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A RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO: UMA ANÁLISE DE SUA APLICABILIDADE 1 Clóvis Medeiros Camargo 2 RESUMO: Este trabalho apresenta a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica de direito privado, demonstrando uma análise da sua aplicabilidade no ordenamento jurídico, através do posicionamento divergente da doutrina e da jurisprudência brasileira, uma vez, que as pessoas jurídicas tomam papel cada vez mais importante na sociedade moderna, podendo-lhe trazer benefícios, mas também causar sérios prejuízos. Analisando a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica como instituto previsto pelo Legislador Constitucional como instrumento de controle da qualidade ambiental em casos de grave ameaça ao meio ambiente, partindo de uma análise da evolução do Direito Ambiental brasileiro desde os tempos embrionários até dos tempos hodiernos, analisando a evolução legislativa Constitucional e infraconstitucional sobre a proteção ambiental e, a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a demonstração do papel do Direito Penal Ambiental, como ferramenta de combate a degradação ambiental através da repressão e prevenção, e a sua subsidiariedade frente aos outros ramos do Direito, apresentando a correntes doutrinarias concernente a matéria. Palavras-chave: responsabilidade - penal - ambiental - pessoa jurídica ABSTRACT: This paper is about the environmental penal responsibility of legal entity from the private law, demonstrating an analysis about legal standards applicability, thru a divergent positioning of the Brazilian doctrine and jurisprudence, once legal entities are taking an important role in the modern society, which can bring benefits, but also cause serious damages. This present work shall also analyze the environmental penal responsibility of legal entity as an intention of the Constitutional lawmaker as environment quality control instrument at cases of serious environment‘s threat. This paper starts with a Brazilian environment law evolution analysis since early times until now, analyzing the Constitutional and infraconstitutional evolution about the environment protection and an ecologically balanced environment with a demonstration about the role of the environmental law as a combat tool against the environmental degradation thru the prosecution and prevention, and the subsidiarity front of the other branches of law, presenting new stances of legal writing related with this theme. Keywords: responsibility – penal – environmental – legal entity INTRODUÇÃO O estudo do meio ambiente, ao longo das ultimas décadas tem se intensificado e se tornado alvo de profundas observações, não tão somente pelos operadores do direito, mas pelos operadores das mais diversas ciências. O ambiente dá mostras que cada vez mais é necessário compreendê-lo e preservá-lo, como um conjunto complexo de vida que é. A complexidade do estudo do meio ambiente e diretamente proporcional a complexidade de sua existência, uma vez que, a interação dos corpos que a compõem não estão adstritos a um resultado previamente estabelecido. A cada ação pode ter uma reação totalmente adversa daquilo já conhecido. Neste ponto temos a clara percepção que ao estudarmos o meio ambiente há uma contribuição para a permanência de uma convivência harmônica, ainda que difícil, em nosso planeta. O Direito Ambiental surge no momento da interação do homem com a natureza, nas suas diferentes modalidades. O direito penal, por conseguinte, não pôde se distanciar da relação do meio ambiente com a humanidade, ao passo que este mesmo direito penal necessariamente, através de sua evolução enquanto ciência teve que prever remédios jurídicos penais, para a agressão aquele bem, estabelecendo o Direito Penal Ambiental. Vejamos que a 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador, Prof. Orci Paulino Bretanha Teixeira, pelo Prof. Maurício Carvalho Góes e pela Profª. Marcia Andréa Büring, em 25 de novembro de 2011. 2 Acadêmico do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Contato: [email protected]

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A RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO: UMA ANÁLISE DE SUA APLICABILIDADE1

Clóvis Medeiros Camargo2

RESUMO: Este trabalho apresenta a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica de direito privado, demonstrando uma análise da sua aplicabilidade no ordenamento jurídico, através do posicionamento divergente da doutrina e da jurisprudência brasileira, uma vez, que as pessoas jurídicas tomam papel cada vez mais importante na sociedade moderna, podendo-lhe trazer benefícios, mas também causar sérios prejuízos. Analisando a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica como instituto previsto pelo Legislador Constitucional como instrumento de controle da qualidade ambiental em casos de grave ameaça ao meio ambiente, partindo de uma análise da evolução do Direito Ambiental brasileiro desde os tempos embrionários até dos tempos hodiernos, analisando a evolução legislativa Constitucional e infraconstitucional sobre a proteção ambiental e, a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a demonstração do papel do Direito Penal Ambiental, como ferramenta de combate a degradação ambiental através da repressão e prevenção, e a sua subsidiariedade frente aos outros ramos do Direito, apresentando a correntes doutrinarias concernente a matéria. Palavras-chave: responsabilidade - penal - ambiental - pessoa jurídica ABSTRACT: This paper is about the environmental penal responsibility of legal entity from the private law, demonstrating an analysis about legal standards applicability, thru a divergent positioning of the Brazilian doctrine and jurisprudence, once legal entities are taking an important role in the modern society, which can bring benefits, but also cause serious damages. This present work shall also analyze the environmental penal responsibility of legal entity as an intention of the Constitutional lawmaker as environment quality control instrument at cases of serious environment‘s threat. This paper starts with a Brazilian environment law evolution analysis since early times until now, analyzing the Constitutional and infraconstitutional evolution about the environment protection and an ecologically balanced environment with a demonstration about the role of the environmental law as a combat tool against the environmental degradation thru the prosecution and prevention, and the subsidiarity front of the other branches of law, presenting new stances of legal writing related with this theme. Keywords: responsibility – penal – environmental – legal entity INTRODUÇÃO

O estudo do meio ambiente, ao longo das ultimas décadas tem se intensificado e se tornado alvo de profundas observações, não tão somente pelos operadores do direito, mas pelos operadores das mais diversas ciências. O ambiente dá mostras que cada vez mais é necessário compreendê-lo e preservá-lo, como um conjunto complexo de vida que é. A complexidade do estudo do meio ambiente e diretamente proporcional a complexidade de sua existência, uma vez que, a interação dos corpos que a compõem não estão adstritos a um resultado previamente estabelecido. A cada ação pode ter uma reação totalmente adversa daquilo já conhecido. Neste ponto temos a clara percepção que ao estudarmos o meio ambiente há uma contribuição para a permanência de uma convivência harmônica, ainda que difícil, em nosso planeta.

O Direito Ambiental surge no momento da interação do homem com a natureza, nas suas diferentes modalidades. O direito penal, por conseguinte, não pôde se distanciar da relação do meio ambiente com a humanidade, ao passo que este mesmo direito penal necessariamente, através de sua evolução enquanto ciência teve que prever remédios jurídicos penais, para a agressão aquele bem, estabelecendo o Direito Penal Ambiental. Vejamos que a

1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador, Prof. Orci Paulino Bretanha Teixeira, pelo Prof. Maurício Carvalho Góes e pela Profª. Marcia Andréa Büring, em 25 de novembro de 2011.

2 Acadêmico do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Contato: [email protected]

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sociedade ao longo de sua fatídica existência utilizou-se de recursos naturais para seu uso, gozo, fruição, de maneira a subsidiar a sua vida despreocupadamente, e os reflexos começam a surgir.

A introdução de sanções penais, para tutelar, proteger e preservar o meio ambiente foi uma consequência inevitável, em face das inábeis atitudes da sociedade para o desenvolvimento sustentável e para o mantimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A sanção penal é capaz de produzir efeitos mais abrangentes de reeducação, repressão, e prevenção pelo caráter que possui. Ao longo do tempo, observou-se que apenas criminalizar atitudes danosas ao meio ambiente, produzidas diretamente pelo homem, não reprimiu inteiramente o delito. Dessa forma, partiu-se para uma nova perspectiva, e observou-se que as pessoas jurídicas, principalmente de direito privado, poderiam, facilitar ações nocivas ao meio ambiente, pela natureza de suas atividades.

As pessoas jurídicas desempenham um papel cada vez mais importante na vida da sociedade, trazendo muitos benefícios, como a produção de empregos, fomentação da economia, mas podem produzir nocividades incalculáveis, ao passo desses benefícios. A sociedade civil organizada através de empresas, grupos econômicos, multinacionais, enfim, todo o tipo de seguimento de pessoa jurídica, não mede esforços para diminuir distâncias e auferir maior lucro em pouco espaço de tempo. A responsabilização penal ambiental da pessoa jurídica, tornaram-se instrumentos importantíssimos na luta para a sobrevivência sadia da sociedade moderna e globalizada.

O Legislador Constitucional previu em nossa Constituição, a responsabilização por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável. Existindo posicionamentos divergentes quanto a possibilidade de se criminalizar atividades de pessoas jurídicas de direito privado, diante da dogmática e tradicional ciência do Direito Penal. Mas para que se possa vislumbrar a aplicabilidade deste feito, os estudos devem romper uma concepção tradicional, e se verificar a proteção de um bem jurídico maior.

Este trabalho tem por objeto de estudo a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica de direito privado, através de uma análise de sua aplicabilidade diante dos instrumentos jurídicos existentes no ordenamento brasileiro. Iniciando por uma breve análise da evolução do Direito Ambiental brasileiro, calcado na evolução histórica infraconstitucional e constitucional da proteção do meio ambiente e nas influências internacionais do direito ambiental brasileiro, tendo como ponto de partida o período colonial brasileiro, considerado como embrionário na proteção ambiental em nosso sistema jurídico.

Analisa-se o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, por meio de seu conceito jurídico e sua previsão na Constituição. Posteriormente, analisa-se o surgimento do Direito Penal Ambiental, sendo este responsável pela aplicação de sanções penais, ao passo da ineficiência das demais áreas do direito na tutela ambiental. O Direito Penal Ambiental, como novo ramo do Direito Penal, tenta romper aspectos tradicionais, que na visão da maioria dos ambientalistas, acabam por dificultar a responsabilidade penal por dano ambiental. O Direito Penal Ambiental leva consigo não somente os princípios consagrados pelo Direito Penal clássico, mas também, os princípios basilares do Direito Ambiental, responsáveis pela tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Tratado-se de questões correlatas a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica, cujos os argumentos elencados pela doutrina se confundem. Partindo para uma apreciação da natureza da pessoa jurídica através das teorias da personalidade jurídica em que esta consagrada os argumento favoráveis ou contrários a possibilidade de responsabilização criminal. Nesta seara, o que se pretende é ilustrar a quão é intrincada a responsabilização penal da pessoa jurídica, introduzida e albergada pela Constituição Federal de 1988, rompendo com as tradicionais perspectivas do Direito Penal, invocando este instituto na tentativa de barrar as atividades altamente lesivas ao meio ambiente. Tal dispositivo foi

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regulamentado dez anos após a promulgação da Constituição, pela Lei nº 9.605/1998, a conhecida Lei dos Crimes Ambientais, reafirmando o compromisso constitucional. O posicionamento ainda controverso sobre o a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, estendeu-se aos Tribunais que necessitam aplicar as normas para a devida persecução penal. 1 A EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL NO BRASIL 1.1 BREVE ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO

No Brasil, o Direito Ambiental vem passando por evoluções, que possibilitaram uma maior reflexão sobre a necessidade de respeitar a interação do homem com o meio ambiente. Nos últimos 30 anos aumentaram as especulações entorno da questão ambiental, e muitos estudos viabilizaram uma melhor visão do Direito Ambiental, e principalmente, da relação compatível do homem com a natureza.

As ciências jurídicas não pôde se privar de estudar o meio ambiente, pois é um bem que afeta diretamente o homem. Um bem que é indispensável a sua sobrevivência e a existência das mais diversas formas de vida. O direito tem por interesse a existência da vida compatível com o uso dos bens ambientais de forma harmônica e equilibrada.

O meio ambiente como bem jurídico a ser tutelado pelo direito, culminou com o surgimento do Direito Ambiental. Este é um novo ramo do direito que estuda as relações jurídicas ambientais, que está fundado em organização, instrumentos e princípios próprios destinados a observar a essência constitucional, difusa e transindividual dos direitos e interesses ambientais, buscando a sua proteção, preservação e efetividade. Nesta linha de pensamento Elida Séguin diz que,

Direito Ambiental é o conjunto de regras, princípios e políticas públicas que buscam a harmonização do homem com o Meio Ambiente. Envolve aspectos naturais, culturais, artificiais e do trabalho, que possuem regulamentação própria, com institutos jurídicos diferentes, apesar de complementares.3

Para Paulo Affonso Leme Machado, “O Direito Ambiental é um Direito sistematizador, que faz articulações da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica”. 4 A importância do estudo do Direito Ambiental não se delimita tão somente ao estudo de normas, mais sim o estudo organizado das ciências que buscam a qualidade ambiental. O Direito Ambiental é marcado pela sua interdependência entre as ciências, do direito e de outras áreas, como por exemplo, a tecnologia.

Visivelmente o direito ambiental não atua isoladamente, ele extrapola as fronteiras estabelecidas pelo dogmático e tradicional estudo do direito, indo além das relações do homem. Avalia nesse sentido Celeste Gomes quando avalia que, “O direito do ambiente é profundamente marcado por uma dependência entre as ciências e a tecnologia. Sua compreensão exige um mínimo de consonância cientifica e a reflexão crítica à propostas apresentadas, marcada pela pluridisciplinariedade”.5

Claramente o objetivo do Direito Ambiental, além regular a interação do homem com os diversos elementos que compõe o ambiente, é de proteger, preservar, e tutelar o direito que recai a uma complexidade de pessoas indeterminadas. “A missão do Direito Ambiental é conservar a vitalidade, a diversidade e a capacidade de suporte do planeta Terra, para usufruto das presentes e futuras gerações”.6 A relação do homem com o meio

3 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 17. 4 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. rev., atual., ampl. São Paulo: Malheiros,

2006. p. 149. 5 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal.

São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 5. 6 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 157.

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ambiente, não ficou desprovido dos olhares das ciências jurídicas. Isto porque, as ciências jurídicas segundo Édis Milaré, “[...] tem evoluído inquestionavelmente no ordenamento da sociedade humana. Ela visa ao interesses individuais a aos da coletividade. Por intermédio da legislação, define direitos e estabelece deveres que devem balizar a organização da sociedade como um todo”.7

Portanto é desiderato do Direito a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futura gerações e a proteção da existência do homem harmoniosamente com a natureza. Na linha evolutiva do Direito Ambiental sempre se esteve na busca de maior conhecimento, e produção de meios legais para combater o desequilíbrio ecológico causado pelas ações desmedidas do homem. Édis Milaré8, com muita propriedade, enfatiza que a devastação ambiental não é marca exclusiva dos tempos hodiernos. Como ele relata, apenas a percepção jurídica deste fenômeno é de explicação recente, até em consequência de um novo bem jurídico denominado “meio ambiente”.

1.1.1 O Direito Ambiental brasileiro no período colonial

As primeiras legislações introduzidas no Brasil, que tinham o meio ambiente como conteúdo, são do período em que o país ainda era colônia portuguesa, e as primeiras formulações normativas organizacionais de direito a respeito do meio ambiente foram importadas de Portugal.9 O reino português já havia editado leis para a proteção de bens ambientais por razões econômicas e, em virtude da escassez dos bens naturais, principalmente os não-renováveis.10 De acordo com Ann Helen Wainer11, as Ordenações de 1326, protegiam as aves, e para efeitos criminais, equiparava a qualquer outra espécie de crime. Na mesma esteira protecionista segunda a autora em 1393, foi proibido o corte de árvores frutíferas, classificando como crime de injúria ao rei,12 face à preocupação portuguesa com a proteção florestal, fonte de matéria-prima para a construção naval, utilizada para expansão.13

No período do descobrimento, vigorava em Portugal as Ordenações Afonsinas, baseadas no Direito Romano e no Direito Canônico que resultou de uma compilação das Ordenações produzidas anteriormente.14 Nestas Ordenações, concluídas em 1446, encontravam-se algumas referências que denotavam preocupação com o meio ambiente. Em substituição as Ordenações Afonsinas, foram produzidas as Ordenações Manoelinas, datadas de 151415, e as Ordenações Filipinas, de 1603, que segundo Fernanda Medeiros16, possuíam penas extremamente severas no que concerne à conservação dos recursos naturais.

