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1 DIREITO NATURAL: CONCEPÇÕES ATUAIS ALÉXIA PENNA BARBOSA DINIZ UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

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DIREITO NATURAL:CONCEPÇÕES ATUAIS

ALÉXIA PENNA BARBOSA DINIZ

UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

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SUMÁRIOINTRODUÇÃO 3

A DIFICULDADE DE UMA DEFINIÇÃO E EXPLICAÇÃO 3

A POSITIVAÇÃO DO DIREITO NATURAL 3

COMPARAÇÃO A UMA CIÊNCIA IRMÃ 4

CONCLUSÃO 5

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1. INTRODUÇÃO

O seguinte trabalho tem como foco abordar e discutir sobre a existência e incidência de um direito natural no meio brasileiro e internacional. Tal discussão já vem sendo feita há séculos por grandes autores do mundo, como Aristóteles e São Tomás de Aquino, mas parece ter perdido um pouco de espaço nas discussões no âmbito jurídico na atualidade.

O Direito Natural, também conhecido como jusnaturalismo, pode ser entendido como um direito que existe independente de ser positivado por alguém. É um direito atemporal e justo, inerente a qualquer pessoa, independentemente de onde estiver. Tal ideia pode parecer difícil de se imaginar, já que pode dar margem a várias interpretações e trazer pouca segurança, mas o que garantiria que as normas fossem cumpridas?

Em oposição à ideia jusnaturalista existe a ideia positivista, que trabalha com a ideia de um direito positivado, posto, ou seja, um sistema jurídico que tem força coercitiva e que é imposto por alguma autoridade. Dessa forma, deveríamos seguir as normas desse ordenamento, sem levar em consideração se ele é justo ou moralmente adequado. Atualmente este é o pensamento prevalecente: Mesmo que achemos que as leis do nosso país não deveriam assim ser somos obrigados a obedecer às normas, já que todos vivemos em sociedade e devemos viver na maior harmonia possível.

A ideia de um sistema imposto pode até trazer desconfiança já que é entregue a outros o dever de definir o que é permitido ou proibido, o que se pode fazer ou não. Se alguns critérios e limitações não fossem impostos governos diadores poderiam suprimir direitos básicos das pessoas, como já ocorreu em diferentes cenários da história do mundo, como a ditadura militar brasileira no século passado e o período nazista na Alemanha. Então onde devem ser encontradas essas limitações?

Essas e outras discussões serão trazidas no seguinte trabalho, que não findará a discussão, mas trará alguns pontos de vista diferentes e algumas questões atuais, que não poderiam antes serem pensadas pelos antigos estudiosos do tema. O Direito Natural ainda existe? Como defini-lo? No que ele se baseia?

2. A DIFICULDADE DE UMA DEFINIÇÃO E EXPLICAÇÃO

No último tópico já foi apresentada uma breve avaliação sobre o tema, dando-lhe de antemão algum contorno. Porém, por se tratar de uma ciência humana, o Direito conta com termos que não mantem definições e significados fixos, mas que acabam sofrendo alteração de tempos em tempos para seu melhor enquadramento em cada época. Com o assunto em

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questão, o Direito Natural não poderia ser diferente, apresentando ao passar dos séculos sentidos maleáveis. O que configura como principal ponto do Direito Natural é a ideia de justiça, palavra que tem sua origem no sentido de correto, administração social. Em termos, é fácil traçar uma definição do que seja exatamente esse direito, mas na prática o pensamento do que é certo ou errado não é somente difícil de definir, mas varia de pessoa para pessoa, de época para época e de país para país, o que faz o tema ficar ainda mais conturbado.

“A questão efetivamente dos direitos naturais ela é decisiva. Ela traça um divisor de águas entre a possibilidade de termos uma vida em sociedade viável ou a impossibilidade efetivamente de concebermos e acalcarmos uma vida em sociedade. ” Palestra proferida pelo Juiz Federal e Doutor em Filosofia, Marcelo Souza Aguiar, no auditório da Escola de Magistrados da Justiça Federal da 3ª Região, em 31/5/2012.

