRU

    I

  • www.facebook.com/groups/livrosparadownload

    www.slideshare.net/jsfernandes/documents

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Del Prette, AlmirPsicologia das relaes interpessoais : Vivncias para o trabalho em

    grupo / Almir Del Prette, Zilda A.P. Del Prette. Petrpolis, RJ : Vozes, 2001.

    Bibliografia.ISBN 85.326.2596-7

    1. Habilidades sociais 2. Psicologia social 3. Relaes interpessoais 4. Trabalho em grupo I. Del Prette, Zilda A.P. I. Ttulo.

    01.2861 CDD-158.2

    ndices para catlogo sistemtico:1. Relaes interpessoais : Psicologia aplicada 158.2

  • Alm ir Del Prette Zilda A.P. Del Prette

    PSICOLOGIA DAS RELAES

    INTERPESSOAISVIVNCIAS PARA O TRABALHO EM GRUPO

    EDITORA VOZES

    Petrpolis2001

  • 2001, Editora Vozes Ltda.

    Rua Frei Lus, 100

    25689-900 Petrpolis, RJ Internet: http://www.vozes.com.br

    Brasil

    Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra po

    der ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrnico ou mecnico, incluindo

    fotocpia e gravao) ou arquivada em qualquer sistema ou

    banco de dados sem permisso escrita da Editora.

    Editorao e org. literria: Orlando dos Reis

    ISBN 85.326.2596-7

    Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes ttda.

  • Dedicamos este livro a todos aqueles que contriburam para que as relaes entre as pessoas se tornassem cada vez mais humanasem especial aos dois grandes mestres:

    Jesus Cristo e Siddhartha Buda

  • SUMRIO

    Pr l o g o , 11

    1 - Pa r a d ig m a s e r e la e s in t e r p e s s o a is : osENFOQUES LINEAR E SISTMICO, 15

    1. Os novos paradigmas, 16

    2. Abordagens psicolgicas sobre as relaes interpessoais, 19

    A explicao linear, 22

    A explicaao sistmica, 25

    2 - D esenvo lv im en to d a com petncia s o c ia l e re la e s in terpessoa is , 30

    1. Critrios de competncia social, 33

    2. ^ Desenvolvimento e socializao, 37

    '^J\fam ia e a escola, 41

    A influncia da mdia na socializao, 44

    3 - Co n te x to s e d e m a n d a s de h a b il id a d e s so c ia is , 46

    1. O contexto familiar, 48

    Relaes conjugais, 49

    '^fy.elaes pais-filhos, 51

    ^2 . 0 contexto escolar, 54

    3. O contexto de trabalho, 56

    . 4 - h ab ilid ad es soc ia is p a ra uma n ova SOCIEDADE, 58

    Aprendendo a aprender: a automonitoria, 61

    2. Habilidades sociais de comunicao, 63

    Fazer e responder perguntas, 65

    Gratificar e elogiar, 66

    Pedir e dar feedback nas relaes sociais, 68

    Iniciar, manter e encerrar conversao, 70

  • 3. Habilidades sociais de civilidade, 72

    4. Habilidades sociais assertivas de enfren.tam.ento: direitos e

    cidadania, 73

    Manifestar opinio, concordar, discordar, 76

    Fazer, aceitar e recusar pedidos, 77

    Desculpar-se e admitir falhas, 78Esfaeiecer reiaconame7ito a/etivo/sexuai, 79

    Encerrar relacionamento, 80

    Expressar raiva e pedir mudana de comportamento, 81

    Interagir com autoridades, 83

    lidar com crticas, 84

    5. Habilidades sociais empticas, 86

    6. Habilidades sociais de trabalho, 89

    Coordenar grupo, 90

    Falarem pblico, 91

    Resolver problemas, tomar decises e mediar conflitos, 93

    Habilidades sociais educativas, 94

    7. Habilidades sociais de expresso de sentimento positivo, 97t' Fazer amizades, 98

    j Expressar a solidariedade, 100

    : Cultivar o amor, 101

    5 - 0 USO DE VIVNCIAS EM PROGRAMAS DE TREINAMENTO DE HABILIDADES SOCIAIS, 103

    1. O que vivncia?, 106

    2. A estrutura das vivncias, 108

    3. A utilizao das vivncias, 110

    4. O facilitador de grupo: questes tcnicas e ticas, 114

    6 - V iv n c ia s p a r a a p r o m o o d e h a b il id a d e ss o c ia is , 1161. O meu nome ..., 116

  • 2. O nosso e o do outro, 117

    3. Caminhar alterando ritmo e movimento, 119

    4. Caminhos atravessados, 120

    5. Crculos mgicos, 122

    6. Conduzindo o outro, 125

    7. Mundo imaginrio, 127

    8. Nmeros poticos, 130

    9. A descoberta do corpo, 132

    10. Feedback: como e quando, 134

    11. Complemento indispensvel, 137

    12. O pndulo, 139

    13. Quebra-gelo, 140

    14. Direitos humanos e interpessoais, 141

    15. Reconhecendo e comunicando emoes, 145

    16. Dar e receber, 147

    17. Relmpagos, 149

    18. Perguntas sem respostas, 151

    19. Olhos nos olhos, 154

    20. Nem passivo nem agressivo: assertivo!, 156

    21. Histria coletiva oral, 160

    22. Contar e modificar histria, 162

    23. A tarefa de Atlas, 164

    24. O mito de Ssifo, 166

    25. Vivendo o papel do outro, 169

    26. Inocente ou culpado?, 171

    27. Pea o que quiser, 174

    28. Corredor brasileiro, 176

    29. Nasce uma rvore, 178

    30. Recolhendo estrelas, 180

  • 31. Formando um grupo, 182

    32. Trabalhando em grupo, 184

    33. Buscando sadas, 185

    34. Misto-quente, 189

    35. A fumaa e a justia, 191

    36. Entrada no cu, 194

    37. Sua vez, outra vez, 196

    38. Perdidos na ilha, 198

    39. Regresso no tempo, 200

    40. Avano no tempo, 202

    7 - A NECESSIDADE DE NOVAS RELAES INTERPESSOAIS, 205

    1. Novos fatos e suas conseqncias, 210

    2. Propostas para um novo padro relacional, 212

    Interdependncia, 217

    Aceitao, 219

    Solidariedade, 220

    3. O desenvolvimento da sociabilidade e as novas relaes

    interpessoais, 221

    Referncias bibliogrficas, 223

  • PROLOGO

    0 interesse pelos temas pertinentes qualidade das re

    laes interpessoais parece refletir hoje uma preocupao

    geral com problemas a elas associados: a violncia, o preconceito, a intolerncia, o desrespeito etc. No entanto, o leitor

    interessado no assunto deste livro, ao procurar obras simila

    res nas livrarias, praticamente nada encontrar, a no ser

    que se dirija ao setor de importados onde, ento, principal

    mente na seo de Psicologia, ir se deparar com vasta litera

    tura. A predominncia da literatura estrangeira no significa que, entre ns, os problemas interpessoais no alcancem a

    amplitude verificada nos demais pases e por isso no atraiam

    a ateno dos pesquisadores. A constatao de que o investi

    mento em pesquisa no pas ainda pequeno no esclarece muito. Supor que o pblico em geral tem pouco interesse ou

    busca proteger-se atravs da indiferena pode tambm no

    corresponder realidade, considerando o teor das matrias dos jornais, revistas e da mdia em geral que, insistentemen

    te, veiculam esse assunto.

    Em nosso campo, a Psicologia, observamos na ltima d

    cada a presena constante dessa temtica e correlatas nos

    principais congressos no pas. Os artigos sobre habilidades

    sociais, desenvolvimento de relaes interpessoais, assertivi- dade e inteligncia social vm marcando presena freqente

    nas pginas de nossas revistas cientficas, Em nossa Universidade, a equipe que trabalha com Treinamento em Habilida

    des Sociais no consegue dar conta da demanda por pales

    tras, cursos e solicitaes de programas nessa rea. Isso re

    fora a idia de que h, de fato, um interesse crescente pela temtica abordada neste livro.

    Nos contatos com pessoas que participam de nossos cur

    sos e com leitores de nosso livro Psicoogia das habilidades sociais: terapia e educao, fomos incentivados a preparar este

  • novo traoamo, voitaao para uma exposio mais aerainaaa

    de nossa prtica e, em particular, do mtodo vivencial que

    desenvolvemos. Pedem-nos, inclusive, a apresentao de um

    programa-padro para desenvolvimento de habilidades so

    ciais. Relutamos bastante porque, sem entrar em maiores de

    talhes, temos feito uma avaliao muito negativa das publica

    es apressadas que buscam mercado colando-se s teorias e

    aos temas em ascenso. Nossa resistncia foi minada pelos argumentos dos colegas, de que o leitor faz o seu prprio julga

    mento, valorizando os trabalhos que se apiam em pesquisas

    e publicaes que do suporte prtica. Outro argumento foi

    que nosso mtodo vivencial j foi testado inmeras vezes e

    que deveramos agora d-lo a conhecer ao pblico em geral.

    Cedemos a esses arrazoados e preparamos com bastante cuidado este novo livro, escrito a quatro mos. Mesmo quando um de ns iniciava um captulo, o outro fazia a reviso e o

    completava. Ao final, fizemos revises conjuntas com a espe

    rana de atender expectativa e confiana dos leitores. No obstante definirmos esta obra na perspectiva do desenvolvi

    mento das relaes interpessoais, muitas das idias aqui enfa

    tizadas no aparecem em outros textos nossos e queremos

    mencionar a importncia de vrios pensadores para a consoli

    dao das idias aqui expostas: Edgard Morin, Humberto Ma- turana, Peter Trower, Michael Argyle, Fritjof Capra. Conside

    rando a importncia de se explorar novos substratos de anli

    se das relaes entre as pessoas, realizamos uma tentativa ini

    cial de aplicao da viso sistmica na compreenso dessa temtica. Estamos conscientes de que essa anlise ainda no

    est completa e permanecemos abertos s crticas dos leito

    res buscando o aperfeioamento das idias aqui registradas.

    Este livro pode ser dividido em duas partes. A primeira

    compe-se dos quatro captulos iniciais. No primeiro, discu

    timos as mudanas paradigmticas nas cincias em geral e, em particular, na Psicologia, situando os modos de pensar as

    relaes interpessoais nos enfoques linear e sistmico. Nos

    captulos seguintes, apresentamos as noes de desenvolvi

    mento das relaes interpessoais, os conceitos fundamentais

  • v_ia a i c a , a aucuiDC u t u c i c u l c as i i d i u c~

    mandas de desempenhos interpessoais e um sistema de organizao das habilidades sociais, em termos de requisitos e

    complexidade com a descrio de cada uma delas.

    Na segunda parte, composta pelos trs captulos finais,

    trazemos ao leitor as bases do mtodo vivencial e uma estru

    tura analtica para a organizao das vivncias em um pro

    grama de interveno voltado para a promoo das habilidades apresentadas na seo anterior. Inclumos tambm a des

    crio de quarenta vivncias a serem utilizadas em progra

    mas de Treinamento de Habilidades Sociais. No captulo de encerramento, analisamos os problemas humanos em um

    mundo globalizado, enfocando principalmente a questo das relaes interpessoais.