As Ordenações das Filipinas, uma das mais referenciadas legislações do período colonial, dispunham sobre relevantes providências relativas a proibição de caça de determinadas espécies animais, a proibição de pesca com rede em determinadas épocas, e menções expressas à poluição das águas, com a proibição de lançamento de material que

7 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 89. 8 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 134. 9 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 46. 10 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 46. 11 WAINER, Ann Helen. Legislação Ambiental Brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 5. 12 WAINER, Ann Helen. Legislação Ambiental Brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 62. 13 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 47. 14 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 135. 15 MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de

Oliveira, 2002. p. 25. 16 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: PUCRS,

2001. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2001. p. 70.

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pudesse causar danos a vida de animais aquáticos.17 Juristas como Juraci Perez Magalhães18 consideram o período colonial como sendo o berço de nosso direito a proteção ambiental, e como ele bem elucida, desde a produção das Ordenações oriundas de Portugal que,

[...] legislação ambiental teve grande progresso em terras brasileiras. Desenvolveu-se de tal forma, na fase colonial, que podemos considerar esse período como a fase embrionária de nosso Direito Ambiental. A partir daí, esse novo ramo jurídico não parou de crescer, chegando aos nossos dias como um direito especializado, de forte tendência publicista, destacando-se como um dos mais importantes da era contemporânea.19

Mas o escopo dos dispositivos legais que traziam matéria relativa a recursos naturais, até então, tinham por objetivo outro viés e não a proteção do meio ambiente.20 Os interesses ali dispostos eram meramente individuais, tinham o cunho de proteção da propriedade privada e de interesses econômicos. Orci Paulino Bretanha Teixeira21 revela que muito embora as normas fossem de natureza econômica, o período colonial é considerado como sendo embrionário de nosso Direito Ambiental, e que nos tempos atuais a normas são consideradas de cunho ambientalista, com forte preocupação com os bens ambientais.

O primeiro texto normativo brasileiro no que tange a proteção das florestas foi o “Regimento sobre o Pau-Brasil” de 1605. A primeira lei florestal brasileira apresentava regras bem definidas a respeito do corte e da exploração da madeira, criando tipificações penais e suas respectivas sanções22. A partir deste regimento, a legislação de proteção florestal teve grande desenvolvimento, sendo demonstrada a preocupação com o crescente desmatamento da colônia.23 Para Juraci Magalhães24 foi a partir deste ponto que uma grande de quantidade de regimentos, alvarás e outras formas de legislação determinando medidas de proteção florestal. Destacando ele, a expedição de Cartas Régias datadas de 179725.

Nesta esteira em 1808, Dom João VI, fundou o Jardim Botânico e, como acontecimento importante, em 1861 mandou plantar a Floresta da Tijuca, com a finalidade de garantir o abastecimento de água potável para o Rio de Janeiro, que estava ameaçado pelo desmatamento.26 Nota-se que o período colonial brasileiro apesar da visão estratégica e econômica que se tinha, propiciou indiretamente a proteção ambiental. Tais medidas ainda

17 MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 27.

18 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: PUCRS, 2001. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2001. p. 70.

19 MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 3.

20 ROCHA, Vânia de Almeida Sieben. Constituição e Meio Ambiente. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 183.

21 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 46.

22 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 46.

23 MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 27-28.

24 MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 28.

25 Em 1797, por exemplo, foram expedidas as cartas régias declarando de propriedade da Coroa todas as matas e arvoredos existentes à borda da Costa ou de rios que desembocassem imediatamente no mar e por qualquer via fluvial que permitissem a passagem de jangadas transportadoras de madeiras. MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 28

26 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 47.

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que iniciais, garantiram novos rumos ao Direito Ambiental brasileiro como Estado independente. 1.1.2 Novos rumos do Direito Ambiental brasileiro

A preocupação das autoridades voltadas ao meio ambiente através do Direito Ambiental podia ser notada no ordenamento jurídico pátrio efetivamente a partir de 1930. Entretanto, foi o Código Civil de 1916, uma das primeiras legislações do período republicano, que indiretamente protegia o meio ambiente ao disciplinar o uso da propriedade, tornado ilícito civil seu mau uso, que integrou o conceito de bem de uso comum do povo, utilizado posteriormente pelo Legislador Constituinte brasileiro na edição da Constituição Federal de 1988.27

O Direito Ambiental ganhou novos rumos através da promulgação de leis que deram partida na proteção ambiental. Com a edição do Código Florestal de 1934, o Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro daquele ano, o Código das Águas, o Decreto nº 24.643/1934, além do Código de Pesca, o Decreto-Lei nº 794/1938, foi dada uma pequena mostra da fomentação da matéria ambiental. Em meados dos anos de 1960, além do Código Florestal, a Lei nº 4.771/1965, que reformava o anterior, houve a criação de outros textos legislativos infraconstitucionais importantes sobre o meio ambiente. Tais disposições legislativas tinham suas essências mais ligadas a prevenção e o controle da degradação ambiental. Temos por exemplo, o Estatuto da Terra, a Lei nº 4.504/1964, que é anterior ao Código Florestal; a Lei nº 5.197/1967, que dispunha sobre a proteção a fauna, revogando o então Código de Caça, o Decreto-Lei nº 5.894/1943; o Código de Pesca, Decreto-Lei nº 221/1967; o Código de Mineração, Decreto-Lei nº 227/1967; o Decreto-Lei nº 303/1967, que criava o Conselho Nacional de Controle de Poluição Ambiental e a Lei nº 5.357/1967, que estabelecia penalidades para embarcações e terminais marítimos e fluviais que laçassem detritos ou óleo em águas brasileiras. As elaborações legislativas passaram a respeitar mais a necessidade de preservação ambiental.

Mas como muito bem revela Fernanda Medeiros, “entre as décadas de 30 e 60, as promulgações de leis voltadas para a defesa do meio ambiente foram realizadas de forma setorizada, sem apresentar qualquer tipo de unidade sistemática”.28 Nos anos 70, o país em que pese já soubesse da necessidade da preservação ambiental, pois já produzia legislações a respeito, passava por um momento político em que era defendido o crescimento econômico sem preocupação com males da poluição e devastação ambiental, classificados como menores, ou até mesmo insignificantes em relação aos problemas socioeconômicos, que são fortes até hoje. Como bem observa Édis Milaré, “a poluição e a degradação do meio ambiente eram vistas como uma mal menor”.29

Muito embora o Brasil encabeçasse os países com problemas de crescimento econômico e social, que questionavam os movimentos de proteção ambiental da comunidade internacional, que ganhava corpo nos anos 70, em 1973, no âmbito do Ministério do Interior, através do Decreto nº 73.030, criou a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), órgão de fiscalização ambiental30, que objetivamente tinha missão de criar uma política de uso e

27 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 50.

28 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: PUCRS, 2001. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2001. p. 71.

29 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 51. 30 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. ver., atual., ampl. São Paulo: Malheiros,

2006. p. 155.

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conservação dos recursos naturais.31 A abertura de novos olhares em relação ao Direito Ambiental, influenciou a aprovação, através da Lei nº 6.151 de 1974, do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), que era para ser executado até o ano de 1979, e tinha a missão de implantar uma política ambiental, o que resultou na mudança da visão despreocupado com o desenvolvimento desenfreado.

O Direito Ambiental brasileiro foi produtivo nos anos 70, pois nesse período houve as edições do Decreto-Lei nº 1.413/1975, que tratava sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por atividades industriais; da Lei nº 6.453/1977, que disciplinava a exploração de Energia Nuclear no país e da Lei nº 6.766/1979, conhecida como a “Lei Lehmann”, que tratava sobre o parcelamento do solo urbano. Notadamente, a visão de meio ambiente, através do Direito Ambiental já começava ser introduzida nas discussões políticas um pouco mais com força. Como bem observado por Orci Paulino Bretanha Teixeira, “A partir de 1970, em face à enorme devastação dos recursos naturais não-renováveis e o comprometimento do habitat do homem, a preocupação com ecossistema equilibrado despertou o interesse de juristas brasileiros. O ambiente passou a ser objeto de debates e de proteção legislativa”.32

Apesar de um pensamento voltado ao crescimento econômico a qualquer custo dos anos 70, uma mudança de concepção de políticas públicas voltados ao meio ambiente foi notada definitivamente a partir dos anos 80, em que a busca de alternativas para crescimento econômico através de tecnologias e modelos de desenvolvimento mais adequados ficaram mais visíveis. Neste sentido, visando a essa mudança de concepção, de que o meio ambiente que é de suma importância para a vida, foi promulgada a Lei nº 6.938 de 1981, a denominada Lei da Política Nacional do Meio Ambiente. “É a primeira lei onde a preocupação é com o meio ambiente, onde a tutela é para coletividade”.33 Elida Séguin34 afirma que a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente foi a “certidão de nascimento” do Direito Ambiental brasileiro, apesar da Lei de Zoneamento Industrial, de 1980, ter a primazia de enunciar a questão sob uma ótica holística de Meio Ambiente.

Esse diploma legal trouxe a baila definições sobre o meio ambiente ainda não tratadas em nenhuma outra legislação brasileira. Em apenas um texto legal reuniu as bases da proteção ambiental, trazendo os conceitos de meio ambiente, poluição, poluidor e recursos naturais. Além de traçar os objetivos da proteção ambiental, relacionou os órgãos integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e elencou os instrumentos da política nacional do meio ambiente. A Lei ainda dispôs sobre licenciamento, e também previu um crime de poluição genérica, atualmente revogado.35

Como bem afirma Sílvia Cappelli, “pode-se dizer que o Direito Ambiental se assentou no Brasil na década de 80, principalmente a partir da publicação das leis nº 6.938/81 e 7.347/85”.36 A segunda de 24 de julho 1985, conhecida como a Lei da Ação Civil

31 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 140. 32 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 50. 33 ROCHA, Vânia de Almeida Sieben. Constituição e Meio Ambiente. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci

Paulino Bretanha; ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 185.

34 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 25. 35 CAPELLI, Sílvia. Novos Rumos do Direito Ambiental. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci Paulino

Bretanha; ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 53.

36 CAPELLI, Sílvia. Novos Rumos do Direito Ambiental. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha; ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 53.

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Pública, instrumentalizou a defesa do meio ambiente. Forneceu ferramentas processuais para coibir e reparar danos à natureza.

E para corroborar com a idéia, de que os anos 80 foi uma época de ouro da produção de meios de proteção ambiental, foi promulgada a Constituição Federal de 1988. Apontada como um marco, o terceiro, assim classificado na escala de evolução legislativa ambiental, a Constituição Federal de 1988, projetou uma bela matéria relativa ao meio ambiente, apresentando um capitulo próprio ao tema, um dos mais modernos textos já estabelecidos no mundo. Somente no final do Século XX, o problema ambiental começou a ser percebido com toda a sua intensidade.37 Vânia de Almeida Sieben Rocha, declara que foi nesse período que

Iniciaram-se estudos direcionados a diminuir os impactos ambientais, com a intenção de obter um equilíbrio, uma convivência harmônica entre o homem e a natureza. Um equilíbrio que permitisse o desenvolvimento econômico sem a degradação do meio ambiente. Ao lado disso, paulatinamente, começou a surgir uma consciência ecológica.38

As legislações infraconstitucionais produzidas anteriormente foram muito positivas e propiciaram a criação novas legislações protecionistas do meio ambiente a partir dos anos 90. A criação da Lei dos Crimes Ambientais, foi o quarto marco na evolução legislativa ambiental brasileira.39 A Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas aplicavéis às condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, significou relevante avanço na tutela dos bens ambientais, uma vez que, expos pela primeira vez no nosso ordenamento as sanções administrativas e elencou de forma organizada os crimes ambientais. Tal diploma, representou uma mudança da visão do tradicional Direito Penal pois em sua redação tornou efetiva o compromisso constitucional de se incluir a pessoa jurídica como sujeito ativo de crime ambiental, possibilitando que os entes coletivos pudessem estar no pólo passivo da ação penal, sobrepujando o clássico principio societas delinquere non potest.40 A Lei dos Crimes Ambientais sistematizou os tipos penais que antes estavam esparços no Código Penal, Código de Mineração, Código Florestal, definindo também novos tipos penais buscando a uma melhor tutela do meio ambiente.

Novos caminhos na luta pela proteção ambiental estão sendo traçados pelo Direito Ambiental brasileito, seja na tentativa de produção legislativa ou na criação de programas de incentivo para um meio ambiente sadio. Ao analisar o caminho construído ao longos das décadas do século XX na busca da tutela do meio ambiente por intermédio do Direito Ambiental, se tem a clara percepção que a produção legislativa ambiental brasileira teve momentos marcantes e de transição de pensamento. Mas as legislações não alcançam sua plenitude se não houver uma mudança comportamental da sociedade.

Esse é o desafio do Direito Ambiental brasileiro, a busca pela efetiva tutela ambiental através do comportamento humano, por meio da proteção, preservação, manutenção e recuparação de um meio ambiente sadio para as presente e futuras gerações. A convivência harmônica, com o mínimo de qualidade e dignidade possivel, do homem com a natureza, é o principal objeto de estudos do direito e das ciências modernas.

1.1.3 A evolução do Direito Ambiental na Constituição

37 ROCHA, Vânia de Almeida Sieben. Constituição e Meio Ambiente. In: HAUSEN, Enio Costa. TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 183.

38 ROCHA, Vânia de Almeida Sieben. Constituição e Meio Ambiente. In: HAUSEN, Enio Costa. TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 183.

39 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 142. 40 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 142.

