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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE DIREITO DENIS REGIS DA SILVA LUCENA DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL FORTALEZA 2014

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE

CURSO DE DIREITO

DENIS REGIS DA SILVA LUCENA

DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL

FORTALEZA 2014

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DENIS REGIS DA SILVA LUCENA

DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL

Monografia submetida à aprovação da Coordenação do Curso de Direito do Centro de Ensino Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientação: Prof. Ms. Giovanni Augusto Baluz Almeida.

FORTALEZA 2014

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DDEENNIISS RREEGGIISS DDAA SSIILLVVAA LLUUCCEENNAA

DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL

Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Direito, outorgado pela Faculdade Cearense – FaC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data de aprovação: 15/12/2014

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Professor Orientador Ms. Giovanni Augusto Baluz Almeida

_____________________________________________________

Professor Examinador Ms. Roberto Silvio Morais Almeida

_____________________________________________________

Professor Examinador Ms. José Péricles Chaves

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Aos meus pais, que me ensinaram e sempre me apoiaram nessa árdua e prazerosa caminhada, na qual aprendi a enfrentar dificuldades antes nunca enfrentadas, e que contribuíram com os seus conhecimentos e experiências para formação de meu caráter profissional.

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AGRADECIMENTOS

Quero dedicar esses humildes agradecimentos em primeiro lugar a Deus,

por me permitir estar aqui.

A minha esposa, Regianne, e meus filhos, Matheus e Larissa, que sempre

estiveram ao meu lado, Aos amigos e irmãos Geovane, Gervásio, Mardônia,

Luciana, Jane e Marcilene, que sempre estarão em meu coração.

Ao professor Roberto Silvio, por sua “fórmula secreta de ensino”, com a

qual revela que com paciência e estudo tudo é possível.

Ao grande professor Augusto César, que com rigidez e ao mesmo tempo

tolerância ensinou que é preciso disciplina para alguém se tornar vencedor. Seu

conhecimento e experiência, aliados ao dom da didática, abrilhantaram nosso

percurso acadêmico.

Às professoras Ninon e Ana, excelentes profissionais, que demonstram

maestria na transmissão do conhecimento e prática adquiridos ao longo da

magistratura, com uma paciência somente comparável ao seu saber.

Ao professor Giovanni Baluz, eterno presente, mesmo quando enfrentei

dificuldades com problemas de saúde de meu filho mais novo; surpreendente

professor, que com suas atitudes tornou-me seu grande admirador.

À turma com a qual convivi nesses últimos cinco anos, na pessoa do

amigo Leandro Alexandre, que em muitas oportunidades demonstrou sensibilidade e

preocupação em ajudar o próximo com seu conhecimento e talento.

Às amigas Débora, Francismeire e Célia pelos incentivos e “carões” nos

momentos de fraqueza nas horas de estudos e pela amizade preciosa e inigualável.

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“Nossa maior fraqueza está em desistir. O caminho mais certo de vencer é tentar mais uma vez.”

(Thomas Edison)

“A justiça sustenta numa das mãos a balança que pesa o direito, e na outra, a espada de que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal; a balança sem a espada é a impotência do direito.”

(Rudolf von Ihering)

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RESUM0

Este trabalho tem como maior objetivo estudar e analisar a Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007, que constitui inovação no Direito pátrio, com ênfase nos casuísmos que ocorrem no dia a dia. Abordam-se os requisitos necessários para a solicitação da separação e do divórcio direto nos cartórios e a mudança produzida pela Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, buscando-se identificar os impedimentos para a sua realização, o papel do advogado nos atos praticados pelos tabelionatos e avaliar o pedido da justiça gratuita. Para sua consecução, optou-se pela realização de pesquisas bibliográficas em obras doutrinárias específicas sobre a citada lei, artigos de leis, revistas, etc. compreendendo regras e princípios. Verificou-se que há divergências na doutrina nacional e que a lei em comento não conseguiu abordar todos os “problemas” que porventura poderão surgir para o tabelião, uma vez que não há regulamentações suficientes para sanar o que há por vir. Palavras-chave: Inovação. Extrajudicial. Justiça. Regulamentação.

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ABSTRACT

This work has as main objective to study and analyze the law nº 11.441, of January 4, 2007, what constitutes innovation in Brazilian Law, with emphasis on the situations that occur in everyday life. Discuss the requirements for separation and divorce request right in the registries and the change produced by Constitutional Amendment 66, of July 13, 2010, seeking to identify the impediments to its implementation, the role of the lawyer in the acts performed by the register Office systems and evaluate the application of free justice. For their achievement, it was opted for the realization of doctrinary works in specific bibliographic research on the cited law, law articles, magazines, etc. comprising rules and principles. It was found that there are differences in national doctrine and that the law in comment failed to address all the troubles that may arise for the notary, since there is no sufficient regulations to remedy what's to come. Keywords: Innovation. Out Of Court. Justice. Regulations.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 09

2 INSTITUTO FAMÍLIA................................................................................... 13

3 DESAGREGAÇÃO FAMILIAR.................................................................... 14

3.1 Histórico...................................................................................................... 14

3.2 Causas......................................................................................................... 15

3.3 Modalidades................................................................................................ 16

3.3.1 Antiga separação judicial............................................................................... 17

3.3.2 Divórcio......................................................................................................... 20

3.3.3 Divórcio direto................................................................................................ 21

3.3.4 Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, lei vigente................ 22

4 SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAIS.......................................... 25

4.1 A Lei nº 11.441/2007................................................................................... 25

4.2 Requisitos................................................................................................... 26

4.3 Funções do Advogado.............................................................................. 26

4.4 Gratuidade das despesas cartorárias...................................................... 29

4.5 Possibilidade de dissolução por procuração.......................................... 30

4.6 Regulamentações pelo Conselho Nacional de Justiça.......................... 32

4.7 A constitucionalidade da Lei..................................................................... 35

4.8 Casuística................................................................................................... 35

5 CONCLUSÃO.............................................................................................. 37

REFERÊNCIAS....................................................................................................... 39

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1 INTRODUÇÃO

A relação entre os homens sempre foi complexa, desde os primórdios de

sua existência, e quando esses seres pensantes e dotados de atitudes resolvem se

unir e constituir família, o relacionamento que os caracterizava, até então “egoísta”,

passa a ser compartilhado. O casal percebe que as coisas já não eram mais como

antes, e que a partir daquele momento de união as decisões deveriam ser tomadas

em conjunto. Os conflitos começaram a surgir e a ficar cada vez mais intensos, a

ponto de alguns não saberem mais lidar com determinada situação e adotarem

medidas extremas para a sua resolução.

À mulher, ao longo dos séculos, destinava-se uma educação diferenciada

formada para o homem, priorizando o servir, visto que sua existência transcorria sob

a dominação dos demais familiares, ou “homens da casa”. Ao casar-se, essa

“herança” era transmitida ao marido, que era educado para assumir a posição de

chefe da casa. Em algumas culturas essa dominação era tão forte que o marido

podia escolher o próximo marido de sua mulher em caso de morte; em outras, com a

morte do marido, matavam-na e enterravam-na a fim de continuar servindo-o no

outro mundo.

No Direito Romano, berço da cultura jurídica brasileira, a mulher era

desprovida de capacidade jurídica, cabia-lhe seguir inclusive a religião do marido,

sem que lhe fosse dada opção de escolha. O parentesco só se transmitia pelos

homens, e apenas por razões genéticas o impedimento matrimonial relativo à mulher

era evocado (SILVA, [entre 1998 e 2014]).