    Muitas pessoas contriburam, direta ou indiretamente, para a realizao deste livro. Gostaramos de agradecer: aos

    colegas, aos alunos que passaram pela disciplina Psicologia das Habilidades Sociais e enfrentaram conosco o desafio de aprender e promover novas formas de relacionamento. Agra

    decemos particularmente s pessoas, que utilizaram seus

    momentos de descanso lendo e dando sugestes que permiti

    ram o aperfeioamento deste trabalho: Alcione Vital, Giova-

    na Del Prette, Jos Fernando da Costa Vital, Lucas Del Prette,

    Maria Eny R. Paiva, Mirella Lopez Martnez, Roseli G. Cavalcanti e Tnia Maria De Rose.

  • 1PARADIGMAS E RELAES INTERPESSOAIS:

    OS ENFOQUES LINEAR E SISTMICO

    05 tempos em que vivemos, meu caro, no permitem que se lhes faa trapaa com a Psicologia.

    Thomas Mann

    Por que as pessoas se comportam da maneira como o fazem? Essa pergunta recorrente nos cursos de Psicologia, mas

    no so os estudantes os nicos interessados em respond-la.

    As mais diferentes respostas vm sendo dadas a essa questo

    ao longo do tempo. Podemos supor duas vertentes gerais de

    explicao para o comportamento das pessoas, ambas orien

    tadas pelos paradigmas cientfco-culturais em vigor. A primei

    ra vem sendo denominada de explicao linear e est associada ao paradigma newtoniano-cartesiano, tambm chamado

    clssico. A segunda, com base no paradigma holstico, foi ba

    tizada de sistmica, ou ainda de complexidade'1.

    Segue-se um breve resumo dos dois paradigmas junta

    mente com explicaes que orientam a anlise de questes

    pertinentes compreenso das demandas e desempenhos in

    terpessoais, foco de interesse deste livro.

    1. Sobic cssc tema existem vrias referencias na lngua portuguesa, Entre outros, ver: Capra, F. (1982). O ponto de mutao. So Paulo: Cultrix; Di Biasi, F. (1995). 0 homem holstico. Pctrpolis: Vo2.es; Mariotti, H. (2000). As paixes do ego: complexidade, poltica e solidariedade. So Paulo: Palas Athena; Maturana, H. (1998).Da biologia psicofogio. Porto Alegre: Artes Mdicas.

    15

  • x . K j iiu v u p itr a u ig m a

    Kuhn2, em seu Livro A estrutura das revolues cientificas, analisou de forma bastante detalhada as transformaes que

    estavam ocorrendo na esfera da cincia e seus paradigmas.

    Outros autores tambm contriburam com essa anlise e,

    cerca de trinta anos depois, fala-se hoje abertamente, sem nenhum temor, o que alguns diziam timidamente em um

    passado no muito distante: compartimentalizao do saber, modeLos reducionistas, vises ps-positivistas da cin

    cia, holismo etc.

    Como em outras cincias, tambm na Psicologia o debate sobre paradigmas, epistemologia, objeto, metodologia etc.

    ganha amplo espao nos dias atuais. A Psicologia pode ser entendida como uma cincia em estgio multiparadigm- tco3 que, at o momento, no superou essa caracterstica,

    produzindo conhecimento multiforme com vrias matrizes

    filosficas e tericas de difcil integrao.

    H, no entanto, um esprito novo, uma nova maneira

    de enfrentar questes atuais e antigas a respeito da episte

    mologia, do valor heurstico da maioria das investigaes

    e da cientificidade da Psicologia. Pode-se falar em uma ati

    tude mais aberta para considerar posies divergentes e,

    portantoj mais favorvel discusso entre pesquisadores com diferentes formaes. A perplexidade que tomou con

    ta das cincias naturais com relao aos paradigmas e aos

    debates que nela ocorreram possivelmente se converteu

    em um sopro vivificador, inspirando os tericos e pesquisa

    dores da Psicologia.

    2. Kuhn,T.S. (1978). A estrutura das revolues cientificas. So Paulo: Perspectiva.

    3. A questo controversa, j que, tomando por modelo as outras cincias, alguns autores situam a Psicologia, conforme perspectiva kuhniana, em um estgio pr-paradigma tico e outros cm estgio multiparadigmtico. Nossa posio est mais detalhada em: Del Prette, Z.A.P. e Del Prette, A. (1995). Notas sobre pensamento e linguagem em Skinncr e Vygotsky. Psicoo^ia: Reflexo e Crinca, 8, 147-164. Ver, tambm: Mastcrman, M. (1979). A natureza de um paradigma. Em: L. Lakatos e A. Musgrave (Orgs.), A crtica < o desenvolvimento do conhecimento. So Paulo: Cul- trix-Edusp.

    16

  • e. no amoito da Psicologia social que o entrentamento

    desse debate ganhou mais fora, em parte devido sua so

    breposio e caracterizao nas vrias psicologias e, em

    parte, porque os psiclogos sociais vm, h cerca de quatro

    dcadas4, discutindo as crises na disciplina: de identidade,

    de prtica profissional, de busca de articulao entre mkro-

    teorias e outros temas correlatos.

    No final da dcada de oitenta, aps vrias discusses em

    diferentes simpsios, foi realizado na Europa um evento di

    rigido para a temtica dos paradigmas, contando com a par

    ticipao da maioria dos autores que j vinham discutindo

    as questes referidas5. Naquele evento, alm de outras con

    cluses, observou-se que na Psicologia Social coexistem

    duas compreenses generalizadas da disciplina. Uma de

    fende a Psicologia Social como uma cincia natural, supon

    do que o comportamento seja regulado por mecanismos ca

    usais internos a serem explicitados atravs de rigorosa investigao emprica com orientao metodolgica hipotti-

    co-dedutiva. A outra d nfase induo e rejeita a causa-

    o interna como varivel independente, mas aceita a in

    vestigao emprica rigorosa, incluindo a a experimenta

    o, ainda que no somente. Alguns autores, conforme Je-

    suno6, propuseram uma sntese entre essas duas formas de

    entender a Psicologia Social. Essa terceira posio, como

    era de se esperar, carrega ainda certa ambigidade, no

    sendo possve pelo momento a emergncia de uma sntese

    acabada dessas duas vises predominantes.

    Pesquisadores de outros campos da Psicologia tambm

    se vem s voltas com esses problemas. Na Psicologia do De

    senvolvimento, h algum tempo se tem feito crticas forma

    4. Ver: Duck, S. (1980). Taking the past to heart: One of the futures of Social Psychology? Em: R. GilmourcS. Duck (Eds.), Tke development o f Social Psycholog)'. London: Academic Press.

    5. Do-s nomes mais conhecidos na Psicologia Social no Brasil, podemos citar Stroc- be, Zajonc, Nutdn, DoLse, Moscovici, Harr, Gcrgen, Semin, Lcmaine e Kruglanski.

    6. Jesuno, J.C. (1995). A Psicologia Social europia. Em: J. Vala e M.B. Mortteiro (orgs.), Psicologia Social. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian.

    17

  • tradicional de investigao posLtivista ao aesenvojvimento

    humano7. Altman e Rogoff8 fazem uma anlise da evoluo

    dos modelos ao longo da histria da Psicologia dando desta

    que a quatro vises de homem que influenciaram os pressu

    postos epistemolgicos e metodologias de pesquisa na cin

    cia psicolgica; a de trao, a interacionista, a organsmico-sis-

    tmica e a transacional.

    As duas primeiras so influenciadas pela viso positivis

    ta. A de trao enfatiza a causalidade interna dos fenmenos

    psicolgicos e a interacionista desloca a causaao para os es

    tmulos do ambiente. Ambas tm, como suporte bsico, pelo menos na sua constituio, o experimentalismo de laborat

    rio para o estudo de seu objeto. Na perspectiva sistmica, o

    modelo causai deixa de ser linear (tipo funo) e passa a ser

    visto em suas relroalimentaes circulares onde a idia de

    causa e efeito substituda pela noo de reciprocidade

    de influncia. Essa orientao holstca sendo possvel, no

    entanto, focalizar partes do sistema ou subsistemas, man-

    tendo-se a idia de uma certa clivagem observador-obser-

    vado. A perspectiva transacional entendida por Altman e

    Rogoff como o estudo das relaes em mudana entre as

    pectos psicolgicos e ambientais, partindo da premissa de

    que estes so inseparveis, incluindo-se o pesquisador como

    parte do sistema a ser estudado. Nessas duas ltimas vertentes, a contextualizao dos dados e a busca de compre

    enso so condies importantes do fazer pesquisa e a dife

    rena principal entre ambas reside na nfase da ltima sobre a continuidade temporal, a historicidade e a transitorie-

    dade dos fenmenos e na implicao do observador sobre o

    conhecimento produzido.

    7. Ver, por exemplo: Branco, A. e Ferraz -da Rocha, R. (1998). A questo da metodologia na investigao do desenvolvimento humano. Psicologia; Teoria c Pesquisa, 14 (3 ), 251-258; Bronfenbrenncr, V. (1977). Toward an experimental ecology of human development. American Psychologist, 32, 513-531.

    8. Altman, I. e Rogoff, B. (1987). World view in Psychology: Trait, interactional, or- ganismic and transaccionai perspectives. Hm: D. Stokolse I. Altman (Eds.), Handbook o f enviromcntal psychology. New York: Wiley.

  • j-.rriDora simpuncaaa, acreaitamos que essa exposio seja

    sulidente para mostrar um panorama geral do que ocorre

    no mbito da Psicologia neste incio do sculo XXI. Ao lei

    tor entusiasmado com as possibilidades dos novos para

    digmas na Psicologia, recomendamos cautela e reflexo

    sobre as psicologias enfeitadas com rtulo de holismos,

    nova viso etc., pois que, freqentemente, muitos des-

    srs trabalhos refletem apenas um discurso dissociado de qualquer investigao emprica sobre o objeto a que se re

    lerem. A fala de Soczka9, ele prprio defensor de nova ori-

    rntao (denominada de ecolgica) para a Psicologia Social,

    jusdfica bem esse alerta:

    O conhecimento -e reconhecimento - de que a realidade social uma totalidade serve muitas vezes de justificao para substituir a investigao cientfica do social pelo simples discurso interpretativo e vago acerca dessa mesma realidade.

    Alm disso, a adoo de novos paradigmas e metodologi

    as no significa o descarte dos conhecimentos produzidos por

    investigaes orientadas sob outras vises, mesmo aqueles

    que no alcanaram aceitao ou que aguardam a chegada

    de novos tempos para serem revisitados. No se pode negar a

    cumulacidade do conhecimento historicamente construdo

    cm vrias reas da investigao psicolgica, ainda que seja

    difcil a generalidade nas cincias humanas.

    2. Abordagens psicolgicas sobre as relaesinterpessoais

    O interesse da Psicologia pelas relaes interpessoais , pode-se dizer, to antigo quanto a prpria formao dessa

    disciplina. Na Psicologia clnica, h uma longa tradio de

    estudos sobre essa temtica nos mais diferentes referenciais, como o comportamental, o cognitivista, as orientaes psico-

    dinmicas, as denominadas humanistas com base em Rogers

    9. Soczka, L. (1995). Para uma pcrspcctiva ecolgica em Psicologia Social. Em: J. Vala e M.B. Monteiro (Orgs), Psicologia Social. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian.

