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5 ANOS É NA EDUCAÇÃO INFANTIL

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5 ANOS É NA EDUCAÇÃO INFANTIL

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Dossiê FMEI: 5 anos é naEducação Infantil

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Dossiê FMEI: 5 anos é naEducação Infantil

Organizadoras Mônica Correia Baptista

Rosalba Rita Lima

Belo HorizonteNúcleo de Estudos e Pesquisas sobre

Infância e Educação InfantilFaculdade de Educação/ UFMG

2013

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D724

Dossiê FMEI : 5 anos é na educação infantil / Mônica Correia Baptista, Rosalba Rita Lima (orgs.). - Belo Horizonte, UFMG/Faculdade de Educação, 2013. 219 p. : il. ISBN: 978-85-8007-066-8 (eletrônico) 1. Fórum Mineiro de Educação Infantil -- Relatórios. 2. Educação de crianças -- Congressos. 3. Educação e Estado. 4. Serviço social escolar. I. Título. II. Baptista, Mônica Correia. III. Lima, Rosalba Rita. IV. Fórum Mineiro de Educação Infantil. CDD- 372.414

Catalogação da Fonte : Biblioteca da FaE/UFMG

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Apresentação: o Fórum Mineiro de Educação Infantil e a luta pelo recorte etário.......................................................................................................7

1. As discussões no âmbito do judiciário..........................................................22

a. Decisão do Ministério Público de Pernambuco..........................................22

b. Medida cautelar que suspendeu a abrangência da liminar de Pernambuco..........................................................................44

c. Liminar da 3ª vara – Seção Judiciária de Minas Gerais.............................47

d. Doutrina do Rio Grande do Sul quanto à duraçãodo ensino fundamental................................................................................50

e. Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade................58

2. Documentos legais e normativos sobre a temática:leis, decretos, resoluções....................................................................................62

a. Constituição Federal de 1988 – artigos referentes

ao direito à educação......................................................................................62

b. Lei 12.796/2013 que altera artigos da IDBEN 9394/96............................63

c. Resoluções do Conselho Nacional de Educação........................................65

d. Nota técnica do Ministério da Educação.....................................................71

3. Documentos da Secretaria de Estado de Minas Gerais..............................78

a. Resolução de cadastro publicada em 2012................................................78

b. Ofício encaminhado para as escolas orientando quanto à avaliação de crianças que completam seis anos após 31 de março.................................81

4. Textos teóricos.................................................................................................83

Texto 1: Corte etário - em defesa da

Sumário

infância e da Educação Infantil......................................................................83

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Texto 2: O ingresso no ensino fundamental com cinco anos:

Texto 3: A judicialização da educação...........................................................131

5. Projeto de lei 3871/2013 – Assembleia Legislativa de Minas Gerais.....................................................................................................159

Parecer para o 1º turno do Projeto de Lei nº 3.871/2013..............................159

Parecer para o 2º turno do Projeto de Lei nº 3.871/2013..............................164

Lei nº 20.817, de 29 de julho de 2013...........................................................167

6. Documentos do Fórum Mineiro de Educação Infantil – FMEI.................168

a. Carta aberta à comunidade........................................................................168

b. Nota de esclarecimento..............................................................................170

c. Carta ao Promotor.......................................................................................171

d. Abaixo – assinado......................................................................................173

e. Folder de divulgação da campanha............................................................173

f. Texto para associação nacional do ministério público:

produção NEPEI e FMEI...............................................................................176

7. Posicionamento de outras instituições.........................................................180

a. Fórum Gaúcho de Educação Infantil.............................................................. 180

b. Campanha Nacional pelo Direito à Educação.................................................181

c. ANPEd.............................................................................................................182

d. Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte.....................................184

e. Resposta da Faculdade de Educação da Universidade

f. O posicionamento da Rede Nacional Primeira

Infância – RNPI...................................................................................................195

8. Indicação de outras leituras para aprofundamentona temática......................................................................................................216

direito à escolarização ou negação do direito à infância?.............................116

de São Paulo.....................................................................................................187

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APRESENTAÇÃO: O FÓRUM MINEIRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL E A LUTA PELO RECORTE ETÁRIO

Prof.ª Mônica Correia BaptistaCoordenadora do FMEI

Faculdade de Educação – UFMG

Durante algumas décadas, o ensino fundamental no Brasil teve a duração de oito anos, incluindo as crianças que completavam sete anos até 30 de abril e se estendendo aos jovens com quatorze anos completos. Após a promulgação da Constituição Federal, a extensão da duração do ensino fundamental para nove anos passou a ser debatida como uma possibilidade de ampliação do acesso à educação, acompanhando uma tendência mundial de iniciar-se a escolarização obrigatória a partir dos seis anos de idade.

Em 2004, o Conselho Nacional de Educação homologou o Parecer CEB 24/2004, que indicava a implantação da matrícula de crianças de seis anos no ensino funda-mental como opção dos sistemas de ensino e estabelecia uma série de normas a serem respeitadas, no caso de os municípios optarem por essa ampliação. Entre essas nor-mas, destacavam-se: o respeito ao preceito constitucional do regime de colaboração entre os sistemas de ensino; a garantia da universalização do ensino fundamental na faixa etária de sete aos quatorze anos; o não prejuízo da oferta da educação infantil; a adequação da proposta pedagógica.

Vale ressaltar que, naquela conjuntura, as condições para a ampliação da escolari-zação já se mostravam possíveis, mas ainda uma medida bastante exigente, conside-rando as políticas vigentes, sobretudo aquelas relacionadas ao financiamento, que priorizavam o ensino fundamental de oito anos. Ainda que indicasse a ampliação da matrícula no ensino fundamental para crianças menores de sete anos como uma opção dos sistemas e ressaltasse alguns condicionantes para sua efetivação, o Parecer se preocupava com a fixação da idade cronológica limite para a matrícula das crianças de seis anos. Segundo seu relator, deveriam ser matriculadas, no primeiro ano do ensino fundamental, as crianças que tivessem seis anos completos ou aquelas que viessem a completar seis anos no início do ano letivo, ou seja, no máximo até 30 de abril do ano em que se efetivasse a matrícula.

Acompanhando a tendência mundial e, ao mesmo tempo, considerando as mudan-ças que se operaram no atendimento educacional brasileiro e no perfil da sua popu-lação, em maio de 2005, homologou-se a Lei 11.114, que determinava a matrícula obrigatória das crianças de seis anos de idade no ensino fundamental. Essa lei al-terava, assim, o Art. 6º da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394/96), que passou a ter a seguinte redação: “É dever dos pais ou responsáveis efe-tuar a matrícula dos menores, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental.”

Talvez pelo caráter acelerado com que tramitou no congresso e pela insuficiência de debates com a área educacional que antecedessem sua homologação, a lei deixou uma lacuna que causou grandes conflitos e poderia trazer nefastas consequências para

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a organização dos sistemas de ensino. Manteve-se o Art. 32 da LDB, que definia a du-ração de oito anos para o ensino fundamental obrigatório e gratuito na escola pública. Dessa maneira, antecipava-se a entrada da criança, sem com isso assegurar a ela mais tempo de escolarização obrigatória.

Quase no mesmo instante em que a Lei 11.114 foi aprovada, o CNE, em junho de 2005, homologou o Parecer 6/2005, que reexaminou o Parecer 24/2004, acres-centando a este último a noção de que a ampliação do ensino fundamental obrigatório para nove anos, a partir dos seis anos de idade, tratava-se de uma política afirmativa. Os relatores defendiam que essa ampliação repercutiria na melhoria da educação e na oferta de condições educacionais mais equânimes e, como tal, mereceria ser es-timulada e acompanhada por processos avaliativos apropriados. Esse novo Parecer manteve muito da redação contida no anterior, acrescentando uma nova nomenclatura para o ensino fundamental de nove anos. Para a etapa que se estende dos seis aos dez anos, adotou-se como nomenclatura a expressão Anos Iniciais. A etapa posterior, que compreende a faixa etária dos onze aos quatorze anos, foi denominada Anos Finais do ensino fundamental. O Parecer chamou a atenção, ainda, para o fato de que a am-pliação da obrigatoriedade de matrícula no ensino fundamental aos seis anos de idade implicava a ampliação deste para nove anos, aspecto que, como vimos anteriormente, fora negligenciado pela Lei 11.114. Essas definições foram contempladas na Reso-lução Nº3/2005, homologada pelo CNE apenas três meses após a homologação do Parecer 6/2005, de 03 de agosto de 2005.

Em 15 de setembro de 2005, o Conselho Nacional homologou o Parecer Nº18/2005, que orientava os órgãos públicos e cidadãos interessados quanto à matrícula das cri-anças de seis anos de idade no ensino fundamental obrigatório, em atendimento à Lei 11.114. Nesse Parecer, os conselheiros relatores reconheceram que o Congresso Na-cional não considerara o processo de estudos, debates, articulações e esclarecimentos que vinha se realizando no âmbito do próprio Conselho, do Ministério da Educação, dos estados e municípios e das entidades representativas dos educadores e da so-ciedade. Segundo os relatores, a Lei aprovada fora precipitada, intempestiva e com uma redação precária, apenas legislando sobre um dos aspectos: a obrigatoriedade da matrícula e da frequência à escola a partir dos seis anos de idade, deixando em desco-berto a determinação quanto à duração do ensino fundamental. O Parecer é, assim, contundente quanto à associação entre matrícula aos seis anos e duração de nove anos do ensino fundamental. É, também, minucioso quanto às condições a serem assegu-radas para que essa determinação se materializasse em condições favoráveis para a criança, respeitando seu direito a uma educação de qualidade.

No início de 2006, o Congresso Nacional aprovou e o presidente sancionou a Lei 11.274, que corrigiu a questão da duração do ensino fundamental, dando nova redação ao artigo 32 da lei 9394/96: “O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]”.

Com a duração do ensino fundamental resolvida, outro tema que, mesmo antes das definições legais, já vinha ocupando as pautas dos gestores, dos profissionais e

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das famílias das crianças a serem matriculadas no ensino fundamental passou a ser objeto de análise e de deliberação do Conselho Nacional de Educação. Em agosto de 2008, o Conselho Nacional respondeu a uma consulta do Movimento Interfóruns de Educação Infantil – MIEIB – em relação à (in)definição de quem seria a criança de seis anos de idade que deveria ingressar no ensino fundamental. O Parecer 39/2006, que resulta dessa consulta, recupera vários textos normativos e legais e reafirma que a idade de ingresso no ensino fundamental é a de seis anos completos ou a completar até o início do ano letivo. O Parecer é, ainda, uma peça fundamental na defesa de que o direito à educação, na faixa etária que antecede os seis anos completos, se concretiza na frequência da criança à educação infantil:

A matrícula de crianças de seis anos no ensino fundamental já representa a diminuição do seu tempo de educação infantil, de pré-escola. De certa forma, pode representar, na falta de um projeto pedagógico consistente, a introdução da criança de forma prematura no ensino formal, sem a devida preparação. Esse encurtamento da educação infantil, que já vem acontecen-do na prática pelo movimento de se apressar a alfabetização e se pretender que a pré-escola se assemelhe, ao máximo, ao ensino fundamental, não é recomendável e pode representar um desestímulo à criança em seu desen-volvimento. A principal atividade da criança até os seis anos é o brinquedo: é nele e por meio deles que ela vai se constituindo. Não se deve impor a seriedade e o rigor de horários e de atividade de ensino para essa faixa etária. O trabalho com a criança até os seis anos de idade não é enformado pelo escolar, mas um espaço de convivência específica no qual o lúdico é o central. A educação infantil cuida das relações entre vínculos afetivos, compartilhamento, interações entre as crianças que precisam ser atendidas e compreendidas em suas especificidades, dando-se-lhes a oportunidade de ser criança e de viver essa faixa etária como criança. Por que diminuir esse tempo e forçar uma entrada prematura na escolaridade formal? Não há ga -nhos nesse apressamento e sim, perdas, muitas vezes irrecuperáveis: perda do seu espaço infantil e das experiências próprias e necessárias nessa idade.

Dois outros pareceres se seguiram a esse último, ainda no ano de 2006: Parecer 41/2006 e Parecer 45/2006. Ainda que tratando de aspectos mais gerais relaciona-dos à implantação da lei 11.274/2006, ambos reafirmam, no voto do relator, que a idade cronológica para o ingresso de crianças no ensino fundamental é a de seis anos completos ou a completar no início do ano letivo.

Em 2007, a regulamentação dessa matéria pelo CNE permanece indicando que ainda pairavam muitas dúvidas e ambiguidades em relação ao recorte etário. No Parecer 05/2007, o relator, aproveitando-se de uma consulta que, não tendo abordado diretamente essa questão, mas que, de alguma maneira, a perpassava, escreve:

Com efeito, têm chegado à Câmara de Educação Básica muitas questões so-bre o corte de idade, matéria já superada e esclarecida em outros pareceres e Resoluções da Câmara de Educação Básica. De fato não deve restar dúvida

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sobre a idade cronológica para o ingresso no ensino fundamental com a duração de nove anos: a criança necessita ter seis anos completos ou a completar até o início do ano letivo. Pode-se admitir outra interpretação diante de um texto tão claro? Será que alguém pode alimentar alguma dúvida sobre o que significam seis anos completos ou a completar até o início do ano letivo? Será que a tolerância até o início do ano letivo pode ter dupla interpretação?

No mesmo Parecer, o relator esclarece o que já era bastante evidente: a necessi-dade de os sistemas de ensino estabelecerem normas para as crianças que completas-sem seis anos depois do início do ano letivo, de maneira a assegurar-lhes a frequência na educação infantil, evitando, assim, uma indesejável descontinuidade. O texto é concluído com a seguinte afirmação: “A pré-escola é o espaço apropriado para a cri-ança com quatro e cinco anos de idade e também para aquelas que completarão seis anos posteriormente à idade cronológica fixada para matrícula no ensino fundamental”.

O Parecer 04/2008 também abordou a questão do recorte etário. Considerando que a lei previa a efetiva implantação dos nove anos de ensino obrigatório até 2010, o Parecer estipula o ano de 2009 como o último período para o planejamento e a organização da implementação dessa diretriz a ser adotada por todos os sistemas de ensino. Reitera, ainda, as seguintes normas: admite o redimensionamento da educação infantil; estabelece o primeiro ano do Ensino Fundamental como parte integrante de um ciclo de três anos de duração denominado “ciclo da infância”. Ressalta os três anos iniciais como um período voltado à alfabetização e ao letramento, no qual deve ser assegurado também o desenvolvimento das diversas expressões e o aprendizado das áreas de conhecimento, e destaca princípios essenciais para a avaliação.