O homem teve que aprender a conviver com algumas mudanças ao longo

da história, que envolveram desde conquistas em diversas áreas, como saúde e

educação, até o abandono de certos costumes arraigados com o ingresso da mulher

no mercado de trabalho, que se tornou mais exigente com as suas relações, e

ninguém mais poderia forçar a fazer algo que não desejasse, muito menos a

permanecer em um relacionamento que não a fizesse feliz. Porém tudo isso foi

também um alívio para o homem, que muitas vezes ficava preso a uma mulher que

não lhe proporcionava satisfação emocional, pois a sociedade era muito dura com o

casal que terminasse a relação conjugal.

A situação jurídica da mulher brasileira foi se transmutando lentamente ao

longo da história. Pode-se citar o Estatuto da Mulher Casada (Lei n° 4.121, de 27 de

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agosto de 1962), que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei n.º

5.452, de 1º de maio de 1943), a Consolidação das Leis da Previdência Social e, à

época, a Constituição Federal de 1946. Leis que formalizaram e concretizaram as

novas mudanças que estavam por vir, dando mais liberdade e menos discriminação

as mulheres da época, tornando-as competitivas e cada vez mais participativas no

meio social.

Desgastados pelas constantes brigas e pela obrigatoriedade

(principalmente para a mulher) de continuar em uma relação que não os fazia felizes

e nem aos próprios filhos, forçados que se viam a conviver em um cenário cotidiano

de agressões, muitas vezes físicas, os casais foram buscando cada vez mais a

separação, situação em que a mulher era a mais estigmatizada, posto que,

separada, não tinha mais honra e era discriminada na sociedade.

Mas não apenas a mulher sofria com essa conjuntura: os filhos de casais

separados também eram bastante afetados pelo novo status quo, que sobre eles

recaía como uma doença contagiosa, resultando em sua segregação social.

Entretanto permanecer juntos era pior, então lhes restava apenas enfrentar a

sociedade e todo o preconceito dela decorrente.

E assim a separação e o divórcio começaram a ser uma realidade na

sociedade, a ser vistos com outros olhos, posto que se percebesse que seria melhor

a construção de uma nova unidade familiar do que manter uma relação conjugal

repleta de brigas, e muitas vezes, de violências.

Nesse contexto, a Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007, surgiu como um

marco inovador para o direito civil brasileiro, regulando a possibilidade de realização

de escrituras de inventários, partilhas, divórcios e separações consensuais por via

administrativa, facilitando, com isso, a resolução de um conflito que poderia arrastar-

se por décadas, e ainda contribuindo para desafogar o Poder Judiciário em relação

ao grande número de processos de divórcios e separações extrajudiciais que viriam

a migrar para os cartórios.

Ocorre que a sua publicação no início de um novo ano, com vigência

imediata, e a atenção recebida das mídias pegou muita gente de surpresa e

provocou uma demanda substancial pela via administrativa para a solução de

litígios, alguns dos quais já se arrastavam há tempos nos corredores do Judiciário,

suscitando inúmeras dúvidas acerca dos requisitos necessários para a solicitação da

separação e do divórcio direto nos cartórios, a mudança produzida pela Emenda

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Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, os impedimentos para a sua

realização, o papel do advogado nos atos praticados pelos tabelionatos e o pedido

da justiça gratuita, entre outras.

Para se lançar luz sobre essas indagações optou-se por desenvolver uma

pesquisa que tem por objetivo geral estudar e analisar a Lei nº 11.441, de 4 de

janeiro de 2007, que constitui inovação no Direito pátrio, com ênfase nos casuísmos

que ocorrem no dia a dia.

Entende-se que a publicação da lei em estudo é bastante relevante

socialmente, visto facilitar o exercício de uma parte da população, que até então

precisava de apoio jurídico para desfazer oficialmente uma relação conjugal, do

direito de decidir por manter ou não uma relação que já não tem solução, sem

precisar esperar durante anos, ou até décadas, para tentar um novo relacionamento,

e contribuir para desafogar o Poder Judiciário.

Sob o viés acadêmico, quaisquer estudos que venham a produzir

certezas em torno de matérias de interesse da sociedade serão bem aceitos. O

interesse pessoal pela matéria decorre do fato de este pesquisador estar a poucos

passos de se tornar um operador do Direito, e de trabalhar em um Cartório de Notas,

tendo sido selecionado à época para compor o quadro de funcionários encarregados

dessas novas atribuições, o que exigiu que se buscassem mais informações sobre a

temática.

Como metodologia aplicada na realização deste trabalho desenvolveu-se

pesquisa bibliográfica nas obras de alguns doutrinadores, especialistas no assunto,

e em artigos disponíveis em revistas eletrônicas, e documental, na legislação e

jurisprudência pátrias.

Os resultados, após sistematização, foram distribuídos ao longo desta

monografia em cinco capítulos, abertos por esta introdução, que delineia os passos

trilhados por este pesquisador na idealização e execução deste estudo.

No segundo capítulo discorre-se sobre o instituto família, abordando-se a

proteção especial que recebe do Estado, que põe à disposição de seus tutelados

meios jurisdicionais para proteger determinada parte interessada em resolver de vez

algum conflito que não lhe é possível resolver por meios particulares.

O terceiro capítulo dedica-se a esclarecer as causas que levam aos

conflitos do relacionamento, abordando, assim, as relações anteriores entre Função

do Estado e Igreja e o modo como interferiam em um relacionamento, e o

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crescimento e maior destaque da inclusão de vez da mulher no mercado de

trabalho, processo lento e suado.

Alguns pontos expostos pelo pesquisador no quarto capitulo demostram a

inovação da nova lei, seus requisitos e as possibilidades extrajudiciais para os

indivíduos. Ainda na mesma seção apresentam-se informações sobre

acompanhamento ou não de advogados, gratuidade de despesas cartorárias, entre

outros aspectos relativos aos métodos utilizados para a feitura da escritura pública

de separação judicial ou de conversão ou de divórcio direto, procurando oferecer

respostas a algumas indagações sobre a utilização da Lei nº 11.441/2007 em casos

particulares.

No derradeiro capítulo o estudo elaborado apresenta, de forma sintética,

algumas considerações extraídas da pesquisa desenvolvida a título de conclusão,

com o que se espera ter contribuído para aumentar o conhecimento do leitor sobre a

temática e, por via de consequência, com a sociedade.

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2 INSTITUTO FAMÍLIA

Berger e Kellner (1970 apud FÉRES-CARNEIRO, 1998),

[...] descrevem o casamento como um ato dramático, no qual dois estranhos, portadores de um passado individual diferente, se encontram e se redefinem. O casal constrói assim, não somente a realidade presente, mas reconstrói a realidade passada, fabricando uma memória comum que integra os dois passados individuais.

A família é a unidade base da sociedade, de onde se origina o poder do

Estado. Desse modo, afetar a família é afetar, em tese, o próprio Estado.

Por causa dessa proximidade entre ambos o Estado não permite que as

decisões referentes à família fiquem em mãos de particulares, retendo para si as

que considera mais importantes.

Esse posicionamento alcança as separações e divórcios, que não podem

ser decididas apenas pelos casais, posto que já se saiba que as brigas entre os

consortes são mais ferrenhas que as do âmbito do Direito Civil. Com esse

discernimento o legislador criou as leis para salvaguardar os direitos dos cônjuges,

dos filhos e dos possíveis terceiros interessados nas separações e divórcios em que

possam ter negócios envolvidos.

A legislação vigente descreveu o rito do casamento, apontando quem

pode casar e com que idade, os impedimentos e acima de tudo o modo como se

concretiza uma possível dissolução da sociedade conjugal.