  • e iviasiow* e, mais ik^ciilcijiciilc: auiua, C.R.,e Rosenberg, R.L (1977). Apcssoacnmo centro. So Paulo: EPU/EDUSP.

    11. Ver, entre outros: Bateson, G. (1985). Pasos hacia una ecologia de la wente. Buenos Aires: Carlos Lobl; Grof, S. (1984). Psychologie transpersonnelle. Mnaco: Ro cher; Grof, C. eGrof, S. (1990). A tempestuosa busca do ser. Sic Paulo: Cultrix; La- ing. R. (1987). O eu dividido. Pctrpolis: Vozes; Walsh, R. e Vaughan, F. (Orgs.), Alm do ego: Dimenses transpessoais cm Psicologia. So Paulo: Cultrix/Pensamento; Wilber, K. (1989). Q espectro da conscincia. So Paulo: Cultrix.

    12. O mtodo teraputico denominado de Treinamento Assertivo foi elaborado por dois terapeutas sul-africanos, radicalizados nos Estados Unidos: Wolpe e Lazarus. Ver: Wolpe, J.S. (1976). A prtica da terapia comportamentai So Paulo: Brasilien- se; Lazarus, A. (1977). Psicoterapia personalista: Uma viso alm do condicionamento. Belo Horizonte: Interlivros. O treinamento assertivo foi popularizado pelo livro Your perfect right, de Robert E. Alberti c Michael L. Emmons, que havia alcanado, em 1989, a20aedio c vendido 800 mil exemplares. O mtodo teraputico Treinamento de Habilidades Sociais teve sua origem com um projeto sobre habilidades: sociais coordenado por Michacl Argyle, durante quinze anos, na Universidade de Oxford, na Inglaterra. As obras pioneiras com traduo para a maioria dos pases europeus e Estados Unidos foram: Argyle, M. (1967). The Psychology o f interpersonal behaviour. London: Penguin e Argyle, M. e Trowcr, P. (1979). Person to person: Ways o f communicating. London: Multimedia Publications. Para melhor detalhamento da constituio c histria dessas reas, o leitor poder recorrer ao nosso artigo: Del Prette, Z.A.P. e Del Prette, A. (2000). Treinamento em habilidades sociais:

    Panorama geral da rea. Em V.G.Haasc, R.. Rothe Neves, C.Kappler, M.L.M. Teodo- roe G.M.O- Wood (Eds.), Psicologia do Desenvolvimento: Contribuies interdiscipli- nares (p. 249-264). Belo Horizonte: Health.

    20

  • MLuamieiiLe, c ic s uujs iiiuvjiiiciiius aii_
  • nic] Golemanlb, onde o autor resenha os vrios conceitos e

    teorias nessa temtica e resume as principais investigaes so

    bre o desenvolvimento emocional, tambm contribuiu para

    aumentar o interesse e a compreenso sobre as relaes in

    terpessoais, principalmente por colocar em destaque as questes inerentes ao sentimento e emoo em suas ligaes com

    a cognio e o comportamento.

    As teorias e conceitos do campo terico-prtico das habi

    lidades sociais e das relaes interpessoais possuem unia his

    tria de conhecimento produzida sob a perspectiva linear, ra

    ramente encontrando-se propostas de investigao ou de in

    terveno em uma viso sistmica. A seguir, apresentaremos

    ao leitor essas duas perspectivas, explorando possibilidades

    identificadas em ambas e defendendo uma perspectiva sist

    mica para a epistemologia e a heurstica na rea do THS.

    A explicao linear

    Em uma perspectiva linear, todos ns somos tentados a

    explicar nossa maneira de agir considerando as possveis relaes causa-efeito com base na contgidade da ao com

    eventos antecedentes e/ou conseqentes. Alm disso, leva

    mos em conta os eventos internos, os quais tm sido nomea

    dos de vontade, desejo, conscincia etc. A todo momento,

    damos e recebemos explicaes do tipo: Fiz isso porque de me provocou', Sempre tive vontade de responder-lhe assim; Agi de acordo com a minha conscincia.

    Em que pese a variabilidade dos termos utilizados, con

    cordamos que a nossa maneira de ser e agir afetada por va

    riveis do ambiente (caractersticas fsicas, sociais e/ou cul

    turais de uma dada situao) e, tambm, por variveis in-

    tra-individuais (crenas, percepes, sentimentos). Quando,

    diante de uma mesma situao, observamos duas pessoas apresentarem respostas bastante diferenciadas, tendemos a

    fazer alguns acrscimos em nossas explicaes, como por

    exemplo: Ao ser ofendidoj Mrio reagiu altura porque cora

    16. Goleinan, D. (1995). Inteligncia emocional. Rio dc Janeiro: Objetiva.

    00

  • joso e Pedro calou-se, fo i pusilnime. Entre os profissionais da rea da Psicologia, as explicaes incluem um vocabulrio

    mais elaborado sobre conceitos, fatores e processos psicol

    gicos do tipo: um melhor treino de tolerncia frustrao, estado de excitao difusa, dessensibilizao diante de estimulao ameaadora, fortalecimento do ego. Independentemente do discurso, se leigo ou especializado, as explicaes oscilam

    entre os determinantes endgenos e os exgenos.

    Uma sntese entre essas explicaes vem sendo tentada

    h muitas dcadas. Entre as muitas tentativas, merece aten

    o, na Psicologia Clnica, a proposta de Ellis, cuja formao psicanaltica o levou a desenvolver uma abordagem terapu

    tica por ele denominada de Terapia Racional-Emotva. Du

    rante algum tempo, dedicando-se a auxiliar pessoas que precisavam de ajuda e a contribuir na formao de novos profis

    sionais, Ellis foi colecionando informaes relevantes que o

    levaram a considerar tambm a importncia das variveis

    ambientais sobre o comportamento, tanto na base dos pro

    blemas como na manuteno das melhoras obtidas pelos

    seus clientes. Essa mudana de posio imps a necessidade

    de alterar a designao de seu mtodo para Terapia Racional

    Emodvo-Comportamental17.

    No obstante a possibilidade de integrar alguns nveis de

    anlise e com isso superar redues por demais restritivas sobre o objeto em estudo, essas snteses no correspondem a

    um olhar holstico, permanecendo ainda em um paradigma

    newtoniano. Nessa perspectiva, a Psicologia herda conceitos

    e valores correspondentes aos das cincias exatas, tais como

    regularidade, uniformidade, previsibilidade e controle. A ra

    cional lgica a de que, se o universo possui uma estrutura material formada por tomos que se movimentam dentro de

    leis fixadas nas dimenses espao-tempo, todos os processos

    vivos, de alguma maneira, tambm assim podem ser definidos e enquadrados possuindo, portanto, leis gerais de funcio

    namento. Caberia ento s cincias que estudam essas reali

    17. Ellis, A. (1993). Changing Rational-Emotive Therapy (RET) to Rational Emoti

    ve Behavior Therapy (REBT), Behavioral Therapist, 16(10), 257-258.

    ->o

  • dades objetivas descobrir tais leis, propondo enunciados de

    regularidade e uniformidade que permitiriam fazer previ

    ses mecnicas e probabilsticas sobre o comportamento dos

    organismos. Logo, quanto mais decomposto e aprofundado o

    conhecimento das partes, tanto maior seria o nosso conheci

    mento sobre o todo.

    Como essa forma de pensar produziu um avano extraor

    dinrio ao ser aplicada mecnica, resultando na revoluo industrial, a suposio foi que o mesmo deveria ou poderia

    acontecer quando empregada aos seres vivos. Foi na esteira

    dessa premissa que o interesse cientfico pela compreenso do funcionamento humano dividiu, com o propsito de pos

    teriormente integrar, algumas disciplinas que se ocupavam

    do assunto e tambm criou outras. Das veteranas Filosofia,

    Biologia, Psicologia, Psicanlise e Sociologia, a comparti-

    mentalizao do saber se estendeu Etologia, Psicobiologia,

    Sociobiologia, Neuropsicologia, no existindo sinais de que esse processo de fragmentao se interrompa a curto ou m

    dio prazo. No h dvida de que essas cincias trouxeram informaes relevantes sobre o funcionamento dos organismos

    em geral e do homem em particular. Essas informaes dinamizaram as cincias aparentadaSj projetando a Psicologia e a Psiquiatria como disciplinas aplicadas. Uma e outra descar

    taram algumas de suas posies anacrnicas e assimilaram o discurso cientfico em moda, produzindo diferentes conheci

    mentos e prticas, com pouco dilogo entre si.

    Esse processo criou a especializao e a subespecializa-

    o, isolando os pesquisadores. A multidisciplinaridade (v

    rias disciplinas estudando o mesmo objeto) passou, ento, a ser empregada na produo do conhecimento. Da progre

    diu-se para a interdisciplinaridade, buscando-se tambm o

    dilogo entre pesquisadores com diferentes formaes. Alcanamos agora, pelo menos em termos de proposta, a transdis-

    ciplinaridade, que preconiza a abolio das fronteiras entre as disciplinas e a cooperao entre os pesquisadores. Nesse

    processo, no deveria haver disciplinas (cincias) menores

    ou com aratus mais elevados. Assim considerando, o conheci-

  • mento transitaria de uma disciplina a outra, sendo aprimora

    do e resultando no enriquecimento das disciplinas em si mesmas at que elas prprias fossem abolidas.

    Isso tudo? Embora haja um desencanto generalizado rom a cincia, uma frustrao com as promessas no reali

    zadas do marxismo e uma grande desconfiana com os pres

    sgios de bem-aventurana da globalizao, muito se obte

    ve at o presente momento. Poder-se-ia acrescentar, entretanto, que todas as realizaes obtidas atravs da viso linear

    no foram capazes de solucionar os problemas atuais, justi

    ficando outras alternativas que vm sendo construdas ao longo do tempo.

    A explicao sistmica

    Um sistema pode ser entendido como uma combinao ordenada de partes que interagem para produzir um resulta

    do. A viso sistmica constitui uma tentativa de compreen

    der a influncia recproca entre as partes d um sistema Xsus subsistemas) e entre sistemas e seu entorno. Todo-subsiste

    ma possui relativa autonomia, mas , ao mesmo tempo, componente de sistemas mais amplos. A decomposio de um

    sistema em subsistemas (ou a recomposio destes em siste

    mas mais amplos) depende da perspectiva de investigao do observador.

    Se, na viso linear, o esforo pela superao da dicoto

    mia e do reducionismo, atravs da integrao de diferentes anlises e da contextualizaao do objeto nas investigaes,

    no significa uma mudana paradigmtica, tambm na pers

    pectiva sistmica a decomposio do sistema em subsistemas

    no constitui uma contradio s suas premissas. Alm disso,

    a possibilidade de decomposio no implica em sua substi

    tuio pela abordagem linear nem em uma idenrificao com ela. Em outras palavras, a viso sistmica no se prope

    como alternativa irreconcilivel a outras formas de compre

    enso do mundo. A relao entre esses modelos, como a en

    tendemos, no se assenta na dicotomia do isto ou aquilo, porm na posio concilivel do isto c tambm aquilo.