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Partindo para uma perspectiva quanto a evolução do Direito Ambiental nas Constituições, é de facil constatação que o tratamento dispensado à materia tem evoluído. Pois partiu-se de um ponto onde a constituição nada declarava até alcançarmos um nível de amparo muito bem definido com a Constituição atual.41 Nossa primeira Carta Magna, a Constituição do Império de 1824, como primeiro diploma Constitucional, não fazia nenhuma menção ao meio ambiente. Orci Paulino Bretanha Texeira, atribui este lapso, como sendo “produto de um tempo e uma cultura”.42 Fernanda Medeiros, afirma que este fato não surpreende, uma vez que, à época “além de não ser preocupação corrente de todos os povos, o Brasil ainda carecia de identidade como povo e nação independente”.43

Estabelecida a primeira República, representada pela Constituição de 1891, foi dado início a uma preocupação com regulamentação constitucional no que tange aos elementos da natureza.44 Atribui-se competência para tratar de minas e de terras a União, numa visão ambiental utilitarista, de natureza econômica.45 Na Carta de 1934, tinha-se também o objetivo de regulamentar as atividades econômicas, mas não o de proteger o meio ambiente. Aliás, as Constituições subsequentes, ou seja a Constituição de 1937, de 1946 e de 1967, estabeleceram o mesmo modelo de normatização, quanto ao meio ambiente. A finalidade que se destinavam, eram de racionalização econômica das atividades de exploração de recursos naturais, e não a de estabelecer a proteção ambiental, como conhecemos nos tempos hodiernos.46

Acompanhando as marcantes modificações políticas que estavam ocorrendo no país, a partir da década de 80, a proteção ambiental tomou novos rumos, e como afirma Fernanda Medeiros47, a preocupação deixou de ser “extrativista” para ser “protecionista”. A legislação mais importante da história brasileira, a Constituição Federal de 1988, foi a marca balizadora da reconstituição e renascimento da democracia. Esta foi a primeira Constituição a tratar clara e explicitamente sobre o meio ambiente. Tratando-lhe com o verdadeiro valor que possui, o adicionado no nosso ordenamento como direito e garantia fundamental. Para Paulo Affonso Leme Machado, “a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a primeira Constituição Brasileira em que a expressão ‘meio ambiente’ é mencionada”.48

A promulgação da Constituição Federal de 1988, transmitia verdadeiramente o reflexo da nova concepção em torno do problema ambiental: preservar, proteger e manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado, para as presentes e futuras gerações, através do Poder Público e da coletividade. Fato é que o meio ambiente foi visto com a grandeza que lhe merece. O trato passou a ser em prol da coletividade e não para individualidade conforme as legislações produzidas anteriormente. Todos os textos normativos, que não contrariavam a Constituição, foram recepcionados e elevados a outro nível. Os bens ambientais, a fauna, a flora, os bens naturais e artificiais que eram tutelados individualmente nas legislações

41 MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 61.

42 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 58.

43 MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 61.

44 MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 61.

45 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 58.

46 MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 61-62.

47 MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 62-63.

48 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. ver., atual., ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 115.

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infraconstitucionais, passaram a ser protegidos com mais ênfase através da tutela constitucional voltada a preservação do todo.

A constituição além de reverenciar o meio ambiente, como nunca havia se feito, trouxe novas perspectivas de combate a degradação ambiental. Dentre estas podemos citar a previsão da responsabilidade penal, civil e administrativa aos autores de práticas lesivas ao meio ambiente. Além de prever que não só as pessoas físicas (pessoas naturais) podem ser responsabilizadas pelos danos ambientais, mas também, as pessoas jurídicas. Essa talvez tenha sido a maior evidência da mudança da visão do legislador em relação aos bens ambientais.

1.1.4 As influências Internacionais no Direito Ambiental brasileiro

O Direito Ambiental brasileiro teve influências internacionais na alçada protecionista do meio ambiente ecologicamente equilibrado. E como bem observa Fernanda Medeiros, “o que se tem percebido é que a legislação ambiental brasileira emergiu no ordenamento jurídico nacional como consequência das normas internacionais”.49

Um clara mostra de influência internacional no sistema jurídico ambiental brasileiro foi a Conferência de Estocolmo, ocorrida no ano de 1972, que foi um marco para os movimentos sociais que influenciaram a produção de meios de proteção na legislação brasileira. O Direito Ambiental brasileiro começou a ser alvo de estudos mais dedicados. Mas, os movimento sociais de proteção ao meio ambiente começavam ainda acanhados, em vista a grande degradação de bens ambientais.

A Conferência de Estocolmo foi uma Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, United Nations Conference on the Human Environment, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), contando com a participação de 113 (cento e treze) países.50 Considerada com divisor de águas por Fernanda Medeiros51, pode-se dizer que a motivação para a realização da conferência, fora o crescimento econômico despreocupado, além de um acelerado processo de industrialização predatório. A conferência foi resultado da percepção das nações ricas e industrializadas da degradação ambiental causada pelo seu modelo de crescimento econômico e progressiva escassez de recursos naturais. 52

A conferência foi de suma importância, pois teve a presença de grandes potências, sendo consagrados vários princípios os quais, para Édis Milaré53, refletiam o cerne das preocupações e concepções ambientais da época. Tal conferência e seus princípios influenciaram o Direito em todo o mundo. Considerado por Orci Paulino Bretanha Teixeira54 como extensão da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948. Pois na conferência de Estocolmo, estabeleceu-se que o homem tem direito fundamental à vida saudável em um ambiente ecologicamente equilibrado, com uma vida digna que deve ser tutelada pelo Estado, o qual tem dever de protegê-lo, manter o equilíbrio ecológico,

49 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: PUCRS, 2001. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2001. p. 72.

50 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 50. 51 A conferência de Estocolmo como grande divisor de águas para o enraizamento da efetiva busca pela proteção

ambiental. E a razão para é que a referida conferência contém 26(vinte e seis) princípios e 109(cento e nove) resoluções. Podemos afirmar, conjuntamente com outros autores, que, a partir dessa Convenção de 1972, as nações ‘passaram a compreender que nenhum esforço, isoladamente, seria capaz de solucionar os problemas ambientais do planeta’. MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Meio Ambiente: Direito e Dever Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 44.

52 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 140. 53 MILARÉ, Édis. Legislação Ambiental do Brasil. São Paulo: APMP, 1991. p. 532. 54 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 67.

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necessário a existência do homem. Na ótica de Elida Séguin, “A conferência de Estocolmo, em 1972, foi um marco para os movimentos sociais, que terminaram por impor frutos na legislação brasileira, que timidamente começou a regulamentar a devastação desenfreada do nosso patrimônio ambiental”.55

Na década de 90, outro evento internacional realizado pela Organização das Nações Unidas, entusiasmou o estudo do Direito Ambiental brasileiro. No de 1992, foi realizada no Brasil a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), United Nations Conference on Environment and Developpment, mais conhecida como Eco 92 ou Rio 92, na qual participaram mais de 150 (cento e cinqueta) países. Esta é considerada uma das mais importantes conferências sobre o Meio Ambiente e desenvolvimento, na qual vários documentos foram produzidos, entre eles a Convenção sobre a Biodiversidade56 e a Agenda 2157.Para Elida Séguin esta conferência “teve o grande mérito de despertar os brasileiros de sua inércia, ao verem o mundo todo preucucupado com o tema (ambiental)”.58 Considerando-lhe como “um marco divisor na história do Direito Ambiental, por popularizar conhecimentos”.59

O despertar da comunidade internacional frente as violações ambientais ocorridas no planeta, viabilizaram estas duas conferências, consideras como marcos, pontos de partida para uma reformulação dos meios de proteção ambiental. No sistema jurídico ambiental brasileiro, apartir principalmente, da Conferencia de 1972, foi possivel vislumbrar melhores pespetivas de legislações ambientais realmente protecionistas, como por exemplo, a Lei da Politica Nacional do Meio Ambiente de 1981, e a Constituição Federal de 1988.

1.2 O MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO

O meio ambiente ecologicamente equilibrado, indispensável á sadia qualidade de vida, está em um momento de grande especulação entorno das consequências da irresponsabilidade do homem, quando este lança mão de um direito que é indisponível. O homem quando afeta um parcela, mínima deste equilíbrio, indiretamente atinge a totalidade do equilíbrio ecológico. O reflexo pode ser não ser sentido imediatamente, mas seus efeitos cumulativos podem abranger diversas gerações. Neste sentido Eladio Lecey afirma que, “[...] a sobrevivência da espécie humana e sua digna qualidade de vida dependem da sustentação de um ambiente equilibrado ecologicamente”.60

A existência de uma vida digna, passa pela soma dos diversos aspectos e fundamentos que são de suma importância para uma sociedade e para uma vida saudável. Estão entre estes fundamentos, o direito a educação, o direito a segurança, o direito a saúde, que só podem ser buscados a partir da aplicação de uma política de conservação ambiental que se digne a preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Pois, este por sua vez,

55 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 25. 56 É um documento em que os países signatários se comprometem em proteger as riquezas biológicas existentes,

principalmente nas florestas; 112 países assinaram a Convenção. MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do Direito Ambiental no Brasil. 22 ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 66.

57 É um texto de diretrizes, por vezes normativo, de cunho otimista e com abrangência até então pouco vista em textos congêneres. [...] Nele são tratados, questões temáticas relativas ao desenvolvimento econômico – social e as suas dimensões, à conservação e administração de recursos para o desenvolvimento, ao papel dos grandes grupos sociais que atuam nesse processo. [...] pode-se dizer que a Agenda 21 é a cartilha básica do desenvolvimento sustentável. MILARÉ, Édis. Agenda 21: A cartilha do desenvolvimento sustentável. In: MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 6. p. 114.

58 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 27. 59 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 27. 60 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS,

Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 37.

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tem objetivo de efetivamente garantir a existência de vida, para as presentes e futuras gerações, com o mínimo de qualidade possível. Para melhor compreender o meio ambiente ecologicamente equilibrado, deve-se compatibilizar da idéia de José Afonso da Silva, que definiu o meio ambiente, como riqueza insubstituível, e a sua interação com o homem como sendo “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”.61

O meio ambiente, como um bem da coletividade, necessita de um especial tratamento do Estado. Pensando nisso, o Estado brasileiro na escala evolutiva de meios legislativos de proteção ambiental, produziu os textos mais modernos nessa matéria, através da Legislação Constitucional e Infraconstitucional.

1.2.1 O conceito de meio ambiente ecologicamente equilibrado

O meio ambiente não teve conceito definido legalmente, até o advento da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), que além de definir o que se entende por meio ambiente, poluição e degradação, demonstrou os objetivos do da Política Nacional do Meio Ambiente, o que representou o efetivo surgimento da proteção ambiental brasileira. Na lei o meio ambiente está conceituado como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Esta definição foi dada pelo artigo 3º, inciso I, da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente. A lei no artigo 2º, inciso I, ainda definiu o meio ambiente como “patrimônio publico a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo”.

Édis Milaré62 faz uma classificação do sentido da expressão meio ambiente, em linguagem técnica, e no conceito jurídico. Na linguagem técnica, o meio ambiente é entendido como combinação de todas as coisas e fatores externos ao indivíduo ou a população de indivíduos. Precisamente é constituído por seres bióticos e abióticos e suas relações e interações. É uma realidade complexa e marca por inúmeras variáveis.

No conceito jurídico, o meio ambiente e visto através de duas perspectivas: uma estrita e uma ampla. Na primeira, o meio ambiente, não é nada mais que a expressão do patrimônio natural e as relações com os seres vivos e entre eles. Desprezando-se o que não diz respeito aos bens naturais. Na segunda, o meio ambiente abrange toda a natureza original e artificial. O meio ambiente na perspectiva ampla abrange todos os elementos culturais, artificiais, e naturais, que se destinam a permitir o desenvolvimento equilibrado de todas as formas de vida.

1.2.2 O meio ambiente ecologicamente equilibrado na Constituição Federal

Foi visando à proteção da interação de todos os elementos essenciais a existência de vida em todas as suas formas que o legislador dedicou-se a trabalhar implantando na Constituição Federal de 1988 o desenvolvimento sustentável e o Meio ambiente ecologicamente equilibrado como direitos fundamentais de todos os cidadãos, em um capítulo especifico, iniciado no artigo 225.

63 Para Paulo Affonso Leme Machado64, a Constituição de 1988 pela primeira vez

inseriu o tema meio ambiente reunindo todos os elementos que a compõem de forma não

61 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 20. 62 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 158. 63 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia

qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

64 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. ver., atual., ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 104.

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fragmentada. A nova ordem constitucional garantiu o direito de todos ao meio ambiente equilibrado ecologicamente e essencial a qualidade de vida.

Celso Antonio Pacheco Fiorillo65 observa que a Constituição Federal “validou”, a definição jurídica de meio ambiente apontada na Lei nº 6.938/1981, e fica evidente que a definição jurídica está circunscrita à tutela da vida em todas as suas formas. Sendo assim, a proteção ambiental constitucional se ocupa da defesa jurídica da vida no plano constitucional, pois o direito a vida em todas as suas formas, estabelecido pelo artigo 225 da Constituição Federal, deve ser ecologicamente equilibrado.

As inovações trazidas pela Constituição de 1988 foram tão importantes para os brasileiros em matéria ambiental, quanto os direitos e garantias elecandos no artigo 5º da Constituição Federal, pois elevou o meio ambiente a direito fundamental da pessoa humana, como afirma Édis Milaré,

A par dos direitos e deveres individuais e coletivos elencados no art. 5º, acrescentou o legislador constituinte, no caput do art. 225, um novo direito fundamental da pessoa humana, direcionado ao desfrute de adequadas condições de vida em um ambiente saudável ou, na dicção da lei, “ecologicamente equilibrado”.66

Portanto, o meio ambiente equilibrado ecologicamente passou a ser considerado um direito fundamental, apesar de não constar no rol de direitos previstos no artigo 5º de nossa Constituição, face a importante constatação de que somente haverá vida, ou existência do homem, a partir do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Assim, leciona Orci Paulino Bretanha Teixeira

Este direito é portador de uma mensagem de interação entre o ser humano e a natureza para que se estabeleça um pacto de harmonia de equilíbrio. Ou seja, um novo pacto: homem e natureza. Fixada sua importância, passa a ser reconhecido como direito fundamental, embora não conste como tal no catálogo destes direitos.67

Na Constituição de 1988, estão dispostos os meios de proteção; o papel do cidadão na proteção; o papel do Poder Público na tutela do meio ambiente e as formas como ele deve exercer esta tutela. Da mesma forma que Constituição quis impor ao poder público o dever de zelar pela qualidade ambiental, solidariamente repassou este dever a todos os cidadãos que usufruem do equilíbrio ecológico. Muito bem refere Orci Paulino Bretanha Teixeira que,

A defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado passa a ser tarefa e finalidade do Estado e obrigação dos indivíduos para garantir o direito fundamental formalmente reconhecido e preexistente ao próprio Estado. [...] O homem na condição de cidadão torna-se titular do direito ao ambiente ecologicamente equilibrado e também sujeito ativo do dever fundamental de proteger ao meio ambiente.68

Na visão de Paulo Affonso Leme Machado, a Constituição federal foi muito bem elaborada, pois aproximou o Poder Público e a coletividade na tarefa de defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado,

A Constituição foi bem-formulada ao terem sido colocados conjuntamente o Poder Público e a coletividade como agentes fundamentais na ação defensora e preservadora do meio ambiente. [...] O Poder Público e a coletividade deverão defender e preservar o meio ambiente desejado pela Constituição, e não qualquer meio ambiente. O meio ambiente a ser defendido e preservado é aquele ecologicamente equilibrado.69

65 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Princípios do processo ambiental. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 34-35. 66 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 158. 67 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 67. 68 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 87. 69 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. ver., atual., ampl. São Paulo: Malheiros,

2006. p. 123.

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Ele ainda esclarece enfatizando que o equilíbrio ecológico não significa dizer imutabilidade dos elementos que compõem o meio ambiente, mas uma convivência harmoniosa com o mínimo de impacto possível,

O equilíbrio ecológico não significa uma permanente inalterabilidade das condições naturais. Contudo, a harmonia ou a proporção e a sanidade entre os vários elementos que compõem a ecologia – populações, comunidades, ecossistemas e a biosfera – hão de ser buscadas intensamente pelo Poder Público, pela coletividade e por todas as pessoas.70

O Legislador Constitucional foi muito hábil quando consagrou a punição aos agressores dos bens ambientais indispensáveis para o equilíbrio do ecossistema, prevendo punições nas esferas civil, penal e administrativa tanto para as pessoas físicas quanto para as pessoas jurídicas. A aplicação da tutela penal do meio ambiente e da responsabilidade da pessoa jurídica no texto Constitucional foi a grande nova idéia com o fito de proteger e preservar o meio ambiente. Foi lúcida a ruptura do legislador com os tradicionais e dogmáticos princípios do direito que devem ser analisados de forma diferente quando o bem jurídico a ser tutelado possui tão elevado valor a vida, como é o meio ambiente. Foi uma clara tentativa de barrar o esvaziamento dos recursos ambientais.