Percebe-se o cuidado do Estado com o referido assunto, decorrente do

fato de que ainda que a degradação de certos núcleos familiares seja inevitável, haja

vista a convivência marital sempre ter sido complicada, e que o Estado não queira a

dissolução, ela é forçosa e padece de regulamentação.

A família é a base de tudo, da sociedade, do Estado e da formação do

caráter do individuo, por isso é tão importante e necessária a sua proteção.

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3 DESAGREGAÇÃO FAMILIAR

Entende-se que para se desenvolver uma pesquisa acerca de um dado

instituto jurídico torna-se imprescindível o conhecimento da estrutura interna daquilo

que se pretende ter como objeto de estudo. E isso não ocorre por mero deleite, mas

para que não se tenha que enfrentar, com o desenvolvimento do tema, a incursão de

elementos outros no âmbito da investigação que possam denunciar uma indesejável

extensão temática, fugindo à essência do instituto, bem como uma eventual

contradição.

3.1 Histórico

Nos primeiros momentos da civilização existia uma inter-relação entre o

Estado e a Igreja, na qual esta última, com a força política que possuía, restringia a

existência de qualquer espécie legal de separação ou divórcio, por acreditar na

indissolubilidade do vínculo conjugal. Porém, sabe-se que a sociedade está sempre

em processo de evolução, o que requer a adequação das normas existentes às

novas demandas e a criação de novos regulamentos para dar conta de questões

como as relativas ao desfazimento da união conjugal, o que suscitou a

regulamentação do divórcio e da separação judicial, efetivada mediante a inclusão

de novas normas instituídas pelo Estado, que nesse momento já se encontrava

independente.

Com o passar do tempo, a cada instante evidenciava-se o crescimento no

número de separações e divórcios judiciais, em face das grandes transformações

ocorridas em torno das pessoas que compõem a relação conjugal, motivado por

uma das duas vertentes explicativas apresentadas na sequência:

- segundo a primeira vertente, o crescimento do número de separações

deve-se primordialmente à busca da felicidade individual dentro do relacionamento

matrimonial, que não ocorria antigamente devido à força das instituições como a lei,

a tradição e a religião ser maior que as ameaças ao casamento. Hoje em dia, os

relacionamentos matrimoniais só ocorrem ou permanecem se existir alguma

compensação pessoal para ambas as partes;

- para a segunda vertente, o ingresso da mulher no mercado de trabalho e

as consequências desse passo em sua vida (independência financeira, melhoria da

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autoestima, autoconfiança, entre outras) tornaram-na menos tolerante para a vida de

submissão e sofrimento de antes, quando dependia inteiramente do homem

(financeiramente) e sabia que se se separasse dele não teria como manter o mesmo

padrão de vida. A conquista da independência financeira feminina era tudo de que

ela precisava para perceber que podia se sustentar sozinha e passa a buscar

inteiramente a sua felicidade.

Há que se comentar sobre a situação dos filhos, divididos entre os pais,

muitas vezes usados como objeto de barganha; no calor da situação os pais não

percebem que quem mais sofre na separação são os filhos.

O Legislador, preocupado com a situação, que tomava proporções

inimagináveis, posto que não se concebesse que a sociedade banalizasse a

temática da separação de tal forma, e vendo as ações se avolumando, teve que

regulamentar a matéria.

Todavia, sua preocupação não foi suficiente para dar conta da demanda

na abrangência necessária, e as leis que promulgou não facilitavam a vida da

mulher que decidia se separar, em termos financeiros.

A mulher não poderia ficar com os filhos se não comprovasse que tinha

como sustentá-los e a si mesma, e convivia com a ameaça constante de a qualquer

hora perder a guarda quando conseguia que lhe fosse concedida. Então, muito

lentamente a situação foi se modificando, a mulher foi conquistando cada vez mais

espaço e direitos até adentrar a contemporaneidade, em que, pelo menos no papel,

homens e mulheres são detentores dos mesmos direitos.

3.2 Causas

Desde que homem e mulher convivem sua relação é marcada por

desavenças de todas as espécies, provocadas pelos mais distintos motivos.

O mundo e as pessoas mudaram substancialmente do tempo das

cavernas para a atualidade, mas as divergências persistem no âmbito dos

relacionamentos, e o nível de tolerância para a permanência, às vezes por décadas,

numa relação infeliz, como acontecia num passado não tão remoto, desvaneceu-se,

como tudo o que era sólido antes de o processo da modernidade iniciar sua

trajetória sem volta de ressignificação da sociedade.

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Não é por outro motivo que Maria Berenice Dias (2010, p 66-67) dispara

que:

[...] estando a sociedade vivendo um novo momento histórico, tão bem apreendido pela Constituição Federal, que trouxe um sem número de garantias ao cidadão e assegurou-lhe a liberdade e o respeito à dignidade, é de se questionar se o Estado dispõe de legitimidade para impor aos cônjuges restrições à sua vontade de romper o casamento.

Essa legitimidade existia no passado por causa da influência da Igreja,

que não admitia a separação de um casal, visto que o casamento era indissolúvel,

condenando, assim, duas pessoas, que muitas vezes se detestavam, a conviver

para o resto da vida.

O que complicava ainda mais a situação era o surgimento de filhos, que a

depender da conjuntura poderia ajudar a apaziguar os ânimos ou acirrá-los mais

ainda.

Os motivos que levavam à separação envolvem desde o simples não

gostar ao não querer estar do lado de uma pessoa que espanca ou trai o seu

cônjuge até a falta de sentimento, só para mencionar os mais comuns. A titulo de

esclarecimento, a traição não era prerrogativa apenas masculina, a mulher também

traia - não era à toa que na era medieval os homens, quando iam para as guerras,

deixavam suas esposas presas por cintos de castidade, pois sabiam que poderiam

ser traídos.

As causas mais comuns e frequentes de separação são, em síntese, a

traição e as violências, entre as quais se apontam as físicas, as morais e as

sentimentais.

3.3 Modalidades

Neste tópico abordam-se os tipos de dissoluções familiares, seus

requisitos e os impedimentos à sua concretização. Inicia-se com uma breve

explanação sobre separação judicial, abrangendo a apresentação de informações

acerca de seu prazo legal, de quem pode solicitar e de sua conversão em divórcio,

com destaque para o tempo necessário para a sua requisição. Em seguida discorre-

se sobre o divórcio direto e seu prazo legal, destacando-se a necessidade de prova

testemunhal para a comprovação do tempo de separação.

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3.3.1 Antiga separação judicial

A separação Judicial é um instituto criado pelo constituinte original para

dar uma chance ao relacionamento que está prestes a ser encerrado.

O seu exame mais detalhado requer que se apresente previamente a

conceituação de casamento e sociedade conjugal, destacando-se as características

que os diferenciam, a despeito do entendimento popular de que se trata de institutos

jurídicos idênticos, o que não é verdadeiro.

A sociedade conjugal se estabelece em razão do casamento, e pode ser

dissolvida pela vontade das partes ou pelo descumprimento, por qualquer dos

cônjuges, dos deveres inerentes ao casamento, entre outros motivos.

Se, por exemplo, um dos cônjuges manteve uma relação de concubinato

durante o período em que existiu sua sociedade conjugal, adquirindo patrimônio com

a participação de outrem, os direitos de seu companheiro serão preservados em

qualquer circunstância.

Essa situação tem guarida na Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977,

em seu art. 46 e parágrafo único:

Art. 46 - Seja qual for a causa da separação judicial, e o modo como esta se faça, é permitido aos cônjuges restabelecer a todo o tempo a sociedade conjugal, nos termos sem que fora constituída, contanto que o façam mediante requerimento nos autos da ação de separação.

