Cap 9 ICTERICIA NEONATAL - UFRGS

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ICTERÍCIA NEONATAL Laura Vargas Dornelles Fabiana Costa Menezes Luciana Friedrich DEFINIÇÃO E EPIDEMIOLOGIA: A icterícia é a expressão clínica da hiperbilirrubinemia e é, na maioria dos casos, um processo benigno e secundário ao aumento da bilirrubina indireta. As bilirrubinas vêm da quebra da hemoglobina. Inicialmente é insolúvel em água (bilirrubina indireta), é conjugada no fígado (bilirrubina direta) e sua excreção acontece pelo intestino. 98% dos recém-nascidos (RNs) apresentam níveis de bilirrubina indireta > 1,0 durante a primeira semana de vida devido à adaptação do metabolismo das bilirrubinas. Em torno de 80% dos RNs a termo e 60% dos pré-termos irão desenvolver icterícia clinica. HIPERBILIRRUBINEMIA FISIOLÓGICA: A hiperbilirrubinemia fisiológica é aquela em ocorre o aumento dos níveis de bilirrubina sem a necessidade de tratamento. Causas desse aumento: o Hemácias de maior volume e com menor meia-vida quando comparado com adultos o Eritropoiese ineficaz, aumentando o turnover celular o Aumento da circulação êntero-hepática (população bacteriana intestinal reduzida e trânsito intestinal mais lento) o Redução da captação hepática e da atividade das enzimas de conjugação o Redução da excreção hepática para o intestino. O RN a termo apresenta icterícia visível com bilirrubina >7 mg/dL, e esta alcança um pico de 6 a 8 mg/dL em torno do 3º dia de vida. Nos pré-termos o

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ICTERÍCIA NEONATAL

Laura Vargas Dornelles

Fabiana Costa Menezes

Luciana Friedrich

DEFINIÇÃO E EPIDEMIOLOGIA:

A icterícia é a expressão clínica da hiperbilirrubinemia e é, na maioria

dos casos, um processo benigno e secundário ao aumento da bilirrubina

indireta. As bilirrubinas vêm da quebra da hemoglobina. Inicialmente é insolúvel

em água (bilirrubina indireta), é conjugada no fígado (bilirrubina direta) e sua

excreção acontece pelo intestino.

98% dos recém-nascidos (RNs) apresentam níveis de bilirrubina indireta

> 1,0 durante a primeira semana de vida devido à adaptação do metabolismo

das bilirrubinas. Em torno de 80% dos RNs a termo e 60% dos pré-termos irão

desenvolver icterícia clinica.

HIPERBILIRRUBINEMIA FISIOLÓGICA:

A hiperbilirrubinemia fisiológica é aquela em ocorre o aumento dos

níveis de bilirrubina sem a necessidade de tratamento. Causas desse aumento:

o Hemácias de maior volume e com menor meia-vida quando

comparado com adultos

o Eritropoiese ineficaz, aumentando o turnover celular

o Aumento da circulação êntero-hepática (população bacteriana

intestinal reduzida e trânsito intestinal mais lento)

o Redução da captação hepática e da atividade das enzimas de

conjugação

o Redução da excreção hepática para o intestino.

O RN a termo apresenta icterícia visível com bilirrubina >7 mg/dL, e esta

alcança um pico de 6 a 8 mg/dL em torno do 3º dia de vida. Nos pré-termos o

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pico pode ser de até 10-12 mg/dL no 5º dia de vida, podendo alcançar 15

mg/dL sem nenhuma alteração específica no metabolismo da bilirrubina.