Em 17 de dezembro de 2009, o Conselho Nacional aprovou o Parecer 20/2009 e a resolução 05/2009, que estabelecem as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Esses textos normativos reúnem princípios, fundamentos e pro-cedimentos para orientar as políticas públicas na área e a elaboração, o planejamento, a execução e a avaliação de propostas pedagógicas e curriculares. Após definir, no artigo 5º, os principais atributos que caracterizam o atendimento educacional à cri-ança em creches e pré-escolas, a Resolução, no parágrafo 2º desse artigo, estabelece, em conformidade com a emenda 59 aprovada no mesmo ano, a obrigatoriedade da matrícula na Educação Infantil de crianças que completam quatro ou cinco anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. Determina, ainda, no parágrafo seguinte do mesmo artigo, que as crianças que completam seis anos após o dia 31 de março devem ser matriculadas na Educação Infantil.

No Parecer 22/2009 da Câmara de Educação Básica, que definiu Diretrizes Opera-cionais para a implantação do Ensino Fundamental de nove anos, a data de ingresso das crianças no Ensino Fundamental foi novamente tema de regulamentação, ficando estabelecido que a idade para iniciar-se o ensino fundamental é “a partir dos seis anos de idade, completos ou a completar até o início do ano letivo, conforme as orientações legais e normas estabelecidas pelo CNE na Resolução CNE/CEB nº 3/2005 e nos

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seguintes Pareceres: CNE/CEB nºs 6/2005; 18/2005; 7/2007; e 4/2008”. O Parecer continua: “Compreenda-se “início do ano letivo” como o primeiro dia de aula do ano, previsto no calendário escolar do respectivo sistema de ensino”. Nesse documento, se expressa ainda a consequência dessa definição para a organização da educação infantil e define-se que:

A mesma recomendação aplica-se ao ingresso na Educação Infantil, nos termos do parecer CNE/CEB nº 20/2009. Portanto, observando o princípio do não retrocesso, a matrícula no 1º ano fora da data de corte deve, ime-diatamente, ser corrigida para as matrículas novas, pois as crianças que não completaram 6 anos de idade no início do ano letivo devem ser matricula-das na Educação Infantil.

No ano seguinte, a Câmara de Educação Básica aprova a Resolução Nº 1, de 14 de janeiro de 2010, que define Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos, reafirmando a data de corte para matrícula inicial no ensino fundamental e para ingresso na pré-escola, mas admite duas excepcionalidades. Para o caso daquelas escolas e sistemas que, por ventura, houvessem matriculado cri-anças que completavam seis anos após a data de início do ano letivo, estes deveriam, em caráter excepcional, dar prosseguimento ao percurso educacional dessas crianças, adotando medidas especiais de acompanhamento e avaliação do seu desenvolvimento global (§ 1º, Art. 4º da Resolução 01/2010). Quanto às crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário, que, no seu percurso edu-cacional, estivessem matriculadas e tivessem frequentado por mais de 2 (dois) anos a Pré-Escola, poderiam, em caráter excepcional, no ano de 2010, prosseguir no seu percurso para o Ensino Fundamental (§ 2º, Art. 4º da Resolução 01/2010).

Motivado pela ainda intensa discussão e divergências que se observavam no in-gresso de crianças de 6 (seis) anos de idade no Ensino Fundamental de 9 (nove) anos de duração e cedendo a pressões que persistiam para que as crianças menores de seis anos fossem matriculadas no ensino fundamental, o Conselho, por meio do Parecer 12/2010, considerou necessário estender por mais um ano, ou seja, exclusivamente para o ano seguinte, 2011, os dispositivos excepcionais contidos na Resolução CNE/CEB nº 1/2010. No texto, o CNE afirma que, com essa medida, buscava assegurar àquelas crianças um percurso sem interrupções em direção ao Ensino Fundamental e, consequentemente, a adequada reorganização da Educação Infantil.

Conforme se evidenciou, do ponto de vista dos textos oficiais expedidos pelo CNE, a data de corte para a entrada no ensino fundamental foi exaustivamente reafirmada. Entretanto, a ausência de um dispositivo legal gerou ações judiciais, em diferentes cidades e estados brasileiros, de pais e mães representando os filhos contra as resoluções do CNE, alegando que eram inconstitucionais e pleiteando que os juízes determinassem a matrícula das crianças no ensino fundamental, ain-da com cinco anos de idade.

Na mesma época em que as famílias começaram a entrar com essas ações indi-viduais, o Ministério Público Federal, em Pernambuco, interpôs ação civil pública,

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na justiça federal, com pedido de antecipação de tutela contra o Estado de Pernam-buco e contra o município do Recife, requerendo a suspensão dos atos normativos do Conselho Nacional de Educação e solicitando a matrícula na primeira série do ensino fundamental das crianças que completassem seis anos de idade no decorrer de todo o ano letivo (de janeiro a dezembro). Além disso, sugeria que a matrícula no ensino fun-damental deveria ser precedida de uma avaliação psicopedagógica a ser realizada por cada entidade de ensino, com vistas a comprovar a capacidade intelectual da criança. O juiz de Pernambuco concedeu liminar, suspendendo os efeitos das Resoluções do CNE. A princípio, essa liminar teria efeito em todo o território nacional. Entretanto, o Tribunal Regional de Pernambuco entendeu que essa decisão estaria circunscrita a Pernambuco. A partir daí, o Ministério Público passou a entrar com várias ações civis públicas para suspender o efeito das resoluções do CNE em cada estado brasileiro. Foi o que ocorreu em Minas Gerais. Seguindo nessa mesma direção, a Terceira Vara Federal de Minas Gerais, em 26 de outubro de 2012, ratificou a ação civil pública de Pernambuco e suspendeu os efeitos das resoluções do CNE, julgando improcedente o estabelecimento da data de corte etário em 31 de março e autorizando a matrícula de crianças com seis anos incompletos no ensino fundamental.

Cabe recordar que, há alguns anos, em 2006, a matéria foi objeto de Ação Direta de Constitucionalidade, proposta pelo Governador de Mato Grosso do Sul, objetivando a declaração de constitucionalidade dos artigos 24, inciso II, 31 e 32, caput, da Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional da Educação), com redação dada pela Lei nº 11.274/2006. Argumentou-se, perante a Suprema Corte, que o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul vinha recebendo sucessivos mandados de segurança que tratavam de limitação de matrícula no primeiro ano do ensino fundamen-tal em unidades das redes públicas e particulares de ensino. Na Ação, manifestava-se favoravelmente à tese de que a exigência de idade mínima de seis anos para ingresso no ensino fundamental atentaria contra a regra do artigo 208, inciso V, da Constituição Federal, que estabelece como dever do Estado a garantia de acesso aos níveis mais ele-vados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um. A questão ainda continua sendo analisada pelo Supremo Tribunal Federal.

A dificuldade de o STF proferir uma sentença e colocar um ponto final na questão é resultado da controvérsia que o tema inspira no próprio poder judiciário. Há mais de quatro anos, o Ministério Público Federal deu parecer afirmando que a interpretação contrária às liminares dos estados de Pernambuco e Minas Gerais também é válida. O Parecer do Procurador Geral da República, na ocasião, foi de que se pode interpretar tanto de uma maneira como de outra.

O fato é que a judicialização do debate sobre o recorte etário impõe a nós, especialistas da área da Educação, uma condição de espectadores, além de representar um risco à gara-ntia do direito da primeira infância a uma educação de qualidade. O Fórum Mineiro de Educação Infantil, desde que esse debate se instaurou, sempre entendeu que a criança de cinco anos, ou seja, aquela que completa seis anos após os primeiros meses do ano letivo, tem direito de permanecer na educação infantil pelos motivos que passaremos a expor.

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Ao longo de sua existência, o FMEI vem lutando pelo reconhecimento das cri-anças, desde o nascimento, como seres capazes, inteligentes, fortes e competentes e que possuem direito de aprender e de se desenvolverem em instituições educativas formais. Entretanto, o FMEI também sempre reconheceu que a luta pelo direito à educação deve ser, inseparavelmente, a luta por vagas e pela garantia da qualidade. A discussão sobre que características deve possuir a educação para bebês e demais crianças até os seis anos incompletos, para que seja considerada de qualidade, é uma questão que nos remete à identidade da educação infantil. Definida como sendo a primeira etapa, a educação infantil pressupõe um vínculo com a etapa seguinte, o ensino fundamental, mas, ao mesmo tempo, pressupõe uma especificidade em relação a essa segunda etapa da educação básica.

Esse debate sobre a identidade do atendimento educacional à primeira infância não se circunscreve ao sistema educacional brasileiro. Peter Moss (2009) alerta para o fato de que é preciso, para o bem das crianças, para que tenham assegurada uma boa trajetória escolar, que haja uma relação entre a educação infantil e o ensino fundamen-tal, entretanto, o mesmo autor ressalta que essa relação não pode significar a submis-são da educação infantil à cultura, ao formato, às práticas do ensino fundamental. A relação não pode ser de submissão e, sim, de cooperação.

Para Zabalza (1998), a educação infantil é o espaço para que haja o enriqueci-mento da experiência e a reconstrução dos espaços da vida, ou seja, o local para se ampliar as experiências das crianças, buscando uma racionalização, uma recon-strução em outros códigos daquilo que constitui a sua experiência cotidiana. Já o ensino fundamental seria o momento de se iniciar o estudo sistemático dos espaços de vida, ou seja, o momento em que se inicia uma abordagem pré-disciplinar e integrada ao conhecimento do meio físico, social e cultural, incorporando a aquisição das ha-bilidades necessárias para que isso se efetive. E, finalmente, o ensino médio seria a oportunidade para o aprofundamento disciplinar nos diferentes espaços culturais e técnicos estabelecidos no currículo, isto é, para que se desenvolvam as habilidades e os conhecimentos adquiridos nas etapas anteriores que servem como plataforma para analisar em profundidade aquilo que cada disciplina traz de linguagem e metodologia própria para o ensino da realidade.

Coerentes com esses pressupostos, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil definem currículo como sendo “(...) um conjunto de práticas que articula as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade” (Art.3º, Resolução CNE/CEB 05/2009). Esse currículo que considera as vivências infantis e as articula ao conhecimento sistematizado expressa a noção de que a criança é con-siderada um sujeito de direitos e, ao mesmo tempo, produtora de cultura. Alguém que, nas relações sociais que estabelece, nas práticas cotidianas que vivencia, constrói ativamente sua identidade pessoal e coletiva (Art.4º, Resolução CNE/CEB 05/2009) . 1

1 - Artigo 4º da Resolução CNE/CEB 05/2009. “As propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura”.

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Em outras palavras, a criança é compreendida como alguém que cria cultura, brinca, dá sentido ao mundo, produz história, recria a ordem das coisas, estabelecendo uma relação crítica com a tradição (Kramer, 2009). Em suma, ao interagir com os diferentes conheci-mentos produzidos socialmente, a criança o faz sob a mediação dos seus saberes e das suas experiências infantis e, dessa articulação, nascem novos saberes e conhecimentos.

Esse deve ser, pois, o compromisso da educação infantil. Assegurar que o direito de aprender e de se desenvolver se efetive plenamente. Para isso, é preciso que a organização dos sistemas e as práticas pedagógicas respeitem as especificidades da primeira infância, isto é, sejam capazes de entender e respeitar a maneira como esses sujeitos se relacionam com o mundo, a forma como dele se apropriam e o tempo que necessitam para que esse desenvolvimento e essas aprendizagens ocorram satisfato-riamente. O projeto pedagógico deve, pois, assegurar à criança de zero a cinco anos espaços e tempos nos quais ela possa brincar, descansar, experimentar e realizar ativi-dades ora estruturadas, ora espontâneas e livres. Deve garantir classes menos numero-sas, organização do tempo e dos espaços que possibilite um equilíbrio adequado entre situações de aprendizagem com níveis variados de concentração e dispersão, maior oferta de atividades que envolvam o uso do corpo e de movimentos amplos, menor número de crianças por professores, alargamento das suas experiências com as artes e com as linguagens humanas e com os rudimentos dos conhecimentos científicos. A Educação Infantil é a etapa de ensino que melhor pode educar e cuidar das crian-ças antes dos seis anos porque as determinações legais estabelecidas nacionalmente, resultado de anos de debate entre especialistas e militantes da área, asseguram esses princípios e parâmetros.

Nessa mesma direção de garantir que as orientações legais e normativas asse-gurem o melhor atendimento educacional para nossas crianças durante a primeira infância, o FMEI definiu como estratégia prioritária o estabelecimento do corte etário. Assim, mobilizou gestores públicos estaduais e municipais; instituições governamen-tais e não governamentais, Conselhos de Educação, Conselhos dos Direitos das Crian-ças e dos Adolescentes, Conselhos tutelares, sindicatos, pais e mães de crianças, para garantir que o direito à educação dessas crianças se concretizasse mediante o acesso à educação infantil. O Fórum institui uma campanha permanente de luta, 5 ANOS É NA EDUCAÇÃO INFANTIL! Nesse processo, produziu materiais de divulgação e esclarecimento (folder, boletim, cartas), articulou uma petição pública e um abaixo assinado e realizou reuniões com o Ministério Público, com as famílias, com os mu-nicípios e com a Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais. Foram várias estratégias para que a campanha se efetivasse.

Uma das estratégias empregadas pelo FMEI foi solicitar ao Deputado Rogério Correia que apresentasse projeto de lei determinando a data de ingresso no ensino fundamental. A Lei 20. 817, após tramitar nas comissões pertinentes e receber al-guns substitutivos, foi sancionada pelo governador, em 30 de julho de 2013. De acordo com o texto aprovado:

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Art. 1º Para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental no Estado, a criança deverá ter seis anos de idade completos até o dia 30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula.

Art. 2º A criança que completar seis anos de idade após a data definida no art. 1º será matriculada na pré-escola.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Em reunião com a Secretária de Estado da Educação, realizada em 07 de junho de 2013, os representantes do FMEI discutiram a necessidade da aprovação da Lei e ouviram a proposta da senhora Secretária de alterar a data de corte para o dia 30 de junho. Ainda que na avaliação do FMEI a melhor data seria aquela já definida pelos pareceres e resoluções exaustivamente discutidos e deliberados pelo CNE, avaliou-se que seria oportuno construir um acordo para garantir a aprovação ágil da lei.

Para o FMEI, essa lei representa um avanço em termos do direito da criança à educação. Dentre os avanços, destacamos dois aspectos que nos parecem primordiais.

Em primeiro lugar, a definição de uma data de corte assegura a permanência das crianças de cinco anos na etapa da educação básica, que deve garantir a elas as con-dições adequadas para que se desenvolvam integralmente, ou seja, para que ampliem suas capacidades, suas habilidades, seus conhecimentos, suas possibilidades físicas, psicológicas, intelectuais e sociais, conforme determina a Lei 9394/96.