Parágrafo único - A reconciliação em nada prejudicará os direitos de terceiros, adquiridos antes e durante a separação, seja qual for o regime de bens.

Vale ressaltar que ainda que dissolvida a sociedade conjugal, o

casamento persistirá até que seja decretado o divórcio do casal ou sobrevenha o

falecimento de qualquer deles.

Não há lógica na manutenção da separação judicial, segundo Brum

(2001, p. 23), sendo dotada de melhor juridicidade a “implantação do divórcio direto

sem exigências outras”.

Isso porque, como visto anteriormente,

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[...] o casamento não fica apenas no campo das relações civis entre os cônjuges, mas, mais do que isto, é o instituto jurídico que dá origem a família. Importa relembrar, ainda, que a célula fundamental da sociedade é a família e, até por força de disposição constitucional, a família tem proteção especial do Estado (MENDEZ, [entre 2012 e 2014]).

A Constituição Federal, em seu art. 226, assim dispõe: “A família, base da

sociedade, tem especial proteção do Estado”.

Tamanha importância conferida à união familiar justifica que o Estado

cerque a sua dissolução de procedimentos garantidores dos direitos do casal, para o

que foi publicada a Lei nº 6.515/77, cujo art. 1º assim enuncia: “A separação judicial,

a dissolução do casamento, ou a cessação de seus efeitos civis, de que trata a

Emenda Constitucional nº 9, de 28 de junho de 1977, ocorrerão nos casos e

segundo a forma que esta lei regula”.

A separação judicial é o caminho mais simples e imediato de que os

casados dispõem para promover a dissolução da sociedade conjugal. A separação

judicial pode ser consensual, quando os cônjuges resolvem pôr fim ao

relacionamento de forma amigável, ou contenciosa, em que o litígio e a divergência

permeiam a sua realização. No primeiro caso as duas partes devem estar de acordo

com os termos da separação. No segundo, um dos cônjuges não aceita a separação

em si ou os termos impostos pelo outro.

É importante registrar que a Ação de Separação é personalíssima, razão

pela qual não admite a participação de quaisquer terceiros, nem mesmo dos filhos.

No entanto, nada impede que o cônjuge que mantiver a guarda dos filhos possa,

concomitantemente ou em caráter preparatório, pedir alimentos para a sua

manutenção.

No momento em que a separação for pedida por apenas um dos

cônjuges, em caráter litigioso, há de ser observado o que dispõe o art. 100, I, do

Código de Processo Civil (CPC), que estabelece como competente o foro ”I - da

residência da mulher, para a ação de separação dos cônjuges e a conversão desta

em divórcio, e para a anulação de casamento;”.

Vale ressaltar que embora a Constituição Federal estabeleça a igualdade

de direitos entre o homem e a mulher, a jurisprudência dominante se pronuncia no

sentido de que esse dispositivo da Lei Maior não altera o foro privilegiado que a

mulher conquistou.

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Quando a ação tem início no foro de residência da mulher e ela se muda

para outra comarca, a competência não se alterará, o processo continuará correndo

onde teve início e caberá à mulher ali se defender.

Nas situações em que a separação ocorra em razão da ruptura da vida

em comum por mais de um ano, a lei estabelece que os filhos permaneçam com o

cônjuge em cuja companhia ficaram durante esse tempo, evitando, dessa forma, que

a demanda se estenda apenas para a discussão sobre a guarda de filhos quando

essa questão não havia sido objeto de litígio anterior. É o que dispõe o art. 11 da Lei

nº 6.515/77, in verbis: “Quando a separação judicial ocorrer com fundamento no § 1º

do art. 5º os filhos ficarão em poder do cônjuge em cuja companhia estavam durante

o tempo de ruptura da vida em comum.”.

Apenas excepcionalmente, no caso de incapacidade civil, quando o

cônjuge não tem condições legais para dispor sobre os atos da vida civil, poderá ser

representado por curador, ascendente ou irmão.

Em síntese, a separação judicial pode ser homologada pelo Juiz apenas

com base na vontade das partes, mas para que seja decretado o divórcio,

dissolvendo o casamento, não basta que os cônjuges assim o queiram, há

necessidade de que o Estado participe, permita, examine o processo e confira se os

requisitos legais estão atendidos, tudo dentro do prazo que a lei estabelece.

De outro modo, a separação judicial tem o poder de dissolver a sociedade

conjugal e fazer cessar os seus efeitos civis, mas não é suficiente para dissolver o

casamento. Por isso quem está separado judicialmente não tem deveres conjugais a

cumprir com o outro cônjuge, mas também não poderá casar-se novamente sem

que promova o divórcio.

Dispõe a Lei nº 6.515/77 em seu art. 2º:

A sociedade conjugal termina: I - pela morte de um dos cônjuges; II - pela nulidade ou anulação do casamento; III - pela separação judicial; (revogado) IV - pelo divórcio. Parágrafo único. O casamento válido somente se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. (Grifo nosso).

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Art. 1.574. Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges se forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por ele devidamente homologada a convenção.

O requisito para a solicitação da separação judicial é o decurso de um

ano de casamento, quer seja na modalidade consensual ou litigiosa, como dispõe o

art. 1.574 do Código Civil Brasileiro acima citado.

3.3.2 Divórcio

O divórcio é a segunda etapa da finalização da sociedade conjugal.

Quando decorrido o prazo legal de um ano da separação judicial, o casal, se

permanecer decidido sobre o término da relação, pode pôr fim ao casamento.

Do mesmo modo, se resolverem mudar sua decisão e restituir o

relacionamento é nesse momento que deverão se manifestar.

Somente por intermédio do divórcio é que se dissolve o casamento válido;

tirando essa hipótese, o casamento só pode ser extinto com a morte de um dos

cônjuges.

O divórcio pode ser decretado como conversão de separação judicial ou

como divórcio direto.

Qualquer dos cônjuges separados judicialmente poderá, individualmente,

postular em juízo a conversão de Separação Judicial em Divórcio.

Quando o divórcio for requerido na mesma comarca onde tenha ocorrido

a separação judicial o processo do Divórcio será apensado ao processo da

Separação.

Dispõe a Lei nº 6.515/77, no parágrafo único de seu art. 35, que “o pedido

será apensado aos autos da separação judicial”.

Sempre houve preocupação do legislador em não deixar constar no

registro civil qualquer alusão à causa do divórcio, com o objetivo de evitar a invasão

da privacidade do casal. O processo de separação e divórcio também tramita sob

segredo de justiça, sigilo que deverá permanecer quando da averbação do divórcio

no Cartório de Registro Civil, como se depreende da leitura do art. 25 da Lei nº

6.515/77:

21

A conversão em divórcio da separação judicial dos cônjuges, existente há mais de um ano, contada da data da decisão ou da que concedeu a medida cautelar correspondente (art. 8º), será decretada por sentença, da qual não constará referência à causa que a determinou.

Na forma geral, quando é realizado o divórcio a mulher tem que alterar o

seu nome para o nome de solteira. Três são as situações, entretanto, que lhe

possibilitam permanecer com o nome de casada: I - evidente prejuízo para a sua

identificação; II – manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos

havidos da união dissolvida; e III – dano grave reconhecido em decisão judicial.

(todos os incisos deste art. 25 da Lei nº 6.515/77 incluídos pela Lei nº 8.408, de

1992).