  • Ao talarmos das limitaes do experimentalismo de labo

    ratrio em Psicologia Social, no antecipamos nenhuma no

    vidade. Apenas repetimos o que outros18 apontaram, embora

    faamos coro com o sentimento de insatisfao. A hipersim-

    plificao do ambiente do laboratrio, a incerteza dos sujei

    tos quanto possibilidade de interpretao correta dos pa

    dres normativos de desempenho, a relao atemporal entre

    os sujeitos e entre estes e o pesquisador configuraram uma artificialidade tal que contribuiu para muitas das objees

    recorrentes, familiares aos estudiosos da rea. Alguns pes

    quisadores construram, criativamente, no laboratrio, ambientes anlogos s situaes da sociedade. Essas investiga

    es trouxeram um impacto formidvel, ganhando densidade de denncia e, desse modo, contriburam para uma refle

    xo sobre vrias instituies: a cultura que desenvolvem, os

    valores sobre quais se organizam, os papis que esses valores

    exercem, os seus efeitos positivos ou negativos etc.

    Estendendo a reflexo para a temtica das relaes inter

    pessoais em uma perspectiva sistmica, a decomposio

    do desempenho social em diversos nveis de habilidades

    (molares ou amplas e moleculares ou restritas), supon

    do-as sempre em um contnuo e no em uma relao dico

    tmica, faz sentido se, e apenas se entendermos o desem

    penho como conjunto de subsistemas do indivduo inte

    grados ao seu ambiente. O ambiente no se refere apenas a

    situaes especficas, mas tambm a contextos como famlia,

    escola, sociedade, cultura.

    Qualquer programa visando o desenvolvimento de habi

    lidades sociais, de carter remediativo ou preventivo deve,

    nesta perspectiva, possibilitar ao participante uma compre

    enso de suas dificuldades interpessoais para alm do pensa

    mento linear, ou seja, para alm da causao imediata dos fatores intra-individuais ou localizados nas variveis da situa

    18. Ver: Gcrgcn, RJ. (1973). Social Psychology as history. Jorjuici of Personality and Social Psychology, 26,309-330; Harre, R. (1980). Making Social Psychology scientific. Em G. Gilmoui c S. Ouck (Eds.), The development of Social Psycholog)'. London: Acadcmic Press.

  • i^ o. Pessoas-chave cm sua vida seriam ento reconstrudas"

    no ambiente teraputico a partir de sua percepo que, nessa

    nova perspectiva, tende a se refinar. A entrada simblica des

    ses significantes no programa obedece aos princpios defini

    dos em nosso trabalho anterior19, de respeito aos direitos hu

    manos e de equilbrio nas relaes de poder.

    O risco do pensamento linear, aplicado ao contexto tera

    putico, o de tomar o outro como responsvel pelas dificul

    dades do cliente que apresenta a queixa e, da, supor que cnbe ao processo desenvolver habilidades deste para lidar

    com aquele. Simplificando, tende-se a cair no pressuposto vencer/derrotar, inerente sociedade capitalista. Uma viso

    sistmica implicaria em considerar ambos como necessitados

    de ajuda e a relao como um processo de vrios componen

    tes. O pensamento subjacente que orienta essa viso o de co

    locar o outro, de quem o cliente se queixa, sejam pais, mes,

    filhos, ou qualquer outro significante, como participantes ati

    vos da relao, tanto em pensamento (crenas) como em sen

    timentos e comportamentos.

    Focalizar o processo teraputico em apenas um dos p

    los, desconsiderando a relao existente entre subsistemas,

    leva ao risco de ceder armadilha da lgica da organizao

    social capitalista, que a de preparar um para vencer o outro (ser mais competente). Nessa forma de olhar o problema, pa

    rece no existir lugar para respeito e compaixo. No h,

    nesta linha de pensamento, a possibilidade da terapia desen

    volver habilidades no cliente para que este auxilie o outro a

    ser feliz sem usar o poder coercitivo e de prover, a ambos, recursos para encontros saudveis, preenchidos por relaes

    igualitrias, fraternas e amistosas. E, no entanto, o que poderia ocorrer em uma perspectiva sistmica, uma vez que am

    bos, cliente e seu entorno (incluindo me, pai ou outra pes

    soa envolvida), seriam considerados integrantes de um siste

    ma mais amplo, reconhecendo-se que alteraes positivas

    19. Del Prcttc, Z.A.P. c Del lJrcttc, A. (3999). Psicologia das Habilidades Scciais: te

    rapia e educao. Peirpolis: Vozes.

    07

  • em um subsistema so geradoras defeedback para o prprio e produzem tambm mudanas em outros subsistemas.

    Um sistema representado por vrios componentes ou

    subsistemas interligados e interdependentes, em uma din

    mica prpria, dirigida a manter a sua organizao. Tome

    mos, por exemplo, os chamados fatores intra-indviduas,

    cognio e emoo. Ambos se afetam e afetam a maneira

    com que a pessoa reage aos estmulos do ambiente (que

    pode ser o comportamento de outro indivduo), caracterizando-se como subsistemas. Para entender uma parte, por

    exemplo, a emoo, preciso raciocinar de forma ampla e,

    ainda, incluir outros subsistemas, por exemplo, a famlia. A

    forma como cada sistema se organiza definidora de suas

    caractersticas e mudanas nas partes podem no atingir a

    totalidade, a menos que ocorram nos chamados pontos de

    alavancagem20, difceis de serem completamente definidos a priori, considerando-se as especificidades de cada sistema. No mximo, pode-se identificar possibilidades, mas sempre

    com uma boa dose de incerteza. A trade pensamento-senti-

    mento-ao pode ser considerada como subsistemas do siste

    ma humano. Qualquer processo teraputico ou educacional

    precisa levar em conta a articulao entre esses subsistemas

    e a possibilidade de identificar pontos de alavancagem em

    pelo menos um deles.

    Os sistemas humanos so determinados pela forma como seus componentes se relacionam entre si e isto lhe confere a

    estrutura. Pode-se dizer, nessa perspectiva, que as estruturas

    sempre se diferenciam, porque seus componentes possuem

    uma dinmica prpria (forma de relao, normas e regras).

    Por isso uma determinada realidade pode ser percebida de

    maneira diferente em diferentes momentos e por diferentes

    pessoas. Isso implica reconhecer que a realidade pode ser ob

    jetiva, mas a percepo dela sempre subjetiva. O exerccio

    20. Pontos de alavancagem so os elos mais frgeis, porm impon antes de um sistema que, ao serem mobilizados, podem produzir mudanas na totalidade. Ver, por exemplo: Marioui, H. (2000). As paixes do ego: complexidade, polkica e solidariedade. So Paulo: Palas Athcna (p. 86).

  • de perceber-se e perceber o outro pode ser aperfeioado pelo

    feedback que os sistemas provm; entretanto, cada indivduo sempre manter a sua prpria percepo da realidade. O poe

    ta rabe Kalil Gibran21 fala sobre isso com rara beleza. O tre

    cho que segue bem ilustrativo

    O astrnomo poder falar-vos dc sua compreenso do espao,mas no vos poder dar sua compreenso.Porque a viso de um homem no empresta suas asas a outro homem.

    Esse panorama geral de raciocnio serviu de base para a

    anlise e sntese (decomposio e composio) das habilidades sociais, a identificao de demandas e contextos e a for

    mulao da proposta do mtodo vivencial como instrumento de integrao dos subsistemas emoo, sentimento e compor

    tamento, em um programa de habilidades sociais sob a pers

    pectiva sistmica.

    21, Gibran, K.G. (1972). 0 profite. Rio de Janeiro; Expanso Editorial,

    nn

  • DESENVOLVIMENTO DA COMPETNCIA SOCIAL E RELAES INTERPESSOAIS

    O essencial saber ver,Saber ver sem estar a pensar,Saber ver quando se v E nem pensar quando .se v Nem ver quando se pensaMas isso (triste de ns, que trazemos a alma vestida) Isso exige um estudo profundo,Uma aprendizagem de desaprender.

    Fernando Pessoa

    2

    O Treinamento em Habilidades Sociais (THS), expres

    so recorrente ao longo desse livro, abrange uma rea origi

    nalmente associada Psicologia Clnica e do Trabalho, mas

    que se estende, atualmente, Psicologia Social, Educacional,

    do Desenvolvimento, Evolutiva etc. Inicialmente concebido

    como um mtodo teraputico1, o estatuto atual do THS per

    mite consider-lo tambm como uma rea de investigao

    tanto emprica quanto terica.

    As pesquisas no campo do THS tm mostrado que as pes

    soas socialmente competentes tendem a apresentar relaes

    pessoais e profissionais mais produtivas, satisfatrias e duradouras, alm de melhor sade fsica e mental e bom funcio

    namento psicolgico. Por outro lado, os dficits em habilida

    des sociais esto geralmente associados a dificuldades e con-

    1. Ver: Del Prcttc, Z.A.P. c Del Prctte, A. (2000). Treinamento cm habilidades sociais: Panorama geral da rea. Cm V.G. Haase, R. Rothe-Ncvcs, C. Kappler, M.L.M. Tcodoro, c G.M. 0. Wood (cds.), Psicologia tio Desenvolvimento: contribuies inter- rLsciplinares (p. 249-264). Belo Horizonte: Health.

    30

  • litos na relao com outras pessoas, por qualidade de vida

    e a diversos tipos de transtornos psicolgicos.

    O termo habilidades sociais se diferencia tanto do termo

    desempenho social como de competncia social2. O desem

    penho social refere-sc emisso de um comportamento ou

    seqncia de comportamentos em uma situao social qual

    quer. J o termo habilidades sociais refere-se existncia de

    diferentes classes de comportamentos sociais no repertrio

    do indivduo para lidar de maneira adequada com as deman

    das das situaes interpessoais. A competncia social tem

    sentido avaliativo que remete aos efeitos do desempenho so

    cial nas situaes vividas pelo indivduo. Muitas vezes, uma

    pessoa possui as habilidades, mas no as utiliza no desempe

    nho por diversas razes, entre as quais a ansiedade, crenas

    equivocadas e dificuldade de leitura dos sinais do ambiente.

    Na dinmica das interaes, as habilidades sociais fazem

    parte dos componentes de um desempenho social competente. A competncia social qualifica, portanto, a proficincia de um desempenho e se refere capacidade do indivduo de or

    ganizar pensamentos, sentimentos e aes3 em funo de

    seus objetivos e valores articulando-os s demandas imedia

    tas e mediatas do ambiente4.

    As relaes entre ao, razo e emoo, recorrentes na

    Psicologia, tm sido objeto de interesse tambm de outras

    cincias, especialmente da neurologia. Os sentimentos po

    dem depender de um sistema de mltiplos componentes que

    2. Ver ODonohue, W. c Krasner, L. (1995). Psychological skills training. Em W. ODonohue c L. Krasnci (Eds.), Handbook of psychological skills training: Clinical techniques and applications (p. 1-19). New York: Ally'll and Bacon.