HIPERBILIRRUBINEMIA NÃO FISIOLÓGICA:

Fatores que sugerem icterícia não-fisiológica, devendo ser sempre

investigados:

o Inicio da icterícia antes de 24 horas de vida

o Aumento da bilirrubina sérica > 0,2mg/dL/hora

o Sinais de doença subjacente, como vômitos, letargia, recusa

alimentar, perda de peso, apnéia, taquipnéia ou instabilidade térmica

o Icterícia persistente após 8 dias de vida no RN a termo e após 14

dias no RN pré-termo

Dados de anamnese e exame físico que podem direcionar o início da

investigação:

o Irmão que apresentou icterícia ou anemia: sugere incompatibilidade

sangüínea ou icterícia do leite materno.

o Doença materna durante a gestação: sugere infecções congênitas do

grupo STORCH (sífilis, toxoplasmose, outras [hepatites, HIV],

rubéola, citomegalovírus).

o Relato de uso de drogas maternas que interferem com a conjugação

da bilirrubina

o Tocotraumatismo: associado com sangramento extravascular (cefalo-

hematoma, hematomas em geral). É uma causa frequente de icteríca

em prematuros

o Atraso na eliminação de mecônio ou eliminações infreqüentes:

sugere icterícia por baixo aporte ou obstrução intestinal com aumento

da circulação êntero-hepática.

o Policitemia: freqüente em RNs pequenos para a idade gestacional

(PIG), filhos de mãe com diabete gestacional e clampeamento tardio

de cordão

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o RNs que sofreram hipóxia perinatal ou com lesão hepática:

dificuldade hepática em conjugar e excretar a bilirrubina.

o História familiar de icterícia, anemia, esplenectomia ou litíase biliar:

sugere anemia hemolítica hereditária

o História familiar de doença hepática: sugere galactosemia,

deficiência de alfa-1-antitripsina, tirosinemia, doença de Gilbert ou

Crigler-Naijar, fibrose cística

PRINCIPAIS CAUSAS DE ICTERÍCIA NEONATAL:

Fatores de risco associados à hiperbilirrubinemia:

o Alta hospitalar com níveis de bilirrubinas na zona de alto e

intermediário risco para desenvolver hiperbilirrubinemia (FIGURA

1)

o IG < 38 semanas

o Ganho de peso abaixo do ideal (perda de >7% do peso de

nascimento)

o Icterícia nas primeiras 24 horas

o Presença de doença hemolítica (Rh, ABO, antígenos irregulares)

o Irmão que apresentou icterícia com indicação de tratamento

o Tocotraumatismos, ex: cefalohematoma (icterícia aparece 48-

72hs após o parto e pode ser prolongada)

o Raça asiática

o O risco de hiperbilirrubinemia pode ser acessado como abaixo, na

Figura 1.

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FIGURA 1. Gráfico de Bhutani – Risco para desenvolver

hiperbilirrubinemia.

Adaptado de Pediatrics 114:297, 2004.

Avaliar a presença de icterícia a cada 8-12 horas no alojamento conjunto e,

sempre que houver risco para o desenvolvimento de icterícia significativa,

repensar o momento da alta do RN, com objetivo de evitar reinternações.

Icterícia associada ao baixo aporte de Leite Materno:

O principal fator responsável por este tipo de icterícia é o baixo aporte

inicial de leite que leva ao aumento da circulação êntero-hepática com a

redução da eliminação das bilirrubinas.

A incidência de um pico de bilirrubina >12 mg/dL em RNs a termo

amamentados ao seio é de 12-13%.

É vista quando o aleitamento ainda não está adequado e o RN não

ganha peso de forma consistente. Geralmente observada em RNs que

perderam mais de 7% do peso de nascimento.

Associada à alta hospitalar precoce, com menos de 48 horas de vida.

Icterícia do Leite Materno:

O mecanismo exato é desconhecido, mas parece ser devido a fatores

presentes no leite materno que interferem com a conjugação da

bilirrubina. Apesar de raros, existem relatos de kernicterus em RNs

anteriormente saudáveis, sem fatores de risco e amamentados ao seio.

Sua incidência é de 2-4% em RNs a termo.

Estes RNs apresentam um bom ganho de peso, função hepática normal

e não há evidência de hemólise.

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Tem inicio tardio, em torno dos 14 dias de vida, podendo chegar a níveis

de bilirrubinas superiores a 20-30 mg/dL com redução gradual até as 12

semanas de vida se nenhum tratamento é realizado.