A equivocada reivindicação de matricular as crianças menores de seis anos no en-sino fundamental não pode ser confundida com a luta geral e justa por educação des-sas crianças. O fato de não serem matriculadas no ensino fundamental não significa que essas crianças terão o seu direito denegado. A frequência a creches, a partir de zero até os três anos de idade, e a pré-escolas, a partir dos quatro anos, é um direito assegurado constitucionalmente. Cabe ao Estado o dever de garantir educação infantil gratuita às crianças até os cinco anos de idade (Art. 4º inciso II da Lei 9394/96). No caso das crianças com quatro anos ou mais, ao seu direito corresponde o dever do Estado de ofertar vagas e também o dever dos pais de matricular seus filhos em uma instituição educativa (Art. 6º da Lei 9394/96). Ainda que saibamos que há um contin-gente de crianças menores de seis anos sem frequentar creches e pré-escolas, a luta pelo direito à educação dessas crianças não pode ser apenas a luta pelo acesso, mas precisa ser, também, e talvez, neste momento histórico, deva ser, sobretudo, a luta por uma educação de qualidade. No caso específico das crianças que ainda não completa-ram seis anos nos primeiros meses do ano letivo, lutar para que tenham direito à edu-cação de qualidade é lutar para que tenham assegurada sua frequência à pré-escola, por ser essa etapa a que possui melhores condições para acolhê-las e respeitá-las no seu processo de construção de conhecimentos e de apropriação de formas de sociali-zação e de inclusão na sociedade.

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Em segundo lugar, essa lei põe fim à outra medida ilegal e danosa que acompanha as decisões judiciais: a condicionalidade de a matrícula se efetivar mediante uma avali-ação psicopedagógica. Desde sua aprovação em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei 9394/96) previa no seu artigo 31 que, na Educação Infantil, a avaliação deveria ser realizada mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento da criança. Acrescentava ainda, no mesmo artigo, que a avaliação não poderia ter o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.

Em setembro de 2003, o Conselho Nacional, respondendo a consulta feita pelo Ministério Público Federal, aprovou o Parecer CNE/CEB 26/2003, que questionava a realização de “vestibulinhos” na educação infantil e ensino fundamental. O ofício encaminhando a consulta relatava que, em São Paulo, escolas particulares seleciona-vam crianças por meio de processos subjetivos de escolha. Processos esses que iam desde “manhãs de conhecimento, onde a criança é observada em situações lúdicas, a provinhas, também chamadas de ‘vestibulinhos’”.

O Ministério Público assim se manifestou, no mesmo ofício, em relação a essa prática:

Entendemos que tais métodos, além de se constituírem num obstáculo natural à inclusão de crianças portadoras de deficiência mental no ensino regular, ferem o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Art. 5ª e 17º). Entendemos que até mesmo reflete critério eugenésico de escolha, pois não há o que ser avaliado em uma criança sem qualquer bagagem acadêmica.

Ao final do ofício, solicitava-se que o MEC editasse norma explicando às escolas que essas práticas implicavam discriminação, desrespeito à criança e ofensa ao Es-tatuto da Criança e do Adolescente. Em resposta à solicitação do Ministério Público encaminhada pelo Ministério da Educação, a Câmara de Educação Básica do CNE aprovou o referido parecer, que inicia sua argumentação respaldando-se nos textos normativos e legais: Constituição Federal, LDB, Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Com base nesses textos, reafirma a identidade da Educação Infantil; as normas referentes à elaboração das propostas pedagógicas pelas institu-ições de ensino e ao acesso das crianças com deficiências à educação; a explicitação de que as instituições privadas de ensino devem cumprir exigências para que possam ofertar esse serviço à população; e, finalmente, as diretrizes que orientam o processo avaliativo nessa etapa da educação básica. O parecer é conclusivo ao afirmar:

É claro que, nesta perspectiva, a avaliação jamais deverá ser utilizada de maneira punitiva contra as crianças, não se admitindo a reprovação ou os chamados “vestibulinhos” para o acesso à Educação Infantil e à primeira série do Ensino Fundamental. A avaliação das crianças pela escola só se justifica pela necessidade de decidir em que etapa da sua organização cur-ricular o aluno poderá ser melhor atendido, nesse momento de sua vida. Pais e filhos, com o apoio das instituições de Educação Infantil, vivem nesta fase de vida à busca de formas de ser e relacionar-se assim como a

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procura de espaços próprios de convivência e de estimulação, sendo assim indispensável que haja diálogo, acolhimento, respeito e negociação sobre a identidade de cada criança.

Reconhecendo que há situações em que o número de vagas demandadas é superior à oferta, o Parecer sugere que, nessas situações, as famílias sejam informadas sobre os critérios que serão adotados no preenchimento das vagas existentes e recomenda-se que sejam utilizados sistemas de sorteio, ordem cronológica de inscrição e outros, de modo a se evitar que as crianças sejam submetidas, ainda que com a concordância dos pais, a qualquer forma de ansiedade, pressão ou frustração.

A proibição de se empregarem processos avaliativos com fins de promoção não pode ser entendida meramente como um capricho ou um excesso de zelo do legis-lador. Ela é, antes de tudo, a expressão de uma concepção de educação da criança pequena que se quer ver adotada pelos sistemas e instituições de ensino. A importân-cia dessa normatização reside não apenas no fato de ela preservar a criança de uma situação que pode ser estressante e frustrante, mas incide, ainda, na própria identidade dessa etapa educativa. O que se espera da educação infantil? Qual seu papel como primeira etapa da educação básica? Que práticas pedagógicas devem ser asseguradas às crianças de zero a seis anos de idade? Como devem ser implantadas e avaliadas essas práticas educativas? Essas são algumas das questões que tangenciam o debate sobre a avaliação. Ao se definir que habilidades, competências, conhecimentos devem ser avaliados, define-se o que deve ser ensinado. Por isso, a fixação de uma avaliação psicopedagógica como condição para o ingresso no ensino fundamental torna-se um fator determinante para o currículo da educação infantil e se contrapõe ao que está definido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação infantil.

Como vimos, o ato de ensinar, na educação infantil, deve estar articulado ao ob-jetivo de expandir os conhecimentos da criança sobre o mundo, de garantir a ela res-postas para as questões que ela própria formula e de assegurar um repertório que amplie sua vontade de conhecer e de fazer novas perguntas. A definição de quais serão os conhecimentos a serem trabalhados deve respeitar o processo de aprendizagem da criança, seu ritmo, suas estratégias, suas indagações, seus desejos, suas capaci-dades e competências. Sobretudo, trata-se de consolidar um processo educativo que aborde conteúdos, saberes e conhecimentos como instrumentos de interação e como apoio ao pensamento da criança e à sua expressividade. A melhor prática educativa na educação infantil será, portanto, aquela capaz de levar a criança a utilizar os ob-jetos do conhecimento como instrumentos para compreender o mundo, interpretá-lo, problematizá-lo e construir seus próprios significados.

Este dossiê é resultado do processo de luta empreendido pelo Fórum Mineiro de Educação Infantil, processo esse que ainda não se encerrou. O trabalho de organizar e reunir documentos e textos sobre o tema pretende contribuir para sanar dúvidas sobre a questão e compartilhar com outros atores os caminhos percorridos para garantir às crianças menores de seis anos o acesso a uma educação infantil de qualidade.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Lei n.º 11.114, de 16 de maio de 2005. Altera os Arts. 6º, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do ensino fundamental aos seis anos de idade. Brasília, 2005. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11114.htm. Acesso em 05 ago. 2013.

BRASIL. Lei n.º 11.274, de 06 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos Arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Brasília, 2006. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm. Acesso em 05 ago. 2013.

BRASIL. Lei nº 12.796, de 04 de abril de 2013. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezem-bro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências.

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Brasília, 2013. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12796.htm. Acesso em 05 ago. 2013.

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BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 5/2007, de 1º de fevereiro de 2007. Consulta com base nas Leis nº 11.114/2005 e n° 11.274/2006, que tratam do ensino fundamental de nove anos e da matrícula obrigatória de crianças de seis anos no ensino fundamental. Brasília: 2007.

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BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 6/2005, de 8 de junho de 2005. Reexame do Parecer CNE/CEB 24/2004, que visa ao estabelecimento de normas nacionais para a ampli-ação do ensino fundamental para nove anos de duração. Brasília: 2005.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 7/2007, de 19 de abril de 2007. Reexame do Parecer CNE/CEB nº 5/2007, que trata da consulta com base nas Leis nº 11.114/2005 e n° 11.274/2006, que se referem ao ensino fundamental de nove anos e à matrícula obrig-atória de crianças de seis anos no ensino fundamental. Brasília: 2007.

BRASIL. Resolução CNE/CEB n.° 5/2009, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Dire-trizes Curriculares Nacionais da educação infantil. Brasília, 2009.

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ZABALZA, Miguel A. Qualidade em educação infantil. Porto alegre: ArtMed, 1998.

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1. AS DISCUSSÕES NO ÂMBITO DO JUDICIÁRIOa. DECISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO

EXMA. SRA. DRA. JUÍZA DE DIREITO DA 1ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DA CAPITAL

(...) A criança de quatro anos, em vez de permanecer na rua, precisa de uma pré-escola que facilitará o seu sucesso na escola fundamental, seja ela do município ou do estado. O aluno jovem ou adulto, que se escolarizou, pre-cisa de oportunidades de formação profissional para exercer plenamente a sua cidadania, que pode ser encontrada em outra esfera administrativa. Por tudo isso, o poder público precisa agir em conjunto, por seus diversos níveis e integrantes, construindo pontes e passarelas.(...)

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO – MPPE, repre-sentado pelas Promotoras de Justiça com atuação na Promoção e Defesa do Direito Humano à Educação que esta subscrevem, com endereço no rodapé, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, com supedâneo no art. 129, inciso III, da Consti-tuição Federal, no art. 67, § 2º, inciso II, da Constituição do Estado de Pernambuco, no art. 5º, inciso I, da Lei nº 7.347/85 e no art. 148, inciso IV, da Lei nº 8.069/1990, vem à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de ANTECIPAÇÃO DE TUTELA contra o ESTADO DE PERNAMBUCO, pessoa jurídica de direito público interno, o qual deverá ser citado na pessoa do Procurador Geral do Estado, com sede à Rua do Sol, 143, 1° andar, Santo Antônio, Recife/PE, nesta demanda representando adequadamente todos os órgãos públicos e privados do Sistema Estadual de Ensino, e contra o MUNICÍPIO DO RECIFE, pessoa jurídica de direito público interno, o qual deverá ser citado na pessoa do Excelentíssimo Prefeito, com endereço na Av. Cais do Apolo, 925 - Bairro do Recife, Recife/PE, nesta de-manda representando adequadamente todos os órgãos públicos e privados do Sistema Municipal de Ensino, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

I- DOS FATOS ENSEJADORES DA ABERTURA DE INVESTIGAÇÃO PELO MPPE E OBJETO DA PRESENTE DEMANDA:

Em virtude de representação formulada por F. E. DE S. J. e K. A. C. DE S. (DOC. 01), pais da criança L.A.C.P.S., os quais solicitam “que o Ministério Público Estadual intervenha para que seja imediatamente suspensa a eficácia das Resoluções nº 03, de 29 de novembro de 2010, e demais atos posteriores que reproduziram a mesma ilegali-dade, editados pelo Conselho Estadual de Educação, em ordem a autorizar e garantir a matrícula na primeira série do ensino fundamental das crianças que venham a com-pletar seis anos de idade no decorrer do ano letivo (de janeiro a dezembro), uma vez

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2 - In: Fundamentos de uma lei de responsabilidade educacional. Cândido Alberto Gomes, UNESCO, Série Debates X, Agosto/2008, p. 12.

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comprovada sua capacidade intelectual mediante avaliação psicopedagógica por cada entidade de ensino”, o Ministério Público de Pernambuco instaurou o Procedimento de Investigação Preliminar nº 024/2011, na 29ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, com o objetivo de apurar se as escolas privadas do sistema es-tadual de ensino estariam limitando o ingresso no ensino fundamental às crianças com seis anos de idade completos ou a completar até 31 de março de 2012, obstaculando, assim, o ingresso no ensino fundamental das crianças que completariam 06 (seis) anos de idade no decorrer do ano letivo de 2012, a partir de 1º de abril do mencionado ano, e, em consequência, restando as mesmas retidas na educação infantil.

No andamento da investigação, outro pai de aluno prejudicado com a citada Reso-lução, J. K. DOS S. A., compareceu ao MPPE onde prestou declaração perante o Apoio Pedagógico desta Promotoria de Justiça (Termo de Declarações nº 32/2011-PJDCC-Educação – DOC. 02), encartada nos autos do Procedimento de Investigação Pre-liminar nº 024/2011, onde afirma que foi informado pelo Colégio Salesiano Recife que sua filha C. A. A., nascida em 09/04/2006, aluna do Infantil II, não poderia ser matriculada no 1º ano do ensino fundamental para o ano letivo de 2012 por força de uma resolução do Conselho Estadual de Educação.

Também compareceu a esta Promotoria de Justiça A. M. B. L., mãe de G. P. L., declarando (Termo de Declarações nº 31/2011-PJDCC Educação – DOC. 03) que sua filha, embora concluindo a educação infantil com 5 anos de idade, está impedida de ser matriculada no 1º ano do ensino fundamental para o ano letivo de 2012 pela direção do Colégio Geração Ativa em virtude de que somente completará 6 (seis) anos de idade no dia 15/06/2012.

Quando da tramitação da representação mencionada, o MPPE diligenciou investi-gar como estaria ocorrendo a matrícula no 1º ano do Ensino Fundamental nas escolas públicas do Sistema Estadual de Ensino, evidenciando que o Diário Oficial do Estado (DOE), edição de 05/11/2011, publicou a Instrução Normativa de Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 (DOC. 04), com as regras para a realização do cadastro e matrícula dos estudantes, para o ano letivo de 2012, na educação básica da rede es-tadual de ensino do Estado de Pernambuco .

A edição dessa instrução normativa motivou a instauração, de ofício, de um outro Procedimento de Investigação Preliminar (nº 023/2011) na 29ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, para apurar se mencionado instrumento norma-tivo, com fundamento em seu art. 7º, I, também iria impedir o ingresso de crianças no 1º ano do ensino fundamental das escolas da rede estadual de ensino.

O MPPE ainda decidiu investigar como estaria ocorrendo a matrícula no 1º ano do Ensino Fundamental nas escolas públicas do Sistema Municipal de Ensino do Recife, 3 - Ou seja, as normas que regem a matrícula para os estudantes que pretendem ingressar ou se manter nas escolas públicas do Sistema Estadual de Ensino (rede estadual de ensino).4 - Correspondem às normas que disciplinam a matrícula para os estudantes que pretendem ingressar ou se manter nas escolas públicas do Sistema de Ensino do Recife.