A sobrevivência humana, e da vida, inegavelmente esta relacionada ao meio ambiente, que deve ser um meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida. Esse direito projeta-se como a defesa, proteção, tutela e preservação de recursos indispensáveis à dignidade de uma vida. Ensina ainda Elida Séguin que,

O ângulo de abrangência e influência do Meio Ambiente, a impossibilidade de determinar seu titular, que constantemente tem no proprietário do bem específico seu maior inimigo, o transforma num direito difuso por excelência, justificando a amplitude do vocábulo todos no art. 225 da CRF.71 (grifo da autora)

O Direito Ambiental tem indubitavelmente, através da norma constitucional e das normas infraconstitucionais, a meta de manter e ditar o equilíbrio do meio ambiente, composto pelos recursos naturais, pelo o homem e todas as formas de vida presentes e futuras.

O meio ambiente ecologicamente equilibrado, indispensável á sadia qualidade de vida, está em um momento de grande especulação entorno das consequências da irresponsabilidade do homem, quando este lança mão de um direito que é indisponível. O homem quando afeta um parcela, mínima deste equilíbrio, indiretamente atinge a totalidade do equilíbrio ecológico. O reflexo pode ser não ser sentido imediatamente, mas seus efeitos cumulativos podem abranger diversas gerações. Neste sentido Eladio Lecey afirma que, “[...] a sobrevivência da espécie humana e sua digna qualidade de vida dependem da sustentação de um ambiente equilibrado ecologicamente”.72

A existência de uma vida digna, passa pela soma dos diversos aspectos e fundamentos que são de suma importância para uma sociedade e para uma vida saudável. Estão entre estes fundamentos, o direito a educação, o direito a segurança, o direito a saúde, que só podem ser buscados a partir da aplicação de uma política de conservação ambiental que se digne a preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Pois este, por sua vez, tem objetivo de efetivamente garantir a existência de vida, para as presentes e futuras gerações, com o mínimo de qualidade possível. Aduz Elida Séguin que

O art. 225 da Constituição Federal da República (CRF) incorporou ao nosso ordenamento jurídico institutos conhecidos por poucos segmentos sociais. Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente ecologicamente equilibrado

70 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. ver., atual., ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 119.

71 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 40. 72 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS,

Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 37.

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começaram a fazer parte do conceito de cidadania, influenciado pelos Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos, como o direito ao desenvolvimento, à saúde e à educação.73

Nesta esteira, Celso Antonio Pacheco Fiorillo e Marcelo Abelha Rodrigues, manifestam-se no sentido de que

O direito ao meio ambiente, em verdade, é pressuposto de exercício lógico dos demais direitos do homem, vez que em sendo o direito à vida, o objeto do direito ambiental, somente aqueles que possuírem a vida, e, mais ainda, a vida com qualidade e saúde é que terão condições de exercitarem os demais direitos humanos nestes compreendidos os direitos sociais, da personalidade e político do ser humano.74

Portanto, o meio ambiente ecologicamente equilibrado busca a proteção da vida, e como tal, tem de ser respeitado como direito fundamental. E como direito fundamental merece os olhares não só do Direito Civil, do Direito Administrativo e do Direito Penal, mas do conjunto de todos os fundamentos das ciências de forma integralizada. 2 A TUTELA PENAL DO MEIO AMBIENTE 2.1 ORIGEM DA TUTELA PENAL DO MEIO AMBIENTE

Para melhor compreender a tutela penal do meio ambiente, mister a análise histórica quanto a evolução da legislação penal que se destinou a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Tem-se que a legislação de natureza fundamentalmente penal é bem mais escassa do que a de natureza civil e administrativa.75 A primeira formulação legislativa penal foi o Código Criminal do Império do Brasil, de 1830, que estabelecia sanções para quem destruísse ou danificasse construções, monumentos e bens públicos e, também, para quem cortasse árvores ilegalmente.76

No Código Penal de 1890, o Decreto nº 847, também pode ser encontrada uma breve alusão ao corte de árvores. Em relação à Consolidação das Leis Penais, aprovada e adotada pelo Decreto nº 22.213/1932, tem-se a proteção parcial do meio ambiente cultural; em seu artigo 390, a exemplo do Código Penal de 1890, também em artigo do mesmo número, dispõe sobre a proteção ambiental. Posteriormente, o Código Penal de 1940, o Decreto-Lei nº 2.848, previa, o crime de corrupção ou de poluição de água potável. Todavia, esse dispositivo legal protegeu apenas a água potável, e não àquela já considerada poluída. Esse Código tutelava indiretamente o meio ambiente em seus artigos 165 (dano in cousa de valor artístico, arqueológico ou histórico); 166 (alteração de local especialmente protegido); 252 (uso de gás tóxico ou asfixiante); 259 (difusão de doença ou praga); e 270, caput e §1°, 1ª parte (envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal).77

O Decreto-Lei nº 3.688/1941, conhecido por Lei das Contravenções Penais, em seus artigos 38 e 64, de modo tímido dispôs sobre a proteção ambiental. Este texto legal na verdade, tratou da poluição e da proteção dos animais. Entretanto, da legislação citada, esses dispositivos são os mais próximos do moderno Direito Penal Ambiental, pois tinham por objetivo também, o princípio da prevenção.

73 SÉGUIN, Elida. Direito Ambiental: nossa carta planetária. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 25-6. 74 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de direito ambiental e legislação

aplicável. 2.ed. [s.l.]: Max Liminad, 1999. p. 31-32. 75 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade penal ambiental. texto não publicado, 2011. 76 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade penal ambiental. texto não publicado, 2011. 77 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 55.

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Para Orci Paulino Bretanha Teixeira, a evolução do que se pode denominar de Direito Penal Ambiental, tem como grande marco o artigo 1578 da Lei nº 6.938/81, com a redação conferida pela Lei nº 7.804/1989, que introduziu no sistema penal a responsabilidade pelo crime de poluição. Como ele mesmo destaca

as normas penais editadas até 1940 foram insuficientes para uma efetiva proteção do meio ambiente por si só. A proteção se limitava a alguns bens isolados e se dava por razões patrimoniais e não como recursos da humanidade essenciais à própria sobrevivência da vida.79

Comprova-se tal assertiva, com alguma facilidade, tendo como ponto de partida a legislação ambiental, uma vez que, alguns danos são as vezes irreversíveis quando produzidos. Para Orci Paulino Bretanha Teixeira80, a legislação ambiental além de ter o caráter preventivo também tem o caráter educacional. Nessa conjuntura, tendo se revelado precária a legislação infraconstitucional até então produzida, somada a falta de conscientização quanto à necessidade de proteger o meio ambiente, foi editada a Le nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, regulamentando o artigo 225, §3º, da Constituição Federal de 1988, como já explicitado. A Lei nº 9.605/1998 dispôs sobre as sanções penais e administrativas para as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, ainda, precursoramente tipificou os delitos ambientais imputados às pessoas físicas e às pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado, sendo impar ao dispor sobre responsabilidade penal de pessoa jurídica, o que significou um grande avanço na proteção ambiental81

A Lei nº 9.605/1998 revogou parcialmente a Lei nº 6.938/1981 quanto às sanções penais e administrativas relativas ao meio ambiente. Além do art. 15 da Lei nº 6.938/1981, que dispunha sobre o crime ambiental, a Lei nº 9.605/1998, também revogou os artigos 165, 166, 252, 259, 270, caput, § 1ª parte, e 271, todos do Código Penal e os artigos 28, 38, 42 e 64, todos da Lei das Contravenções Penais. Outros textos infraconstitucionais que dispunham sobre crime ambiental também foram revogados pela Lei dos Crimes Ambientais. Tais como: o artigo 26, “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, “i”, “n”, “o”, e o artigo 45, §3º, da Lei nº 4.471/1965 (código florestal); os artigos 4º, 17, 18, 27, caput, §1º e §2º, da Lei nº 5.197/1967 (Código de Caça) ; os artigos 20, 21, 22, 24 3 25 da Lei nº 6.453/1977 (atividades nucleares); o artigo 8º da Lei 7.679/1988 (proibição de pesca de espécies em períodos de reprodução); os artigos 15 e 16 da Lei 7.802/1989 (agrotóxicos); e o artigo 21 da Lei 7.805/1989 (lavra garimpeira).82

2.2 O DIREITO PENAL AMBIENTAL

A manifestação da tutela jurídica do meio ambiente é em decorrência da ameaça, constante, assim como definiu José Afonso da Silva “não só do bem-estar, mas a qualidade da vida humana, se não a própria sobrevivência do ser humano”.83 A manifestação do Direito Ambiental no controle da qualidade ambiental, em função da qualidade de vida,

78 Art. 15. O poluidor que expuser a perigo a incolumidade humana, animal ou vegetal, ou estiver tornando mais grave situação de perigo existente, fica sujeito a pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a mil 1000 (MRV).

[...] II – a poluição é decorrente de atividade industrial ou de transporte. III - o crime é praticado durante a noite em domingo ou feriado. § 2º. Incorre no mesmo crime a autoridade competente que deixar de promover as medidas tendentes a impedir a

pratica das condutas acima descritas. 79 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade Penal Ambiental.texto não publicado, 2011. 80 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade Penal Ambiental.texto não publicado, 2011. 81 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade Penal Ambiental.texto não publicado, 2011. 82 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito

fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 57. 83 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 28.

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agredida pela própria ação desmedida do homem, pode-se dizer que é a busca da tutela do meio ambiente.

E como ferramenta, ou propriamente um ramo da tutela jurídica do meio ambiente, a tutela penal do meio ambiente é hoje um instrumento jurídico apto, importantíssimo para a proteção, manutenção e preservação de um ambiente ecologicamente equilibrado, para que a vida seja possível nas sua diferentes formas. A tutela do meio ambiente assim como afirma Eladio Lecey, “tem merecido a atenção de toda a humanidade, sendo objeto de preocupação nos mais diversos países do planeta”.84

O Direito Penal Ambiental foi introduzido no sistema jurídico como uma forma de proteger o meio ambiente e sancionar as atividades e as condutas nocivas a sua existência como um sistema complexo que é. O Direito Penal quis na verdade manter a harmonia entre o homem e a natureza, e incorporar a repudia da sociedade em relação aos danos causados a essa relação. Leciona nesse sentido Eladio Lecey que,

[...] o meio ambiente ecologicamente equilibrado é essencial à qualidade de vida a ponto de impor-se ao Poder Público e à coletividade o dever de vida a ponto de preservá-lo às presentes e futuras gerações. [...] Bem de tal extrema importância, não pode ficar alheio ao Direito Penal, cujas regras devem estender-lhe proteção.85

Nota-se que o ambiente é tutelado e protegido, como um valor em si mesmo, pelo que representa às gerações presentes e futuras, como destaca nossa própria Constituição de 1988.86 A tutela penal do meio ambiente, por consequência, decorre da relação do homem e a natureza, que o direito tratou de regular e proteger.

Ensina Celeste Gomes que, “A proteção do meio ambiente não se resume apenas a conservação, mas coordenação e racionalização do uso dos recursos, com a finalidade de preservar o futuro do homem”.87 A criminalização do dano ambiental deve ser analisada a partir da perspectiva da evolução da sociedade. A evolução social fez com que tivéssemos uma visão de consumo sustentável, frente à escassez destes recursos. A necessidade de punir os danos ao meio ambiente provocou a intervenção do Estado para a preservação dos recursos naturais. Eladio Lecey assevera que “O direito Penal Ambiental incrimina não só o colocar em risco a vida, a saúde dos indivíduos e perpetuação da espécie humana, mas o atentar contra a própria natureza”.88 Édis Milaré89 coloca como sendo uma questão de “vida ou morte” restabelecer o equilíbrio ecológico em nossos dias, pois os fenômenos biológicos e suas manifestações sobre o planeta estão sendo alterados muito perigosamente. Por isso, a indiferença da tutela do Direito Penal, frente ao clamor social pela criminalização das condutas antiecológicas, estaria ferindo a sua reputação, enquanto ciência do direito responsável por assegurar os direitos fundamentais.

A punição aos danos primeiramente, tinha uma visão econômica dos recursos naturais, passando posteriormente a uma visão protecionista, pois o meio ambiente é um complexo de interações de diversos elementos, que refletem diretamente na vida do homem. A criminalização aos limites extrapolados surgiu como uma forma de preservação, proteção e

84 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 37.

85 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 38.

86 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 39.

87 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 1.

88 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 39.

89 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 845.

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melhoria a qualidade ambiental, e não simplesmente, uma forma de punição do Estado. A observação de Alex Fernandes Santiago é muito clara quando fala que, o Direito Penal Ambiental tem a sua missão muito bem definida:

Dois marcos bem nítidos fixam a missão do Direito Penal Ambiental e dentro destes marcos deve ser examinada e avaliada sua eficácia: proteger o meio ambiente como uma composição de interesses sociais e, em sentido acessório, fazê-lo somente frente aos ataques mais intoleráveis e atuando de modo subsidiário. O Direito Penal deve sancionar pouco e bem[...].90

A responsabilização criminal, por se tratar de aplicação de uma pena, tem a feição mais impositiva, pois reflete diretamente o grau de reprovabilidade da conduta realizada. Eladio Lecey91 faz uma bela demonstração da utilidade do direito criminal na tutela penal do meio ambiente. Portanto como ele classifica, o Direito Penal Ambiental mostra-se útil: como resposta social, tendo em vista a natureza do bem tutelado, pois o meio ambiente é um bem da coletividade transcendendo ao indivíduo, merecendo, portanto, o rigor da sanção penal; como instrumento de pressão à solução de conflitos, pois deve atuar nas mais graves lesões e violações ao meio ambiente; como instrumento de efetividade das normas gerais, pois como resposta social e instrumento de pressão, torna efetiva as normas que não são penais, que por vezes, só se tornam efetivas com a aplicação da norma penal; e como instrumento de prevenção, pois o mais notório papel do Direito Penal é o de prevenir a ocorrência de delitos ambientais.

Contribui nesse sentido Alex Fernandes Santiago92, quando aponta as vantagens do Direito Penal na proteção do meio ambiente, observando-se a dosada intervenção. Pois frente ao Direito Civil, o Direito Penal aporta a dimensão sancionatória. O Direito Penal carrega consigo, a força do mecanismo público de persecução de infrações, o que lhe dá uma o status de comunicativa superior. Como ele mesmo afirma “o direito penal é bem menos romântico do que se costuma imaginar. Os tipos penais constituem verdadeira autorização primária para que o Estado possa intervir em certas áreas reservadas da esfera da liberdade individual”.93 E ainda, frente ao Direito Administrativo, o Direito Penal aporta maior neutralidade política, assim como a imparcialidade jurisdicional.

Em que pese, a sanção penal ambiental tenha, em uma analise menos rebuscada, um caráter meramente repressivo, pois em tese age somente após a atividade lesiva, ela pode desempenhar um duplo papel. O papel da repreensão e da prevenção. Mas prevenir é o mais importante em tratando-se do bem jurídico que atinge a coletividade, como é o meio ambiente, pois não há qualquer mérito em punir quando o dano, as vezes, irreversível já ocorreu.