    3. Os term os pensamento, componentes cognitivos e cognio tm sido utilizados de forma intcrcambivel c no sero objeto dc diferenciao nesta obra. 0 mesmo se aplica aos ccrmos sentimento, emoo e afeto c, tambm conao, ao c comportamento, os trs ltimos referindo-se ao desempenho aberto e publicamente observvel. O termo desempenho usado cm um sentido abrangente, incluindo aspec

    tos comportamcntais, cognitivos e afetivos.

    4. Trowcr chama a esses componentes de blocos construtores do desempenho social. Ver: Trowcr, P. (199S). Adult social skills: State of die art and future directions. Em W. ODonohue c L. Krasner CEds.), Handbook o f psychological skilb training: Clinical techniques and applications (p. 54-80), New York: Allyn and Bacon.

  • sao importantes na regulaao biolgica e, por outro lado, a

    razo dependeria de sistemas cerebrais que podem tambm

    processar sentimentos5. Essa posio contraria a noo carte

    siana com a qual nos acostumamos,, ou seja, a de compreen

    der a razo parte do organismo. Defende-se, aqui, que a

    anlise das relaes interpessoais deve levar em conta a tra

    de pensamento, sentimento e comportamento, independen

    temente de estes se apresentarem de forma coerente ou incoerente no desempenho do indivduo em uma dada situao.

    A coerncia entre cognio, emoo e comportamento

    usualmente designada pelos termos autenticidade, sinceridade e honestidade. No seu oposto, encontram-se as pala

    vras dissimulao, falsidade e mentira. Pode-se dizer que uma

    pessoa coerente quando, tanto quanto possvel, seus pensa

    mentos e sentimentos se refletem em suas aes e interaes

    com as demais.

    Considerando-se a educao para algumas prticas culturais, a grande maioria das pessoas no consegue evitar al

    gumas incoerncias'; So as chamadas mentiras sociais como,

    por exemplo, os convites que no expressam verdadeiros de

    sejos e os falsos elogios: passe l em casa...; espere um pouco para o jantar; no incmodo nenhum; seu caf est delicioso; no est gorda, parece at ter emagrecido. Observa-se, tambm, a conteno na expresso de certos sentimentos ou

    pensamentos com o propsito de preservar a auto-estima do

    outro ou evitar constrangimentos desnecessrios e conse

    qncias indesejveis.

    Tanto a incoerncia como a coerncia entre sentimentos,

    pensamentos e aes podem ser aprendidas. A aprendiza

    gem da incoerncia se d principalmente atravs de trs pro

    cessos que, quase sempre, incidem sobre a expresso mais do

    que. sobre, a experincia subjetiva de pensar e sentir: a) a ob

    servao e a imitao de padres de dissimulao de outrem;

    b) a punio para a expresso verdadeira de sentimentos e

    5. Ver: Damsio, A. (1994/1998). O erro de Descartes: Emoo, razo ec crebro humano. So Paulo: Companhia das Lctrasj Sacks, A. (1999). homem que confundiu sua mulher com um chapu. So Paulo: Companhia das Letras.

  • pensamentos; e c) a recompensa para a expresso no verda

    deira de sentimentos e pensamentos. Inicialmente a incoe

    rncia pode gerar desconforto e ansiedade, dificultando mais

    ui rida a expresso de sentimentos verdadeiros. Por outro Indo, esse desconforto pode ser abrandado e desaparecer to-

    l:ilmente quando a prpria pessoa passa a justificar a sua ma

    neira de agir, obtendo, com isso, satisfao por mentir, jul-

    jiindo-se muito esperta. Em outras palavras, ela desenvolve

    um esquema de auto-reforamento que, como se sabe, bas- linte poderoso na manuteno de padres de ao.

    1. Critrios de competncia socialOs encontros sociais no ocorrem no vazio. Eles se do

    cm determinados contextos e situaes especficos e so regidos por normas da cultura mais ampla ou da subeultura.

    Portanto, alm da dimenso pessoal (conhecimentos, senti

    mentos, crenas), o uso competente das habilidades sociais depende tambm da dimenso siruacional (contexto onde

    ocorrem os encontros, status do interlocutor, presena/au

    sncia de outras pessoas etc.) e da cultural (valores e normas do grupo).

    Defendemos a idia de que as pessoas socialmente competentes so as que contribuem na maximizao de ganhos e

    na minimizao de perdas para si e para aquelas com quem

    interagem. Assim, considerando a dimenso pessoal e os con-

    lextos situacional e cultural, o desempenho socialmente com

    petente aquele que - fundado na coerncia entre os subsis

    temas, afetivo, cognitivo e conativo - expressa uma leitura adequada do ambiente social, ou seja, decodifica corretamente os desempenhos esperados, valorizados e efetivos

    para o indivduo em sua relao com os demais. Alguns autores6 diferenciam as habilidades cognitivas (de percepo so

    cial e processamento de informao) das habilidades com-

    portamentais (verbais e no verbais), atribuindo s primei

    6. Ver, por exemplo: Trower (1995), anteriormente citado; Bedell, J.R., e Lennox, S.S. (1997). Handbook for communication and problem-solving skill training. New York: John Wiley e Sons.

  • ras a funo de definir, organizare guiar o desempenho social

    e s segundas, a de implementar a direo definida peos

    processos cognitivos. A maioria dos autores, no entanto, no

    faz essa diferenciao, agrupando os dois conjuntos como

    habilidades sociocognitivas ou, simplesmente, como habili

    dades sociais. Isto se aplica noo de timing7, essencial nas relaes interpessoais, que implica, simultaneamente, em

    processos de percepo e desempenho observvel.

    Em termos de efetividade, possvel atribuir competn

    cia social aos desempenhos interpessoais que atendem aos

    critrios de: a) consecuo dos objetivos da interao; b) ma

    nuteno ou melhora da auto-estima; c) manuteno e/ou

    melhora da qualidade da relao; d) maior equilbrio de ga

    nhos e perdas entre os parceiros da interao; e) respeito e ampliao dos direitos humanos bsicos8. Embora todos es

    ses critrios no sejam usualmente atendidos em uma mesma

    situao, pode-se afirmar que quanto mais deles so atendidos simultaneamente, maior competncia social pode ser

    atribuda ao indivduo.

    Os objetivos de uma interao social podem ser os mais

    variados9: transmitir ou obter conhecimentos, informaes

    ou compreenso; solicitar mudana de comportamentos, ati

    tudes, crenas ou estado emocional do outro; obter produtos

    desejados; supervisionar atividades; manter conversao tri

    vial. Supor que uma pessoa socialmente competente sempre atinge seus objetivos nas interaes com as demais uma no-

    7. A noo de rmng diz respeito sensibilidade para identificar o momento apropriado a determinado desempenho e para omiti-lo quando as condies do contexto assim o indicarem.

    8. EmoutTOs trabalhos, apresentamos os conceitos de direitos humanos e de equil

    brio de refora dores como critrios ou princpios que podem servir de orientao ao atendimenLo clnico ou interveno psicolgica. Ver, por exemplo: Del Prette, A.; Del Prette, Z.A.P. c Castelo Branco, U. V. 0-992). Competncia social na formao do psiclogo. Paidia: Cadernos de Educao, 2 (fev.), 40-50; Del Prette, A. (1982). Treinamento comportumental em gmpo junto populao imo dinica de baixa renda: Uma attlisc descritiva dc procedimento. Dissertao de Mestrado em Psicologia Clnica. Pontifcia Universidade Catlica dc Campinas, So Paulo.

    9. Ver: Argvle, M. (1967/1994). Psicologia, dei comportamiento interpersonal. Madrid: Alianza Universidad.

  • i;;in equivocada. Embora a consecuo dos objetivos espera

    dos seja um dos indicadores do desempenho socialmente

    competente, este no um critrio a ser considerado isolada

    mente. Uma pessoa pode., devido a outros fatores, no atingir os objetivos pretendidos na interao e, ainda assim, ser

    considerada competente sob os demais critrios. Por outro

    liido, ela pode atingir os objetivos de uma forma que no se

    ria considerada competente sob os demais critrios, por

    1'xemplo, por meio da agresso e da coero que prejudicam imediatamente, ou em mdio prazo, a qualidade da relao,

    ;i auto-estima e o equilbrio de poder.

    A auto-estima relaciona-se com os pensamentos e senti

    mentos elaborados pelo indivduo a partir de seus comporta

    mentos e das conseqncias deste no ambiente. Esses sentimentos sero tanto mais positivos quanto maior a segurana

    cia pessoa de estar fazendo o que acredita mais correto, mais

    justo, mais adequado, mesmo que no atinja os objetivos. Atin

    gir os objetivos gera satisfao e uma auto-avaliao positiva,

    inas, quando isso ocorre s custas de humilhao, autodepre-

    dao, falsas promessas, intimidao etc., pode, devido in

    coerncia entre pensamentos e aes, reverter em prejuzos

    para a auto-estima. A exceo a essa regra refere-se s pessoas

    psicologicamente doentes incluindo-se, aqui, as extremamen

    te ambiciosas e cnicas. Por outro lado, sacrificar os prprios objetivos ou priorizar as necessidades e direitos do outro, em

    detrimento dos prprios, comportando-se de forma passiva,

    usualmente tambm afeta a auto-estima e a autoconfiana trazendo a mdio ou mesmo a curto prazo insegurana e re

    laes sociais insatisfatrias para o indivduo.

    A manuteno ou melhoria da qualidade das relaes in

    terpessoais um indicador de competncia social associado,

    tambm, ao compromisso com a relao. A nossa compreen

    so de compromisso semelhante de Hinde10. Para esse au

    tor, o compromisso na relao se resume:

    10. Vcr: llindc, R.A. (1981, p. 14). The bases of a science of interpersonal relationships. F.m S. Duckc R. Gilmour (F.dsO, Personal Relationships 1: Studying personal relationships. New York: Academic Press.

  • ...extenso pela qua] os parceiros aceitam a continuidade da relao ou dirigem seu comportamento no sentido dc assegurar essa continuidade ou otimizar suas propriedades.

    Duas pessoas, coerentes no pensar, sentir e agir, tendem

    a pautar-se pela honestidade nas relaes, garantindo confi

    ana mtua e troca de estimulao positiva, fortalecendo

    dessa maneira o compromisso entre elas.

    Um dos critrios mais difceis de avaliao objetiva o do equilbrio de reforadores e de poder nas relaes, pois

    h muitos componentes subjetivos associados percepo

    de ganhos e perdas entre os participantes de uma intera

    o. Teoricamente, se um dos participantes obtm relati

    vamente maiores ganhos e sofre menores perdas do que o(s) outro Cs) pode-se falar em desequilbrio e, ao contr

    rio, verifica-se o equilbrio quando todos obtm o mximo

    de ganhos e o mnimo de perdas, em perodo de tempo mais

    ou menos semelhante. Isso produz uma circularidade posi

    tivamente reforadora, ou seja, com grande probabilidade

    de automanuteno da relao. As falhas na competncia social podem produzir ruptura nessa circularidade positiva,

    criando oportunidade para o aparecimento de comporta

    mentos aversivos, com conseqncia negativa para um ou

    ambos os envolvidos. Mesmo ocorrendo esforos no sentido

    de revitalizar a positividade da relao, algumas rupturas

    podem ter um carter excessivamente prolongado, induzin

    do deteriorao do relacionamento, principalmente quan

    do um dos participantes obtm relacionamentos alternativos

    mais satisfatrios.