Como sabe-se, não poderíamos jamais tratar o ordenamento jurídico da mesma forma com que tratamos as ciências exatas. Essas, depois de séculos de estudos, apresentam no geral ideias que podem ser comprovadas e que tendem a se tornar mais completas com o desenvolver de novos cientistas e novos métodos, cada vez mais tecnológicos e eficientes. Foi assim, por exemplo, com as pesquisas que visavam a entender do que a matéria é feita, qual a menor partícula que podemos alcançar e qual sua estrutura. A resposta veio depois de muitos cientistas: O átomo. Os principais modelos passaram de Dalton a Bohr, nomes que trouxeram inovações marcantes às suas áreas do conhecimento. Começou com Dalton a ideia de que tudo era feito por diminutas partículas indivisíveis e Bohr aprimorou o modelo, separando o átomo em uma parte nuclear e uma parte que o envolve com carga negativa, tendo essa parte diversas camadas. Os dois cientistas e todos os demais que se dedicaram a essas pesquisas, se baseavam sempre nos modelos passados para analisar o que deveria ser mudado, o que deveria ser aprimorado e aquilo que não era mais condizente. A direção a ser seguida era sempre o caminho adiante, sem retrocesso.

No campo do Direito nem sempre é assim, por mais que assim seja mais ideal e racional. Se civilizações passadas usaram meios jurídicopolíticos que não deram certo ou que trouxeram consequências negativas, é bem provável que esse meio seja usado no futuro, ignorando o passado. Exemplo simples de se entender é a tortura, principalmente no âmbito penal, para interrogatórios.

A prática da tortura já existiu em diversas civilizações ao passar dos séculos. Pode ser tomado como exemplo o período Inquisitório na Idade Média onde as pessoas interrogadas de

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bruxaria (quase sempre mulheres) eram submetidas a dolorosas práticas para que confessassem suas atividades mágicas. Dentre elas podemos citar o arrancamento dos seios, afogamentos e dissipação de partes do corpo, onde torturadores retiravam a força as partes dos corpos daqueles submetidos a julgamentos. Tudo isso era feito para que a vítima, em um extremo estado de dor, confessasse suas práticas de bruxaria. Porém, com o tempo percebeu-se que qualquer pessoa nessa situação confessaria qualquer coisa para poder acabar com a dor e o sofrimento, preferindo a morte. Depois de muito tempo, a Igreja Católica se viu evolvida em práticas humanistas, abolindo certos costumes, como a água fervendo e o óleo quente. Foi deixada para trás a ideia de que “em qualquer julgamento Deus estará presente para dar razão a quem a tiver”, pois esta ideia servia como justificativa para as dolorosas práticas. Se a pessoa saísse viva ou ilesa, isso significava que Deus a teria protegido porque estava falando a verdade. Além disso, com a Idade Moderna uma coletividade de ideias humanistas varreu os os estudiosos e pensadores da Europa, trazendo condenações às práticas antes usadas. Começouse a pensar na dignidade das pessoas, tendo cada um o direito de se defender de acusações de maneira justa e legítima, sem a violação de seu corpo e de sua integridade

Grande avanço, pensamos. Como assegurou Victor Hugo em 1874, “A tortura deixou, para sempre, de existir”. Parecia que aquele tenebroso período havia sido deixado para trás e que todas as civilizações tinham aprendido com o que havia ocorrido. Afinal, não é este o papel da história? Entender o passado, compreender o presente e melhorar o futuro, de forma a não repetir aquilo que não deu certo, sem retrocesso?

Mas infelizmente, o Direito não funciona assim. Sabemos, entretanto, que a tortura permaneceu e que ela está presente em mais de um terço dos países que foram signatários da Carta Magna de Direitos Humanos, principalmente em casos de crimes políticos. Na verdade, sabemos que ela nunca deixou de existir no âmbito penal, mesmo tendo o tempo, a história e o pensamento racional nos mostrado o contrário.

Mas por que, ao contrário das ciências exatas, o retrocesso continua a existir? Por que repetimos os mesmos erros do passado? Tudo nos leva a crer que as atividades sociais ocorrem de forma cíclica. Tendemos a repetir os mesmos erros do passado. Mesmo sabendo que não deram certo, nós os repetimos, talvez por achar que desta vez tudo será diferente. A sociedade continua com seus conflitos religiosos mesmo depois de as Cruzadas não terem gerado frutos, além da dificuldade financeira dos países que nelas participaram. A sociedade continua a hostilizar aquelas pessoas que nasceram diferentes do padrão social, mesmo sabendo que elas não tiveram culpa de ter assim nascido. E a sociedade continua a usar a tortura como método interrogatório, mesmo sabendo que isso fere uma série de princípios básicos, sendo condenada e criticada em todas as épocas em que foi utilizada.