No art. 1.580 do Código Civil e seus §§ 1º e 2º evidencia-se a

comprovação dessa assertiva:

Art. 1580. Decorrido um ano do trânsito em julgado da sentença que houver decretado a separação judicial, ou da decisão concessiva da medida cautelar de separação de corpos, qualquer das partes poderá requerer sua conversão em divórcio. § 1º A conversão em divórcio da separação judicial dos cônjuges será decretada por sentença, da qual não constará referência à causa que a determinou. § 2º O divórcio poderá ser requerido, por um ou por ambos os cônjuges, no caso de comprovada separação de fato por mais de dois anos.

O requisito para a solicitação do divórcio consensual é o decurso de um

ano da sentença que declarou a separação judicial ou de dois anos de separação de

fato, e a declaração dos divorciandos de que não houve e não há possibilidade de

reconciliação.

3.3.3 Divórcio direto

Essa modalidade de divórcio é uma forma que o legislador encontrou para

que o casal não fosse forçado a conviver por pelo menos mais um ano para poder

solicitar a separação judicial, tampouco ficasse à mercê de possível ação judicial

movida pelo outro por abandono de lar.

22

O divórcio direto consiste no direito ao rompimento do vínculo conjugal

após uma separação de fato por dois anos. É imprescindível a presença das

testemunhas para atestar a veracidade da declaração das partes.

A sentença decretando o divórcio não pretende apenas pôr fim ao vínculo

matrimonial, conferindo aos divorciados a possibilidade de convolar novas núpcias.

Produz outras consequências em relação aos divorciados, aos seus bens e a sua

prole, abrangendo a cessação dos deveres matrimoniais, o estabelecimento de

domicílio individual próprio para cada cônjuge, a extinção do regime matrimonial de

bens e o desaparecimento da condição recíproca de herdeiro. Esses efeitos não

retroagem; logo, não atingem ou fazem desaparecer as situações jurídicas já

consolidadas durante o casamento, pois o divórcio “dissolve para o futuro” (eficácia

ex nunc) (GOMES, 1998, p. 290).

Segundo Arnoldo Wald (1998, p. 144), “[...] não se modificam os direitos e

deveres dos pais com relação aos filhos, quaisquer que eles sejam, mesmo que um

deles ou ambos venham a contrair novo casamento”.

É o que dispõe o art. 27 e seu parágrafo único da Lei nº 6.515/77, in

verbis: “Art. 27. O divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação

aos filhos. Parágrafo único. O novo casamento de qualquer dos pais ou de ambos

também não importará restrição a esses direitos e deveres.”.

A partilha dos bens e a guarda dos filhos terão que ser feitas já na

separação judicial.

O cônjuge que não tiver a guarda dos filhos poderá visitá-los e tê-los em

sua companhia, por meio consensual ou conforme o juiz estabeleça, e ainda

fiscalizar-lhes a educação e as condições em que são mantidos por quem detenha a

guarda, de forma geral, em consonância com o disposto no art. 15 da Lei em estudo:

“Os pais, em cuja guarda não estejam os filhos, poderão visitá-los e tê-los em sua

companhia, segundo fixar o juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.”.

3.3.4 Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, lei vigente

A Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010. Sua elaboração

teve por objetivo resolver os problemas de morosidade/cansaço do Poder Judiciário

e dos consortes que por anos se desgastavam tentando manter ou reestabelecer

uma relação que na maioria das vezes não tinha mais condições de existir. Trata-se

23

de mais uma evolução futurista do Direito pátrio, que como outros Diplomas, foi

muito bem recebida por alguns doutrinadores, mas nem tanto por outros mais

conservadores.

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos; (revogado) § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 66, de 2010) [...]

O novo art. 226, § 6º da Constituição Federal, modificado pela Emenda nº

66, de 14 de julho de 2010, veio para suscitar ainda mais dúvidas sobre a separação

judicial no Brasil, mais especificamente sobre a sua existência ou não. Alguns

doutrinadores afirmam que ela continua a existir, mas a grande maioria acredita que

já não há mais espaço na legislação para esse instituto.

Os doutrinadores também divergem sobre as vantagens e desvantagens

da alteração do Texto Constitucional. Para grande parte deles a Emenda veio para

facilitar a vida dos consortes, possibilitando-lhes optar por manter ou não um vínculo

matrimonial apenas enquanto der certo, sem que sejam obrigados a isso; outros,

também numerosos, temem ou afirmam que o matrimônio ficou prejudicado com a

alteração proposta pela Emenda nº 66, podendo inclusive vir a se banalizar.

Na prática, a alteração do texto teve como finalidade retirar as restrições

previstas no § 6º à dissolução do casamento civil pela via do divórcio – ser precedido

de separação judicial por mais de um ano ou de separação de fato por mais de dois

anos. Isso significa que com a nova regulamentação as pessoas podem se casar em

um dia e divorciar-se no outro dia ou alguns minutos depois.

Não se considera que o Legislador constituinte reformador teve como

intuito denegrir a imagem da instituição matrimônio, como se pode depreender das

palavras de Pablo Stolze Gagliano (2010, p.): “não se prestigiaria o fim do

matrimônio, mas a dignidade da pessoa humana, constitucionalmente protegida”.

Para o autor, quis o Legislador com a nova Emenda facilitar a resolução de um

determinado conflito, dotando-o de rapidez e eficiência. Isso porque o casal que já

24

sofre com o fim do casamento ainda precisa enfrentar uma situação desgastante,

conflituosa e demorada, que é o seu divórcio pelos meios convencionais, anteriores

à nova Emenda. Espera-se, com essa facilidade, que o casal tenha tempo até para

buscar sua felicidade em outro relacionamento, com outro parceiro.

25

4 SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAIS

Finalmente a apostilar sobre o assunto em pauta, discorre-se sobre os

métodos utilizados para a feitura da escritura pública de separação judicial ou de

conversão ou de divórcio direto, procurando oferecer respostas a algumas

indagações sobre a utilização da Lei nº 11.441/2007 em casos particulares.

4.1 A Lei nº 11.441/2007

A Lei nº 11.441/2007 produziu importantes inovações no panorama

jurídico nacional, alterando substancialmente paradigmas há muito consolidados nas

doutrinas civilistas ao permitir a realização de separações e divórcios em cartórios

extrajudiciais.

Referido Diploma incluiu no Direito brasileiro a possibilidade de realização

de divórcio e separação extrajudicial, de solicitação de pensões alimentícias entre os

ex-cônjuges e de restabelecimento ou não dos nomes de solteiros, respeitando-se

os prazos legais previstos no Código Civil e não havendo filhos menores ou maiores

incapazes.

A nova lei restringe a intervenção do Estado na vida privada das pessoas,

na medida em que possibilita que as separações e os divórcios consensuais, nos

casos em que não haja filhos menores e ou incapazes, sejam levadas a termo fora

do âmbito do Poder Judiciário.

Preocupada em conferir mais celeridade e afastar dificuldades até mesmo

de ordem financeira a esses tipos de demandas a Lei autorizou inclusive a

concessão do benefício da gratuidade da justiça.

Dessa forma, e ainda que a separação e o divórcio consensuais se

insiram no campo de abrangência do que o CPC denomina de procedimentos

especiais de jurisdição voluntária, não tendo tais pedidos, por sua natureza

amigável, litigiosidade justificadora de alteração processual fundamental no tocante

ao rito a eles inerente, procurou-se, com a Lei nº 11.441/2007 e de forma

extrajudicial, ainda que com a assistência de advogados e desde que não houvesse

filhos menores ou incapazes do casal, permitir a realização de separação e divórcio

não litigiosos em cartório extrajudicial, independentemente de intervenção judicial.