    Os direitos interpessoais correspondem aplicao, na

    interao social, dos direitos humanos bsicos, entendendo-se que eles so vlidos para todos e que cada direito cor

    responde a um dever: o direito de expressar nossas opinies corresponde ao dever de respeitar as opinies dos demais; o

    direito de pedir o que se quer implica o dever de respeitar o

    gireito de recusa do outro e assim por diante.

  • 2. Desenvolvimento e socializaoA Psicologia do Desenvolvimento pode ser caracterizada

    por um pluralismo conceituai e metodolgico que, historica

    mente, evoluiu das posies organicistas e ambientalistas para uma viso mais ampla do ciclo vital contemplando tam

    bm as perspectivas etolgica, ecolgica e histrico-cultural .

    As concepes atuais sobre o desenvolvimento humano des

    tacam o papel das interaes organismo-ambiente, especial

    mente o ambiente social, sobre as mudanas relativamente

    duradouras que ocorrem, tanto nas caractersticas da pes

    soa como no padro de suas interaes com o ambiente. As

    interaes sociais tm sido entendidas como um importante

    fator do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento

    socioemocional dos indivduos, A anlise do desenvolvi

    mento humano, visto como trajetria no linear de mudanas ao longo do ciclo vital, enfatiza os processos din

    micos de construo, reconstruo e plasticidade das ca

    ractersticas individuais em transao contnua com as ca

    ractersticas do ambiente. O desenvolvimento ocorre, portanto, em um sistema dinmico de interaes que determi

    nam e so determinadas por outras, sob influncia das carac

    tersticas gentico-constitucionais e psicolgicas adquiridas

    ao longo dessas interaes, bem como das condies fisiolgicas presentes e das caractersticas imediatas e mais amplas

    do ambiente atuai12.

    De um ponto de vista abrangente, grande parte do ambi

    ente sociocultural, entendendo-se o cultural como produto

    historicamente acumulado das relaes dos homens entre si

    e com a natureza. A ao recproca (interao) entre o indiv

    duo e seu ambiente sociocultural est na base da construo

    de relaes sociais13, continuamente afetando e sendo afeta -

    11. Ver: Palcios, J. (1995). Introduo psicologia evolutiva: Histria, conceitos bsicos e metodologia. Em: C. Coll, J. Palcios c A. Marchesi (Orgs.), Desenvolvimento psicolgico e educao: Psicologia evolutiva (p. 9-26). Porto Alegre: Artes Mdicas (Volume 1).

    12- Ver Novak, G. (1996). Developmental psychology: Dynamical systems and behavior analysis. Reno: Nevada: Context Press.

    13. Ver: Hindc, R.A. (1981). Obra j citada neste captula.

  • das por suas cognies, emoes e ao. O esquema que se

    gue mostra os principais processos envolvidos no desenvolvi

    mento das relaes interpessoais.

    O desenvolvimento da sociabilidade humana pode ser

    entendido como o conjunto de modificaes que ocorrem, ao

    longo do ciclo vital, na qualidade e natureza das relaes e

    interaes com as outras pessoas e, concomitantemente, nos

    processos cognitivos, afetivos e conativos a elas associados14.

    Cognio, emoo e conao podem ser entendidos como componentes de um sistema nico, que transacionam entre si e

    com o ambiente social15. Diante de uma situao, social nova,

    h uma percepo social ou seja., o indiydua a interpreta comcramadora, amistosa, ambgua ou familiar (cognio), simultaneamente sente medo, curiosidade ou raiva (emoo)

    e reage abertamente a ela (conao). No possvel isolar es

    ses processos16.

    Considerando os processos cognitivos, a socializao da

    criana inicia-se pelo reconhecimento que ela faz das pessoas

    14. Ver: Lpez,F. (1995). Desenvolvimento social e da personalidade. Em: C. Coll,

    J. Palcios c A. Marchesi (Orgs.), Dcsenvoivi mento psicolgico e educao: Psicologia evolutiva (p. 81-93). Porto Alegre: Artes Mdicas (Volume 1).

    15. Ver: Lega, LJ, Caballo, V.E. c Ellis, A. (1997). Teoria yprctica de la terapia racional emotivo-conductital. Madrid: Siglo XXI dc Espana.

    16. Antnio Damsio apresenta uma argumentao fundamentada de que os processos emocionais c racionais no podem ser isolados c que a emoo serviu evolutivamente dc base para o desenvolvimento de processos cognitivos importantes no

    plano pessoal social. Ver: Damsio, A, (1994/199S), obra j citada neste captulo,

  • c das demandas das situaes possibilitando a diferenciao

    entre conhecidos e estranhos que se relacionam ao desenvol

    vimento da identidade social, atravs de autocategorizao

    c categorizao dos demais em termos de gnero, idade, papel

    social etc. incluindo o reconhecimento de si e dos comporta

    mentos dela esperados. Essa cognio social importan

    te para a aquisio de padres comportamentais de auto-

    cuidado, auto-apresentao, comportamentos pr-sociais e

    opositivos e de outras habilidades (principalmente regras

    de convivncia). Com relao afetividade, ocorre a for

    mao de vnculos que se iniciam com as figuras de apego do ambiente familiar e se generalizam para outras pes

    soas, associada experincia com as diferentes emoes.

    Os trs processos (cognitivo, afetivo e comportamental) es

    to presentes no desenvolvimento das habilidades de reso

    luo de problemas impostos pelo ambiente social e que

    exigem habilidades de discriminar e responder a estmulos

    sociais e, simultaneamente, aos prprios eventos internos

    (pensamentos e sentimentos).

    Incidentes no ambiente social ou exigncias da subcultu-

    ra grupai podem prejudicar o desenvolvimento harmonioso

    dos padres acima referidos, favorecendo a aquisio de esti

    los disruptivos (anti-sociais) nas relaes interpessoais, ge

    rando conseqncias indesejveis para o indivduo e seu en

    torno. Por outro lado, a competncia em habilidades sociais,

    particularmente as assertivas ou de enfrentamento, tem sido

    vista como fator de proteo e resilincia para um funcionamento psicossocial adaptativo do indivduo diante dos fato

    res de risco que se apresentam em sua histria de vida17.

    O desenvolvimento pode ser considerado deficitrio quan

    do permanece aqum do esperado para o grupo demogrfi-

    co-cultural em que o indivduo est inserido. Quando a falta

    de determinadas habilidades sociais se torna crtica, pode ca-

    17. Sobre faLores dc risco c proteo, vulnerabilidade e rcsilicncia associados ao desenvolvimento socioafettvo c ao desenvolvimento geral, ver, por exemplo: Haggerty, R.J., Sherrod, L.R., Garmczy, N. e Rutter, M. (orgs.), C1996). Stress, risk and resilience in children and adolescents: Processes, mechanisms and inteiventions. Cambridge: Cambridge University Press.

    on

  • verbal desenvolve-se posteriormente observando-se, a partir dos seis meses, que os sons e as palavras vo se aprimorando

    at chegar ao manejo da fala significativa. A habilidade de

    expressar sentimentos muito importante para o desenvolvi

    mento saudvel. Alguns pais inadvertidamente bloqueiam a

    expresso de sentimentos, punindo, ignorando ou no lhe dando importncia e, ainda, exagerando na ateno seletiva

    a formas inapropriadas de express-los.

    To logo quanto possvel, a criana necessita aprender a

    conhecer seus sentimentos, primeiramente atribuindo-lhes

    ~s nornTconsensualmente aceitos. Por exemplo, nomeia-se

    medo quando certas reaes fisiolgicas, psicolgicas e motoras ocorrem, tais como sudorese, batimento cardaco ace

    lerado, tremores, abrir demasiadamente os olhos ou cobri-los, correr e esconder-se, procurar proteo junto aos

    pais etc. A alegria corresponde a um outro conjunto de rea

    es e assim por diante^Alm dJdentificao, ela deve

    prender a lidar com os sentimentos de forma adequada, ou

    seja."sabef que pode sentir raiva, inclusive de seus pais, re

    conhecer gue invejou o colega cujo trabalho fo{"premiado e

    admitir que tambm ama e sente compaixo por um animal

    ferido ou por algum que no tem o que comer. Essa uma

    aprendizagem_feita penosamente pela maioria .dos-adttltos, mas jjgtes^ap ajudarem os filhos^jjodem minimizarjhes as dificuldades desse processo, tornand3~ni"saudvel aven

    tura de autodesoberta.

    As relaes pais-filhos vm sendo discutidas, na literatu

    ra especializada, em termos de estilos parentais caracteriza

    dos com base em suas estratgias de controle, responsivida- de e afetividade19. Muitos estudos associam os estilos paren

    tais (por exemplo, autoritrios, negligentes ou democrti

    cos) ao desenvolvimento das habilidades sociais e da compe-

    19. Ver: Glasgow, K., Dornbusch, S., Troyer, L., Steinberg, L. e Ritter, P. (1997).

    Parenting styles, adolescents'attribunons and educational outcomes in nLne heterogeneous high schools. Child Development, 68, 507-509. Entre os poucos estudos da literatura nacional sobre essa temtica, pode-se destacar: Pacheco, J.T.B., Teixeira, M.A.P. e Gomes, W.B. (1999). Estilos parentais e desenvolvimento de habilidades

    sociais na adolesccncia. Psicoogia: Teoria t Pesquisa, 15(2), 117-126,

  • tencia sociai aas crianas e uusjuvcua, iuciuiih.l1Uu

    es com auto-estima, condutas pr-sociais e empatia, auto

    controle e agressividade dos filhos. As relaes entre irmos

    e com os demais parentes, a se incluindo as relaes interge-

    racionais, constituem uma fonte adicional de satisfao, mas

    tambm de muitos conflitos potenciais. Os conflitos entre ir

    mos podem, em muitos casos, representar oportunidades de

    experimentao de habilidades de enfrentamento, com maior controle das possveis conseqncias indesejveis. As habili

    dades sociais contribuem para minimizar conflitos e maximi

    zar a satisfao nas relaes familiares.

    _Ao ingressar na escola, a criana constri novos conheci-

    mentos amplaflda-saa-compreenso social. As relaes com companheiros da mesma idade, mais velhos ou mais novos,

    so essenciais nesse processo. As brincadeiras e os jogos so

    experiencias significativas para a apreenso da organizao

    social, a aprendizagem de regras, a identificao de habilida

    des associadas aos diferentes papis e, portanto, para o de

    senvolvimento da competncia social. As demandas do con

    texto escolar e do grupo de companheiros induzem tambm

    ao raciocnio pr-social e moral e tomada de perspectiva

    que constituem uma base importante para o desenvolvimento

    de vrias habilidades, especialmente a de empatia. Alm da

    nfase no desenvolvimento da linguagem e na assimilao

    das estruturas de comunicao verbal, importantes para a

    competncia social, as relaes com os colegas estabelecem

    um conjunto de condies que podem modelar as caractersticas do desempenho social do indivduo. As relaes de

    amizade, o status social adquirido no grupo, as experincias

    de aceitao e rejeio e as preferncias que nele se formam

    esto relacionados com os comportamentos de cooperao,

    ajuda, seguimento de regras, controle de raiva e agressivi

    dade e outros indicadores de competncia social nessa fase.