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A normativa é expressa em seu art. 7º, inciso I: deverá inscrever-se no cadastro candidato(a) ao 1º ano do Ensino Fundamental, com seis anos de idade completos ou a completar até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula de acordo com a Resolução CNE/CEB nº 06/2010 de 20/10/2010.

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evidenciando que, na edição do Diário Oficial do Município (DOM) de 17/11/2011, foi publicada a Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011 (DOC. 05), com as re-gras para a realização das matrículas dos estudantes, para o ano letivo de 2012, na educação básica das unidades educacionais da rede municipal de ensino do Recife .

Tal normativa estabeleceu que o acesso às turmas do 1º ciclo/1º ano do ensino fundamental restou garantido apenas aos estudantes com 6 anos completos ou a com-pletar até o dia 31/03/2012 (cf. art. 3º, caput, e parágrafo único).

A edição dessa instrução normativa municipal motivou a instauração, de ofício, de mais um Procedimento de Investigação Preliminar (nº 026/2011), na 29ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, para apurar se as escolas do sistema municipal de ensino estariam limitando o ingresso no ensino fundamental às crianças com seis anos de idade completos ou a completar até 31 de março de 2012, obstacu-lando, assim, o ingresso no ensino fundamental das crianças que completariam 06 (seis) anos de idade no decorrer do ano letivo de 2012, a partir de 1º de abril do men-cionado ano, e, em consequência, restando as mesmas retidas na educação infantil.

Esse assunto, inclusive, mereceu destaque na edição do Jornal do Commercio de 23 de outubro de 2011 (DOC. 06), na qual foi publicada a matéria intitulada ”Limite para o aprendizado”, com declarações de mães de crianças que estão no último ano da educação infantil e que se encontram na iminência de serem retidas nessa primeira etapa da educação básica por não completarem 06 (seis) anos de idade até o dia 31 de março de 2012.

A matéria jornalística repercutiu, havendo o mesmo Jornal do Commercio, na sua edição de 10/11/2011, veiculado em sua coluna “Repórter JC” duas matérias intitu-ladas “Educação para todos” e “Desrespeito burocrático” (DOC. 07). Na primeira, o Presidente do Conselho Estadual de Educação, o Professor Fernando Gonçalves admitiu entender como balizamento sobre qual deve ser a idade mínima para ingresso no ensino fundamental a Emenda Constitucional nº 59/2009 (a educação básica é obrigatória e gratuita dos quatro aos dezessete anos) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (que assegura enquanto princípios a prioridade absoluta e o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, garantindo acesso aos níveis mais elevados de ensino conforme a capacidade de cada aluno). Na segunda das matérias, a mencionada autoridade afirmou, categoricamente, que “há um desrespeito buro-cratizador diante da Lei 10.172/2001 , a qual é enfática: quanto mais cedo se der a intervenção educacional, mais eficaz ela se tornará no decorrer dos anos, produzindo efeitos mais profundos sobre o desenvolvimento das crianças”.

Na realidade, o Conselho Nacional de Educação (CNE), através de sua Câmara de Educação Básica (CEB), editou a Resolução CNE/CEB nº 6 (DOC. 08), de 20 de outubro de 2010, onde foram definidas diretrizes operacionais para a matrícula no ensino fundamental e na educação infantil, estabelecendo, em seu art. 2º, que “para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter idade de 4 (quatro) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula”. Quanto ao ensino fundamental, determinou a resolução, no art. 3º, que “para o ingresso no primeiro ano do Ensino 5 - A Lei nº 10.172/2001 instituiu o anterior Plano Nacional de Educação, ressaltando que o novo Plano Nacional de Educação se encontra em tramitação no Congresso Nacional.

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Fundamental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula”.

Vale ressaltar que a mesma resolução consagrou uma exceção, exclusivamente para o ano letivo de 2011: admitiu que os sistemas de ensino poderiam “dar prossegui-mento para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos às crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário de 6 (seis) anos, que no percurso educacional estiverem matriculadas e frequentaram, até o final de 2010, por 2 (dois) anos ou mais a Pré-Escola” (cf. art. 5º, § 2º). Seguro o CNE da valia da regra imposta, o que justificaria excepcionar? Diferentes seriam as crianças que completaram 6 anos em 2011, daquelas que alcançarão tal idade em 2012? Não se encontra qualquer fun-damento razoável para tal previsão!

Em seguida, no mês de dezembro/2010, a mesma Câmara de Educação Básica (CEB) do CNE editou a Resolução CNE/CEB nº 7 (DOC. 09), de 14 de dezembro de 2010, ao fixar as diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental de 9 anos, repetiu a resolução anterior, referida: manteve a limitação do acesso ao 1º ano do ensino fundamental às crianças que possuam 6 (seis) anos completos ou a completar até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. Estabeleceu, ainda, que as crianças que venham a completar 6 (seis) anos após essa data sejam matriculadas na pré-escola (v. art. 8º, §§ 1º e 2º), insistindo na inconstitucionalidade que incorrera ao editar a Resolução CNE/CEB nº 06/2010 (v. CF, art. 208, IV).

Por sua vez, o Conselho Estadual de Educação (CEE) de Pernambuco , com base naquela Resolução do CNE/CEB, editou a Resolução CEE/PE nº 3 (DOC. 10), de 29 de novembro de 2010, estabelecendo para as escolas integrantes do Sistema Estadual de Ensino:

(...)I- para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter 4 (quatro) anos com-pletos ou a completar até 31 de março do ano que ocorre a matrícula;II- para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança de-verá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorre a matrícula.Parágrafo único. As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data estabelecida nesta Resolução, deverão ser matriculadas na Pré-Escola.

Tal como o CNE, a Resolução do CEE também excepcionou as regras que estipu-lou, antes transcritas, exclusivamente para o ano letivo de 2011: “no ano de 2011, as crianças que, em seu percurso escolar, frequentaram no mínimo 2 (dois) anos na Pré-Escola, deverão ter acesso ao primeiro ano de estudos no Ensino Fundamental de 9 (nove) anos, independente do mês de seu aniversário de 6 (seis) anos” (art. 3º, destaque não existente no original).

Já no âmbito do Sistema Municipal de Ensino do Recife, o Conselho Municipal de Educação (CME) não chegou a editar regra específica sobre o acesso ao ensino fun-

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6 - A quem compete estabelecer normas relativas à adequação do Sistema Estadual de Ensino aos princípios das Constituições Federal e Estadual, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e do Plano Nacional de Educação (cf. inciso I do art. 2º da Lei Estadual nº 11.913/2000), compatibilizar as diretrizes curriculares estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação com a política educacional do Estado (inciso VII, idem), e fixar normas para autorização, reconhecimento e sua renovação, credenciamento, re-credenciamento de instituições de ensino, integrantes do Sistema Estadual de Ensino (cf. inciso VIII, idem). 7 - Órgão normativo, deliberativo e consultivo do Sistema Municipal de Ensino do Recife que possui entre as suas atribuições, “normatizar a prestação do serviço público educacional” (cf. art. 2º, caput e inciso III, da Lei Municipal nº 17.325/2007).

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damental, tendo a Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011 (DOC. 05), adotado por fundamento o art. 8º, § 1º, da Resolução CNE/CEB nº 07/2010 anteriormente destacada.

Exemplificando a situação acima explicitada, o MPPE, por meio de seu apoio peda-gógico, realizou inspeção no Colégio Fazer Crescer, no Colégio Pontual, no Colégio Santa Maria e no Educandário Nossa Senhora de Lourdes (todas escolas privadas do Sistema Estadual de Ensino), comprovando as situações expostas no Relatório de Inspeção nº 49/2011 (DOC. 11), evidenciando que cada unidade de ensino teve uma posição distinta tentando se adequar ao corte etário estabelecido nas Resoluções do CNE/CEB nº 6 e 7/2010 e do CEE/PE nº 03/2010.

Para confirmar a implicação do corte etário nas escolas públicas e privadas dos Sistemas Estadual e Municipal de Ensino, o mencionado apoio pedagógico emitiu o Pronunciamento nº 06/2011 (DOC. 12), tecendo algumas considerações a respeito do critério de idade no acesso ao 1º ano do ensino fundamental, considerando, ao final “que a Secretaria de Educação de Pernambuco, através da Instrução Normativa nº 11/2011, e a Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Recife, através da Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011, estão impedidno de ingressar no Ensino Funda-mental no próximo ano letivo as crianças que completam seis anos de idade, após o dia 31 de março de 2012”.

Ademais, pesquisa realizada no sítio eletrônico do Tribunal de Justiça de Per-nambuco, demonstrou que representantes legais de crianças matriculadas na educação infantil de escolas privadas do sistema estadual de educação tem ingressado com me-didas judiciais a fim de assegurar o ingresso de seus filhos não obstante a discutida previsão normativa do CCE, e obtido antecipação de tutela pleiteado, conforme se constata nas decisões proferidas nos processos de nº 0060233-29.2011.8.17.0001 (DOC. 13); 0069803-39.2011.8.17.0001 (DOC. 14); 0058799-05.2011.8.17.0001 (DOC. 15); 0060669-85.2011.8.17.000 (DOC. 16); 00600232-44.2011.8.17.0001 (DOC, 17); 0063511-38.2011.8.17.0001 (DOC. 18); 0063186-63.2011.8.17.0001 (DOC. 19); 0065594-27.2011.8.17.0001 (DOC. 20); 0065785-72.2011.8.17.0001 (DOC. 21); 0065405-49.2011.8.17.0001 (DOC. 22); 0065409-86.2011.8.17.0001 (DOC. 23); 0065410-71.2011.8.17.0001 (DOC. 24); 0065418-48.2011.8.17.0001 (DOC. 25); 0065427-10.2011.8.17.0001 (DOC. 26); 0065430-62.2011.8.17.0001 (DOC. 27); 0065438-39.2011.8.17.0001 (DOC. 28); 0065424-55.2011.8.17.0001 (DOC. 29); 0065451-38.2011.8.17.0001 (DOC. 30).

Registre-se que o Ministério Público Federal (Procuradoria da República em Pernam-buco) ingressou com Ação Civil Pública (Processo nº 0013466-31.2011.4.05.8300) junto à 2ª Vara da Justiça Federal, onde obteve antecipação de tutela determinando a suspen-são, das disposições (de autoria do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica) das “Resoluções de nº 01, de 14/01/2010, de nº 06, de 20/10/2010 e outras normas que a elas se seguiram de igual conteúdo, no que tange à proibição de ingresso no ensino fundamental de crianças menores de idade em 31 de março do ano letivo a ser cursado, de modo a permitir a regular matrícula desses educandos nas instituições escolares”.

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II – DO DIREITO:

A Constituição Federal, ao consagrar o Estado Democrático, em seu Preâmbulo, assegura o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e com-prometida, na ordem interna e na ordem internacional, com a solução pacífica das controvérsias, Daí ser expressa a Carta Magna: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros resi-dentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (art. 5º, caput, da Carta Magna – destaque não existente no original).

Nela a educação é tratada como um dos direitos sociais, juntamente com a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados (art. 6º, caput).

A mesma Lei Fundamental dispõe, ainda, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o di-reito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (cf. caput do art. 227 – destaques não existentes no original). Tal disposição encontra-se também expressamente consagrada no Estatuto da Criança e do Adoles-cente – ECA (Lei nº 8.069/1990, art. 4º) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei nº 9.394/1996, art. 2º).

Cuidando especificamente da educação, o texto constitucional a considerou como direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (v. art. 205), o que é refletido no caput do art. 53 do ECA.

Tal dispositivo foi recepcionado pela Constituição do Estado de Pernambuco, em seu art. 176 (“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, baseada nos fundamentos da justiça social, da democracia e do respeito aos direitos humanos, ao meio ambiente e aos valores culturais, visa a preparar o educando para o trabalho e torná-lo consciente para o pleno exercício da cidadania e para a compreensão histórica de nosso destino como povo e nação”).

MARIA CRISTINA DE BRITO LIMA pontuou:

No caso da educação, tem-se que, embora esteja, como um todo, eviden-ciada no art. 6º, ‘caput’, da Lei Fundamental, no que toca à educação básica (ensino fundamental) houve o seu deslocamento para a categoria de direito fundamental, pois, ao tratar amiúde do Tema no Título VIII, Da Ordem Social, o legislador constitucional atendeu ao reclamo da sociedade e esta-beleceu no artigo 208, § 1º, da Constituição Federal que o acesso ao ensino

8 - A Educação como Direito Fundamental, 1ª edição, 2003, RJ: Editora Lumen Juris, pág. 29.

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obrigatório (este entendido como ensino fundamental, a teor do mesmo ar-tigo, inciso I) e gratuito é direito público subjetivo.

Mais especificamente, o direito à educação básica tornou-se tão importante quanto o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprie-dade, todos evidenciados pelo ‘caput’ do artigo 5º da Carta Magna, tendo como consequência, a possibilidade de demanda independentemente de qualquer política pública que o evidencie.(…)Com efeito, o direito público subjetivo ao ensino fundamental, obrigatório e gratuito, está ligado ao ‘status positivus libertatis’, isto é, aquela circun-stância necessária a que o indivíduo possa ir em busca de oportunidades em igualdade de condições com os demais.

Nesse contexto, o art. 206 da norma constitucional impõe que o ensino deverá ser ministrado com base em princípios, dentre eles, o da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola (inciso I), o da liberdade de aprender (inciso II) e o da coexistência de instituições públicas e privadas de ensino (inciso III, parte final), princípios que também se encontram inscritos nos arts. 178, incisos I e VI, da Consti-tuição Estadual; art. 3º, incisos I e V, da LDB; e no art. 53, inciso I, do ECA.

O direito à educação não se situa dentro da discricionariedade estatal mas se cons-titui, repita-se, em dever do Estado efetivar o direito à educação mediante algumas garantias constitucionais (art. 208 da CF), dentre as quais se destacam:

(...)I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria ;(...)IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade ;V- acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;(...)§ 1º. O acesso ao ensino obrigatório é direito público subjetivo.§2º. O não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.(...)” (destaques não existentes no original).

Essas garantias estão previstas também no art. 4º da LDB e no art. 54 do ECA .Entretanto, como o texto constitucional original sofreu alterações introduzidas

pela Emenda Constitucional nº 53/2006, resultou em divergência entre essa emenda constitucional e a legislação infraconstitucional citada (art. 4º da LDB e art. 54 do ECA). Isto porque pela emenda constitucional o Estado deverá garantir a educação infantil, em creche e pré-escola, até os 5 (cinco) anos de idade (art. 208, inciso IV, CF) e não mais até os 6 (seis) anos de idade. Enquanto que na LDB (arts. 4º, inciso IV e 30, inciso II) e no ECA (art. 54, inciso IV), permaneceu consignado atendimento em

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9 - Redação determinada pela EC nº 59/2009, entretanto, o próprio art. 6º dessa EC estabeleceu que “o disposto no inciso I do art. 208 da Constituição Federal deverá ser implementado progressivamente, até 2016, nos termos do Plano Nacional de Educação, com apoio técnico e financeiro da União” (destaque não existente no original).10 - Redação determinada pela EC nº 53/2006.