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A tortura vai e volta nas diferentes épocas, passando por seus períodos de tolerância. Isso se viu no período militar brasileiro, no último século, onde pelo menos 1.918 prisioneiros políticos atestaram ter sido torturados entre 1964 e 1979, segundo o relatório "Brasil, nunca mais", que descreveu 283 diferentes formas de tortura realizadas pelos órgãos de Segurança.

E aí está a dificuldade de se definir e dar contornos ao Direito Natural: Como definir o que é certo ou errado, se o Direito está sempre ligado à religião, à política, à filosofia e a vários outros ângulos da sociedade? A primeira resposta que percebemos é que não existe uma maneira sólida e concreta de trazer essa definição, ao contrário das definições de massa, força, matéria, átomo, que perduram há séculos e sofrerão poucas alterações no futuro. Com esse ponto de partida já demarcado, nos resta buscar um novo caminho, ao invés de cobiçar a simplicidade das ciências exatas e biológicas.

Apesar de ser impossível delimitar totalmente em uma tabela o que é certo e o que é errado, existem ideais e princípios que vêm sendo mantidos ao passar das eras, mesmo em civilizações distintas, em diferentes continentes, nos principais movimentos revolucionários do mundo. Ou seja, os grupos sempre tendem a lutar pelas mesmas coisas, o que nos leva a crer que possam ser esses os direitos naturais que tanto buscamos.

Para exemplificar, traremos aqui 2 movimentos diferentes que exemplificam bem como funcionou em diferentes pontos da história esta busca por direitos. O primeiro deles, e talvez o mais importante, foi a Revolução Francesa(1789). Esse movimento apresentou importância tão grande que serviu como marco de passagem da Idade Moderna para a Contemporânea, trazendo novas ideias, novos autores e novos direitos, com a intenção de deixar um passado tenebroso para trás. Em suma, o que se buscou nesse movimento foi a mudança, já que a França no século XVIII era marcado por um regime desigual, em que a maior parte da população (o chamado 3º Estado) era responsável pelo sustento das camadas mais ricas, já que esses não pagavam impostos ou trabalhavam. O regime da monarquia absolutista também dava total poder ao rei, sem dar às pessoas nenhum direito político, tendendo assim a um regime cada vez pior para a população. Com o estouro desse grande movimento, Liberdade, Igualdade e Fraternidade passaram a representar o que os novos direitos trariam, como, por exemplo, os direitos civis para as pessoas, o direito de propriedade e até mesmo direitos políticos. Foi, definitivamente, um marco no Ocidente, trazendo à tona a importância do Direito Natural, já que defendiam ideias e direitos que não existiam naquele ordenamento, ou seja, direitos que não estavam positivados e que não eram reconhecidos pelo rei. Foi trazida a ideia de que existem certos direitos que devem ser respeitados e garantidos a todos, independentemente de estarem escritos em algum papel. Esses direitos não seriam baseados em nenhuma estrutura de poder, mas sim na razão.

O segundo movimento aconteceu em um período bem mais atual, no continente africano: A luta contra o regime de Apartheid. O Apartheid foi o regime segregacional que ocorreu na África do Sul entre as décadas de 1940 a 1990, em que uma pequena parte da

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população retinha todo o poder político e monetário, excluindo da sociedade a população que não fosse branca. A população negra, mestiça, judia e todos aqueles grupos que não fossem brancos não tinham seus direitos assegurados e eram excluídas da sociedade. Foi retirado dessa grande parcela da população os direitos políticos, já que não participavam das eleições e não podiam escolher pessoas a serem candidatas, e os direitos civis, pois não podiam andar nas ruas sem carteira de identificação, não tinham liberdade para frequentar os bairros mais nobres e “brancos” das cidades sul-africanas.

O pior de tudo no regime era que todas essas limitações e discriminações estavam positivadas no sistema jurídico daquele país. Em discurso, o primeiro ministro da África do Sul em agosto de 1985, expôs as seguintes palavras em defesa do regime:

“Pretória [capital executiva da África do Sul] foi erguida pela mente branca para o homem branco. Não somos obrigados a provar a qualquer um nem mesmo aos pretos que nós somos um povo superior. Já demonstramos de mil maneiras. [...] Por agora cada um de nós tem visto praticamente que os pretos não podem se governar. Dê lhes armas que eles vão se matar uns aos outros. São bons em nada mais do que fazer barulho, dançar, casar muitas esposas e espojaremse no sexo. Vamos todos aceitar que o homem preto é símbolo da pobreza, da mente inferior, do perder e da incompetência emocional.”