    A influncia do grupo de companheiros, especialmente se as

    sociada a outros fatores de risco, pode, tambm, induzir

    comportamentos anti-sociais e outras condutas disruptivas com

    prometendo o desenvolvimento de relaes interpessoais sa

    tisfatrias e desejveis.

  • j h f c v * * * fcv* o v V r k t i i i ^ i c y > c i L /

    Dois outros personagens vm ganhando proeminncia

    na ocupao do tempo da criana: a televiso e o computa

    dor. A cada dia que passa, avolumam-se as informaes so

    bre a influncia deles no comportamento das crianas e dos

    adultos. Em 1998, a ONU (Organizao das Naes Unidas)

    realizou pesquisas sobre as emissoras de televiso aberta no

    Brasil. Analisando 71 horas de desenhos animados, encon

    trou uma ocorrncia de 20 crimes a cada 60 minutos de pro

    gramao. Alm disso, verificou que a violncia nos dese

    nhos e filmes assusta menos as crianas do que a do cotidiano, exibida no noticirio das emissoras. Uma das concluses

    que a influncia da televiso est diretamente associada ao

    tempo de exposio e qualidade da programao disponvel. Se os relacionamentos que vem so de carter agressi

    vo, elas podem, em algumas situaes, exibir o mesmo com

    portamento de seus heris ou dolos.

    Com relao Internet, algumas pesquisas recentes20 mostram que considervel percentagem de jovens vem reduzin

    do a quantidade e a qualidade de suas interaes face a face

    e adquirindo hbitos de internautas que podem resultar em

    isolamento social. Contrapondo-se a essa informao, alguns

    tm respondido que a Internet um espao privilegiado para se fazer amizades e, inclusive, conhecer pessoas que no so

    encontradas nos locais habituais de freqncia dos jovens.

    Isto de fato verdadeiro e poderia ser melhor utilizado pelos

    pais e pela escola. Todavia, essa resposta no invalida os da

    dos de que: a) com a Internet um grande nmero de jovens reduziu suas possibilidades de contato social direto; b) o

    contato social atravs da Internet difere significativamente da interao face a face; c) na interao face a face, as pesso

    as se expem mais (o self verdadeiro fica mais disponibilizado) e, ao se darem a conhecer, tambm passam a obter maior

    20. O jornat O Estado de S. -Paulo, DE 17/02/2000 (Caderno Geral A-13), apresentou reportagem bastante detalhada sobre pesquisas conduzidas por vrias universidades americanas sobre o hbito de internautas das crianas c adolescentes. Desconhecemos pesquisas conduzidas no Brasil a esse respeito.

    44

  • conhecimento de si, uma vez que recebem/eedftac/ [.retroali

    mentao)21 sobre seus desempenhos reais; d) o relaciona

    mento via Internet exacerba a fantasia (a comear pelo pseudnimo) e reduz as oportunidades de um conhecimento ver

    dadeiro incluindo-se, a, a impossibilidade de observao di

    reta do desempenho em situaes sociais reais.

    Outro instrumento poderoso sobre o qual a maioria dos

    pais no dispe (por vrios motivos) de muito controle, so

    os games. Na dependncia do tempo de exposio e do tipo de estimulao, esses jogos so eliciadores de um estado di

    fuso de excitao e incitadores potenciais da agressividade.

    A maioria desses jogos possui personagens (reais ou simbli

    cos) violentos, destrutivos, impulsivos, guiados pela norma

    retaliativa (olho por olho, dente por dente), fornecendo mo

    delos de comportamento bastante inadequado para o desenvolvimento da competncia social.

    Apesar desses problemas, esses instrumentos eletrnicos podem ser utilizados como aliados no desenvolvimento da

    qualidade das relaes interpessoais. J existem, por exem

    plo, games educativos, disponveis no mercado de alguns pases22 destinados a ajudar pas e professores na educao das

    crianas para a convivncia social. importante que os pes

    quisadores brasileiros se interessem pela produo desse tipo de material til na educao, adequando-os nossa realida

    de cultural e disponibilizando mais essa alternativa aos pais

    e educadores em geral.

    21. O termo feedback pode ser literalm-cntc traduzido por retroalimentao. Nas cincias humanas, e em particular na Psicologia, o uso do termo em ingls amplamente conhecido e aceito, razo por que tambm se manter esta forma ao lo ago do

    livro.

    22. Ver, por exemplo: Social skiflgamf Learning to get along with people. Game board and supllies by PCI Educational Publishing; FUchars, K. e Pal Ion, M, Cause and tiffect Card Games. Two Decks of Game Cards and Other Game Supplies. Published by Psychological Corp. Esses games podem ser acessados era http://www.idyllar- bor.com/gamcs/M369.HTM.

    45

  • CONTEXTOS E DEMANDAS DE HABILIDADES SOCIAIS

    Eu mesmo,Se transponho o umbral enigmtico,Fico outro ser,De mim desconhecido.

    C. Drummond de Andrade

    Os diferentes contextos dos quais participamos contribuem, de algum modo, para a aprendizagem de desempe

    nhos sociais que, em seu conjunto, dependem de um repert

    rio de habilidades sociais. A decodificao dos sinais sociais, explcitos ou sutis, para determinados desempenhos, a capa

    cidade de selecion-los e aperfeiodos e a deciso de emi

    ti-los ou no so alguns dos exemplos de habilidades apren

    didas para lidar com as diferentes demandas das situaes

    sociais1 a que somos cotidianamente expostos.

    O termo dem anda pode ser compreendido como oca

    sio ou oportunidade diante da qual se espera um determinado desempenho social em relao a uma ou mais pessoas.

    As demandas so produtos da vida em sociedade regulada

    pela cultura de subgrupos. Quando algumas pessoas no con

    seguem adequar-se a elas (principalmente as mais importantes) so consideradas desadapiadas provocando reaes de

    vrios tipos. O exemplo mais extremo o do fbco social que

    1. Ver; Argyte, M., Fumham, A. c Graham, J.A. (1981). Social situations. Cambridge: Cambridge University Press.

  • MHO consegue Itspoiiuei is u c l h i i j .i j i m i . i p u i u u u u \ . * u i j u j

    contextos, isolando se no grupo familiar e, mesmo neste, mantendo um contato social bastante empobrecido.

    Quando, por alguma razo, um contexto prov aprendi

    zagem de determinadas habilidades sociais, mas no cria opor

    tunidade para que sejam exercidas, as necessidades afetivas

    ;i elas associadas podem no ser satisfeitas. Em nossos pro

    gramas de desenvolvimento de relaes interpessoais com

    universitrios, os estudantes freqentemente apresentam di

    ficuldade de expressar carinho (apesar do desejo de faz lo)

    porque, em suas famlias, seus pais no incentivam e nem

    mesmo permitem "essas liberdades.

    Ao nos depararmos com as diferentes demandas sociais,

    precisamos inicialmente identific-las (decodific-las) para,

    em seguida, decidirmos reagir ou no, avaliando nossa com

    petncia para isso. A identificao ou decodificao das de

    mandas para um desempenho interpessoal depende, critica

    mente, da leitura do ambiente social, o que envolve, entre

    outros aspectos:

    1 a) ateno aos sinais sociais do ambiente (observao e

    escuta);

    b) controle da emoo nas situaes de maior complexi

    dade;

    c) controle da impulsividade para responder de imediato;

    d) anlise da relao entre os desempenhos (prprios e

    de outros) e as conseqncias que eles acarretam.

    No muito fcil identificar os sinais que, a cada momen

    to, indicam demandas para desempenhos excessivamente ela

    borados. Por exemplo, quando o ambiente social extrema

    mente ameaador, pode provocar ansiedade, requerendo

    respostas de enfrentamento ou fuga que variam na adequa

    o s demandas. Em outras palavras, como se o indivduo dissesse a si mesmo:

    S Aqui esperado que eu... (leitura do ambiente social ou das demandas);

  • iise da prpria necessidade de reagir a uma demanda);

    S Acho melhor no dizer nada agora... (deciso quanto a apresentar ou no um desempenho em determinado momento).

    Diferentes tipos de demandas interpessoais podem apa

    recer sob combinaes variadas. Algumas combinaes, no

    entanto, parecem tpicas de contextos especficos e reque

    rem conjuntos de habilidades sociais que podem ser cruciais

    para a qualidade dos relacionamentos a desenvolvidos. O

    contexto mais significativo da vida da maioria das pessoas o familiar. Alm deste, podem-se destacar, como inerente

    vida social na maior parte das culturas, a escola, o trabalho,

    o azer, a religio e o espao gera] de cotidianidade (ruas,

    praas, lojas etc.). Segue-se uma anlise dos contextos familiar, escolar e de trabalho que, no obstante suas especifi-

    cidades, contemplam tambm muitas das habilidades sociais

    requeridas nos demais.

    1. O contexto familiarA vida familiar se estrutura sobre vrios tipos de relaes

    (marido-mulher, pais-flhos, entre irmos e parentes) com

    uma ampla diversidade de demandas interpessoais. O de

    sempenho das habilidades sociais para lidar com elas pode

    ser uma fonte de satisfao ou de conflitos no ambiente fami

    liar. Dada a inevitabilidade de conflitos2, o carter saudvel

    de muitos deles depende da forma de abord-los e resol

    v-los3, o que remete, em ltima instncia, competncia so

    cial dos envolvidos.

    2. Ver: Johnson, D.W. c Johnson, R.T. (1996). Conflict resolution and peer mediation programs in elementary secondary schools: An overview of the research. Review of Educational Research, 66(4), 459-506.

    3. Ver: Barclcy, D.R. e Houts, A.C. (1995). Parenting skills: A review and development analysis of training contcnt. Em W. ODonohuc cL, Krasner (Eds.), Handbook o f psychological skills training. Cfim'rai techniques and applications. Boston: AJIyn and Bacon.

  • kaoes conjugais

    Embora, na sociedade atual, as pessoas j possuam um

    razovel conhecimento de seu parceiro antes de optarem

    por uma vida em comum, mesmo assim, com o passar do

    tempo, pode ocorrer a deteriorao de alguns comporta

    mentos mutuamente prazerosos (reforadores) e o apareci

    mento ou maximizao de outros de carter aversivo. Em

    um relacionamento novo, cada pessoa procura exibir ao outro o melhor de si mesma, mas, ao longo do tempo, o cotidi

    ano domstico pode alterar drasticamente esse repertrio.

    Alm disso, a maioria das pessoas, ao se casarem, possuem al

    gumas idias romnticas sobre o amor4 que, alm de no se

    concretizarem, dificultam a identificao e o enfrentamento

    das dificuldades conjugais.

    Considerando o conceito de compromisso (referido no

    Captulo 2), crucial para o caso das relaes conjugais, a qua

    lidade desse relacionamento depende, criticamente, de quanto os cnjuges investem na sua continuidade e otimizao. O

    auto-aperfeioamento de ambos em habilidades sociais conju

    gais garante, em parte, esse compromisso. No entanto, quan

    do apenas um dos parceiros alcana um desenvolvimento so-

    cioafetivo rpido, diferenciando-se excessivamente do outro, ele pode reavaliares prprios ganhos na relao como insatis

    fatrios e dispor-se busca de relacionamentos alternativos,

    provocando a sua ruptura. Uma fonte de ruptura ocorre, por

    tanto, quando h uma ausncia de compromisso com a pr

    pria relao e/ou com o desenvolvimento do outro.