Para Alex Fernandes Santiago94, existem três formas em que se dá a prevenção do dano ambiental através do Direito Penal. A primeira delas é pela técnica da tipificação das condutas prejudiciais ao meio ambiente, pois também são tipificadas condutas de perigo, antecipando o momento de consumação, evitando portanto, o dano ambiental; a segunda, pela prevenção geral positiva feita pela norma penal, reafirmando o bem ambiental como

90 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do Direito Penal na defesa do Meio Ambiente. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 61, p. 83, jan./mar. 2011.

91 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 40-1.

92 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do Direito Penal na defesa do Meio Ambiente. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 61, p. 84-86, jan./mar. 2011.

93 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do Direito Penal na defesa do Meio Ambiente. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 61, p. 86, jan./mar. 2011.

94 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do Direito Penal na defesa do Meio Ambiente. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 61, p. 101-102, jan./mar. 2011.

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fundamental e relevante para a sociedade; a terceira, pela prevenção especial impositiva, dirigida ao infrator, reafirmando o valor do bem atingido. Para Gilberto Passos de Freitas,

[...] a relevância do objeto tutelado justifica a intervenção penal. Daí se falar em Direito Penal Ambiental. Outrossim, por ser o meio ambiente um bem difuso, alguns conceitos e princípios consagrados no Direito Penal tradicional a eles não se aplicam ou se aplicados, devem se amoldar às especialidade e aos princípios do Direito Ambiental.95

Portanto o Direito Penal Ambiental aporta os principais princípios do Direito Ambiental, quais sejam: princípio do ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental; principio do controle do poluidor pelo Poder Público; princípio do poluidor-pagador e princípio da prevenção. Este último é basilar do Direito Ambiental, concernindo à prioridade que deva ser dada às medidas que evitem o nascimento de atentados ao meio ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar sua qualidade.96

2.3 A SUBSIDIARIEDADE DA RESPONSABILIDADE PENAL

A responsabilidade ambiental, em termos genéricos, representa destinar a alguém um ônus pelo resultado de ações que lesem, ou que venham a lesar o ambiente ecologicamente equilibrado, ou seja, imputar as consequências ao infrator da transgressão à legislação ambiental e causador de um dano, muitas vezes tecnicamente irreparável. A responsabilidade não se aplica tão somente em casos de danos já causados propriamente, mais se funda também em um risco de dano que certas atividades ou atitudes que se tomadas venham a causar.

A palavra responsabilidade tem origem latina, respondere - responsa97, tomado na significação de se responsabilizar, garantir, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou ou do ato que praticou. Edson José da Fonseca observa que,

Em seu sentido amplo, revela-se como o dever jurídico em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais que lhe são impostas.98

A responsabilidade ambiental é reflexo de uma ação ou de uma omissão. E como bem vislumbra Alessandra Rapassi Mascarenhas Prado a responsabilidade, é termo que se refere às consequências da conduta e,

sob o prisma jurídico-penal: a obrigação de suportar as consequências jurídicas do crime. Mediante a determinação da responsabilidade, procura-se tornar obrigado alguém a ressarcir um dano ou a sofrer determinada pena, por motivo daquele que deu causa.99

A responsabilidade por dano ambiental, como muito bem observado pela Constituição Federal, poderá ter reflexos penais, civis e administrativos, de acordo com a natureza da infração, do dano ou da lesão ao meio ambiente. A caracterização da responsabilidade a ser imputada dependerá da natureza jurídica da infração, bem como, da gravosidade do dano ambiental cometido.

95 FREITAS, Gilberto Passos de. Direito Penal Ambiental. In: PHILIPPI JR., Arlindo; ALVES, Alaôr Caffé. (Edit). Curso interdisciplinar de direito ambiental. Barueri: Manole, 2005. p. 400.

96 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 162. 97 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal.

São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 13. 98 FONSECA, Edson José da. A responsabilidade penal da pessoa jurídica no direito constitucional brasileiro. In:

MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. p. 793.

99 PRADO, Alessandra Rapassi Mascarenhas. Proteção penal do meio ambiente: fundamentos. São Paulo: Atlas, 2000. p. 129.

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O método de verificação da modalidade de responsabilidade a ser empregado, decorre dos procedimentos organizados em seu ramo jurídico, uma vez que são aferidos de modo diferenciado pelas áreas do direito. Portanto, cada esfera manifesta-se de maneira diferente em relação ao dano ambiental. O que não exclui a possibilidade de comunicação entre as esferas. A concomitância de imputação de responsabilidade não causa prejuízo aos procedimentos de cada esfera jurídica.

A persecução penal não causa prejuízo, a responsabilização civil, que visa, por exemplo, a reparação do dano, e muito menos a responsabilização administrativa que, por exemplo, visa a aplicação de multas. A responsabilidade ambiental está devidamente separa no que concerne a matéria da responsabilidade, visando a tutela, proteção, preservação e manutenção do ambiente, conforme muito bem dispôs a Política Nacional do Meio Ambiente.

Na tentativa de ajustar a aplicação jurisdicional adequada, temos os remédios jurídicos, que visam evitar um dano ecológico fruto de uma conduta intencional ou negligente. Neste diapasão busca-se desestimular uma conduta ilícita e a correção das violações de direito. Repercutindo obviamente na aplicação de uma penalidade, na busca da reparação e na cessação do dano. Neste contexto a responsabilidade civil por dano ambiental, por exemplo, predispõe prejuízo a terceiro, ensejando pedido de reparação de dano, consistente na recomposição do status quo ante ou numa importância em dinheiro. Esta modalidade pressupõe reparação do dano ambiental.100 A responsabilidade administrativa é resultado do descumprimento de normas administrativas, acarretando ao infrator uma sanção de natureza também administrativa101. Exemplificando: multa, advertência e a interdição de atividades.

A responsabilidade penal, por sua vez, decorre da prática de uma infração penal102, podendo ser subdivida em: responsabilidade penal individual; e a responsabilidade penal da pessoa jurídica, sendo esta segunda, tema do presente trabalho. Entretanto, a doutrina clássica do direito revela que o Direito Penal e a responsabilidade penal devem ser utilizados como ultima ratio. Daí falar-se em subsidiariedade do Direito Penal Ambiental, pois o Direito Penal Ambiental atua no auxilio da tutela do meio ambiente, na medida em que se mostram ineficientes as normas gerais de regulação do meio ambiente. O Direito Penal Ambiental é a garantia de efetivação das Leis, e subsidiariamente atua no suprimento das sanções. Como observa, Alex Fernandes Santiago,

A contribuição do Direito Penal há de ser, inevitavelmente, modesta. É de sua natureza que seja assim. Não é desiderato das normas penais melhorar sem mais nem menos a situação ambiental nem reduzir por si só os agentes contaminantes senão em um quadro de uma complexa estratégia da qual forma somente uma pequena parte, pretendem prevenir comportamentos que atentem contra o meio ambiente de um modo ilícito e, cumulativamente e não disjuntivamente, que sejam comportamentos graves.103

O amparo penal do meio ambiente deve incidir sobre o caso concreto quando as outras áreas do direito, ou seja, outras instâncias da responsabilização jurídica, tenham se mostrado ineficazes para coibir a atividade lesiva. Na visão de Édis Milaré,

[...] a abordagem do Direito Penal surge como a ultima ratio, devendo esse ramo do Direito incidir sobre o caso concreto somente quando as demais

100 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 824. 101 FONSECA, Edson José da. A responsabilidade penal da pessoa jurídica no direito constitucional brasileiro.

In: MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. p. 794.

102 FONSECA, Edson José da. A responsabilidade penal da pessoa jurídica no direito constitucional brasileiro. In: MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. p. 795.

103 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do Direito Penal na defesa do Meio Ambiente. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 61, p. 82, jan./mar. 2011.

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instâncias de responsabilização jurídica – civil e administrativa, que são menos gravosas – tenham se mostrado insuficientes para coibir a conduta infracional.[...]

104 Sob a ótica de Eladio Lecey, “A ofensa ao meio ambiente não diz uma pessoa, mas

com a coletividade. [...] Em razão da acentuada danosidade social é que se mostra indispensável, como ‘ultima ratio’ a tutela penal do meio ambiente”.105 Luiz Regis Prado106 analisa a interferência do Direito Penal na defesa do meio ambiente como sendo oportuna nas atividades lesivas mais graves ao bem jurídico ambiental. O Direito Penal, portanto, para ele, tem função subsidiária, auxiliar, mas que não se pode excluir sua intervenção de forma direta e independente quando houver grave ataque ao meio ambiente. Édis Milaré107 compactua da idéia de Luiz Regis Prado, quando diz que, quando no caso concreto, as demais áreas forem suficientes para atingir integralmente a prevenção e a reparação tempestiva, na há mais razão de se incidir o Direito Penal.

Entretanto, observa Valdir Sznick, que o Direito penal protege a vida e incolumidade pública pessoal, mas a coletividade fica desassistida quando a ameaça é a vida e incolumidade especialmente em violações novas ao comércio e ao meio ambiente: “Mais importante do que a vida de um ou dois indivíduos que o direito penal, com tanto empenho pune, é a vida e incolumidade da coletividade ameaçada pelas agressões ao meio ambiente, agressões que podem chegar até o genocídio”.108 Neste contexto, e muito importante ressaltar que no Direito Penal Clássico não há aproximação deste com o Direito Administrativo e Civil, para o completamento da tutela ao meio ambiente. Portanto, é necessária a interlocução do Direito Penal de outros ramos das ciências para que haja uma efetiva persecução penal ambiental, sob pena de inabilidade dos princípios e conceitos clássicos do Direito Penal frente às grandes ameaças ao meio ambiente.

Contudo o Direito Penal Ambiental rompe com a visão tradicional do Direito Penal, pois este é portador não só dos princípios consagrados das Ciências Penais, mas também é portador dos princípios e fundamentos do Direito Ambiental, que tem por objetivo a eliminação da ameaça ao meio ambiente muito antes que ele ocorra. O Direito Penal Ambiental deve ser considerado subsidiário na medida em que ele se apresenta como via do direito sancionador e impõe a execução de normas gerais reguladoras de prevenção do dano ao meio ambiente.

3 RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DA PESSOA JURÍDICA

Responsabilizar criminalmente as pessoas jurídicas pela prática de ilícitos penais é uma tendência mundial, pois elas, em decorrências de suas atividades e interesses econômicos têm um potencial destruidor cada vez maior.109 A Constituição Federal, no seu artigo 225, § 3º, dá o fundamento para punir as pessoas jurídicas, “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. A Lei nº 9.605/98 que regulamentou o dispositivo constitucional estabelece o tipo penal para as pessoas jurídicas “sempre que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade”.

104 MILARÉ, Edis. Tutela Processual do Ambiente. In: PHILIPPI JR., Arlindo; ALVES, Alaôr Caffé. (edit). Curso interdisciplinar de direito ambiental. Barueri: Manole, 2005. p. 483.

105 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 40-1.

106 PRADO, Luiz Régis. Crimes contra o ambiente. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1998. p. 17. 107 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 4. ed. rev., ampl., atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 847-

848. 108 SZNICK, Valdir. Direito penal ambiental. São Paulo: Ícone, 2001. p. 71-72. 109 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. Responsabilidade Penal Ambiental. Texto não publicado, 2011.

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Orci Paulino Bretanha Teixeira110 observa que a previsão constitucional, do §3º do artigo 225, da expressão “atividades” ficou reservada pelo constituinte para as pessoas jurídicas de direito público e privado, enquanto a expressão “condutas” ficou reservada para as pessoas naturais. Toshio Mukai111, observa que a Lei nº 9.605/1998, concretizando a previsão Constitucional, quanto a responsabilidade penal, administrativa e civil das pessoas jurídicas, avança como uma das mais modernas legislações a respeito.

As pessoas jurídicas de direito privado desempenham um papel cada vez mais importante na sociedade moderna, positivo ou negativamente. Portanto no atual contexto em que a sociedade encontra-se num acelerado estágio de modernização e crescimento, o que por consequência reflete numa maior amplitude da globalização, as pessoas jurídicas passaram a integrar posição de maior evidência na vida econômica – social da sociedade, necessitando de um especial tratamento das ciências jurídicas. Todavia, as pessoas jurídicas, ao mesmo tempo em que beneficiam a coletividade, podem, em determinadas situações, causar danos de consideráveis proporções, como por exemplo, danos ao meio ambiente. Paulo Affonso Leme Machado, por exemplo, afirma,

O acolhimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica na Lei 9.605/98 mostra que houve atualizada percepção do papel das empresas no mundo contemporâneo. Nas últimas décadas, a poluição, o desmatamento intensivo, a caça e a pesca predatória não são mais praticados só em pequena escala. O crime ambiental é principalmente corporativo.112

Esclarece Paulo Affonso Leme Machado113 que a previsão única e exclusivamente de responsabilizar o homem individualmente enquanto pessoa física frente aos crimes ambientais é aceitar a imprestabilidade ou inutilidade do Direito Penal para corroborar na melhoria da qualidade ambiental e a sua devida recuperação. Pois o homem se locupleta através da atividade da pessoa jurídica, que em sendo ilegal ou nociva devam ser sancionados.

O Direito Penal Ambiental, como qualquer outra ciência, tem por objetivo tutelar o meio ambiente, e por consequência mantê-lo ecologicamente equilibrado, livre de ações danosas que possam comprometer a qualidade de vida existente e futura. A proteção do meio ambiente constitui um problema fundamental no mundo contemporâneo, e nesse contexto a tutela penal desse bem jurídico surgiu como uma forma constitucionalmente valida para tentar minimizar ou evitar os danos causados por uma sociedade repleta de avanços tecnológicos e científicos, que contribuiu é muito para sua degradação. Para tanto, o direito tenta resolver com medidas de caráter punitivas e preventivas, conflitos da sociedade moderna, economicamente em desenvolvimento, e a proteção do meio ambiente. Rodrigo Andrade Viviani alerta que,

No Brasil, o legislador enfocou a responsabilidade criminal da pessoa jurídica em relação aos delitos que lesam o meio ambiente, haja vista a grande periculosidade que eles representam à saúde e à vida humana, sobretudo porque a Constituição da República Federativa anunciou que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.114

110 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 57. nota de rodapé.

111 MUKAI, Toshio. Direito Ambiental sistematizado. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. p. 86-87.

112 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. rev., atual., ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 685.

113 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. rev., atual., ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 686.

114 VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Aspectos Controvertidos no Direito Brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008. p. 58.