É difícil crer que tal regime tenha acabado em menos de 3 décadas, que esse movimento praticamente lutou pelos mesmos motivos que brigou lutou o terceiro estado na Revolução Francesa: ambos queriam o direito de atuar na vida política, igualdade entre todos, tendo qualquer pessoa as mesmas oportunidades de vida, e o fim de benefícios de uma certa classe. O principal ponto é que ambos os regimes eram positivados, havendo assim respaldo legal.

Percebese então, que por mais que as épocas sejam diferentes, movimentos sociais tendem a buscar sempre direitos da mesma espécie: A igualdade, direitos básicos, direitos políticos, direitos a liberdades e também o direito de impor algumas restrições ao Estado, dando a eles certas limitações. Não foi assim somente com a Revolução Francesa e com a luta contra o Apartheid, mas também com vários outros acontecimentos, como a Inconfidência Mineira (1789), Movimento de Independência da Índia (início do século XX), a luta contra a Segregação racial nos Estados Unidos (que alcançou ápice em meados do século XX), entre outros. Todos esses movimentos buscam a ideia de um Direito Natural, um direito que muitas vezes contraria um Direito Positivado por este ser autoritário ou segregatício. Os movimentos sempre estão conectados à ideia de uma vida mais justa, ideia base do Direito Natural.

É neste momento que se faz necessário parar e refletir se realmente o Direito Positivo é suficiente por si só, se ele realmente não precisa de um suporte, um ponto de apoio caso a

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capacidade de governar acabe servindo como forma de opressão. É essa discussão que abrirá o próximo tópico.

3. A POSITIVAÇÃO DO DIREITO NATURAL

Já definidos e contornados os principais aspectos da discussão, chegamos a um importante ponto: A positivação do Direito Natural. Ao contrário de muitos que creem que o Jusnaturalismo é uma corrente mitológica, mística e ilusória, tudo nos leva a crer que ele existe: sempre haverá uma ideia do que é certo por trás de todo sistema positivado, apesar de ser difícil delimitar o que seja o Direito Natural concretamente.

A própria histórica foi capaz de mostrar que sempre existiram e sempre existirão governos autoritários que suprem os mais básicos direitos, direitos esses que são considerados básicos. Então, por consequência, continuarão a existir os movimentos sociais que pleiteiam seus direitos.

Apesar disso, sabese que por mais que o Direito Natural traga a ideia de justiça, como um direito ideal, essa ideia não traz a segurança necessária. Era necessária a criação de algum meio para que as ideias desse direito ideal fossem positivadas. Por isso, logo na histórica Revolução Francesa, foi realizada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que trouxe direitos a serem aplicados a qualquer pessoa, independente de raça, país ou etnia. Dessa forma, garantiase que essas ideias passassem a ter uma força maior, algo que ameaçava os monarcas europeus e seus governos excludentes e autoritários. Este foi só o começo da positivação do Direito Natural, que alcançou grande importância no século passado, onde vários tratados internacionais vieram trazer esses direitos, obrigando os países signatários a cumprir certas limitações e garantir direitos básicos, para garantir à população o mínimo de dignidade.

Infelizmente, os tratados muitas vezes não conseguem os resultados esperados, já que cada país é soberano, sendo responsável por suas leis. Apesar disso, existem sanções internacionais capazes de coagir os países a obedecer, algo que auxilia muito o cumprimento dos acordos. Porém, ainda há uma parte do mundo que não participa desses tratados internacionais de Direitos Humanos, deixando milhões de pessoas vivendo sem as mínimas condições e respeito. Como agir e o que fazer a respeito disso ainda é uma questão polêmica e intrigante, já que são países que se fecham para a influência do mundo ocidental, misturando política e religião. Este é um dos temas que tomam tempo para discussão, discussão essa que não será trazida aqui. É deixada apenas um ponto inicial para reflexão: Existe uma resposta certa sobre o que deveria ser feito?

4. COMPARAÇÃO A UMA CIÊNCIA IRMÃ

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Diferente de outras ciências exatas em que os cursos são compostos por ciclos básicos que podem chegar a durar metade do curso, o curso de direito na maior parte das universidades e faculdades brasileiras não segue a mesma ideia. Logo nos primeiros períodos os alunos já encerraram o estudo das disciplinas humanísticas, como a filosofia, psicologia e sociologia, disciplinas de grande importância e que deveriam ser mais estudadas por aqueles que serão responsáveis por todo um sistema jurídico e legal do país. Assim, já existe desde cedo a ideia de isolamento do direito como área de estudo.