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creche e pré-escola de 0 (zero) a 6 (seis) anos de idade. Portanto, as normas infracons-titucionais citadas, insculpidas na LDB e no ECA, não sofreram – como deveriam – alterações para se adaptarem ao novo texto constitucional supra destacado e se en-contram em desacordo com a nossa Carta Magna.

Vale consignar que, necessariamente prevalece o texto constitucional em relação à legislação infraconstitucional, em virtude do princípio da supremacia da Constituição Federal, estando essa legislação infraconstitucional implicitamente revogada no que diverge do texto constitucional.

A respeito desse princípio da supremacia da Constituição Federal, leciona JOSÉ AFONSO DA SILVA :

Nossa Constituição é rígida. Em consequência, é a lei fundamental e só ela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas atribuições nos ter-mos nela estabelecido.Por outro lado, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal.

Ressalte-se que, se por um lado o Estado tem deveres com a educação básica, de outro, a legislação atribui deveres aos pais ou responsáveis pelas crianças. Tanto é que o art. 6º da LDB impõe que é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental.

No ECA, esse mesmo dever está expresso no art. 55: “os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”.

Neste ponto, vale destacar que a Constituição Estadual determinou em seu art. 179, § 1º, que é obrigatória a escolarização dos seis aos dezesseis anos, ficando os pais ou responsáveis pelo educando responsabilizados, na forma da lei, pelo não-cumprimento desta norma.

É sabido que a Lei nº 11.274/2006 implementou uma grande mudança na LDB, am-pliando o ensino fundamental obrigatório de 08 (oito) para 09 (nove) anos de duração, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade (v. art. 32, caput), bem como estabelecendo que cada Estado e Município deve matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) anos de idade no ensino fundamental (cf. nova redação do art. 87, § 3º, inciso I).

Frise-se que, em nenhum momento, o legislador constitucional determinou que os 6 (seis) anos de idade deveriam ser completados no início, no meio ou no fim do ano e qualquer tentativa burocrática de estabelecer um corte etário para essas crianças deve ser repudiada, por não se revestir de amparo constitucional e legal.

Nenhum instrumento normativo poderá restringir direito público subjetivo garan-tido na nossa Carta Maior.

11 - LDB, art. 4º: “O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de : I- ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria; (…) IV- atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade; V- acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; (...) X- vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) anos de idade.”12 - ECA, art. 54: ”É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria; (…) IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; (...)”. 13 - Curso de Direito Constitucional Positivo, 30ª edição, 2007, SP: Malheiros Editores, pág. 46.

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Após a análise dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais citados, pode-se concluir:

1º: o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade (art. 208, inciso I, da CF – redação dada pela Emenda Constitucional nº 59/2009);

2º: o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de edu-cação infantil, em creche e pré-escola às crianças até 5 (cinco) anos de idade (art. 208, inciso IV, da CF – redação dada pela Emenda Constitucional nº 53/2006);

3º: o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo de todos (art. 208, § 1º, da CF);

4º: é dever do Estado e dos Municípios matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) anos de idade no ensino fundamental (arts. 32, caput, e 87, § 3º, inciso I, da LDB – redação dada pela Lei nº 11.274/2006);

5º: é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental (art. 6º da LDB – redação dada pela Lei nº 11.274/2006).

A bem da verdade, a real intenção do legislador, ao ampliar o ensino fundamental obrigatório de 8 (oito) para 9 (nove) anos, foi a de antecipar a entrada das crianças nesta etapa da educação básica, muitas das quais – a grande maioria das classes menos favorecidas que não têm acesso à educação infantil por não ter sido universalizada – permanecem nas ruas submetidas a toda sorte de violência e provação. Com essa mudança e ampliação do ensino fundamental para 9 (nove) anos, as crianças não precisam esperar pelos 7 (sete) anos de idade para ingressar no 1º ano do ensino fundamental obrigatório, entrando 1 (um) ano mais cedo, aos 6 (seis) anos de idade.

Destaque-se que a matrícula das crianças no 1º ano do ensino fundamental deve ocorrer no início do ano em que a mesma completa 6 (seis) anos de idade, não fa-zendo o menor sentido que essa matrícula ocorra somente no decorrer do ano letivo no qual a criança completa os 6 (seis) anos de idade, pois isso seria pedagogicamente inadequado e estaria em desacordo com o texto constitucional e infraconstitucional.

Além do mais, os pais/responsáveis poderiam ser responsabilizados caso não efetuassem a matrícula de seus filhos/pupilos no ensino fundamental, a partir dos seis anos de idade.

Como assegurar o cumprimento desses deveres pelo Estado, pelo Município e pe-los pais/responsáveis, senão entendendo que no ano em que as crianças completam os 6 (seis) anos de idade, independente da data de seus aniversários, devem estar matri-culadas no ensino fundamental de 9 (nove) anos? Se assim não for, no decorrer do ano, quando as crianças completarem os 6 (seis) anos de idade e não estiverem matriculadas no 1º ano do ensino fundamental obrigatório, estará havendo o descumprimento das regras constitucionais pelo Estado, pelo Município e pelos pais/responsáveis.

Ressalte-se, ainda, que as alterações introduzidas na Constituição Federal (art. 208, I e IV) e em dispositivos da própria LDB (arts. 6º, 32, caput, e 87, § 3º, inciso I), anteriormente explicitados, asseguram que a pré-escola deverá ser garantida às crian-ças até 5 (cinco) anos de idade e que, no ano em que essas crianças completam 6 (seis)

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anos de idade, elas possuem direito líquido e certo de serem matriculadas no 1º ano do ensino fundamental, independente da data em que fazem aniversário, de terem ou não passado pela educação infantil e de serem submetidas a qualquer tipo de avaliação.

Constatado que o corte etário, limitando o ingresso no 1º ano do Ensino Funda-mental apenas às crianças com 6 (seis) anos completos ou a completar até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, estabelecido pelas Resoluções CNE/CEB nº 6/2010 e 7/2010, e CEE/PE nº 3/2010, pelo art. 7º, inciso I, da Instrução Normativa de Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 da SEE, e pelo art. 3º, caput, e parágrafo único, da Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011, viola os preceitos constitucio-nais aos quais alude esta exordial, além de violar a LDB e o ECA.

Sequer se contraponha a falta de recursos para atender a demanda de matrícula no 1º ano do ensino fundamental a todas as crianças que completam 6 (seis) anos de idade no decorrer do ano, independente da data de seu aniversário, porque, como bem sentenciou JOSÉ AFONSO DA SILVA , “o Estado tem que aparelhar-se para fornecer, a todos, os serviços educacionais, isto é, oferecer ensino, de acordo com os princípios estatuídos na Constituição (art. 206); que ele tem que ampliar cada vez mais as possibilidades de que todos venham a exercer igualmente esse direito; e, em segundo lugar, que todas as normas da Constituição, sobre educação e ensino, hão que ser interpretadas em função daquela declaração e no sentido de sua plena e efetiva realização. A Constituição mesmo já considerou que o acesso ao ensino fundamental, obrigatório e gratuito, é direito público subjetivo; equivale reconhecer que é direito plenamente eficaz e de aplicabilidade imediata, isto é, exigível judicialmente, se não for prestado espontaneamente”.

Note-se, ainda, que a própria Resolução CNE/CEB nº 6/2010 e a Resolução CEE/PE nº 3/2010, por meio do disposto no art. 5º, § 2º e no art. 3º , respectivamente, de-ram tratamento diferenciado a situações idênticas, determinando que, exclusivamente para o ano de 2011, poderiam ter acesso ao 1º ano do ensino fundamental, as crianças que completassem 6 (seis) anos de idade, independente do mês de seu aniversário, desde que tivessem frequentado 2 (dois) anos de pré-escola.

Vale insistir no mencionado princípio da supremacia constitucional na contestação ao limite etário fixado a bel prazer pelo Conselho Nacional de Educação e pelo Con-selho Estadual de Educação, seguido pela Secretaria Estadual de Educação e pela Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Recife. É de ser invocado mais uma vez porque se cuida de uma questão de proteção ao direito público subjetivo de um largo número de crianças, especialmente quando se tem em mente aqueles pertencentes às classes menos favorecidas que sequer logram uma vaga na educação infantil (ainda não universalizada) precariamente ofertada pela rede pública municipal.

O inconstitucional corte etário para o acesso ao 1º ano do ensino fundamental, já foi objeto do crivo judiciário: a 2ª Câmara de Direito Público do TJSP, ao julgar a Apelação Cível nº 990.10.273767-5, assim decidiu:

14 - Op. Cit., pág. 313.15 - “Art. 5º. (…) § 2º Os Sistemas de Ensino poderão, em caráter excepcional, no ano de 2011, dar prosseguimento para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos às crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário de 6 (seis) anos, que no seu percurso educacional estiveram matriculadas e frequentaram, até final de 2010, por 2 (dois) anos ou mais a Pré-Escola.”16 - “Art. 3º. No ano de 2011, as crianças que, em seu percurso escolar, frequentaram no mínimo 2 (dois) anos na Pré-Escola, deverão ter acesso ao primeiro ano de estudo

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Recurso ex officio e Apelação Cível. Ação Civil Pública. Crianças que completam seis anos de idade no meio do ano letivo. Recusa da matrícula

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no 1º ano do ensino fundamental. Violação a direito líquido e certo assegu-rado pela Constituição Federal (arts. 205 e 208, incis o I). Idade mínima de seis anos para o ensino fundamental estabelecida na Lei nº 11.274/06. Ação julgada procedente. Decisão mantida. Recursos não providos.

Já o Tribunal de Justiça do Paraná reconheceu a possibilidade de ingresso no en-sino fundamental de crianças que completem 6 (seis) anos de idade no ano letivo a ser cursado, conforme ementas abaixo transcritas, cujo inteiro teor acompanham a

REEXAME NECESSÁRIO – MATÉRIA DE ENSINO – MANDADO DE SEGURANÇA – MATRÍCULA NA 1ª SÉRIE (ENSINO DE NOVE ANOS) DO ENSINO FUNDAMENTAL INDEFERIDA COM AMPARO NA DELIBERAÇÃO Nº.03/06 DO CONSELHO ESTADUAL DE EDU-CAÇÃO – ATO ILEGAL – CRIANÇAS QUE NÃO CONTAVAM COM SEIS ANOS DE IDADE NA DATA DA MATRÍCULA – DIREITO ASSE-GURADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, BEM COMO PELO ES-TATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ADVENTO DA DE-LIBERAÇÃO Nº 02/07 DO CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO – PRECEDENTES DESTA CORTE – SITUAÇÃO FÁTICA CONSUMA-DA – SENTENÇA MANTIDA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO (Reexame Necessário nº 521.890-4, da Vara Cível da Comarca de Cidade Gaúcha, Rel. Des. Luiz Antônio Barry, j. 03/05/2011 – DOC. 31);

MANDADO DE SEGURANÇA REEXAME NECESSÁRIO – IDADE INFERIOR À MÍNIMA ESTABELECIDA NA DELIBERAÇÃO Nº 003/2006 DO CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ-CEE – DIREITO, ENTRETANTO, ASSEGURADO CONS-TITUCIONALMENTE E PELO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADO-LESCENTE – OBSERVÂNCIA DA LEI Nº 11.274/2006 QUE DETER -MINA QUE O ENSINO FUNDAMENTAL, AGORA COM DURAÇÃO DE 9 (NOVE) ANOS, CONTEMPLA CRIANÇAS QUE COMPLETEM 6 (SEIS) ANOS DE IDADE NO ANO LETIVO A SER CURSADO. SEN-TENÇA MANTIDA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO (Reexame Necessário nº 725604-8, da Comarca de Quedas do Iguaçu, Vara Única, Rel. Juíza Substituta de 2º Grau Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, j. 19/04/2011 – DOC. 32);

REEXAME NECESSÁRIO MANDADO DE SEGURANÇA – INDE-FERIMENTO DE MATRÍCULA NO ENSINO FUNDAMENTAL COM AMPARO NA DELIBERAÇÃO Nº 03/06 DO CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO – ATO ILEGAL – CRIANÇA QUE NÃO CONTAVA COM SEIS ANOS DE IDADE NA DATA DA MATRÍCULA – DIREITO ASSEGURADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – OBSERVÂNCIA DA LEI ESTA-DUAL Nº 16.049/2009 – POSSIBILIDADE DE INGRESSO NO ENSINO FUNDAMENTAL DE CRIANÇAS QUE COMPLETEM 6 (SEIS) ANOS

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DE IDADE NO ANO LETIVO A SER CURSADO – OFENSA A DIREI-TO LÍQUIDO E CERTO – SENTENÇA MANTIDA EM SEDE DE REEXA-ME (Reexame Necessário nº 766.293-1, da Vara da Infância Juventude, Família e Anexos da Comarca de Umuarama, Rel. Des. ClAyton Camargo, j. 25/05/2011 – DOC. 33).

O Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial nº 1.189.082-SP (DOC. 34), também reconheceu o direito de acesso ao ensino fundamental com seis anos incompletos:

.TRA .88/FC AD 721 .TRA .OVITARTSINIMDA .LANOICUTITSNOC7º DA LEI 8.069/90. DIREITO AO ENSINO FUNDAMENTAL AOS MENORES DE SEIS ANOS “INCOMPLETOS”. PRECEITO CONS-TITUCIONAL REPRODUZIDO NO ART. 54 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. NORMA DEFINIDORA DE DIREI-TOS NÃO PROGRAMÁTICA. EXIGIBILIDADE EM JUÍZO. INTERES -

SADAUTIS SAÇNAIRC SÀ ETNENITA LAUDIVIDNISNART ESNESSA FAIXA ETÁRIA.

1. O direito à educação, insculpido na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, é indisponível, em função do bem comum,

acilbúp medro ed sotiecerp sod avitisopmi açrof airpórp ad odaviredque regulam a matéria.2. Menores de seis anos incompletos têm direito, com base em norma constitucional reproduzida no art. 54 do ECA (Lei 8.069/90), ao en-sino fundamental.