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As pessoas jurídicas representam, pela natureza das suas atividades, uma maior possibilidade de gerar danos ao ambiente, do que pessoas que agem individualmente. E como bem observa Valdir Sznick,

A necessidade da punição da pessoa jurídica tornou-se uma exigência da própria sociedade, tanto nas relações de consumo como no campo ambiental; neste último coloco-se em risco a vida e saúde do individuo – e de gerações futuras – ameaçando, inclusive, a própria espécie humana, daí a relevância jurídica da punição nessa área.115

A responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica de direito privado, no ordenamento jurídico brasileiro, ainda não é tema pacifico, face ao posicionamento divergente dos principais operadores do direito diante desse instituto, introduzido pela Constituição Federal de 1988, no artigo 225, §3º, regulamentado dez anos depois pelo artigo 3º da Lei nº 9.605/1988. Diante dos diversos entendimentos quanto a real possibilidade de aplicação da responsabilização criminal das pessoas jurídicas, estão presentes os principais doutrinadores do Direito Penal brasileiro. Como afirma Alessandra Rapassi Mascarenhas Prado,

A doutrina divide-se. Uma parte entende que o texto Constitucional reconhece a possibilidade dessa responsabilidade, cabendo a lei concretizá-lo. Alguns doutrinadores advertem, porém, que só será possível essa concretização após uma revisão do princípios do direito Penal. Em outro sentido, há autores que negam que a Constituição tenha previsto com o dispositivo a incriminação da pessoa jurídica, deduzida de uma interpretação gramática.116

Destes doutrinadores que divergem em suas posições, podemos extrair que a discussão está acerca da possibilidade da pessoa jurídica ser considerada delinquente, ou seja, ser sujeito ativo, capaz de cometer um ilícito penal e de estar no pólo passivo de uma ação penal. Ou seja, a discussão está na seara da culpabilidade, da capacidade de ação, e da capacidade pena. Celeste Gomes aponta que “A objeção mais séria, para responsabilização penal das pessoas jurídicas, refere-se à culpabilidade até então só compreensível nas pessoas físicas, capazes de agir por si mesmos, Isto é, com vontade própria, com dolo ou culpa. Aponta-se, ainda, a falta de capacidade de ação e de pena”.117

Sobre a responsabilização penal da pessoa jurídica, apesar estar prevista no ordenamento jurídico brasileiro, como um instrumento de controle ambiental, ainda emerge discussões, no que tange a sua efetiva aplicabilidade no sistema jurídico brasileiro. Isto porque a tradicional doutrina jurídica penal, não vislumbra com clareza a pretensão estatal de responsabilizar a pessoa coletiva por crimes, baseando-se no clássico princípio societas delinquere non potest. Entretanto, Luis Paulo Sirvinskas, ressalta que “[...] a pessoa jurídica não pode ser vista com os olhos do conceito da doutrina clássica. Deve-se observar suas particularidades para eventual aplicação da pena de caráter penal”.118

Sílvia Capelli revela que é possível juridicamente a aplicar a responsabilidade penal da pessoa jurídica, mas, não dentro de um padrão tradicional de direito. Ela relata que “efetivamente, a repressão às pessoas jurídicas afigura-se como não sendo possível dentro de pressupostos estatuídos no Código Penal, mas não invencíveis pelo ordenamento constitucional”.119 A preocupação do legislador em garantir uma forma de proteção ambiental

115 SZNICK, Valdir. Direito Penal Ambiental. São Paulo: Ícone, 2001. p. 57. 116 PRADO, Alessandra Rapassi Mascarenhas. Proteção penal do meio ambiente: fundamentos. São Paulo: Atlas,

2000. p. 129. 117 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal.

São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 35. 118 SIRVINSKAS, Luis Paulo. Tutela do Meio Ambiente: Breves considerações atinentes à Lei n. 9.605, de 12-2-

1998. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 22. 119 CAPELLI, Sílvia. Novos Rumos do Direito Ambiental. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci Paulino

Bretanha; ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 76.

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gera discussões acerca da possibilidade da imputação penal da pessoa jurídica frente aos também, tradicionais conceitos de culpabilidade, os quais devem ser reavaliados e reformulados, visando a adequação prática. Celeste Gomes, afirma que devem existir novas concepções doutrinárias e alerta,

Não há dúvida que o processo para essa responsabilização tem de ser diverso do processo contra pessoas físicas calcado no dogma da culpabilidade, na responsabilidade subjetiva. É obvio também, que entre as sanções aplicáveis àquela, não pode estar as sanções privativas de liberdade pertinentes à pessoa individual. Deverão ser previstas sanções apropriadas como as pecuniárias apreensão de bens, prestação de serviço a comunidade, etc.120

Nesse sentido, observa-se que face a natureza jurídica da pessoa jurídica, o legislador inteligentemente previu a necessidade de aplicação de penas adequadas. Ou seja, o próprio legislador adequou às sanções penais em relação às pessoas jurídicas, por uma simples obviedade: as pessoas jurídicas não podem ser cerceadas de liberdade. Na própria Lei nº 9.605/1998, o artigo 21 dispõe sobre as penalidades cabíveis as pessoas jurídicas de acordo com o disposto no artigo 3º da Lei, sendo elas: a multa; restritivas de direitos; prestação de serviço à comunidade. Mas para uma melhor clareza do tema, é necessário entender em quais pressupostos estão estatuídas as diferentes posições doutrinárias do direito. Destarte, necessária a analise da pessoa jurídica como sujeito de direito e de deveres no sistema jurídico brasileiro para a definição da divergência. 3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO

O termo pessoa, que deriva da expressão latina persona, definido por Deocleciano Torrieri Guimarães como sendo “ser que é capaz de exercer direitos e contrair obrigações”121. É utilizado para referenciar as pessoas físicas, dotadas de vontade humana, e as pessoas jurídicas que é o conjunto de pessoas, para execução de uma finalidade. Pontes de Miranda muito bem fala que, “pessoa é o titular do direito, o sujeito de direito. Personalidade é a capacidade de ser titular de direitos, pretensões, ações e exceções e também ser sujeito (passivo) de deveres, obrigações, ações e exceções”.122 Mas como ele mesmo alerta,

só se deveria falar em pessoa, depois de se tratar dos sujeitos de direito, porque ser pessoa é apenas ter a possibilidade de ser sujeito de direito. Ser sujeito de direito é estar na posição de titular de direito. Não importa se esse direito está subjetivado, se é munido de pretensão e ação, ou de exceção. Mas importa que aja “direito”. Se alguém não está em relação de direito não é sujeito de direito. 123

Alessandra Rapassi Mascarenhas Prado124 define pessoa jurídica como sendo uma organização destinada a perseguir de uma finalidade, em que o ordenamento jurídico lhe atribui personalidade e titularidade de direitos e obrigações. Ela leciona que a pessoa jurídica é portanto, “organização destinada à prossecução de fins, a que a ordem jurídica atribui a sustentabilidade de ser titular de direitos e obrigações – pode ser considerada uma entidade fictícia, mera criação do direito, conforme a teoria da ficção; ou um ente real, organismos

120 GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 29-30.

121 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri (org.). Dicionário Técnico Jurídico. 9 ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 442. 122 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Civil: Parte Geral. 3. Ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970. Tomo I. p.

155. 123 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Civil: Parte Geral. 3. Ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970. Tomo I.

p.153. 124 PRADO, Alessandra Rapassi Mascarenhas. Proteção penal do meio ambiente: fundamentos. São Paulo: Atlas,

2000. p. 129

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análogos aos seres humanos, conforme a teoria da realidade – ambas desenvolvidas pela doutrina civil e comercial”.125

As pessoas jurídicas são entidades ou institutos a que a lei atribui personalidade jurídica. Com intuito de realizaram uma finalidade ou atividade em comum, portanto, vários indivíduos juntam seus esforços e bens, mas para agirem em unidade. “[...] É preciso que o grupo adquira personalidade, atuando em nome próprio, e não em nome de cada um de seus integrantes”.126 Quanto a responsabilidade penal da pessoa jurídica, existem correntes doutrinárias que se fixam predominantemente em duas teorias quanto a possibilidade de responsabilização e de forma de existência da pessoa jurídica: a teoria da ficção e da realidade.

3.1.1 A teoria da ficção de Savigny

No que concerne à teoria da ficção, temos que é originaria do Direito Romano e desde a Idade Média predomina na doutrina, sendo melhor elaborada cientificamente por Savigny, em meados de 1840.127 Esta teoria segue o princípio societas delinquere non potest. Para tanto afirma que as pessoas jurídicas têm existência fictícia, irreal ou de pura abstração – devido a um privilégio lícito da autoridade soberana, sendo, portanto, incapazes de delinquir, pois carecem de vontade e de ação.128 Para essa teoria a pessoa jurídica é apenas uma abstração, não obtendo vontade própria,

Na teoria da ficção as decisões das pessoas jurídicas são tomadas por seus membros, que são pessoas naturais passíveis de responsabilização por suas ações e omissões. Devido à falta de vontade finalística, esse ente não pode realizar comportamentos dolosos, tampouco culposos, porque o dever de cuidado só pode ser exigido daqueles que possuem liberdade para optar na ação a ser realizada. Valdir Sznick manifesta que,

Para essa teoria a pessoa jurídica só existe por força da ficção, daí não poder ser julgada culpada e punível, inobstante tenha a lei fixado condições. Com Savigny (1840) essa doutrina ganhou novas formulações assentando que só o homem, individualmente tomado em consideração, é dotado pela natureza de capacidade para ser sujeito de direito e de personalidade.129

Valdir Sznick faz uma curiosa constatação quando afirma que, “o direito civil (especialmente em reparação de danos, por ilícitos) e o direito administrativo, mesmo admitindo a pessoa jurídica como ficção, admitem a punição da pessoa jurídica”.130 No que tange aos argumentos daqueles que defendem a Teoria da Ficção, na aplicação ou não da responsabilidade penal da pessoa jurídica baseiam-se no fato de que a responsabilidade penal da pessoa jurídica esta fundado em elementos ou pressupostos que são, a capacidade de ação; a culpabilidade e capacidade de pena.131

Quanto a capacidade de ação, a teoria da ficção aposta que a ação no crime, tem caráter voluntário, e nas pessoa jurídicas esta ação seria uma vontade jurídica a partir de uma

125 PRADO, Alessandra Rapassi Mascarenhas. Proteção penal do meio ambiente: fundamentos. São Paulo: Atlas, 2000. p. 129.

126 PELUSO, Cezar (Coord). Código civil comentado: doutrina e jursiprudência. 4. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2010. p. 52.

127 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 106.

128 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território, biossegurança (com analise da Lei 11.105/05). São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 145.

129 SZNICK, Valdir. Direito Penal Ambiental. São Paulo: Ícone, 2001. p. 58 130 SZNICK, Valdir. Direito Penal Ambiental. São Paulo: Ícone, 2001. p. 58. 131 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 106.

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construção jurídica, pois não há atuação física dela e sim de seus administradores.132 Luiz Régis Prado afirma que “o delito só existe enquanto ação humana. O simples querer ou pensar, sem qualquer exteriorização, sequer pode ser objeto de consideração no campo penal”.133 Quanto a culpabilidade, entende-se com sendo “a capacidade de entender e de querer”134, ou ainda a consciência do fato típico e da antijuridicidade do fato. Como afirma Julio Fabbrini Mirabete, “a culpabilidade é a reprovabilidade da conduta típica e antijurídica”.135 E Segundo a teoria ficcionista, a pessoa jurídica não é capaz de saber ou analisar a responsabilidade do ato, nem mesmo de fazer o exercício de consciência, não havendo, portanto, elementos suficientes para criar um elo entre culpabilidade e periculosidade, causando a inexistência de reprovabilidade do ato.136 O conceito de culpa nesta teoria não se aplica a pessoa jurídica, por não haver possibilidade do reconhecimento da ilicitude por parte desta. No âmbito da capacidade de pena, a teoria da ficção, enfatiza que tal capacidade é inerente a pessoa física.137 Considerando que a pessoa jurídica “só pode sentir a sanção como um mal através daquele que a dirigem e a integram, que são as pessoas físicas”.138 3.1.2 A teoria da realidade ou da personalidade real

A teoria da realidade, da personalidade real ou orgânica, baseia-se em pressupostos totalmente diversos da teoria da ficção. Teve grande difusão na Alemanha, e sendo amplamente aceita nos países regidos pelo sistema Common Law.139 A pessoa moral não é um ser artificial, criado pelo Estado, mas sim um ente vivo, vivo e ativo, independente dos indivíduos que a compõem.140 Para a teoria da realidade, a pessoa jurídica é sujeito de vontade e por si só é ativo, sendo capaz de ação e de praticar infrações penais.141

Para essa teoria, a pessoa jurídica possui personalidade real, vontade emanada de sua capacidade, sendo capaz de ação e de praticar atos ilícitos, sendo capaz, portanto, de responsabilidade penal. Reconhecida assim sua capacidade criminal. A sua vontade não é formada pela soma de vontades de seus representantes, mas tem vontade própria, sendo um ser real, um verdadeiro organismo. Nesta esteira Clovis Bevilaqua afirma que,“A pessoa jurídica, como sujeito de direito, mesmo modo que do ponto de vista sociológico, é uma realidade, é uma realidade social, uma formação orgânica investida de direito pela ordem jurídica, no fim de realizar certos fins humanos”.142 Valdir Sznick observa que, essa teoria, contorna uma parte da objeção de que a pessoa jurídica não poder ser pessoa, pois,

132 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 107-108.

133 PRADO, Luiz Regis. Elementos de Direito Penal: parte geral. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. v.1. p. 76.

134 PRADO, Luiz Regis. Elementos de Direito Penal: parte geral. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. v. 1. p. 120.

135 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 196. 136 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 108-109. 137 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 108-109. 138 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 109. 139 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 110. 140 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território,

biossegurança (com analise da Lei 11.105/05). São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005. p. 145. 141 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS,

Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 47. 142 BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Francisco

Alves, 1944. v. 1. p. 221.

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No direito civil e no direito administrativo, não há objeção nenhuma a punição e imposição de penas. A única pena – hoje superada e cada vez menos utilizada – a pena privativa de liberdade não pode ser imposta, mas as penas pecuniárias (multa), as de interdição de direitos (como a suspensão de atividades da firma) e outras penas, as chamadas penas alternativas.143

Na teoria da realidade a pessoa jurídica possui capacidade de ação, por possuir vontade livre. Tendo essa faculdade de ação de vontade inteligente, a pessoa jurídica pode praticar atos que são considerados ilícitos, podendo, portanto, ser penalizada. No que concerne a culpabilidade e capacidade de pena, a teoria da realidade enfatiza que a pessoa jurídica tendo capacidade de ação é, portanto, sabedora do juízo de reprovabilidade da ação delituosa. Exemplifica Márcia Elayne Berbich de Moraes144, calcando-se no exemplo de grandes corporações, as quais têm vontade própria independente até mesmo da vontade de seus dirigentes. No tocante a capacidade de pena do ente coletivo, a teoria da realidade é clara ao manifestar-se que impossível aplicar a pena de privação de liberdade, mas existem penas alternativas para tanto. 3.2 POSICIONAMENTO DOUTRINÁRIO

As pessoas jurídicas tomaram posições relevantes na sociedade moderna, em virtude da movimentação econômica e social que proporcionam. Todavia, as pessoas jurídicas às vezes tentam se beneficiar de um bem da coletividade de maneira indiscriminada. No direito brasileiro, existem posições antagônicas em relação a responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito privado. O direito brasileiro arraigado num sistema jurídico romano-germânico tem dificuldades de aceitação, apesar de estar previsto na Constituição e em Lei, a responsabilização penal da pessoa jurídica, uma vez que, diversos juristas entre eles René Ariel Dotti, Cezar Roberto Bittencourt, Luiz Regis Prado, Eugênio Raúl Zafarroni, José Henrique Pierangeli entre outros, criticam que um ente coletivo possa ser sujeito ativo de crime, com argumentos de cunho individualista, pautados na conduta e na culpabilidade, que segundo eles seriam inerentes ao ser humano, jamais concebidos a uma pessoa coletiva, por ser desprovida de sentimentos e impulsos - típicos da ação ou omissão humana. Espelham-se nos princípios, societas deliquere non potest e nullum crimem sine conduta, compactuando da teoria da ficção de Savigny.