Esse sistema de ensino acaba por formar alunos que não questionam o suficiente e que têm suas ideias voltadas para um positivismo extremo. Não é possível fazer uma desvinculação do meio jurídico com a economia, ciência política, religião e o contexto histórico, pois esses estão todos interligados entre si. Dessa forma, todo estudo deveria ser feito de forma complementar e comparativa, estando o estudo em questão nessa linha de pensamento.

Aqui, faremos uma comparação com uma ciência irmã do direito: A economia. As duas se parecem mais do que se pensa. Ambas têm séculos de existência, diversos pensadores e estudiosos, que ao passar dos séculos foram mudando suas linhas de raciocínio para melhor poderem se encaixar na realidade social de sua época. Ambas já tentaram se justificar na religião, mas com o evoluir da sociedade, voltaram à ideia da razão. Ambas sofreram o desgosto de serem sempre comparadas às ciências exatas, ciências que conseguem resultados sem brecha para discussão, ao contrário da economia e do direito. Na matemática, na física e na química só há uma resposta certa, o que dá a elas a certeza da comprovação empírica.

Na corrente jusnaturalista, de certa forma, se acredita na existência de princípios e direitos que seriam inerentes aos seres humanos pelo simples fato de seres humanos serem. Ou seja, tais princípios e direitos estariam sempre ali presentes, independentemente de qualquer ordenamento jurídico que os possam contradizer. Sempre haveria esse “ordenamento” invisível que nos asseguraria nossos direitos mais básicos. Tal ideia não é exclusiva do direito, pois também na economia essa ideia aparece, a ideia de algo por trás do sistema que sempre estaria ali como uma forma de apoio caso algo saísse do planejado.

Qualquer aluno que já começou os estudos em economia, por mais simples que sejam, já ouviu falar nele: Adam Smith. Filósofo e economista britânico é conhecido como o pai da economia moderna, tendo trabalhos usados como base até nos dias de hoje, inclusive neste estudo. Em uma de suas obras mais notórias, “A riqueza das nações”, ele faz menção à “Mão Invisível” que seria capaz de regular o mercado, assegurando que tudo ficasse bem, assegurando que tudo que fosse produzido seria consumido, tudo tendendo ao equilíbrio. Grande defensor do sistema capitalista, condenava a intervenção estatal, já que o mercado poderia se autorregular. Sua ideia foi por muito tempo um dos princípios da economia, então, por mais que o mercado parecesse estar passando por um momento difícil, bastaria esperar um pouco para que a situação se normalizasse.

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Mas o próprio tempo foi capaz de provar que essa “Mão invisível”, sozinha, na economia, não é capaz de equilibrar tudo. Existem fatores externos, imprevisíveis, que o mercado às vezes não é capaz de prever, como as guerras, problemas climáticos e doenças, o que pode desestabilizar toda uma economia, que mesmo tendo sida metricamente planejada pode ser totalmente frustrada pelo menor dos incidentes,. O maior exemplo que se pode trazer é do século passado, com a crise de 1929 nos Estados Unidos. No contexto da segunda guerra mundial, as empresas e indústrias americanas produziram mais do que o mercado pôde suportar, já que a Europa diminuiu drasticamente o número de importações. A mercadoria se acumulou e não havia mercado suficiente para tantos produtos. A consequência veio com a desvalorização das ações na Bolsa, o que piorou ainda mais quando todos quiseram vender suas partes nas empresas. Ao chegar nesse ponto as companhias já estavam falidas e 30% dos trabalhadores já haviam perdido seus empregos, desencadeando uma grande onda de suicídios e depressão.

A solução para a maior crise que aterrorizou a população americana foi o pacote de medidas conhecido como New Deal, no governo de Franklin Delano Roosevelt. As ações que aumentaram significativamente, as intervenções estatais na economia, algo que antes era inconcebível de se pensar. Dessa forma, foram investimentos grandes quantidades de dinheiro no setor público, havendo também um controle so bre quantidades a serem produzidas pelas indústrias. É possível perceber que tais medidas contradizem as ideias de Smith, que acreditava na mão invisível para resolver a crise. Mas se nada tivesse sido feito pelo governo qual teria sido o futuro para aqueles que estavam sofrendo as consequências de um choque tão grande na economia?