26

O Legislador, avaliando a situação, mediante a lei em comento, quis

atingir uma demanda da população que mais necessita dessas alterações, fazendo

com que a justiça, constituída pelos Tribunais, Fóruns e Defensorias públicas,

pudesse se engajar em litigiosos jurídicos mais complicados do que simples ações

consensuais.

4.2 Requisitos

Após tecerem-se, em apertada sinopse, considerações acerca da

evolução histórica e dos requisitos para a solicitação das modalidades de separação

nas vias judiciais, passa-se finalmente para a abordagem do instituto na via

extrajudicial.

Os requisitos para a solicitação da separação judicial e a sua conversão

em divórcio e divórcio direto extrajudiciais são obrigatoriamente de cunho

consensual, não cabendo em hipótese nenhuma o litígio em nenhuma de suas

etapas. Também não se pode utilizar a via extrajudicial nos casos que envolvam

filhos menores ou incapazes, em que se torna obrigatória a manifestação do

Ministério Público, exceto quando os menores em questão sejam emancipados.

4.3 Funções do Advogado

A Lei nº 11.441/2007, que alterou os dispositivos do Código de Processo

Civil, inovou ao prever a possibilidade de realização de separações e divórcios

consensuais na via administrativa.

Assim, no que diz respeito à separação e ao divórcio consensual,

acrescentou o art. 1.124-A ao CPC, que possibilita sua realização por intermédio de

escritura pública, desde que não haja filhos menores ou incapazes, como já

mencionado em ocasião pretérita.

Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.

27

Entretanto, o dispositivo legal faz uma ressalva: as partes devem estar

assistidas por advogado comum ou cada um com o seu próprio, sem a qual não

poderá ser lavrada a escritura, consequentemente, não poderá ocorrer a separação

ou o divórcio.

O deputado Maurício Rands, relator na Câmara Federal do Projeto de Lei

nº 6.416/2005, que deu origem à Lei em estudo, assim justificou a relevância da

mudança:

Diante disso, recorremos novamente à proposta inserida no “Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano”, para inserir em nossa proposta dispositivo que acresce novo artigo ao Código de Processo Civil, cujo texto permite a realização consensual da separação e do divórcio por meio de escritura pública, deste que ausentes os interesses de incapazes e observados os requisitos legais quanto aos prazos. A medida permitirá a realização da separação consensual por meio de escritura pública, incumbindo ao tabelião a tarefa de verificar a existência dos requisitos legais para a realização do procedimento. Efetuada a separação, as partes também poderão realizar o divórcio consensual por meio de escritura pública, cabendo ao tabelião verificar se estão preenchidas as condições legais previstas para a realização desse procedimento, principalmente no que concerne ao prazo.

A razão de ser dessa obrigatoriedade estaria no art. 1°, I do Estatuto da

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, em

torno do qual estabeleceu-se uma polêmica por ocasião da criação dos juizados

especiais (Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995), no âmbito dos quais não é

necessária a presença do advogado: “Art. 1º São atividades privativas de advocacia:

I - a postulação a órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais; (Vide ADIN

1.127-8).”.

Com receio de que a Lei nº 11.441/2007 tivesse o seu objetivo

desvirtuado, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Nacional, Cézar Brito,

pressionou o deputado relator, que se pronunciou da seguinte forma:

Assim como no procedimento para a realização do inventário e de partilha extrajudicial, propomos que as partes interessadas também sejam obrigatoriamente assistidas por advogado no procedimento consensual para a separação e o divórcio extrajudicial, de modo a impedir o consentimento em acordos temerários.

Assim sendo é obrigatória a assistência de advogado nos divórcios e

separações realizadas pela via extrajudicial para que o ato seja acompanhado e

28

supervisionado para que não aja nenhum tipo de fraude ou, como foi dito pelo

Presidente da OAB nacional, “divórcio de gaveta”.

Então, na nova lei, não obstante as críticas de que porventura venha a ser

alvo, a presença do advogado é condição sine qua non para a realização do divórcio

e da separação extrajudicial, restando examinar as consequências de sua falta.

No caso em apreço, a Lei nº 11.441/2007 determina que o Tabelião

somente possa lavrar a escritura se os contratantes estiverem assistidos por

advogado. No entanto, nas hipóteses de o Tabelião lavrá-la sem a assistência

exigida por lei, é necessário verificar se o ato praticado é nulo, anulável ou

inexistente.

Em princípio é possível aceitar que seja inexistente, como a hipótese de

um casamento ser celebrado sem ser presidido por um juiz de paz. Ocorre que a

realização de casamento por juiz de paz é elemento essencial para a sua efetivação

como tal, do contrário não será casamento, todavia, no caso do divórcio e separação

extrajudicial, o essencial é que a escritura seja lavrada pelo Tabelião, não

constituindo escritura se assim não for. O advogado não pratica o ato, apenas

assiste.

Considera-se ato nulo, conforme o disposto no art. 166 do Código Civil

brasileiro, in verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

No caso em vista, a falta do advogado consistiria em negligência a uma

solenidade essencial necessária para produzir direitos, implicando a nulidade da

prática do ato.

29

Nesse sentido, conclui-se que em razão da indispensabilidade da

assistência do advogado para a boa prática de atos jurídicos, com destaque para o

âmbito da separação e do divórcio realizados pela via extrajudicial, se as escrituras

forem feitas sem a sua presença, na absurda hipótese de algo assim vir a acontecer,

o ato é nulo, pois não preenche os requisitos estabelecidos em lei como obrigatórios

para a seguridade dos direitos das partes e de possíveis menores e incapazes que

tenham sido inadvertidamente colocados na escritura, desrespeitando-se a

competência do judiciário no caso citado.

4.4 Gratuidade das despesas cartorárias

Dispõe o artigo 1.124, § 3º do Código Civil brasileiro que “A escritura e

demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as

penas da lei”.

A simples declaração das partes de que não têm condições para arcar

com as despesas cartorárias já supre a exigência para a concessão do benefício da

justiça gratuita, contudo, há que se fazer uma verificação mais aprofundada nessas

declarações para que o sistema judiciário representado pelos cartórios não venha a

ser lesado.

Nas vias judiciais, as declarações de pobreza e os pedidos de justiça

gratuita podem ser contestados pela parte adversa, mesmo no âmbito consensual, e

o juiz pode acatá-los ou não.

Já na via extrajudicial, o pedido de justiça gratuita e a declaração de

pobreza não podem ser contestados, pois como se trata de ação consensual, não

cabe litígio nem mesmo no tocante a essa questão.

O Tabelião não tem competência para indeferir os pedidos, mesmo

quando tem conhecimento de que a declaração não tem procedência e de que o

pedido de justiça gratuita não passa de logro dos consortes para não pagar as

despesas cartorárias.

A Resolução n° 35 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que

disciplinou a Lei nº 11.441/2007, estudada em maiores detalhes na continuidade,

reza o seguinte:

30

Art. 7° Para a obtenção da gratuidade de que trata a Lei n° 11.441/07, basta a simples declaração dos interessados de que não possuem condições de arcar com os emolumentos, ainda que as partes estejam assistidas por advogado constituído.

Mesmo na disciplina do Conselho Nacional de Justiça a simples

declaração de pobreza já permite que se conceda o direito ao benefício da

gratuidade da justiça, ainda que não se tenha verificado a idoneidade dessas

declarações.

Alguns cartórios estão adotando a regra de aceitar casos de gratuidade

da justiça por intermédio da Defensoria Pública, porquanto se trata de instituição que

pode se responsabilizar pelas declarações feitas pelos seus representados.