Se a ingestão de leite materno é suspensa, os níveis caem rapidamente

em 48 horas e não retornam aos valores prévios quando este é

reintroduzido. No entanto, atualmente a suspensão do aleitamento

materno não é indicada, pois a duração da hospitalização não é

reduzida pela suspensão do mesmo.

Incompatibilidade ABO:

É a causa mais comum de doença hemolítica em RN.

Geralmente é vista em mães do tipo O e RNs tipo A ou B, sendo que a

mãe produz anticorpos anti-A e anti-B da classe IgG, que ultrapassam a

placenta, causando hemólise no RN, podendo ocorrer anemia, icterícia e

retriculocitose.

Pode ocorrer já na primeira gestação, porque a mãe pode ser sido

sensibilizada por alimentos, vacinas, bactérias, protozoários e vírus.

Somente 1/5 deste grupo irá desenvolver icterícia importante, pois a

maioria, mesmo com anticorpos anti-A e anti-B na membrana da

hemácia, não apresentará hemólise significativa.

Incompatibilidade Rh:

Ocorre quando a mãe é antígeno D negativo (Rh negativo) e RN Rh

positivo. A mãe produz anticorpos anti-Rh da classe IgG que atravessam

a barreira placentária hemolisando as hemácias fetais, produzindo

anemia, icterícia e reticulocitose.

Geralmente causa doença mais severa do que a incompatibilidade ABO

(a forma mais grave é conhecida como hidropsia fetal)

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Exige uma sensibilização prévia (quantidades mínimas de sangue:

alíquotas de 0,1ml): Na primeira exposição há a produção de IgM que

não atravessa a placenta

A gravidade da doença aumenta com o número de sensibilizações

A prevenção é realizada através da administração de Imunoglobulina

humana antiRh para mães Rh negativo não sensibilizadas (com coombs

indireto [CI] negativo) em até 72 horas após as seguintes situações:

parto, abortamento, amniocentese, biópsia de vilo, gravidez ectópica e

sangramento durante a gestação.

A incompatibilidade ABO protege contra incompatibilidade Rh. Os

anticorpos maternos, anti-A e anti-B, eliminam os antígenos Rh fetais

antes da sensibilização.

A hemólise é extravascular e ocorre principalmente no baço.

Deficiência de G6PD:

É uma doença associada ao X, porém afeta igualmente ambos os sexos

Atinge cerca de 7% população brasileira

Mais comum quando os ascendentes são da região do Mediterrâneo

Deve ser diagnóstico diferencial de RNs que internam por icterícia

precoce ou prolongada ou investigação de doença hemolítica.

Hemólise aguda pode ocorrer quando:

o O RN entrar em contato com agentes oxidantes - gestação,

aleitamento materno e contato direto com algumas substâncias e

drogas como naftalina, cloranfenicol, sulfas, anti-helmínticos

dentre outros

o Apresentar acidose, hipoglicemia e infecções.

Os pais, após a alta, devem ser orientados em relação a evitar

exposição com os agentes causadores de hemólise, incluindo

medicações.

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DIAGNÓSTICO DE ICTERÍCIA:

A icterícia apresenta uma progressão crânio-caudal, sendo que níveis mais

elevados de bilirrubina estão associados à presença de icterícia abaixo dos

joelhos, além de pés e mãos. No entanto, não podemos nos basear apenas

na inspeção clínica.

Devemos estar atentos para os fatores de risco como prematuridade,

pequenos para a idade gestacional (policitemia, STORCH), microcefalia

(STORCH), sangramentos extravasculares (céfalo-hematomas), palidez

(hemólise), petéquias (STORCH, sepse, hemólise), hepatoesplenomegalia

(hemólise, STORCH, doenças hepáticas), hipotireoidismo.