,ortuo rop ,es-alever ;odatsE od reved o ,olugnâ mu rop ,odargasnoC .3o direito subjetivo da criança. Consectariamente, em função do princípio da inafastabilidade da jurisdição a todo direito corresponde uma ação que o assegura, sendo certo que todas as crianças nas condições estipuladas pela lei enquadram-se na esfera desse direito e podem exigi-lo em juízo. A homogeneidade e transindividualidade do direito em foco enseja a propo-situra da Ação Civil Pública.4. Descabida a tese da discricionariedade, a única dúvida que se poderia suscitar resvalaria na natureza da norma ora sob enfoque, se programática ou definidora de direitos. Muito embora a matéria seja, somente nesse particular, constitucional, sem importância se mostra essa categorização. Tendo em vista a explicitude do ECA, é inequívoca a normatividade suficiente à promessa constitucional, a ensejar a acionabilidade do direito à educação.5. Ressoa evidente que toda imposição jurisdicional à Fazenda Pública im-plica dispêndio, sem que isso infrinja a harmonia dos poderes porquanto, no regime democrático e no estado de direito, o Estado soberano submete-se à própria Justiça que instituiu. Afastada, assim, a ingerência entre os poderes, o Judiciário, alegado o malferimento da lei, nada mais fez que cumpri-la ao determinar a realização prática da promessa da legislação.6. Recurso Especial provido.” (destaques não existentes no original).O Supremo Tribunal Federal, em recente julgado, proferido em 23/08/2011,

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nos autos do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo 639.337-São Paulo (DOC. 35), pontuou importantes questões na esfera educacional, principalmente quanto ao fato de reconhecer que o atendimen-to à pré-escola vai até os 5 (cinco) anos de idade:

E M E N T A: CRIANÇA DE ATÉ CINCO ANOS DE IDADE - ATENDI-MENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - SENTENÇA QUE OBRI-GA O MUNICÍPIO DE SÃO PAULO A MATRICULAR CRIANÇAS EM UNIDADES DE ENSINO INFANTIL PRÓXIMAS DE SUA RESIDÊN-CIA OU DO ENDEREÇO DE TRABALHO DE SEUS RESPONSÁVEIS LEGAIS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA POR CRIANÇA NÃO ATEN-DIDA - LEGITIMIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DAS “ASTREIN-TES” CONTRA O PODER PÚBLICO - DOUTRINA - JURISPRUDÊN -CIA - OBRIGAÇÃO ESTATAL DE RESPEITAR OS DIREITOS DAS CRIANÇAS -EDUCAÇÃO INFANTIL - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 53/2006) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDI-CO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADA-MENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) - LEGITIMIDADE CONS-TITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM CASO DE OMISSÃO ESTATAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTI-CAS PÚBLICAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO - INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PO-DERES - PROTEÇÃO JUDICIAL DE DIREITOS SOCIAIS, ESCASSEZ DE RECURSOS E A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS” - RESERVA DO POSSÍVEL, MÍNIMO EXISTENCIAL, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL - PRE-TENDIDA EXONERAÇÃO DO ENCARGO CONSTITUCIONAL POR EFEITO DE SUPERVENIÊNCIA DE NOVA REALIDADE FÁTICA - QUESTÃO QUE SEQUER FOI SUSCITADA NAS RAZÕES DE RE-CURSO EXTRAORDINÁRIO -PRINCÍPIO “JURA NOVIT CURIA” - INVOCAÇÃO EM SEDE DE APELO EXTREMO - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO CONCRE-TIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE EDUCAÇÃO IN-FANTIL: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL. - A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crian-ças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar con-dições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “cri-anças até 5 (cinco) anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e ate-ndimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inér-

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cia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º) - não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político-administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crian-ças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a com-prometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportu-nidade, a eficácia desse direito básico de índole social. - Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Execu-tivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos es-tatais competentes, por descumprirem os encargos político- -jurídicos que sobre eles incidem em caráter impositivo, vierem a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregna-dos de estatura constitucional. DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL. - O Poder Público - quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no próprio texto constitucional - transgride, com esse comportamento negativo, a própria integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.. - A inércia estatal em adimplir as im-posições constitucionais traduz inaceitável gesto de desprezo pela autori-dade da Constituição e configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado. É que nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integral-mente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos. - A intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais previstas e determinadas no texto constitucio-nal, notadamente na área da educação infantil (RTJ 199/1219-1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República assegura à generalidade das pessoas. Precedentes. A CONTROVÉRSIA PERTINENTE À “RESERVA DO POS-SÍVEL” E A INTANGIBILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL: A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS”. - A destinação de recursos

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públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto cons-titucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente rele-vantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras “escolhas trágicas”, em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspec-tiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efe-tividade às normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. - A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. Doutrina. Precedentes. - A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja con-cretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabiliza-doras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à edu-cação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimen-tação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV). A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SO-CIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. - O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em con-seqüência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. LEGITIMIDADE JURÍDICA DA IMPOSIÇÃO, AO PODER PÚBLICO, DAS “ASTREINTES”. - Inexiste obstáculo juríd-ico-processual à utilização, contra entidades de direito público, da multa

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cominatória prevista no § 5º do art. 461 do CPC. A “astreinte” - que se reveste de função coercitiva - tem por finalidade específica compelir, legiti-mamente, o devedor, mesmo que se cuide do Poder Público, a cumprir o preceito, tal como definido no ato sentencial. Doutrina. Jurisprudência.” (destaques não existentes no original).

Vale salientar que as disposições constitucionais e infraconstitucionais aqui versadas não estabelecem que o acesso ao 1º ano do ensino fundamental exi-ge uma avaliação psicopedagógica da criança, como também não estabelecem qualquer processo seletivo para a criança ingressar nessa série que é a “porta de entrada” ao ensino fundamental.

Pelo contrário!Restou constitucionalmente assegurado que o acesso ao 1º ano do ensino fundamen-

tal é direito público subjetivo de toda e qualquer criança ao completar os 6 (seis) anos de idade, esteja ela matriculada ou não na educação infantil. Apesar disso, a legislação pos-sibilita o acesso aos níveis mais elevados do ensino segundo a capacidade de cada um.

Portanto, no ano em que completar 6 (seis) anos de idade, independente de sua data de nascimento, toda e qualquer criança possui o direito público subjetivo de ser matriculada no 1º ano do ensino fundamental obrigatório.

Se vigorar o corte etário estabelecido pelos Conselhos de Educação, frustradas as mudanças constitucionais e legais para implantação do ensino fundamental de 9 anos. Se o legislador pretendeu que as crianças de 6 anos de idade estivessem no 1º ano do ensino fundamental, as resoluções e as instruções de matrícula aqui questionadas limitaram esse acesso aos 6 anos de idade apenas a quem nasceu em janeiro, feve-reiro e março. As crianças que nasceram nos demais meses do ano tiveram seu direito público subjetivo de serem matriculadas no 1º ano do ensino fundamental subtraído abruptamente, pois ali estarão com praticamente 7 anos de idade.

Ou seja, as crianças das classes menos favorecidas, que não dispõem de recursos financeiros para ingressarem individualmente com uma medida judicial visando as-segurar esse direito público subjetivo de ter acesso ao 1º ano do ensino fundamental aos 6 anos de idade, ganharam mais uma exclusão no seu rol de direitos fundamentais violados: a exclusão escolar.

O que é mais grave é que, em publicação do próprio Ministério da Educação, intitulada “A criança de 6 anos, a linguagem escrita e o ensino fundamental de nove anos” , verifica-se a intenção (contrariada pela edição das resoluções aqui questiona-das) daquele órgão público de inclusão das crianças de 6 anos de idade no 1º ano do ensino fundamental:

A inclusão das crianças de seis anos no Ensino Fundamental amplia a esco-larização para uma parcela significativa da população brasileira que se en-contrava, até então, privada da educação escolar ou sem garantia de vagas nas instituições públicas de ensino. Como único nível de ensino de matrícu-la obrigatória no País, o Ensino Fundamental, ao ter sua duração ampliada

17 - Com inteiro teor disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12624%3Aensino-fundamental&Itemid=859

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de oito para nove anos, traz para a escola um grupo de crianças que, ao serem introduzidas nessas instituições, entram em contato com uma cultura da qual devem se apropriar. É importante também considerar que, ainda que algumas das crianças de seis anos já freqüentassem instituições pré-escolares, a entrada desse segmento no Ensino Fundamental impõe novos desafios, sobretudo pedagógicos, para a área educacional. Como se sabe, mesmo admitindo a expansão das vagas como condição fundamental para a garantia do direito à educação, é no âmbito das práticas pedagógicas que a instituição educativa pode tornar-se ela mesma expressão ou não desse direito. Para que esse direito se cumpra, portanto, e para que se configu-re como promotor de novos direitos, o acesso das crianças às instituições educativas e sua permanência nelas devem consolidar-se como direito ao conhecimento, à formação integral do ser humano e à participação no pro-cesso de construção de novos conhecimentos. A construção dessa prática educativa deve ter a criança como eixo do processo e levar em conta as diferentes dimensões de sua formação.

Diante de tudo isso, é esse direito público subjetivo que o MPPE busca ser recon-hecido e assegurado por esse Juízo a todas as crianças, indiscriminadamente, cujos pais ou responsáveis pretendem matriculá-las (o que se constitui em um dever deles) no 1º ano do ensino fundamental nas escolas públicas e privadas pertencentes aos sistemas estadual e municipal de educação, independentemente da rede.

É ocasião, data venia, para consignar, para maior clareamento da questão, o mecanismo do sistema de ensino.

Como a União, os Estados e os Municípios devem organizar, em regime de co-laboração, seus sistemas de ensino (cf. art. 211, caput, da CF), é certo que os Estados e o Distrito Federal devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e médio (§ 3º idem). Tal previsão constitucional é reproduzida no art. 8º, caput, da Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB).

A LDB ainda estabelece, em seu art. 10, que os Estados incumbir-se-ão de:

I – organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino;II – definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das res-ponsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos fi-nanceiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público;(...)IV – baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;V – assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino mé-dio a todos que o demandarem, respeitado o disposto no art. 38 desta Lei;(...)” (destaque não existente no original).

Enquanto os Municípios, pelo disposto no art. 11 da LDB, incumbir-se-ão de:

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I – organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;II – exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;III – baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;(...)V – oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino so-mente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino;(...)Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sis-tema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica” (destaque não existente no original).

I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria, progressivamente, em tempo integral;(...)III – educação de zero a seis anos, em tempo integral, através de creche e pré-escola;(...)VI – possibilidade de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pes-quisa e da criação artística;(...)” (destaques não existentes no original).

É necessário pontuar que dos 184 (cento e oitenta e quatro) municípios pernambu-canos, 39 (trinta e nove) instituíram seus sistemas municipais de ensino, não estando vinculados ao sistema estadual de educação, conforme consta em levantamento re-alizado pela União dos Conselhos Municipais de Educação – UNCME (DOC. 36). Os demais 145 (cento e quarenta e cinco) municípios integram o Sistema Estadual de Ensino e seguem as regras emanadas do Conselho Estadual de Educação, estando sujeitos à decisão desta ação coletiva.

Registre-se, ainda, que o ensino é livre à iniciativa privada, desde que haja o cum-primento das normas gerais da educação nacional e a autorização e avaliação de quali-dade pelo Poder Público, conforme previsão contida no art. 209 da CF, reproduzida

A Constituição do Estado de Pernambuco prevê, no caput do seu art. 179, queo Estado organizará, em regime de colaboração com os Municípios e com a contribuiçãoda União, o sistema estadual de educação, que abrange a educação pré-escolar, o ensinofundamental e médio, bem como oferecerá o ensino superior na esfera de sua jurisdição,respeitando a autonomia universitária e observando as seguintes diretrizes e normas:

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no art. 7º da LDB e no art. 193 da Constituição Estadual, destacando esta que caberá ao Poder Público Estadual a verificação da capacidade pedagógica das instituições de ensino privado, para fins de autorização e funcionamento (art. 194, caput).

Aqui vale esclarecer que os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal compreendem, a teor do art. 17 da LDB:

I – as instituições de ensino mantidas, respectivamente, pelo Poder Público estadual e pelo Distrito Federal;II – as instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público Mu-

III – as instituições de ensino fundamental e médio criadas e mantidas pela

IV – os órgãos de educação estaduais e do Distrito Federal, respectiva-mente” (destaques não existentes no original).

Portanto, todas as escolas da rede estadual de ensino (mantidas pelo Estado de Pernambuco) e todas as escolas privadas que ofertam o ensino fundamental em Per-nambuco fazem parte do Sistema Estadual de Ensino.

De outro lado, os Sistemas Municipais de Ensino englobam:

I – as instituições do ensino fundamental, médio e de educação infantil mantidas pelo Poder Público Municipal;II – as instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa

III – os órgãos municipais de educação” (destaques não existentes no original).

Concluindo-se que todas as escolas da rede municipal de ensino do Recife (man-tidas pelo Município) e todas as escolas privadas que ofertam a educação infantil em Recife fazem parte do Sistema Municipal de Ensino.

Ressalte-se que esta ação coletiva alcança todas as escolas, públicas ou privadas, que integram o Sistema Estadual de Ensino de Pernambuco e todas as escolas públicas que integram o Sistema Municipal de Ensino do Recife, visando à proteção integral das crianças que deveriam, por determinação constitucional e legal, estar matriculadas no 1º ano do ensino fundamental no ano em que completam 6 (seis) anos de idade.

III – DA NECESSIDADE DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA:

O art. 273 do Código de Processo Civil possibilita que o Julgador antecipe to-dos ou alguns efeitos do provimento jurisdicional de mérito, desde que exista prova inequívoca e se convença da verossimilhança das alegações apresentadas, havendo fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Neste caso concreto, o direito que norteia esta demanda está exposto de forma clara nas razões de fato e de direito desta ação, as quais encontram fundamento na Constituição Federal (arts. 5º, caput, 6º, caput, 205, 206, incisos I, II e III-parte final,

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208, incisos I, IV, V e §§ 1º e 2º, 227, caput), na Lei nº 9.394/1996 – LDB (arts. 2º, 3º, incisos I e V, 4º, incisos I, V e X, 6º, 32, caput, 87, § 3º, inciso I), na Lei nº 8.069/1990 – ECA (arts. 4º, 53, caput e inciso I, 54, incisos I e V, 55) na Constituição Estadual (arts. 176, 178, incisos I e VI, 179, § 1º), na doutrina e na jurisprudência citadas. Além, evidentemente, do conjunto probatório que instrui esta inicial.

O próprio texto da Resolução CNE/CEB nº 6/2010 (DOC. 08), da Resolução CNE/CEB nº 7/2010 (DOC. 09), da Resolução CEE/PE nº 3/2010 (DOC. 10), da Instrução Normativa de Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 (DOC. 04) e da Instrução Nor-mativa de Matrícula nº 03/2011 (DOC. 05) demonstram que o Estado de Pernambuco e o Município do Recife, através dos órgãos públicos e privados dos seus respectivos sistemas de ensino, vêm descumprindo a legislação indicada, limitando o acesso ao 1º ano do ensino fundamental apenas às crianças que completam 6 (seis) anos de idade até o dia 31 de março do ano em que devem ser matriculadas, consubstanciando graves e irreversíveis danos às crianças que completam 6 (seis) anos de idade a partir do dia 1º de abril, prejudicadas pelo burocrático corte etário, desrespeitando direito constitucionalmente assegurado.