Essas declarações, sem serem confirmadas, podem resultar em prejuízo

para os cofres da justiça, pois a gratuidade do selo usado na escritura pública de

separação ou divórcio ou conversão é repassada para o Tribunal de Justiça ao qual

o cartório está vinculado.

Quando a escritura não tem valor declarado, o seu custo passa a ser o

mínimo que o Tribunal determina, geralmente disposto nos provimentos em que a

Corregedoria dos tribunais regulamenta os atos notariais. Entretanto, quando a

escritura tem valor declarado, os bens a serem partilhados servirão de parâmetros

para o valor das custas, que é calculado com base em uma tabela que o Tribunal

disponibiliza para os notários.

É evidente, dessa forma, o prejuízo para os Tribunais que deixaram de

receber custa por declarações fraudulentas de pobreza, o que justifica a importância

da verificação da declaração de pobreza pelos notários, para que haja idoneidade

nos atos e que o beneficio da justiça gratuita seja concedido para aqueles que

realmente necessitam.

4.5 Possibilidade de dissolução por procuração

Uma discussão que há muito aquece o cenário do Direito de Família é a

que envolve a possibilidade de a separação ou o divórcio - atos personalíssimos,

que exigem a presença das partes – serem realizados por meio de procuração.

Conceitualmente procuração constitui um contrato pelo qual alguém

recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar

31

interesses. De outro modo, o representante pratica atos que não geram direitos e

obrigações para si, mas para o representado.

Por causa desse conceito é que, em teoria, não se permitia a dissolução

por procuração, em conformidade com o que reza o art. 3°, § 1º da Lei nº 6.515/77,

in verbis: “§ 1º 0 procedimento judicial da separação caberá somente aos cônjuges,

e, no caso de incapacidade, serão representados por curador, ascendente ou

irmão.”.

Todavia o casamento pode ser feito por procuração, e é essa permissão

do art. 1.542 do Código Civil brasileiro que torna a discussão ainda mais acirrada.

Alguns poderiam argumentar a possibilidade de se usar a analogia para a

solução desse problema, baseado na argumentação do art. 4° da Lei de Introdução

ao Código Civil Brasileiro, que confere ao magistrado essa faculdade. No entanto, no

caso da dissolução extrajudicial o tabelião não tem competência para lançar mão do

recurso da analogia.

É imperioso demonstrar que o Conselho Nacional de Justiça,

arbitrariamente, no art. 36 da sua Resolução n° 35 assim discorre:

Art. 36 - O comparecimento pessoal das partes é dispensável à lavratura de escritura pública de separação e divórcio consensuais, sendo admissível ao(s) separando(s) ou ao(s) divorciando(s) se fazer representar por mandatário constituído, deste que por instrumento público com poderes especiais, descrição das cláusulas essenciais e prazo de validade de trinta dias.

Pode-se perceber que no intuito de agilizar o processo o Conselho

Nacional de Justiça passou por cima das normas doutrinárias e legalistas. Já que a

Lei nº 11.441/2007 foi omissa em explanar o assunto, o Conselho Nacional tentou

erroneamente preencher a lacuna deixada pela legislação supracitada.

Há que se ser sensível à ideia de que a lei em estudo surgiu como

facilitadora para os interessados na separação extrajudicial ou no divórcio

extrajudicial, que certamente ocorrerão de modo mais célere e menos burocrático se

realizados dessa forma.

No entanto, o legislador deixou aberta a questão, restando tecnicamente

necessária a presença de ambas as partes no cartório para que não haja

questionamentos futuros em relação aos direitos extintos e aos que se originam da

nova condição.

32

Nos casos de separação judicial, as partes litigantes deverão ser

assistidas e representadas processualmente pelos seus respectivos advogados, no

entanto, os atos de manifestação pessoal dos cônjuges em juízo não poderão ser

supridos por quaisquer terceiros, nem mesmo pelos advogados, salvo no caso de

incapacidade judicialmente aferida.

4.6 Regulamentações pelo Conselho Nacional de Justiça

Os cartórios são regidos pelos provimentos editados pelo Tribunal de

Justiça de cada estado, por sua vez fiscalizados pelas corregedorias dessas

instâncias.

De posse dessa informação, já era de se esperar que o Conselho

Nacional de Justiça se manifestasse para regulamentar as práticas dos cartórios em

referência às separações e divórcios, agora de responsabilidade dos notários.

Prevendo que a Lei n° 11.441/2007 resultaria em uma enxurrada de

ações na via extrajudicial, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n° 35,

de 24 de abril de 2007, oferecendo algumas respostas para determinadas situações

que os Oficiais dos Cartórios iriam enfrentar a partir de então.

O art. 2° da referida Resolução aborda uma das situações que a Lei nº

11.441/2007 não regulamentou, estabelecendo o prazo e o procedimento a ser

seguido por aqueles que já têm um processo tramitando na justiça.

De acordo com a sua redação, as partes podem pedir a suspensão do

processo que tramita na justiça pelo prazo de 30 dias ou solicitar a sua desistência,

a qualquer tempo.

O artigo em estudo esclarece uma das indagações mais frequentes em

relação à inovação da separação e divórcio pela via extrajudicial: se as vias

cartorárias são obrigadas ou não a realizar os procedimentos:

Art. 2° É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial.

33

Então não pairam mais dúvidas sobre esse assunto, restando claro que

ninguém é obrigado a promover sua separação ou divórcio nas vias extrajudiciais,

podendo as partes, caso assim o desejem, permanecer no âmbito judicial.

É evidente que se a procura dessa via não fosse facultativa a população

iria ver essa alteração com desconfiança, pois é histórica a má fama dos cartórios,

marcada por práticas graciosas para alguns clientes em detrimento de outros, a

despeito de sua atuação (pelo menos da maioria) mais idônea na atualidade, até

porque agora são alvos de fiscalização da Corregedoria do Tribunal de Justiça.

Outra situação sobre a qual os Oficiais dos Cartórios se indagavam

bastante se refere à possibilidade ou não de indicação de advogados pelo Tabelião

às partes, perfeitamente respondida no art. 9° da Resolução n° 35 do Conselho

Nacional de Justiça;

Art. 9° É vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes, que deverão comparecer para o ato notarial acompanhadas de profissional de sua confiança. Se as partes não dispuserem de condições econômicas para contratar advogado, o tabelião deverá recomendar-lhe a Defensoria Pública, onde houver, ou, na sua falta, a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil.

As pessoas que trabalham em cartórios sabem que é intrínseco o trabalho

do advogado em suas dependências, contudo o Conselho Nacional de justiça não

viu com bons olhos essa possível parceria, vislumbrando a possibilidade de se

configurar uma situação de captação de recursos, na qual o Cartório entraria com a

parte da escritura e disponibilizaria a assistência de um advogado. Prevendo tal

situação a Corregedoria proibiu a indicação de advogado pelo Tabelião.

Para se certificar de que essa prática restará coibida e demonstrar que a

lei estará sendo aplicada de acordo com o que dispõe o seu texto, já que a

sociedade estará observando as práticas cartorárias com muito interesse, à

Corregedoria caberá a sua fiscalização.

As escrituras públicas decorrentes de separações judiciais, divórcios e

conversões serão lavradas em livro próprio.

No que diz respeito ainda às escrituras, o art. 42 da Resolução CNJ nº

35/2007 estabelece que “Não há sigilo nas escrituras públicas de separação e

divórcio consensual.”.

34

Trata-se de item de extrema importância, pois o segredo de justiça é um

artifício de que se valem os advogados para preservar o anonimato dos clientes,

contudo, na via extrajudicial, como o fim do relacionamento é de cunho consensual,

não é necessária a utilização desse instituto.