Bilirrubina direta >2 mg/dL ou >15% da bilirrubina total indicam colestase,

devendo esta ser prontamente investigada. A causa mais frequentemente

associada à hiperbilirrubinemia direta em UTI neonatal é o uso prolongado

de NPT. Outras doenças associadas:

Doença hepática (ex: hepatite neonatal) e dos canais biliares (cisto

de colédoco, atresia de vias biliares)

STORCH

Sepse neonatal

Denças metabólicas (deficiência de alfa-1-antripsina, galactosemia,

fibrose cística, doenças de depósito)

O fluxograma para investigação de icterícia em recém-nascidos encontra-se

abaixo, na Figura 2.

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Icterícia Clínica

Dosar bilirrubina sérica (total e frações)

Bilirrubina ≥ 12mg/dL e RN < 24 horas de vida

Bilirrubina < 12mg/dL e RN > 24 horas de vida

Acompanhamento das bilirrubinas

séricas

Coombs Direto positivo

Identificar o Anticorpo:

Rh, ABO, KELL

Coombs Direto negativo

Bilirrubina direta ≥ 2

Hepatite

Infecções virais (STORCH)

Obstrução da via biliar

Sepse

Galactosemia

Def alfa-1-antitripsina

Bilirrubina direta <2

Hematócrito Normal ou Alto Hematócrito Baixo

Dosar Reticulócitos e Analisar Morfologia da Hemácia

Normal Alterado

Policitemia

Aumento da circulação entero-hepática

Sangramento Oculto

Leite materno

HIpotireioidismo

Sd Crigler-Najjar

Asfixia

Esferocitose

Eliptocitose

Alfa Talassemia

Drogas ( eniocilina)

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Figura 2. Fluxograma para investigação de Icterícia em recém-nascidos.

Adaptado de Cloherty JP e colaboradores. Manual of Neonatal Care, 7th ed.

(não consigo colocar o título, o fluxograma e a bibliografia do mesmo em uma

mesma página!) (deve ser colocado abaixo do fluxograma na página anterior).

Exames Laboratoriais que devem ser solicitados de acordo com a

suspeita diagnóstica:

Bilirrubina total e frações (SEMPRE)

Hemoglobina, hematócrito, morfologia das hemácias, reticulócitos

(Reticulocitose >6% sugere hemólise, principalmente se acompanhada de

anemia)

Tipagem sanguínea, fator Rh, coombs direto: devem ser realizados de

rotina em mães Rh negativo e tipo O.

Provas de função hepática, pesquisa de infecções do grupo STORCH,

triagem para sepse (hemograma, hemocultura, proteína C reativa),

investigação de doenças metabólicas e hipotireoidismo em casos de

icterícia prolongada.

Pesquisa de deficiência de G6PD

Screening pré-alta do alojamento conjunto de RNs normais: dosar

bilirrubinas e ou utilizar a medida de bilirrubina transcutânea (TcB) quando

ocorre suspeita clínica de icterícia mais importante. Após, colocar os valores

na curva da FIGURA 1. Esse gráfico determina o risco do RN desenvolver

hiperbilirrubinemia não-fisiológica. Se o valor estiver na faixa de alto risco,

este RN deve ser reavaliado em 24 horas após a alta. Quando o nível de

bilirrubina estiver na faixa de baixo risco a probabilidade do RN ter icterícia

severa é pequena.

O TcB pode subestimar o valor das bilirrubinas séricas,

principalmente se o valor está acima de 13-15mg/dL. Não

sofre interferência da cor da pele.

O USO DA FOTOTERAPIA:

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A indicação do uso de fototerapia para menores e maiores de 35 semanas

de idade gestacional encontra-se na Tabela 1 (menores de 35 semanas) e

na Figura 3 (maiores de 35 semanas).