Em contraponto aos que negam a responsabilização penal da pessoa jurídica, estão Édis Milaré, Paulo José da Costa Júnior, Paulo Affonso Leme Machado, Eladio Lecey, Ada Pelegrini Grinover, entre outros, os quais compactuam de que a Constituição albergou a responsabilidade criminal da pessoa jurídica. Estes aceitam, por exemplo, a teoria da realidade, cujo precursor mais ilustre foi Otto Gierke. Fixam-se na idéia de que novas concepções devam ser alinhadas para aplicação da responsabilidade penal da pessoa jurídica.

Fato é que a Constituição, como já alertado, aceitando a teoria organicista ou da realidade, admitiu a responsabilidade penal da pessoa jurídica, no que concerne à ordem econômica e financeira, balizados no artigo 173, § 5º, e ao meio ambiente, em seu artigo 225, § 3º, tema desta pesquisa. Sem embargo, o Direito Penal através de seus princípios constitucionais deve entrar em harmonia com a nova realidade jurídica penal (pessoas jurídicas cada vez mais cometendo ilícitos penais, ou pelo menos pessoas cometendo cada vez mais crimes no âmbito da pessoa jurídica), sob pena de insegurança jurídica à coletividade. Neste sentido, o legislador ordinário introduziu de forma explicita a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, através da Lei nº 9.605/1988. Mas as opiniões, como já observado, divergem e as explicações estão pautadas na estrutura do Direito Penal tradicional e a

143 SZNICK, Valdir. Direito penal ambiental. São Paulo: Ícone, 2001. p. 58 144 MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (In)eficiência do Direito Penal Moderno para a tutela do Meio Ambiente

na sociedade de risco (Lei nº 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 111.

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necessidade de amparo penal ao meio ambiente através de punições mais severas aos entes coletivos. Eugênio Raúl Zafarroni e José Henrique Pierangeli compactuam da idéia de impossibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica, afirmando que a inexistência de conduta humana não caracteriza crime, sendo assim uma violação do principio nullum crimem sine conduta, como se observa no trecho abaixo:

Não se pode falar de uma vontade em sentido psicológico no ato da pessoa jurídica, o que exclui qualquer possibilidade de admitir a existência de uma conduta humana. A pessoa jurídica não pode ser autora de delito, porque não tem capacidade de conduta humana no seu sentido ôntico-ontológico.145

Argumentam Eugênio Raúl Zafarroni e José Henrique Pierangeli no sentido de que existem outros pressuposto utilizados pela doutrina para afastar a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, quais sejam: a inconstitucionalidade da pena pela transcendência e a incapacidade de culpabilidade, faltando o laço psicológico entre a ação e o entendimento da antijuridicidade. Afirmam os autores que de plano, só a capacidade de ação, afasta a possibilidade de aplicação da responsabilização penal,

Têm se usado outros argumentos para refutar a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Alguns que não tem capacidade de culpabilidade. Outros afirmam que a pena é inconstitucional, porque seria transcendente, isto é, afetaria pessoas que não participaram da decisão em virtude da qual é imposta uma pena. Estes argumentos são válidos, mas resultam desnecessários, porque cremos que a responsabilidade é descartada desde que falta a o caráter genérico do delito: não capacidade de conduta na pessoa jurídica.146

Observam ainda Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli que, a pessoa jurídica como criação do direito não pode lhe ser atribuída uma personalidade, considerando um equivoco do legislador nesse sentido, lhe conferir capacidade delitiva:

O legislador chegou ao absurdo extremo de atribuir à pessoa jurídica até mesmo uma personalidade, quando a doutrina francamente majoritária lhe nega capacidade de delinqüir, por faltar-lhe a vontade em sentido psicológico, só encontrável no ser humano e jamais numa mera criação do direito.147

Em sentido oposto posiciona-se Eladio Lecey, quando afirma que “não se pode buscar na pessoa jurídica o que ela não pode ter qual seja, a consciência da ilicitude. Mas se pode encontrar uma conduta e chegar a um juízo de reprovação social e criminal sobre a ação da pessoa jurídica”.148 Eladio Lecey, completa afirmando que,

Distinto deve ser o conceito de culpabilidade com relação à pessoa física à jurídica, não tendo como elemento, com relação a última, a potencial consciência da ilicitude, exigível no tocante à pessoa natural. Assim, diferente deve ser medida e conceituada a culpabilidade das distintas pessoas.149

Édis Milaré e Paulo José da Costa Júnior, aduzem que a responsabilidade penal da pessoa jurídica é na verdade uma responsabilidade social. Afirmam que a teoria da responsabilidade social permite construir um juízo de reprovação sobre a atividade da pessoa jurídica de direito privado, que tem finalidade o lucro. Referem que não se trata de um fato psicológico, mas de um comportamento institucional. Manifestam ainda que,

o juízo realizado na responsabilidade social atende a uma função própria: é um mecanismo de controle normativo social, que se exerce através da coação

145 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. p. 389.

146 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. p. 389-390.

147 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. p. 390.

148 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 50.

149 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 50.

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Estatal, ao mesmo tempo em que resolve conflitos produzidos pelas atividades de certas estruturas que entram em contradição com interesses da comunidade.150

Fernando Capez151, é de entendimento que, se foi vontade do Legislador Constituinte que os bens jurídicos relevantes, como o meio ambiente, devam ser protegidos contra agressões praticadas por entidades coletivas não há de se negar tal possibilidade “ante argumentos de cunho individualista, que serviram de fundamento para a Revolução Francesa de 1789”. Para ele a sociedade moderna precisa encontrar mecanismos de defesa contra agressões que se expandem e se modificam dia a dia. Argumenta finalizando: “Assim é o finalismo, o funcionalismo e outras teorias do Direito Penal que devem adaptar-se à superior vontade constitucional e não o contrário”. No mesmo sentido contribuem Edis Milaré e Paulo José da Costa Junior, afirmando que deve se rever conceitos tradicionais, reformulando-se, por exemplo, as previsões clássicas de culpabilidade, como podemos ver:

Aplicados aos cânones tradicionais que conceituam a culpabilidade, no âmbito penal, impossível reconhecer-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Nesse ponto, para atender à prevenção e repressão de crimes, cuja prática tem-se perpetuado entre, nós, mister a reformulação do conceito [grifo nosso]. A culpabilidade da pessoa jurídica não está adstrita à vontade, enquanto laço psicológico entre conduta e o agente, ou a sua consciência da ilicitude, mas a reprovabilidade de sua conduta.152

Nesta esteira de pensamento posiciona-se Guilherme de Souza Nucci153, ponderando que se confirmou a previsão Constitucional que dependia apenas de uma lei de caráter penal para sua efetiva aplicação, crendo ele estar com a razão aqueles que sustentam a viabilidade de a pessoa jurídica responder por crime no Brasil, após a edição da Lei nº 9605/1998. Já Cezar Roberto Bittencourt posiciona-se no sentido de que a disposição constitucional da responsabilização penal da pessoa jurídica é obscura, e como tal é um equivoco de ser defendida, uma vez que, a responsabilidade penal a despeito da previsão Constitucional ainda utiliza critérios subjetivos do delito, bem como, a individualidade e a pessoalidade consagrados Constitucionalmente no artigo 5º, referindo que a própria Constituição Federal estabeleceu que as punições as pessoas coletivas, estarão sujeitas a compatibilidade de sua natureza jurídica:

No Brasil, a obscura previsão do art. 225, §3º, da Constituição Federal, relativamente ao meio ambiente, tem levado alguns penalistas a sustentarem equivocadamente, que a Carta Magna consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica. No entanto, a responsabilidade penal ainda se encontra limitada à responsabilidade subjetiva e individual. [...] Para combater a tese de que a atual Constituição consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, trazemos à colação o disposto no seu art. 173, §5º.154[...] Dessa previsão pode-se tirar as seguintes conclusões: 1ª) a responsabilidade pessoal dos dirigentes não se confunde com a responsabilidade da pessoa jurídica; 2ª) a Constituição não adotou a pessoa jurídica de responsabilidade penal. [...]

Enfim, a responsabilidade penal continua a ser pessoal.155 A incapacidade criminal da pessoa jurídica é defendida veementemente por Réne

Ariel Dotti156, pois para ele somente a pessoa física, que o Código Civil chama de pessoa

150 MILARÉ, Édis; COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito Penal Ambiental – Comentários à Lei 9.605/98. Campinas: Millenium, 2002. p. 22.

151 CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: parte geral. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 141-142. 152 MILARÉ, Édis; COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito Penal Ambiental – Comentários à Lei 9.605/98.

Campinas: Millenium, 2002. p. 20. 153 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral, parte especial. São Paulo: Revistas do

Tribunais, 2005. p. 152 154 “A lei sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a

responsabilidade desta, sujeitando-as às punições compatíveis com sua natureza”. 155 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito penal: parte geral. 14. ed. ver. , atual. e ampl. São Paulo:

Saraiva, 2009. v. 1. p. 244-245.

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natural, pode ser sujeito de ativo da infração penal. Revela que somente o ser humano, com capacidade de ação pode ser classificado como autor ou partícipe do crime ou contravenção. René Ariel Dotti, manifesta-se no sentido de que,

A máxima societas delinquere non potest se mantém invariável nos sistemas penais positivos de um modo geral. O poder de decisão entre o fazer e o não fazer alguma coisa, que constitui a base psicológica e racional da conduta lícita ou ilícita, é um atributo inerente às pessoas naturais. Somente a ação humana, conceituada como a atividade dirigida a um fim, pode ser considerada como o suporte causal do delito.157

Revela René Ariel Dotti158, que a pessoa jurídica só pode ser sujeito passivo de um crime, como titular do bem jurídico atingido pela ação delituosa, mas não pode ser considerado autor. São as pessoas físicas que compõem e que agem em nome ou em benefício da pessoa jurídica é que serão os autores do ilícito penal. Conforme Luiz Regis Prado159 avalia, em um quadro sinótico, o Direito Penal brasileiro, de filiação romano-germânica, consagra o apotegma societas delinquete non potest, pois faltariam elementos essências a pessoa moral para ser responsabilizada penalmente. Sendo eles a falta de capacidade de ação em sentido estrito do Direito Penal; falta de capacidade de culpabilidade e falta de capacidade de pena. Para Luiz Regis Prado160 a interpretação lógica-sistemática afasta o acolhimento da responsabilidade penal das pessoas jurídicas pelo texto constitucional. Manifesta-se no sentido de que a previsão da responsabilidade penal de pessoa jurídica na Lei dos Crimes Ambientais, é insuscetível de aplicação imediata, por tratar-se de norma inconstitucional, pois defende a responsabilidade objetiva, não havendo a instituição de um microssistema de responsabilidade penal, restrito e especial, nem a previsão de regras processuais próprias.

Quanto a este último argumento de Luiz Regis Prado, referente às regras processuais, Ada Pelegrini Grinover161, manifesta que a falta de tratamento específico em matéria processual e procedimental, não acarreta prejuízos à aplicação do dispositivo previsto pela Lei nº 9.605/1998, que será integrado simplesmente, pelas regras existentes no ordenamento jurídico. Completa informando que: não haverá prejuízo a representação em juízo, a competência, o processo e o procedimento, os atos de comunicação processual e o interrogatório. Assegurando-se todas as garantias processuais. Utilizando-se da analogia, e na falta desta, deve-se recorrer aos princípios gerais do direito.

Eladio Lecey162 aduz que no tocante à óbvia impossibilidade de aplicar-se pena de prisão, a principal em matéria criminal, outras sanções podem ser impostas de forma eficaz à pessoa jurídica, como as pecuniárias, serviços comunitários, de recuperação e preservação ambiental, suspensão de atividades e até a dissolução da empresa. É o que estabelece a Lei dos Crimes Contra o Meio Ambiente, prevendo como sanções às pessoas jurídicas, restritivas de direitos e de prestação à comunidade. As restritivas consistem na suspensão parcial ou total de atividades, na interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e na proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações.

156 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 302. 157 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 302. 158 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 303 159 PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revistas dos

Tribunais, 2004. v.1. p. 287 160 PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revistas dos

Tribunais, 2004. v.1. p. 287 161 GRINOVER, Ada Pellegrini. Aspectos processuais da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. In:

MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. p. 543-544.

162 LECEY, Eladio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 47 – 48.

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3.3 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA

Em pesquisa realizada, nota-se que o entendimento jurisprudencial brasileiro ainda não é unissônomo em relação a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Observa-se que nos julgados colacionados, que admissão da responsabilidade penal da pessoa jurídica passa pela análise dos pressupostos exigidos pela lei, que viabilizam a tomada de decisão no sentido de responsabilizar a pessoa jurídica. Nesse sentido a tendência é que a responsabilidade penal da pessoa jurídica ocorra conjuntamente a pessoa física, face a determinação do artigo 3º da Lei nº 9.605/1998. A inexistência da pessoa física junto da pessoa jurídica na denúncia invariavelmente não tem seguimento no poder judiciário. Os Tribunais julgam pelo descabimento da persecução da ação penal. As primeiras decisões logo após a promulgação da Lei nº 9.605/1988, não foram muito promissoras aos que defendem a responsabilização da pessoa jurídica, pois calcado na visão doutrinária clássica, a jurisprudência concluiu por inadmissibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica por inconstitucionalidade do disposto no artigo 3º da Lei nº 9.605/1988, como percebe-se no Recurso em Sentido Estrito, julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso,

Recurso em sentido estrito. Crime Ambiental. Pessoa jurídica. Responsabilidade pena. Inadmissibilidade. Rejeição da denúncia. Decisão em consonância com orientação doutrinária e jurisprudencial dominantes. Recurso improvido. Mostra-se inconstitucional o art. 3º da Lei nº 9.605/98, no que diz respeito à responsabilidade penal da pessoa jurídica. A pessoa jurídica não pode ser sujeito ativo de crime. Inteligência do art. 5º, inciso LXV da CF/88.163

Vislumbra-se que a negativa de persecução penal da pessoa jurídica está na alegada falta de capacidade delitiva, por falta de vontade própria, adotando-se, portanto, a teoria ficcionista, como podemos ver no julgamento realizado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina no Recurso Criminal interposto pelo Ministério Público:

Crimes contra o meio ambiente. Denúncia ofertada contra pessoa jurídica. Ente coletivo que não pode ser responsabilizado pela prática de crime. Ausência de vontade própria. Recurso ministerial não provido.‘A pessoa jurídica, porque desprovida de vontade própria, sendo mero instrumento de seus sócios ou prepostos, não pode figurar como sujeito ativo de crime, pois a responsabilidade objetiva não está prevista na legislação penal vigente’ (RCR 03.003801-9, de Curitibanos, Relator Maurílio Moreira Leite, julgamento em 01 Abr 2003).164

No julgamento colacionado acima, não houve unanimidade nos votos, divergindo o Desembargador José Carlos Cartens Köhler, sob o argumento de que “apesar das grandes discussões acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica, inclusive nesta Corte de Justiça, após amplo e apurado estudo, entende esta relatoria que a atual legislação brasileira admite a responsabilidade deste ente”.165 Argumenta em seu voto ainda que, “A doutrina moderna compreende que os constituintes originários deram um grande passo ao responsabilizar a pessoa jurídica por danos ambientais”.166

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, também não adere totalmente a responsabilização penal da pessoa jurídica, como podermos ver no julgamento de Apelação

163 BRASIL. Tribunal de Justiça do Mato Grosso. Recurso em Sentido Estrito nº 1.457/01- Sinop – 2ª Câmara Crimina, relator Desembargador Donato Fortunato Ojeta. Cuiabá, MT. Decisão em 02 de maio de 2001. in: PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. v.1. p. 286.