Nessa linha, tanto a tutela de urgência, quanto a de evidência, são plenamente possíveis no caso sob apreciação, atendendo ao preceito do citado art. 273 do Có-digo de Processo Civil.

É mais que patente, neste caso, a presença do periculum in mora, consistente no fato de que o período de matrícula para o ano letivo de 2012 já está em curso nas esco-las, públicas ou privadas, que integram o Sistema Estadual de Ensino de Pernambuco e o Sistema Municipal de Ensino do Recife.

Na realidade, escolas privadas do Sistema Estadual de Ensino já realizaram a reserva de matrícula para o ano letivo de 2012 e já iniciaram a fase de matrícula propriamente dita, com o pagamento da taxa equivalente e entrega de documentação pelos pais/responsáveis.

Quanto às escolas da rede estadual de ensino, a Instrução Normativa e Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 (DOC. 04), da Secretaria Estadual de Educação, esta-beleceu o período de matrícula de acordo com o município, da seguinte forma:

Art. 6º A Inscrição para o Cadastro do (a) Estudante é isenta de pagamen-to de taxas e estará aberta aos(às) candidatos(as) residentes em Recife e Região Metropolitana, conforme determina a relação dos Municípios (ANE-XO I) e, nos demais Municípios, podendo ser realizada da seguinte forma e período:I - via Internet através do site www.educacao.pe.gov.br, no período de 08.11.2011 a 29.11.2011, na Capital e Região Metropolitana do Recife, exceto nos municípios de Itamaracá, Itapissuma, Araçoiaba, Ipojuca e Moreno;II - através da Central de Atendimento Telefônico - 0800.286.0086, no período de 03.12.2011 a 23.12.2011, na Capital e Região Metropolitana do Recife, exceto nos municípios de Itamaracá, Itapissuma, Araçoiaba, Ipojuca e Moreno;III - na escola no período de 03.12.2011 a 23.12.2011, nos demais municí-pios.” (destaques não existentes no original).

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Para as instituições da Rede Municipal de Ensino do Recife, a Instrução Norma-tiva de Matrícula nº 03/2011 (DOC. 05), da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Município do Recife, estabeleceu que:

Art. 16. Para efetuar a matrícula é necessário a apresentação da cópia da Certidão de Nascimento ou RG, cópia do comprovante de residência e docu-mento de transferência escolar, quando necessário.

Parágrafo único: A matrícula será efetuada pelo pai/responsável ou pelo pró -prio estudante, quando de maior idade, no período de 12 de dezembro de 2011 a 13 de janeiro de 2012.” (destaques não existentes no original).

Além do que, como já foi dito, várias são as formas que estão sendo realizadas as matrículas na rede privada do sistema estadual de ensino, conforme restou constatado no Relatório de Inspeção nº 49/2011 (DOC. 11).

Por isso, a demora na prestação jusrisdicional poderá prejudicar uma geração de crianças que completarão 6 (seis) anos de idade de abril a dezembro de 2012, as quais terão seu direito público subjetivo de se matricular no 1º ano do ensino fundamental no ano letivo de 2012 usurpado em função do corte etário burocraticamente fixado, em detrimento do direito constitucionalmente assegurado.

IV – DO PEDIDO:

Considerando todas as razões de fato e de direito acima expostas, requer o Minis-tério Público do Estado de Pernambuco:

LIMINARMENTEA concessão de antecipação de tutela, para:

1- suspender imediatamente os efeitos do:(a) art. 1º da Resolução CEE/PE nº 3/2010; e(b) art. 7º, inciso I, da Instrução Normativa de Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 da Secretaria Estadual de Educação;(c) art. 3º, parágrafo único, da Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011 da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Município do Recife;

2- que o Estado de Pernambuco e o Município do Recife assegurem a matrícula no 1º ano do Ensino Fundamental das escolas dos seus res-pectivos sistemas de ensino para o ano letivo de 2012, a todas as cri-anças que irão completar 6 anos de idade no decorrer do ano de 2012, reabrindo, se necessário, o prazo de matrícula para as escolas das redes estadual e municipal;

3- seja dada ampla divulgação através da imprensa escrita e falada, bem como nos órgãos internos da Secretaria Estadual de Educação e Secretaria

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de Educação, Esporte e Lazer do Município do Recife, sobre a concessão da antecipação de tutela ora requerida;

4- seja arbitrada, em caso de descumprimento, multa diária para cada uma das obrigações contidas nos itens 2 e 3 supra, com base no disposto no art. 461, § 4º, do CPC e no art. 11 da Lei nº 7.347/1985.

NO MÉRITOA procedência do pedido em todos os seus termos para confirmar a antecipação

de tutela e

1- declarar incidentalmente a inconstitucionalidade, suspendendo definiti-vamente os efeitos dos seguintes dispositivos:a) art. 1º da Resolução CEE/PE nº 3/2010; eb) art. 7º, inciso I, da Instrução Normativa de Cadastro Escolar e Matrícula nº 11/2011 da Secretaria Estadual de Educação;(d) art. 3º, parágrafo único, da Instrução Normativa de Matrícula nº 03/2011 da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Município do Recife;2- condenar o ESTADO DE PERNAMBUCO e o MUNICÍPIO DO RECIFE:a) a cumprir obrigação de fazer, para determinar que assegurem a matrícula, desde o início do ano letivo, no 1º ano do Ensino Fundamental das escolas dos seus respectivos sistemas de ensino a todas as crianças no ano em que completam 6 (seis) anos de idade, não importando a data de nascimento das mesmas;b) a cumprir obrigação de não fazer, no sentido de que, por meio da Se-cretaria Estadual de Educação e/ou do Conselho Estadual de Educação, da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Município do Recife e/ou do Conselho Municipal de Educação, abstenham-se de editar outras normas que impeçam o acesso das crianças ao 1º ano do ensino fundamental das escolas dos seus respectivos sistemas de ensino no ano em que completam 6 (seis) anos de idade, não importando a data de aniversário das mesmas;c) seja arbitrada, em caso de descumprimento, multa diária para cada uma das obrigações contidas nos itens “a” e “b” supra, com base no disposto no art. 461, § 4º, do CPC e no art. 11 da Lei nº 7.347/1985.

V – DOS REQUERIMENTOS FINAIS:

Requer a citação do Estado de Pernambuco, na pessoa do Procurador Geral do Estado e do Município do Recife, na pessoa do Excelentíssimo Prefeito para contestar a presente ação, no prazo legal, com a advertência de que o seu silêncio importará na decretação da revelia, reputados como verdadeiros os fatos articulados nesta inicial.

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, bem como a isenção de custas, emolumentos, honorários e outras despesas, em razão do que dispõe o art. 18 da Lei nº 7.347/1985.

Atribui-se à causa, para efeitos meramente fiscais, o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

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Pede deferimento.Recife, 29 de novembro de 2011.KATARINA MORAIS DE GUSMÃOPromotora de JustiçaELEONORA MARISE SILVA RODRIGUESPromotora de Justiça

b. MEDIDA CAUTELAR QUE SUSPENDEU A ABRANGÊNCIA DA LIMI-NAR DE PERNAMBUCO

PODER JUDICIáRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃOMEDIDA CAUTELAR INOMINADA (TURMA) 3146 - PE (0007534- 96.2012.4.05.0000)

REQTE : UNIÃOREQDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROC. ORIGINáRIO : 2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (0013466-31.2011.4.05.8300)RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES

RELATÓRIOO EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES (RELATOR):

Trata-se de Ação Cautelar, ajuizada pela União, pleiteando a atribuição de efeito suspensivo ao apelo da r. sentença da lavra do MM. Juiz da 2ª Vara Federal de Per-nambuco, com o seguinte dispositivo:

Isto posto, e o que mais dos autos consta, julgo PROCEDENTE, confir-mando a decisão que antecipou os efeitos da tutela, para determinar a sus-pensão das Resoluções de n.º 01, de 14/01/2010, de n.º 06, de 20/10/2010, e de outras normas que a elas se seguiram de igual conteúdo, permitindo a regular matrícula no ensino fundamental, em todas as instituições de ensino do País, das crianças menores de 6 (seis) anos de idade em 31 de março do ano letivo a ser cursado.

Sustenta, em resumo, a União, que a fixação da idade limite de seis anos para a criança obter matrícula no ensino fundamental guarda a adequação ao disposto no art. 32, da lei 9.394/96.

Atribuído efeito suspensivo parcial à apelação, apenas para limitar a eficácia da sentença ao âmbito territorial da Seção Judiciária de Pernambuco.

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Contestação às fls. 507/516v.Pedido de reconsideração às fls. 517/523.

É o relatório.

Desembargador Federal Lázaro Guimarães

Relator

PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃOMEDIDA CAUTELAR INOMINADA (Turma) 3146 - PE (0007534- 96.2012.4.05.0000)

REQTE : UNIÃOREQDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROC. ORIGINáRIO : 2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (0013466- 31.2011.4.05.8300)RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES

VOTO

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES (RELATOR):Adoto os fundamentos da Decisão (fl. 503), como razão de decidir:

A requerente postula liminar em cautelar na qual postula efeito suspensivo á apelação ante sentença que suspendeu as Resoluções 1/2010 e 6/2010, da Câmara de Educação Básica do Conselho Federal de Educação, em todo o país. Alega, em resumo, que a fixação da idade limite de seis anos para a criança obter matrícula no ensino fundamental guarda adequação ao dis-posto no art. 32 da Lei 9.394/96.Entendo que as mencionadas resoluções extrapolam a norma legal, que atribui o dever de acesso da criança de seis anos ao ensino fundamental. Não se estabelece ali restrição ao direito dos pais de promoverem a edu-cação dos seus filhos com idade inferior. É pacífica a jurisprudência quanto à viabilidade da imposição de multa à Fazenda Pública por descumprimen-to da obrigação de fazer. No que diz respeito à extensão territorial da eficácia erga omnes da senten-ça, com ressalva do entendimento pessoal, devo aplicar a orientação fixada pelo Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Divergência no RESp 411.529/SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, com a seguinte ementa:

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EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.EFICÁCIA. LIMI-TES. JURISDIÇÃO DO ÓRGÃO PROLATOR.

1 - Consoante entendimento consignado nesta Corte, a sentença proferida em ação civil pública fará coisa julgada erga onmes, nos limites da competência do órgão prolator da decisão, nos termos do art. 16 da Lei nº. 7.437/85, alterado pela Lei nº. 9.494/97. Precedentes.

2 - Embargos de divergência acolhidos.Ante o exposto, atribuo efeito suspensivo parcial à apelação, apenas para limitar a

eficácia da sentença ao âmbito territorial da Seção Judiciária de Pernambuco.”Ante o exposto, dou parcial provimento à medida cautelar, para atribuir efeito

suspensivo parcial à apelação, apenas para limitar a eficácia da sentença ao âmbito territorial da Seção Judiciária de Pernambuco.

É como voto.Desembargador Federal Lázaro GuimarãesRelator

PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃOMEDIDA CAUTELAR INOMINADA (TURMA) 3146 - PE (0007534- 96.2012.4.05.0000)

REQTE : UNIÃOREQDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROC. ORIGINáRIO : 2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (0013466-31.2011.4.05.8300)RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZAROGUIMARÃES

EMENTA

Processual Civil e Administrativo. Suspensão Resoluções de n.º 01, de 14/01/2010, de n.º 06, de 20/10/2010. Possibilidade. Matrícula no ensino fundamental, em todas as instituições de ensino do Estado de Pernambuco, das crianças menores de 06 (seis) anos de idade em 31 de março do ano letivo a ser cursado. Limites da jurisdição do órgão prolator.Precedentes do STJ. Medida cautelar parcialmente provida.

ACÓRDÃOVistos etc.

Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimi-dade, dar parcial provimento à medida cautelar, para atribuir efeito suspensivo parcial

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à apelação, apenas para limitar a eficácia da sentença ao âmbito territorial, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 04 de setembro de 2012.

(data do julgamento)Desembargador Federal Lázaro GuimarãesRelator

c. LIMINAR DA 3ª VARA – SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS

PODER JUDICIÁRIOJUSTIÇA FEDERAL DE 1” INSTÂNCIASEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAISPROCESSO N.° 50861-51.2012.4.01.3800 TERCEIRA VARA

CONCLUSÃOFaço os presentes autos conclusos ao MM. Juiz Federal Substituto em exercício nesta Vara.Belo Horizonte, 26 de Outubro de 2012. Analista Judiciária MG99003

DECISÃO

Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de tutela antecipada, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra a UNIÃO FEDERAL, pugnando pela con-denação da Ré na obrigação de fazer consistente na “reavaliação dos critérios de clas-sificação dos alunos do ensino fundamental, garantindo, também, o acesso de crianças com seis anos incompletos, que comprovem sua capacidade intelectual por meio de avali-ação psicopedagógica”’, e para “”revogar as disposições contidas nas Resoluções n° 01, de 14/01/2010 e n° 6 de 20/10/2010 e demais atos posteriores editados pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE), que reproduziram a mesma obstrução à matrícula, eis que afrontam dispositivos constitucionais e legais”. Postula a inicial que “os dispositivos sejam retirados das disposições normativas do CNE e que a este ato seja dada ampla publicidade”.

Afirma o MPF que o feito em exame cuida de “direito individual homogéneo das crianças (e futuras crianças) que desejam se matricular no primeiro ano do en-sino básico e completaram (completarão) seis anos após 31 de março, já possuindo capacidade intelectual para o início de sua vida estudantil”. Sustenta o Autor a incons-titucionalidade das Resoluções n° 1, de 14/01/2010 e 6, de 20/10/2010 do CNE, por contrariarem o disposto nos arts. 205 a 214 da Constituição, que consagram o acesso ao ensino obrigatório como direito público subjetivo, sendo dever do Estado garantir

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o acesso aos níveis mais elevados de ensino, segunda a capacidade de cada um, não se encontrando no texto constitucional qualquer critério restritivo relativo à idade.

Aduz que a Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB), estabeleceu a obrigatoriedade do ensino fundamental a partir dos seis anos de idade, sem determinar que referida idade deve ser completada antes do início do ano letivo. Argumenta não haver dúvida de que a mens legis é ampliar o acesso à educação. Assevera, em conclusão, que “as Resoluções CNE/CEB n° 10/2010 e n” 6/2010, e demais posteriores, do mesmo jaez, também editados pelo CNE/CEB, ao fazer uso de critério exclusivamente cronológico para a admissão das crianças no ensino fun-damental, delimitando uma data de corte, cria restrição não prevista na lei e afronta a Carta Suprema, que não impõe tal óbice ao menor que demonstre desenvolvimento intelectual para tanto”.