TABELA 1: Indicação de fototerapia para RNs < 35 semanas

Iniciar Fototerapia

Percentis 10 e 90 para

peso segundo idade

gestacional

Bilirrubina Total (mg/dL) Peso Estimado para IG

IG

(semanas)1

Alto

Risco2

Baixo

Risco p10 (g) p90 (g)

<26 Fototerapia profilática

ao nascimento <675 <1100

26 0/7 – 28

0/7 5 6 675 1450

28 0/7 – 29

6/7 6 8 850 1600

30 0/7 – 31

6/7 8 10 1050 2050

32 0/7 – 33

6/7 10 12 1400 2550

34 0/7 – 34

6/7 12 14 1800 2800

Adaptado de Protocolo de Manejo da Icterícia da UTI Neonatal do Hospitala de Clínicas

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1 Utilizar idade gestacional corrigida

2 Alto Risco: albumina< 2,5 g/dl; doença hemolítica; níveis de bilirrubina

rapidamente ascendentes; instabilidade clínica (pH<7,15; diagnóstico de sepse nas

últimas 24h; apneia+bradicardia necessitando VPP ou intubação nas últimas 24h;

hipotensão com uso de vasopressores nas últimas 24h; ventilação mecânica).

3 Níveis atingidos em vigência de fototerapia intensiva; na presença de sinais de

encefalopatia bilirrubínica, indicar exsanguineotransfusão imediata.

Figura 3. Indicações de fototerapia conforme a faixa de risco(*). Para RNs

> 35 semanas. Adaptado de Pediatrics 114:297, 2004.

(*) Usar valor da bilirrubina total. Fatores de risco: doença hemolítica,

deficiência de G6PD, asfixia, letargia, instabilidade térmica, sepse, acidose,

albumina <3g/dL, prematuridade (menores de 37+6)

Técnica correta da fototerapia:

Manter o RN despido e com proteção ocular, trocar de decúbito a cada 2

horas

Quanto maior a superfície corpórea exposta à luz maior é eficácia do

tratamento. No entanto, a sobreposição de luz (dois aparelhos de

fototerapia) não aumenta a eficácia

Monitorar a temperatura corporal do RN (principalmente se em incubadora)

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A luz azul é a que fornece a irradiância adequada sem superaquecimento

Pesar diariamente o RN e compensar a oferta hídrica em 10-20% devido ao

aumento das perdas insensíveis

A cor da pele e a TcB NÃO são parâmetros durante o uso de fototerapia,

mas a bilirrubina sérica deve ser medida periodicamente.

Quando o nível de bilirrubina estiver próximo dos valores de indicação de

exsangüíneotransfusão, devem-se solicitar controles a cada 2-4 horas.

Caso contrário a cada 6-12 horas

Quando os níveis de bilirrubinas já estiverem em queda, coletar a cada 12-

24 horas.

Quando suspender a fototerapia:

Geralmente quando o nível está abaixo do o nível que indicou o início

do tratamento. Após a suspensão da fototerapia a bilirrubina sérica deve

ser verificada entre 12-24 horas.

Efeitos adversos da fototerapia:

Aumento das perdas insensíveis

Diarréia e aumento das perdas insensíveis fecais

Hipocalcemia

Dano à retina

Aumento da pigmentação cutânea em RNs negros, bem como eritema

cutâneo por aumento do fluxo sangüíneo

Queimaduras (proximidade excessiva)

EXANGÜÍNEOTRANSFUSÃO (EXT):

A imensa maioria dos casos de icterícia é controlada com fototerapia, sendo

a principal causa de EXT a doença hemolítica por incompatibilidade Rh.

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É um procedimento que remove parte do sangue total do paciente para

retirar hemácias hemolisadas e opsonizadas e anticorpos da circulação do

RN e devolver sangue total do banco de sangue.

Deve ser realizada quando ocorre falha da fototerapia em prevenir o

aumento da bilirrubina a níveis tóxicos para o sistema nervoso central; para

corrigir a anemia e melhorar a insuficiência cardíaca em bebês hidrópicos;

para interromper a hemólise e a produção de bilirrubinas através da

remoção dos anticorpos e das hemácias sensibilizadas. As indicações de

EXT de acordo com o nível de risco, bilirrubinas e horas de vida podemos

aompanhar na TABELA 2 e na FIGURA 4.