164 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Recurso Criminal n° 2006.022946-4. Relator Desembargador Irineu João da Silva. Florianópolis, SC. decisão em 08 de agosto de 2006. Disponível em: < http:// www.tjsc.jus.br/> Acesso em: 19 Out 2011.

165 Voto do Desembargador José Carlos Cartens Köhler, no julgamento do Recurso Criminal nº 2006.022946-4, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

166 Voto do Desembargador José Carlos Cartens Köhler, no julgamento do Recurso Criminal nº 2006.022946-4, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

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Criminal, que invocando a inexistência de regras especificas para a persecução penal da pessoa jurídica, anulou o processo desde seu início.

Demonstra-se absolutamente nulo o processo penal movido em desfavor de pessoa jurídica, acusada da prática de crime ambiental, uma vez que a lei de crimes ambientais não previu um subsistema penal de caracterização específica do delito, bem como regras próprias ao sancionamento e execução penais compatíveis com a natureza do ente coletivo.167

Entretanto, é possível encontrar decisões receptivas a responsabilidade penal da pessoa jurídica, a exemplo do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que acolheu o recurso Ministerial no sentido de receber denúncia contra pessoa jurídica invocando os pressupostos Constitucionais. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul à luz da vontade Constituinte percebeu que feita a opção política de criminalizar a pessoa jurídica cabe aos operadores encontrar o caminho necessário para perfectibilizar a vontade do legislador, portanto, existindo resistência nesse sentido é ilegítima:

Apelação-crime. Denúncia. Rejeição. Crime ambiental. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, § 3º, determina expressamente que a pessoa jurídica está sujeita às sanções penais quando praticar condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Da mesma forma, preceitua o art. 3º da Lei nº 9605/98. Assim, não aceitar a responsabilização penal da pessoa jurídica é negar cumprimento à Carta Magna e à lei. Recurso de apelação julgado procedente.168

O Superior Tribunal de Justiça manifestou-se favoravelmente para a possibilidade da pessoa jurídica poder figurar no pólo passivo de uma ação penal, a despeito da controvérsia jurisprudencial, no julgamento de Recurso Especial, com a relatoria do Eminente Ministro Gilson Dipp:

Criminal. Crime ambiental praticado por pessoa jurídica. Responsabilização penal do ente coletivo. Possibilidade. Previsão constitucional regulamentada por lei federal. Opção política do legislador. Forma de prevenção de danos ao meio ambiente. Capacidade de ação. Existência jurídica. Atuação dos administradores em nome e proveito da pessoa jurídica. Culpabilidade como responsabilidade social. Coresponsabilidade. Penas adaptadas à natureza jurídica do ente coletivo. Recurso provido. [...] II. A Lei ambiental, regulamentando preceito constitucional, passou a prever, de forma inequívoca, a possibilidade de penalização criminal das pessoas jurídicas por danos ao meio-ambiente. [...]. V. Se a pessoa jurídica tem existência própria no ordenamento jurídico e pratica atos no meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de responsabilização penal. VI. A culpabilidade, no conceito moderno, é a responsabilidade social, e a culpabilidade da pessoa jurídica, neste contexto, limita-se à vontade do seu administrador ao agir em seu nome e proveito. [...] X. A Lei Ambiental previu para as pessoas jurídicas penas autônomas de multas, de prestação de serviços à comunidade, restritivas de direitos, liquidação forçada e desconsideração da pessoa jurídica, todas adaptadas à sua natureza jurídica. XI. Não há ofensa ao princípio constitucional de que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado...", pois é incontroversa a existência de duas pessoas distintas: uma física - que de qualquer forma contribui para a prática do delito – e uma jurídica, cada qual recebendo a punição de forma individualizada, decorrente de sua atividade lesiva. [...] XIII. Recurso provido, nos termos do voto do Relator.169

167 BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 0155.02.000841-5001(1). Relatora desembargadora Márcia Milanez. Belo Horizonte, MG. Decisão em 16 de novembro de 2004. In: VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Aspectos Controvertidos no Direito Brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008. p.88.

168 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Criminal nº 70009597717, Quarta Câmara Criminal. Relator Desembargador José Eugênio Tedesco. Porto Alegre, RS. Decisão em 14 de outubro de 2004. Disponível em: <http://www.mp.rs.gov.br/ambiente/jurisprudencia/id2476.htm>. Acesso em 15 out 2011.

169 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 564960/SC, 5º turma, relator Ministro Gilson Dipp. Brasília, DF. Decisão em 02 de junho de 2005, v.u., Diário da Justiça, 13 de junho de 2005. p. 331. Disponível

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Observa-se, que após o julgamento do Superior Tribunal de Justiça a respeito da responsabilidade penal da pessoa jurídica, que a receptividade nos Tribunais tem sido maior. Inclusive sendo tal julgamento utilizado como precedente para embasamento de decisões favoráveis a responsabilização criminal do ente coletivo. Verifica-se, no entanto que existe uma predominância de jurisprudência de segunda instância, tendo-se dificuldades encontrar decisões quanto a responsabilidade penal da pessoa jurídica em sede de primeiro grau. Contudo, no Rio Grande do Sul foi possível encontrar uma decisão de primeiro grau nesse sentido. Exemplo disto é o julgamento do processo nº 095/2.06.0002839-4, prolatado pela Vara Judicial da Comarca de Estância Velha, Rio Grande do Sul, em que constaram no pólo passivo da ação penal pública, promovida pelo Ministério Público, a União dos Trabalhadores em Resíduos Especiais e Saneamento Ambiental – UTRESA e o seu diretor técnico, Luiz Rauppenthal, por diversos delitos ambientais. Os réus foram condenados a teor da denúncia procedida através de inquérito civil, que se destinou a investigar uma das maiores catástrofes naturais ocorridas no Rio Grande do Sul, que foi a mortandade de 90 toneladas de pelo menos 16 espécies peixes no Rio dos Sinos, ocorrida em outubro de 2006. Tal ocorrência teve grande repercussão nos meios de comunicação.

Os réus foram denunciados por 20 fatos, conforme pode ser observado na sentença que acolheu parcialmente a denúncia. Dentre estes, o lançamento de efluentes líquidos, resíduos sólidos e substâncias oleosas sem o devido tratamento em desacordo com as exigências legais e regulamentares às margens do Arroio Portão, local de funcionamento da empresa. O referido arroio deságua no Rio dos Sinos, principal rio da região. O lançamento dos efluentes líquidos contribui de forma decisiva para a mortandade de peixes na região do Vale do Rio dos Sinos causando um prejuízo incalculável a saúde pública.

O Inquérito Civil procedido pelo Ministério Público foi subsidiado pelas informações Instituto Geral de Perícias, Fundação Estadual de Proteção Ambiental do Rio Grande do Sul, Comando Ambiental da Brigada Militar do Rio Grande do Sul e outros órgãos públicos estaduais e municipais da região do vale do rio dos sinos. Na sentença o Magistrado, Nilton Luís Elsenbruch Filomena, condenou a ré ao pagamento de multa que restou prescrita, extinguindo-se a punibilidade em relação a ela. Mas no que concerne ao o réu, o mesmo foi condenado a 18 anos de reclusão e 12 anos de detenção no regime fechado.

Não resta dúvida que a responsabilidade penal da pessoa jurídica, ainda que não unanime no direito brasileiro, faz jus a melhor atenção do Poder Público, pois a manifestação do Legislador Constituinte e do legislador ordinário ao prever tal instituto, foi para que tal responsabilização fosse utilizada como ferramenta de controle da deterioração do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A constitucionalização da responsabilidade penal da pessoa jurídica habilita a pretensão estatal para a punição como elemento repressivo e preventivo da irresponsabilidade da pessoa jurídica que se aproveita de sua condição, para efetuar delitos ambientais auferindo lucro indiscriminadamente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve por objetivo apresentar a responsabilidade penal ambiental da pessoa de direito privado, por meio de uma análise de sua aplicabilidade no sistema jurídico brasileiro, cuja a previsão Constitucional ainda recebe crítica dos principais operadores do direito. Sua colocação no ordenamento brasileira ainda que controversa, se dá pela vontade do Legislador Constituinte em tutelar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

em: <http://www.mp.am.gov.br:8082/centro_apoio/meio_ambiente_ph/jurisprudencia/meio-ambiente/crimes-ambientais>. Acesso em: 15 Out 2011

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O meio ambiente classificado como bem de uso comum do povo, indispensável à sadia qualidade de vida é tema principal dos tempos modernos, visto o avançado estágio degradação. A proteção ambiental nos tempos atuais não se trata tão somente de questões econômicas, mas é um caso de saúde pública, ao passo que a existência da vida depende do uso racional e coordenado dos bens ambientais. A questão ambiental vai além da conservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, ela engloba a convivência harmoniosa do homem com todos os elementos do meio ambiente.

O desafio destes novos tempos é a mudança da concepção da humanidade em relação ao meio ambiente: os bens ambientais também precisam dos serviços prestados pelo homem, não só o contrário. E diante dessa nova perspectiva que é que a sociedade moderna e globalizada deve pautar-se para a convivência no mínimo digna. O Direito Ambiental surgiu para enfrentar os problemas das relações ambientais, ou seja, sistematizar o conjunto de elementos que compõem o meio ambiente, o homem, a vida nas suas diferentes formas e, principalmente as diversas ciências. O Direito Ambiental consegue reunir diferentes princípios, fundamentos e embasamentos para alinhar os seus objetivos de forma não fragmentada. Esse é o grande mérito do Direito Ambiental, não limitar-se ao estudo de uma única ciência.

Nessa grande ramificação feita pelo Direito Ambiental, aproximando as ciências e seus conceitos mais clássicos, importou na mescla de definições visando a proteção, preservação, conservação e manutenção do meio ambiente ecologicamente para as presentes e futuras gerações, definida pela Constituição Federal de 1988 como direito e dever da coletividade e do Poder Público. Destas novas interações, o Direito Penal foi invocado a regular as agressões mais graves ao meio ambiente, ensejando no chamado Direito Penal Ambiental. Essa é uma moderna concepção do Direito Penal, que reuniu os princípios consagrados do Direito Penal Clássico, com os princípios e fundamentos do Direito Ambiental, um deles, o principio da preservação.

Neste contexto, de ampliada receptividade de meios de proteção ambiental, e percebendo que as pessoas jurídicas, assim como o homem, também poderiam causar lesões ao meio ambiente, o Constituinte brasileiro, após avanços legislativos importantes desde os tempos considerados embrionários na história brasileira, previu um capítulo especifico para tratar do meio ambiente e em especial da responsabilidade ambiental da pessoa jurídica. As pessoas jurídicas desde os tempos da revolução industrial desempenham um papel cada vez mais importante na vida sócio-econômica da sociedade moderna.

E como sujeito de direitos e deveres, a pessoa jurídica, ficou sob a égide da responsabilidade penal por infrações ambientais. A previsão do §3º do artigo 225 da Constituição Federal de 1988 foi notadamente grande o avanço na tutela do meio ambiente. Previsão esta, que causou grande desconforto dos juristas acostumados como os dogmáticos e tradicionais princípios penais. O legislador rompeu com esse tradicionalismo, baseado em teorias e princípios que não encontram amparo nesta nova realidade enfrentada pelas ciências: a grande necessidade de proteger o meio ambiente. Portanto foi necessária esta mudança de concepção e abertura para novos estudos em relação ao Direito prevendo a responsabilidade penal ambiental das pessoas jurídicas.

O trabalho trouxe a baila a contraposição de idéias de juristas que tinham posições contrárias e favoráveis sobre a aplicabilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica. Podendo ser constatado que a divergência estava baseada nos seguintes pressupostos: capacidade de ação, capacidade de culpabilidade e capacidade de pena. Mas pode-se perceber que tal discussão torna-se inócua, ao passo que a Constituição quis punir a pessoa jurídica por lesões ao meio ambiente, sobrepujando, portanto, os princípios tradicionais que dificultassem tal disposição. Ademais, o legislador infraconstitucional ratificou a Constituição e regulamentou tal disposição na Lei nº 9605/1998, responsável por sistematizar o direito penal

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ambiental. A responsabilidade penal da pessoa jurídica representa uma conquista na proteção ambiental como instrumento de legalidade, pois o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um Direito que transcende o homem, sendo um bem jurídico maior.

A responsabilidade penal da pessoa jurídica deve ser vista com base na responsabilidade social, e não na ótica tradicional em que só a ação humana pode ser responsabilizada penalmente. Nesta nova modalidade de responsabilidade, valora-se a conduta e a atividade praticada em desacordo com o ordenamento jurídico, para imputar-se a responsabilidade penal para o ente social quando essa atividade for uma ação institucional, praticada com benefício ou em razão da atividade da pessoa jurídica. A negativa da possibilidade da responsabilização criminal da pessoa jurídica por ilícitos ambientais é uma afronta contra os princípios e valores Constitucionais que defendem o meio ambiente. Nesta seara, implica na contrariedade do desenvolvimento sócio-jurídico dessa moderna e globabilizada sociedade que esta em um estágio de maturação para os problemas ambientais. REFERÊNCIAS BEVILAQUA, Clovis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1944. v. 1. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 13 .ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1. p. 231-234. ______. Tratado de direito penal: parte geral. 14. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 1. p. 243-247. CAPELLI, Silvia. Novos Rumos do Direito Ambiental. In: HAUSEN, Enio Costa; TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha; ALVARES, Pércio Brasil. (Orgs.). Temas de direito ambiental. Uma Visão Interdisciplinar. Porto Alegre: AEBA, APESP, 2000. p. 53- 78. CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: parte geral. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 141-142. CRUZ, Ana Paula Fernandes Nogueira da. A Culpabilidade nos Crimes Ambientais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2008. p. 218-259. DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2005. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de direito ambiental e legislação aplicável. 2. ed. [s.l]: Max Liminad, 1999. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Princípios do processo ambiental. São Paulo: Saraiva, 2004. FONSECA, Edson José da. A responsabilidade penal da pessoa jurídica no direito constitucional brasileiro. In: MILARÉ, Édis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. p. 791-806. FREITAS, Gilberto Passo de. Direito Penal Ambiental. In: PHILIPPI JR., Arlindo; ALVES, Alaôr Caffé. (edit). Curso interdisciplinar de direito ambiental. Barueri: Manole, 2005. p. 400-424. GOMES, Celeste Leite dos Santos Pereira. Crimes Contra o Meio Ambiente: Responsabilidade e Sanção Penal. São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1998. GRINOVER, Ada Pellegrini. Aspectos processuais da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. In: MILARÉ, Edis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (orgs.) Coleção doutrinas essenciais. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011. v. 5. GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri (Org.). Dicionário técnico jurídico. 9. ed. São Paulo: Rideel, 2007. JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: parte geral. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999. v.1. LECEY, Eladio. A proteção do Meio Ambiente e a Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (org.). Direito Ambiental em Evolução 1. 2.ed. 4.tir. Curitiba: Juruá, 2006. p. 37-51. MACHADO, Marta Rodriguez de Assis. (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Série pensando o direito, Brasília, n. 18., ano 2009. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2006. MAGALHÃES, Juraci Perez. A evolução do direito ambiental no Brasil. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. ______. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. aum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

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