    Em uma reviso da literatura de pesquisas sobre Terapia

    Conjugal, Gottman e Rusche5 identificaram algumas habilidades essenciais para a qualidade do relacionamento conju

    gal, destacando aquelas associadas aprendizagem e ao con-

    4- Gottman, J. e Rushe, R. (1995). Communication and social skills approaches to treating ailing marriages: A recommendation for a new marital therapy called "Minimal Marital Therapy1 (p. 287-305). Em W. QDonohue e L. Krasner (Eds.), Handbook o f psychological skills training: Clinical techniques and applications. Boston: Allyn and Bacon.

    5. Gottman, J. e Rushe, R. (1995), obra ja cicada.

  • liuic uuo usiciuu^ dJCLivui quti uestMJLaueiim cunrutos e reau-

    zem a capacidade de processamento de informaes. Tais

    habilidades incluem: acalmar-se e identificar estados de des

    controle emocional em si e no cnjuge, ouvir de forma no

    defensiva e com ateno, validar o sentimento do outro, re

    organizar o esquema de interao do casal de modo a romper

    o ciclo queixa-crtica-defensividade-desdm. Acrescentam,

    tambm, a este conjunto, a habilidade de persuadir o cnjuge a no tomar nenhuma deciso enquanto o estado de excita

    o psicofisiolgica estiver sem autocontrole adequado.

    Freqentemente, um dos cnjuges expressa pensamen

    tos e sentimentos de forma explosiva, extrapolando nas

    queixas e crticas. Se a reao do outro seguir na mesma di

    reo, gera descontrole de ambos e uma alta probabilidade

    de manuteno do ciclo descrito acima, o que tende a piorar

    ainda mais a situao. Da a importncia da habilidade de

    acalmar o outro. Ouvir no defensivamente permite que o

    cnjuge exponha por completo o seu pensamento e pode

    servir para validar seu sentimento (empatia). Adicionalmen

    te, a fala calma facilita a organizao do contedo da mensa

    gem, aumenta a probabilidade de clareza e, conseqentemente, de compreenso, tendo o efeito provvel de acalmar.

    As situaes de conflito geralmente exigem outras habilida

    des como as de admitir o erro, desculpar-se ou pedir mudan

    as de comportamento.

    Existem casais que so bastante atenciosos com amigos,

    colegas de trabalho e pessoas que lhes prestam servio e, no entanto, deixam de dar essa mesma quantidade de ateno

    ao cnjuge. A maioria que age assim parece no ter a inten

    o de colocar o cnjuge em segundo plano, porm acaba

    por negligenciar um elemento importante do relacionamen

    to, ignorando situaes e oportunidades para exercer a habi

    lidade de dar ateno.

    Muitas vezes, a imagem idealizada, ou real no comeo do

    reLarionamento, de uma pessoa bem-humorada, amvel, ca

    rinhosa etc. vai se desvanecendo, gerando insatisfao e de

    sinteresse. Bom humor, gentileza mtua, carinho e ateno

  • precisam ser cuitivaaos no couaiano aa reiaao. ^ara isso, e

    muito importante a habilidade de prover conseqncias

    positivas quando o cnjuge apresenta esses comportamen

    tos. A sinceridade, no entanto, fundamental, caso con

    trrio poder parecer que h pretenso de manipulao.

    H um velho adgro popular que cai bem nesta situao:

    amor com amor se paga. Em muitas situaes em que o comportamento do outro caminha na direo de desempe

    nhos favorveis qualidade do relacionamento, pode ser im

    portante que os cnjuges explicitem claramente esses aspec

    tos, por meio da habilidade de dar feedback positivo. Da mesma maneira, pedir feedback uma habilidade que favorece uma avaliao conjunta.

    So muitos os problemas resolvidos diariamente por apenas um dos membros da dade conjugal em assuntos

    que afetam a ambos. Esses problemas, ou so corriqueiros,

    ou possuem tal urgncia que demandam aes imediatas.

    O partilhar decises pelo casal produz, no entanto, um

    equilbrio nas relaes de poder, na medida que ambos de

    cidem e so, igualmente, responsveis pelo xito ou fracas

    so de todo empreendimento.

    Um subgrupo particularmente relevante de habilidades

    sociais conjugais representado pelas de relacionamento n

    timo. Nesta categoria, os desempenhos sociais possuem ca

    ractersticas singulares, com o padro no verbal tendo um

    peso considervel na interao. O contedo (o que se diz), a forma (como se diz) e a ocasio (quando se dz) so compo

    nentes importantes e precisam ser bem dosados e ajustados

    s preferncias das pessoas envolvidas. Isso significa que re

    quisitos no fundamentais em outros contextos ganham, aqui,

    um estatuto especial como, por exemplo, as discriminaes

    sutis das mensagens enviadas em cdigos e elaboradas no processo de interao.

    Relaes pais-filhos

    As relaes pais-filhos possuem um carter afetivo, edu

    cativo e de cuidado que cria muitas e variadas demandas de

  • naDioaaaes sociais, u.exercicio aessas iaDiLiaaaes , em ge

    ral, orientado para o equilbrio entre os objetivos afetivos

    imediatos e os objetivos a mdio e longo prazo de promover

    o desenvolvimento integral dos filhos e prepar-los para a

    vida. Argyle* identifica trs estratgias bsicas pelas quais os

    pais educam seus filhos: a) por meio das conseqncias (re

    compensas e punies), b) pelo estabelecimento de normas,

    explicaes, exortaes e estmulos e c) por modelao. Cada uma dessas estratgias baseia-se em aes educativas

    que supem um repertrio elaborado e diversificado de habi

    lidades sociais dos pais.

    medida que crescem, os filhos desenvolvem interesses, idias e hbitos que podem gerar conflitos familiares. Nem

    sempre fcil para os pais a identificao dos sinais que

    apontam para a iminncia de um conflito entre eles e os fi

    lhos ou para os estgios iniciais de um comportamento re

    provado no contexto dos valores familiares. Inversamente,

    tambm difcil identificar os estgios iniciais de um compor

    tamento desejvel que pode estar sendo mascarado pela pre

    dominncia de outros indesejveis. Na maioria das vezes,

    presta-se mais ateno aos comportamentos que perturbam

    ou quebram normas estabelecidas. Com freqncia os pais

    buscam interromper esses comportamentos com medidas

    punitivas ou corretivas que produzem resultados pouco efe

    tivos porque os suprimem apenas momentaneamente e, ain

    da, podem gerar vrios sentimentos negativos, como a raiva,

    o abatimento, a revolta7 etc.

    Essas situaes constituem ocasio para o exerccio de

    um conjunto de aes educativas que podem alterar drasti

    camente a qualidade da relao e promover comportamen

    tos mais adequados dos filhos. A literatura enfatiza a impor

    tncia de apresentar feedback positivo para os desempenhos

    6. Argyle, M. (3967/1994). Psicologia dei componamicnto interpersonal. Madrid: Alianza Universidad.

    7. Ver: Silva, A.T.B. (2000), Problemas de comportamento e comportamentos socialmente adequados: Sua relao com as habilidades sociais educativas dos pais. Dissertao de Mestrado. Programa de Ps-Graduao em Educao Especial. Universidade Federal dc So Carlos, So Carlos, SP.

  • considerados aaequaaos tao ogo eies ocorram, mugiai e iui-

    necer conseqncias positivas incentivam e fortalecem de

    sempenhos incipientes que, em etapas posteriores, sero man

    tidos por suas conseqncias naturais. A maioria dos pais faz

    isso quando est ensinando os filhos a andar, falar ou ler,

    mas costuma negligenciar a apresentao de conseqncias

    positivas quando se trata de comportamentos que conside

    ram obrigao como estudar, organizar-se, demonstrar gen

    tileza, apresentar iniciativa na soluo de pequenos proble

    mas pessoais etc.

    Muitos pais queixam-se de que, especialmente na adoles

    cncia, os filhos se tornam esquivos, buscando maior contato

    com os companheiros do que com eles. A adolescncia , sem

    dvida, um perodo de grandes conquistas e descobertas por

    parte dos jovens, podendo produzir inquietao aos pais. o

    momento de experimentar as novas possibilidades cogniti

    vas e o despertar sexual, mas tambm um perodo de grande

    labilidade emocional, dadas suas alteraes hormonais. Em

    qualquer etapa, mas particularmente nesta, so importantes

    vrias outras aes educativas como as de combinar normas

    e regras de convivncia coerentes com os valores familiares e estabelecer consenso sobre padres de conduta a serem as

    sumidos por todos. Em outras palavras, decidir com os filhos como traduzir valores em comportamentos, o que implica em dilogo e nas habilidades a ele inerentes.

    Assim como muitas situaes requerem o autocontrole

    dos sentimentos evitando-se agravar conflitos potenciais,

    outras podem requerer sua expresso. Em tais casos, embo

    ra a demanda aparea sem se anunciar, a expresso de raiva

    ou desagrado requer controle emocional se o objetivo for educativo mais do que meramente de descarga emocional.

    A habilidade dos pais de expressar raiva e

    desagrado fornece modelo de autocontrole. Quando esses

    sentimentos so gerados por comportamentos dos filhos que

    violam os acordos e as normas combinados, a situao pode

    requerer a habilidade de defender os prprios direitos em

    uma viso de reciprocidade.

  • jiju iiiuLLus monienios aa rejaao pais-mnos, ocorrem cri

    ticas de ambos os lados. A maioria de ns tem facilidade em

    fazer crticas que apenas humilham as pessoas, mas dificul

    dade em apresentar as construtivas. Alm disso, a habilidade

    de desculpar-se pode ser importante para diminuir ressenti

    mentos e induzir atitudes construtivas em relao dificul

    dade vivida.

    2. O contexto escolarA Educao uma prtica eminentemente social que am

    plia a insero do indivduo no mundo dos processos e dos produtos culturais da civilizao. A escola um espao privi

    legiado, onde se d um conjunto de interaes sociais que se

    pretendem educativas. Logo, a qualidade das interaes so

    ciais presentes na educao escolar constitui um componen

    te importante na consecuo de seus objetivos e no aperfei

    oamento do processo educacional.

    O discurso oficial sobre os objetivos e metas da institui

    o escolar, preconizado e continuamente reafirmado em termos de formao para a vida e para a cidadania, j inclui, na

    turalmente, a articulao entre aprendizagem e desenvolvi

    mento. O desenvolvimento socioemocional no pode ser ex

    cludo desse conjunto, especialmente quando se observa, nos dias atuais, uma escalada de violncia atingindo crianas e

    jovens e manifestando-se, inclusive, no contexto escolar. H,

    portanto, uma concordncia quase unnime sobre a necessi

    dade de aprimoramento das competncias sociais de alunos,

    professores e demais segmentos da escola.

    Mas necessrio destacar a importncia de uma clara

    compreenso sobre que tipo de habiLidadcs efetivamente

    contrib