Indicações de EXT imediata em doença hemolítica:

Bilirrubina de cordão >4,5 mg/dL e/ou Hb de cordão <11g/dL

Bilirrubina sérica com aumento >1 mg/dL/h apesar da fototerapia

Hemoglobina 11-13 mg/dL e bilirrubina com aumento >0,5 mg/dL/h apesar

da fototerapia

Bilirrubina >20 mg/dL

Progressão da anemia apesar do controle adequado da bilirrubina com

fototerapia

Sinais de encefalopatia bilirrubínica

Os valores para indicação de EXT encontram-se indicados na Figura 4

(para RNs a termo) e na Tabela 2 (para pré-termos menores de 35

semanas).

Técnica:

O volume de sangue para EXT equivale a duas volemias (1 volemia =

80ml/kg), substituindo assim 87% da volemia do RN. É realizada com

sangue total, irradiado, aquecido em temperatura de 37ºC, tipo O negativo,

geralmente com plasma AB (para evitar a presença de anticorpos anti-A e

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anti-B). O ideal é sempre realizar prova cruzada entre o sangue do doador e

o soro da mãe.

Deve ser coletada uma amostra para exames logo antes do início do

procedimento.

O RN deve permanecer em berço aquecido, monitorizado e em NPO. O

cateter deve ser inserido na veia umbilical apenas o suficiente para

possibilitar refluxo de sangue. As alíquotas devem ser de:

o 5 mL para RNs <1500 gramas

o 10 mL para RNs de 1500-2000g

o 15 mL para RNs de 2500-3500g

o 20 mL para RNs >3500g e a duração do procedimento deve

ser de aproximadamente 1 hora.

Ao final do procedimento manter em fototerapia com infusão contínua de

glicose, cálcio e magnésio. Monitorizar: glicemia, eletrólitos, gasometria,

bilirrubinas, hemoglobina e plaquetas devido as possíveis complicações

citadas abaixo. Coletar uma amostra para exames logo após o término do

procedimento e, após, a cada 4-6 horas, de acordo com a melhora

laboratorial.

Possíveis complicações da EXT:

Hipocalcemia, hipomagnesemia, hipoglicemia, hipercalemia

Distúrbio ácido-básico

Sangramentos (trombocitopenia e distúrbios de coagulação)

Infecções, doença doador-versus-hospedeiro

Hemólise (hemoglobinúria e hipercalemia devido ao superaquecimento do

sangue)

Efeitos cardiovasculares (perfuração de vasos, embolização, vasoespasmo,

trombose, infarto, arritmias)

Enterocolite necrotizante

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Figura 4. Indicações de exsangüineotransfusão conforme faixa de risco.

Para RNs > 35 semanas. Adaptado de Pediatrics 114:297; 2004

TABELA 2: Indicação de exsanguineotransfusão para RNs < 35 semanas

Indicar

Exsanguineotranfusão

Percentis 10 e 90 para

peso segundo idade

gestacional

Bilirrubina Total (mg/dL)3 Peso Estimado para IG

IG

(semanas)1

Alto

Risco2

Baixo

Risco p10 (g) p90 (g)

< 28 11 14 <675 <1450

28 0/7 – 29

6/7 12 14 850 1600

30 0/7 – 31

6/7 13 16 1050 2050

Page 16: Cap 9 ICTERICIA NEONATAL - UFRGS

32 0/7 – 33

6/7 15 18 1400 2550

34 0/7 – 34

6/7 17 19 1800 2800

Adaptado de Protocolo de Manejo da Icterícia da UTI Neonatal do Hospitala de Clínicas

1 Utilizar idade gestacional corrigida

2 Alto Risco: albumina< 2,5 g/dl; doença hemolítica; níveis de bilirrubina

rapidamente ascendentes; instabilidade clínica (pH<7,15; diagnóstico de sepse nas

últimas 24h; apneia+bradicardia necessitando VPP ou intubação nas últimas 24h;

hipotensão com uso de vasopressores nas últimas 24h; ventilação mecânica).

3 Níveis atingidos em vigência de fototerapia intensiva; na presença de sinais de

encefalopatia bilirrubínica, indicar exsanguineotransfusão imediata.

GAMAGLOBULINA:

Altas doses (0,5-1 g/kg EV em 2-4 horas) podem ser usadas em doença

hemolítica grave. O mecanismo é incerto.