Desse episódio e dessa comparação, podese concluir que, tanto na economia quanto no direito, acreditouse que um sistema invisível sempre estaria presente, independente de governantes. No caso da mão invisível econômica, provouse que o Estado nem sempre deve ficar omisso, já que a economia não é uma ciência exata previsível, sendo necessário sempre estar disposto a agir para evitar que o pior ocorra. Assim, por mais que um país se diga fortemente capitalista, a atuação do governo pode até ser mínima, mas nunca inexistente. No âmbito do direito essa comprovação já veio bem antes. Por mais que se acredite na ideia de um direito natural, superior, sempre justo e presente, fazse necessário um ordenamento imposto por uma autoridade: Um ordenamento que tenha força e que tenha coerção com aqueles que vivem sob certas leis, pois a sociedade ainda não chegou a um ponto em que as pessoas obedeçam às regras morais pela simples consciência individual. Mesmo existindo os pensadores que defendiam o Direito Natural, suas nações nunca deixaram de fazer leis por representantes, ou seja, nunca deixaram de usar o Direito positivo.

Dessa forma, por mais que existam sistemas organizados positivados, existe um sistema invisível por trás desses, que não são impostos ou elaborados por ninguém, simplesmente visando o equilíbrio.

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5. CONCLUSÃO

Por não se tratar de uma ciência exata, não conseguimos concluir um trabalho e chegar a uma ideia que esteja 100% correta, pois não temos a possibilidade de fazer experimentos práticos que comprovem de forma eficaz aquilo que estamos alegando. Infelizmente, no Direito, não é possível realizar um experimento com um cilindro para chegar a conclusões que serão irrefutáveis por muito tempo ou até mesmo pela eternidade. Assim, nos resta apenas refletir sobre o que foi alegado e concluir as ideias que aqui foram trazidas.

Podese concluir que o Direito Natural ainda está presente, mesmo que seja negado e desacreditado por muitos. A ideia que ele existe nos traz um pouco de segurança, pensando que, por mais que um sistema positivado use o poder de forma indiscriminada e injusta, sempre haverá uma forma de restabelecer as relações jurídicas da forma justa, como deveria ser. Por mais que grande parte destes direitos naturais hoje estejam positivados nos órgãos internacionais, a sociedade é algo altamente mutável, o que significa que em alguns anos estaremos vivendo situações novas, situações que não poderíamos jamais imaginar. Dessa forma, o direito positivado tende a se desatualizar cada vez mais facilmente, não devendo nós ficarmos presos a ele. O Direito Natural sempre estará presente, como uma forma de ajuda ao Direito Positivo, sempre que esse estiver em necessidade.

Um último ponto se faz aqui necessário. Mantivemos o foco do trabalho em um âmbito técnico e jurídico, já que se trata de um tema relacionado ao mundo daqueles que trabalham nesse âmbito. Mas, muito além disso, o direito também está relacionado com a vida daqueles que vivem na sociedade, pois a todo momento estamos fazendo parte de relações jurídicas, vivenciando as normas impostas pelas autoridades e construindo e desconstruindo novas normas sociais. Por isso, fazse também necessário refletir sobre o Direito Natural na vida dos leigos jurídicos.

Ao perguntar a uma criança se matar é errado, ela certamente responderá que sim. Ao perguntar o porquê, ela não citará o artigo 121 do Código Penal como justificativa, mas tentará explicar que isso não é certo, que Deus não fez os homens para tirar a vida um dos outros ou que devemos respeitar as diferentes pessoas, mesmo que não compreendamos suas atitudes. Mesmo sabendo que existe um conjunto de leis, feitas por pessoas importantes que regem a sociedade, existe um senso de justiça dentro de cada um de nós, que nos motiva a agir de forma correta, independente de leis e penas que o legislador estabelece. Não se pretende, aqui, negar de forma alguma o Direito Positivo e sua importância, mas, sim, demonstrar que ele não tem força sozinho, devendo, sim, ser complementado pela ideia do Direito Natural.

Afinal, não é isso que querem os estudantes de Direito? Ao se perguntar em uma sala de calouros sobre o que eles esperam do curso, e o que desejam fazer, a maior parte tem em mente fazer a diferença, trazer justiça e fazer um mundo melhor. Eles não querem

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simplesmente decorar um conjunto normativo, mas entender cada instituto, descobrir suas falhas e como fazer para que aquilo seja melhorado. Não interessam aos alunos as justiças do sistema positivado, mas, sim, a ideia de buscar sempre um Direito utópico: O Direito Natural.