Outro item polêmico refere-se à possibilidade de recusa do Tabelião de

lavrar a escritura de separação ou de divórcio, devidamente esclarecido no art. 46

da Resolução n° 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça:

Artigo 46. O tabelião poderá se negar a lavrar a escritura de separação ou divórcio se houver fundados indícios de prejuízo a um dos cônjuges ou em caso de duvidas sobre a declaração de vontade, fundamentando a recusa por escrito.

Percebe-se mais uma vez o Legislador preocupado com o direito das

partes, para que não aja abuso advindo de nenhum dos lados.

Observando-se o texto do artigo em evidência, verifica-se a preocupação

com as dissoluções que apresentem uma parte coagindo a outra a terminar a

relação conjugal de forma prejudicial à outra parte.

Com a autonomia conferida pela Resolução em comento o Tabelião que

se recusar a lavrar a escritura pública poderá efetivamente proteger o direito das

partes hipossuficientes, entretanto deverá apresentá-la por escrito e devidamente

motivada.

Na continuidade, um item que pode ser delicado para os Tabeliães diz

respeito a sua atuação em caso de descumprimento das cláusulas de prestações

alimentícias inseridas na escritura pública, suscitando a seguinte indagação: como o

alimentado poderá exigir a sua observância?

A solução para a questão é bem simples, mas requer que a parte

prejudicada ingresse na instância judicial e demonstre a inadimplência, baseada no

art. 44 da Resolução n° 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça, com a seguinte

redação: “[...] Art. 44 É admissível, por consenso das partes, escritura pública de

retificação das cláusulas de obrigações alimentares ajustadas na separação e nos

divórcios consensuais”.

Como explicado no texto em evidência, são passíveis de contestação os

alimentos acordados na escritura pública de separação ou de divórcio.

35

4.7 A constitucionalidade da Lei

Essa certamente é uma das discussões que não poderia deixar de ser

abordada em um estudo dessa natureza, visto que a constitucionalidade dos

Diplomas publicados no ordenamento brasileiro preocupa substancialmente os

operadores do Direito pátrio, no qual o Estado se mostra extremamente protetor com

o Direito de Família, não deixando a cargo do particular as decisões referentes ao

núcleo familiar, em razão de que a família é o alicerce de toda a sociedade e fonte

do poder do Estado.

Tal ingerência manifesta-se principalmente por meio da imposição de

normas de ordem pública, que reduzem, de forma significativa, o campo da

autonomia privada.

A preocupação do Estado quando proposta a referida lei era o

desafogamento do Judiciário, em especial nas varas de família, tornando mais

simples e menos onerosos os procedimentos necessários à formalização da

separação e do divórcio, sem se descuidar da proteção aos direitos dos filhos

menores e de terceiros interessados e sem eliminar a possibilidade de que sejam

feitos pelos meios judiciais.

4.8 Casuística

Apresentam-se, neste tópico, algumas situações com as quais o Tabelião

pode vir a deparar e as alternativas constantes na Lei destinadas a solucioná-las de

modo célere e legal.

Uma das situações que o notário poderá vivenciar, ainda que não de

modo corriqueiro, é quando um casal manifestar o desejo de reconciliar-se por meio

de escritura pública depois de ter sido formalizada uma separação judicial.

A regra da separação judicial estabelece que durante o prazo de um ano

após a homologação da sentença da separação o casal não poderá contrair novas

núpcias e que poderá, no mesmo período, reconciliar-se, recompondo-se o status

quo do casamento.

Nesse caso os cônjuges pedirão para que se encerre o processo e

voltarão ao estado civil de casados.

36

Vale esclarecer que o Tabelião só poderá fazer a escritura pública se a

separação tiver sido realizada pelas vias administrativas, caso contrário, os cônjuges

deverão buscar a tutela do Estado.

É uma questão simples de se resolver, pois um ato notarial, sendo

meramente administrativo e não judicial, torna-se mais fácil de ser contestado por

meio de uma ação de nulidade cumulada com danos.

Por fim tal situação poderá se instalar depois que o divórcio for concluído

e as partes desistirem da dissolução.

Essa é uma possibilidade à qual os Tabeliães estarão sujeitos, pois a

população que não conhece a função dos cartórios poderá pensar que pelo fato de

estar longe do ambiente da justiça poderá firmar acordos com esses Oficiais.

Contudo há que se lembrar que os cartórios são uma extensão dos

Tribunais de Justiça, e como tais deverão seguir a lei.

Diante disso, a possibilidade de restauração do casamento depois de um

divórcio extrajudicial ser desfeito é muito remota, a não ser por ordem judicial

motivada por algum erro na lavratura da escritura pública de divórcio.

A lei não permite que se atue nesse sentido, pois como já foi conferido

aos cônjuges o prazo de um ano da separação judicial ou de dois do divórcio direto

para que se reconciliassem, a alteração dessa situação somente ocorrerá mediante

um novo casamento, realizado com todos os ritos e exigências que esse ato solene

impõe.

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5 CONCLUSÃO

A Lei nº 11.441/2007 surgiu no ordenamento jurídico brasileiro para

imprimir maior celeridade às ações de separação e divórcio, umas das que mais

demandam o Judiciário, contribuindo para a situação de crise em que se encontra

imerso.

As varas de famílias estão sempre repletas e seus servidores

assoberbados com o acúmulo de ações que muitas vezes poderiam ser resolvidas

na primeira audiência.

Entretanto, essa solução não se concretiza por falta de acordo entre as

partes, ou até mesmo por causa das pautas de audiências, com suas datas a perder

de vista, que resultam na perda de interesse no acordo pelas partes.

A possibilidade de se realizar a separação e o divórcio no cartório tanto

imprime maior celeridade aos atos em questão quanto desafoga o Judiciário,

sobretudo com a concessão do benefício da justiça gratuita a quem o invoca

declarando-se pobre na forma da lei, o que poderia constituir empecilho para a

procura da via extrajudicial com esse fim.

As únicas exigências feitas pelo Legislador para a realização desses atos

nos cartórios é que se trate de rompimento do vínculo de forma consensual, que não

haja filhos menores ou incapazes envolvidos e que cada um dos cônjuges –

separadamente ou em conjunto, seja assistido por advogado.

Evidenciou-se, com base no exposto, que a Lei nº 11.441/2007 veio para

facilitar a vida da sociedade, entretanto, deverá ser observada de perto para que não

seja desvirtuada e utilizada como meio para burlar os direitos e deveres das partes

envolvidas na dissolução da sociedade conjugal.

As fiscalizações dos atos notariais deverão ser feitas periodicamente

pelos órgãos competentes para que se demonstre para a sociedade que não se trata

apenas de mais uma lei, e, sim, uma lei séria, em cuja aplicação não se admitirá

fraudes, perpetradas ou pelos tabeliães e/ou pelos advogados.

A presença do advogado é imprescindível para a boa prática das

separações e divórcios, porquanto guardião da legitimidade que se faz necessária

às ações em que o Estado tem tanto interesse, mas das quais afastou as

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formalidades que lhes permitiam tramitar na justiça comum em prol de uma

celeridade e praticidade de que a atualidade carece.

Os atos notariais, se realmente praticados por procuração, deverão ser

objeto de atenção redobrada, para se garantir que não sejam violados os direitos ou

retirados os deveres de cada consorte. Ademais, a lei é inovadora e chegou a muito

boa hora para dar um alivio ao sistema Judiciário, tão necessitado de medidas dessa

natureza.

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REFERÊNCIAS

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