RISCOS E COMPLICAÇÕES DA ICTERÍCIA:

A toxicidade da bilirrubina varia com a prematuridade e com as

comorbidades do paciente, implicando em lesão do SNC. Quanto mais

prematuro ou doente for o paciente, maior é a chance de complicações,

devido a maior permeabilidade da barreira hemato-encefálica (BHE) e

redução da capacidade de conjugação da bilirrubina indireta (lipossolúvel),

que atravessa com maior facilidade a BHE quando alguns fatores como

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anóxia, sepse, hipercapnia, hipoglicemia, meningite, hipotermia, NPO,

hipertensão arterial estão presentes.

Outros fatores de risco para neutoroxicidade são: doença hemolítica,

principalmente a Rh, deficiência de G6PD, asfixia neonatal, sepse, acidose

metabólica, albumina <3.

Em RNs hígidos sem doença hemolítica, há pouca evidência de desfechos

neurológicos desfavoráveis com níveis abaixo de 25-30 mg/dL.

Encefalopatia Bilirrubínica Aguda:

Pode ser encontrada em RNs com doença hemolítica e bilirrubinas >20

mg/dL

É dividida em 3 fases que são percebidas ainda no período neonatal:

1. Hipotonia, letargia, choro agudo e sucção débil

2. Hipertonia extensora com opsitótono, rigidez, crises oculogíricas,

convulsões e febre. Muitos RNs evoluem para óbito nesta fase.

Todos os sobreviventes desenvolvem encefalopatia crônica

3. Hipotonia após 1 semana de evolução.

Kernicterus:

É o diagnóstico histopatológico da bilirrubina impregnada no tecido cerebral

apresentando morte neuronal e gliose (coloração amarelada). Os locais

mais acometidos são: gânglios da base, núcleos de nervos cranianos,

núcleos do tronco e cerebelo, hipocampo e células anteriores da medula

espinhal. Está relacionada à sequela crônica e permanente = encefalopatia

bilirrubínica crônica

Tétrade:

o Paralisia cerebral atetoide grave

o Neuropatia auditiva

o Paralisia vertical do olhar

Page 18: Cap 9 ICTERICIA NEONATAL - UFRGS

o Displasia dentária +/- deficiência mental

REFERÊNCIAS:

1. Gregory MLP, Martin RC, Cloherty JP. Neonatal Hyperbilirubinemia. In:

Cloherty JP, Eichenwald EC, Stark AR. Manual of Neonatal Care. Seventh

Edition, Lippincott Williams & Wilkins, Philadelphia, PA, USA, 2012; p304-

339.

2. American Academy of Pediatrics Subcommittee on Hyperbilirubinemia.

Management of hyperbilirubinemia in the newborn infant 35 or more weeks

of gestation. Pediatrics 2004;114(1):297-316. Erratum in: Pediatrics

2004;114(4):1138.

3. Giugliani ERJ e colaboradores. Icterícia. In: Atenção à Saúde do Recém-

nascido: guia para profissionais da saúde, 2011; Vol 2: p59-77

4. Almeida MFB, Draque CM. Síndrome Ictérica do Recém-Nascido:

Diagnóstico Diferencial. In: Programa de Atualização em Neonatologia

(PRORN) 2003; 1(4): 43-77.

5. Leone C. Doença Hemolítica Rh e ABO: Aspectos Atuais. In: Programa de

Atualização em Neonatologia (PRORN) 2004; 3(2): 53-86.

6. Carvalho M, Mochdece CC, Sá CAM. Novos recursos da fototerapia e suas

indicações. In: Programa de Atualização em Neonatologia (PRORN) 2003;

6(1): 39-67.

7. Meneses JÁ, Brandão DCB. Encefalopatia bilirrubínica – aspectos atuais.

In: Programa de Atualização em Neonatologia (PRORN) 2013; 10(3): 31-

53.

8. Protocolo de Tratamento de icterícia da UTI Neonatal do Hospital de

Clínicas de Porto Alegre