Em sede de tutela antecipada, postula a “suspensão imediata dos efeitos das Reso-luções n° 01, de 14/01/2010 e n° 6, de 20/10/2010, e demais atos posteriores que re-produziram a mesma ilegalidade, editados pela Câmara de Educação Básica do Con-selho Nacional de Educação, em ordem a autorizar e garantir a matrícula na primeira série do ensino fundamental das crianças que venham a completar seis anos de idade no decorrer do próximo ano letivo (de janeiro a dezembro de 2012), uma vez com-provada sua capacidade intelectual mediante avaliação psicopedagógica por cada entidade de ensino”.

Em apenso, os inquéritos 1.22.012.000195/2011-05 e 1.22.000.003789/2011-07, conduzidos pelo Ministério Público Federal em Minas Gerais, para apuração dos fatos que dão suporte à ação civil pública ora intentada. Oportunizada vista à União sobre o pedido de liminar, ela se manifesta às f. 35/59.

Decido.

A matéria em debate já foi apreciada pelo Eg. TRF da 1ª Região que, ao jul-gar, sob a relatoria do Dês. Fed. JIRAIR ARAM MEGUERIAN o AI n° 0069732- 20.2011.4.01.0000/DF, interposto contra decisão que indeferiu o pedido de ante-cipação de tutela, em processo com objeto análogo ao dos presentes autos, lançou decisão de cujo teor, na parte decisória, extraio:

6. A princípio, parece que razão assiste à agravante, visto que o acesso à educação é um direito garantido pela Constituição Federal, resguardado no art. 227, que dispõe ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à educação. 7. Parece que a Lei n° 9.394/1996, ao estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional, nada dispôs sobre o estabelecimento de data de corte/limite referente à idade de acesso à educação infantil ou ensino fundamental.

8. Dessa forma, estabelecer limitação de acesso à educação em razão de data em. que a criança completa a idade de acesso ao nível escolar não me parece revestido de razoabilidade visto não haver previsão legal para tanto, bem

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como pelo fato de que a capacidade de aprendizado é individual,podendo ser determinada não somente pela idade, mas também pela capacidade in-telecto/psicológica de cada criança, quepoderá ser conferida pelas escolas, de forma individualizada, por meio de testes psicológicos/pedagógicos.

9. Observo que no julgamento do REsp 753565/MS, cujo feito originário tratava-se de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul objetivando obrigar o Estado a efetivar a matrícula de crianças com idade de seis anos incompletos no início do primeiro ano do ensino fundamental, o e. Relator, Ministro Luiz Fux, res-saltou no seu voto ser ‘direito do menor a frequência ao ensino fundamental a partir de seis anos, sendo a referida idade alcançada no curso do semestre, é razoável que o momento da efetivação da matrícula seja aferida a capaci-dade do menor, para fins de realização do princípio da isonomia, sob pena de violação ao próprio comando constitucional, ...’, fl. 18 de 30, e afirmou que ‘Deveras, matricular um menor de seis anos no início do ano e deixar de fazê-lo com relação aquele que completaria a referida idade em um mês, por exemplo, significa o mesmo que tenta (sic) legalizar a mais violenta afronta ao princípio da isonomia, pilar não só da sociedade democrática anunciada pela Carta Magna, mas também ferir de morte a dignidade humana. ‘,fl. 18 de 30. 10. Dessa forma, a Resolução do CNE/CEB N° 06/20/0 pode ser vista como norma orientadora da escola e dos pais, e não como dispositivo imposi-tivo de restrição do direito ao acesso à educação, pois como bem observado em julgamento recente no Supremo Tribunal Federal pelo Ministro António Dias Toffbli em seu voto (ADIn n. 2,404/DF), os pais devem ser responsáveis pela escolhas que fazem em relação aos seus filhos, visto que tanto um adi-antamento exagerado como o atraso no acesso à educação infantil e/ou ao en-sino fundamental poderão trazer sérios prejuízos à vida académica da criança Catharina Bittencourt de Carvalho.

Pelo exposto, defiro, por ora, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, com a consequente suspensão da eficácia da Resolução n° 06/2010 em relação à Catharina Bittencourt de Carvalho, a fim de que possa se ma-tricular sem a utilização da data de corte que seria fixada em 31 de março.

Comungo do entendimento esposado nesse julgado, arrimado na garantia constitu-cional do acesso à educação e no implemento do princípio da isonomia, dando, tam-bém, concretude à norma constitucional que preceitua acesso aos níveis mais elevados do ensino, segundo a capacidade de cada um.

Nesses motivos, em face da prova inequívoca dos fatos, da caracterização da verossimilhança das alegações do Autor e do periculum in mora, DEFIRO a anteci-pação de tutela postulada para suspender, de imediato, na área do Estado de Minas Gerais, os efeitos das Resoluções n° 01, de 14/01/2010 e n° 6, de 20/10/2010, e dos demais atos posteriores que reproduziram o mesmo comando, editados pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Em consequência, fica au-

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torizada e garantida a matrícula na primeira série do ensino fundamental das crianças que venham a completar seis anos de idade no decorrer do próximo ano letivo (de ja-neiro a dezembro de 2012), uma vez comprovada sua capacidade intelectual mediante avaliação psicopedagógica por cada entidade de ensino.

Em caso de eventual descumprimento da obrigação, a Ré ficará sujeita à incidên-cia de multa no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a qual deverá ser computada a partir do 10° dia contado de sua intimação acerca da presente decisão.

Cite-se a Ré, intimando-a, no mesmo ato, dessa decisão, para ciência e cumpri-mento. Belo Horizonte, 26 de outubro

ANIEL CARNEIRO MACHADOJuiz FEDERAL SUBSTITUTO EIVÍ EXERCÍCIO NA 3a VARA - MG

d. DOUTRINA DO RIO GRANDE DO SUL QUANTO À DURAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Alteração da legislação que dispõe sobre o período de duração do ensino funda-mental de 09 anos, e a idade mínima para o acesso à primeira série.

PARECER

ASSUNTO: Alteração da legislação que dispõe sobre o período de duração do ensino fundamental de 09 anos, e a idade mínima para o acesso à primeira série.

Trata-se de parecer que se elabora, a pedido da 9ª Promotoria de Justiça Especiali-zada da Infância e da Juventude de Porto Alegre (Of. 0921/2008), por intermédio da Promotora de Justiça Synara Jacques Buttelli, tendo por finalidade analisar a questão relativa à alteração da legislação que dilatou o período de duração do currículo do en-sino fundamental, bem como a idade para o ingresso de crianças a partir dos seis anos de idade, levando em conta as alterações promovidas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB - Lei n° 9.394/96), mediante a Lei 11.274/2006.

De acordo com suas explanações, a orientação da Secretaria Estadual de Educação do RS é no sentido de que as escolas da rede pública estadual devem manter, até a adequada e completa implementação do novo sistema, turmas do ensino fundamental com duração de nove anos, e o ingresso da criança a partir dos seis anos de idade, e turmas do currículo de duração de oito anos, com o ingresso a partir do sete anos idade, de acordo com a Portaria nº 227/07, art. 2º caput e parágrafos. Entretanto, nar-rou que tal procedimento não vem sendo adotado em algumas localidades do Estado, à medida em que disponibilizam apenas a nova situação, que compreende a duração do ensino fundamental em nove anos e ingresso a partir dos seis a anos.

Por fim, ressaltou que a Secretaria Estadual de Educação vem adotando posição polêmica ao disponibilizar avaliação de criança com idade inferior à estabelecida

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como mínima para o ingresso no ensino fundamental, na hipótese de ficar evidenciada aptidão e capacidade psicológica. Segundo seu entendimento, tal situação mostra-se delicada, a começar pela referência, no próprio texto legal, à impossibilidade de utilizar o sistema de avaliação para o primeiro ingresso, motivo pelo qual solicita manifestação deste Centro de Apoio dada a nova sistemática ainda estar em período de transição.

Relatei.

Em sua redação original, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB - não men-cionava expressamente uma restrição etária ao ingresso no ensino fundamental, então estruturado em 8 anos ou séries. Mencionava o diploma, apenas, a obrigação dos pais de matricular seus filhos quando estes completassem sete anos, nos seguintes termos:

Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental.

Tal dispositivo foi modificado pela Lei n° 11.114/2005, que reduziu a idade nele referida para seis anos. Entretanto, essa não foi a única mudança introduzida na Lei de Diretrizes. O art. 32 da LDB também foi alterado, inicialmente pela mesma Lei n° 11.114/2005, e depois pela Lei n° 11.274/2006, fazendo com que ele possua hoje a seguinte redação:

Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:

Como pode ser observado, dispõe agora da LDB, de forma expressa, sobre uma idade-limite para o acesso ao ensino fundamental: “iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade”. Não se trata, portanto, de uma faculdade, mas de um critério legal obstativo. Ainda, a legislação federal ampliou a duração do ensino fundamental para nove anos, e inseriu um dispositivo que garante um prazo até 2010 para implementação do ensino fundamental de nove anos.

Nesses termos, três situações jurídicas são de suma importância para a correta interpretação da nova sistemática incorporada no sistema educativo:

um prazo até 2010 para que Municípios, Estados e o Distrito Federal imple-mentem as alterações decorrentes da nova legislação.

No que tange ao prazo de transição do período curricular, vale fazer a transcrição do artigo 5º da Lei 11.274/06, para que assim melhor se possa interpretá-lo:

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Art. 5º - Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal terão prazo até 2010 para implementar a obrigatoridade para o ensino fundamental disposto no ar-tigo 3º desta Lei e a abrangência da pré-escola de que trata o artigo 2º desta Lei.

Dessa forma, pode-se dizer que tal dispositivo vem assegurar ao Poder Público um prazo para a implementação da obrigatoriedade da matrícula aos seis anos, bem como ampliar o período de duração do ensino fundamental. É de se destacar que a garantia de um prazo para essas exigências é uma questão mais do que razoável, uma vez que implementação da matrícula aos seis anos e a ampliação do período de duração do ensino fundamental exigem do Poder Público atividades específicas, acarretando um aumento de despesas que não podem acontecer repentinamente e sem o devido respaldo legal.

Em sintonia com legislação federal, a Secretaria Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, mediante sua Secretária, Mariza Vasquez de Abreu, editou a Portaria 227/2007, que assim dispõe acerca do período de implantação do ensino fundamental:

Art. 2º - O ingresso no 1º ano do ensino fundamental de 9 (nove) anos letivos será assegurado para crianças nascidas até 28 de fevereiro de 2002, portanto, com 6 anos completos até o dia 28 de fevereiro de 2008.(...) § 2º As escolas estaduais que, por descumprimento das orientações da Se -cretaria de Estado da Educação emanadas em 2006, não oferecerem o 1º ano do ensino fundamental de 9 (nove) anos letivos em 2007, deverão oferecer, na existência de demanda para o ano letivo de 2008, vagas na primeira série do ensino fundamental de 8 (oito) anos letivos para crianças com 7 (sete) anos de idade ou mais.

Infere-se, daí, que tal orientação visa a evitar prejuízo às crianças que, no início de 2008, estejam com 7 (sete) anos de idade sem terem ingressado, no ano de 2007, em turmas do currículo de 9 (nove) anos de duração, cujo ingresso se dá a partir dos 6 (seis) anos de idade. Logo, o estabelecimento de ensino que implantou o ensino fundamental de 9 (nove) anos de duração no ano letivo de 2006 deve dar continuidade à oferta dos estudos do ensino fundamental de 8 (oito) anos para turmas ingressantes dos anos anteriores, mantendo a proposta pedagógica, o plano de estudos e o regimen-to escolar que está em vigência para o ensino fundamental de 8 (oito) anos de duração.

Em contrapartida, o estabelecimento de ensino que iniciou a oferta do ensino fun-damental de 9 (nove) anos, no ano de 2006, deve adotar a proposta adequada ao ensino fundamental de 9 (nove) anos, analisado e validado pelo Conselho Escolar.

Por oportuno, também cumpre referir trecho exarado no parecer 752/2005, que se manifesta sobre o ingresso obrigatório a partir dos 6 anos de idade no ensino funda-mental de nove anos de duração, assim redigido:

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O ensino fundamental de 8 (oito) anos deverá ser ampliado para o ensino fun-damental de 9 (nove) anos. Essa ampliação se efetivará de forma progressiva, a partir do ano letivo de 2006, sendo que o ensino fundamental de oito anos e o ensino fundamental de nove anos serão desenvolvidos de forma concomi-tante. Os alunos com 7 anos de idade completos até o início do ano letivo de 2006 deverão ser matriculados no 1º ano do ensino fundamental de oito anos. Os alunos com 6 anos de idade completos até o início do ano letivo de 2006 deverão ingressar no ensino fundamental de 9 anos.

Com relação à redução do critério etário exigido para o ingresso ao ensino funda-mental, e o conseqüente aumento do período do currículo escolar, é de ressaltar que um dos motivos que mais se destacaram entre os defensores de sua implantação vem calcado na idéia de que as crianças serão privilegiadas com a elevação do período escolar, aumentando e qualificando suas oportunidades de aprendizagem.

Segundo dados do IBGE apresentados (Pesquisa Nacional por Amostra de Domi-cílio, 2000), 81,7% das crianças de seis anos estão na escola, sendo que 38,9% freqüentam a educação infantil, 13,6% as classes de alfabetização e 29,6% o ensino fundamental. Ou seja, um quinto das crianças nessa faixa etária ainda não são atendi-das. A ampliação do ensino fundamental para nove anos diminuirá a exposição dessas crianças a situações de risco, promoverá sua permanência na escola, o sucesso no seu aprendizado e aumento de sua escolaridade.

Outra razão defendida está relacionada ao fato de que a educação infantil ainda não é obrigatoriamente exigida, razão pela qual inúmeras crianças carentes sem acesso às creches e pré-escolas ficariam um maior período fora das escolas. A crença, assim, é a de que a reorganização da proposta irá contribuir para que os economicamente menos privilegiados tenham as mesmas oportunidades.

Pode-se dizer, ademais, que a obrigatoriedade de ampliação do ensino funda-mental também tem por objetivo uniformizar o sistema de educação básica no país, onde coexistem escolas que oferecem ensino com duração de oito ou nove anos. Ainda, tal medida vai equiparar o sistema brasileiro ao dos outros países do Mer-cosul, onde a escolaridade obrigatória é de doze anos: nove do ensino fundamental mais três do ensino médio. Mas o mais importante é incluir as crianças que, sem a medida, estariam fora da escola.

Convém acentuar, a essa altura, que a elevação do período escolar para nove anos tem gerado dúvidas quanto ao conteúdo a ser desenvolvido no primeiro ano do ensino fundamental. Um dos questionamentos refere-se à incorporação do currículo do último ano do ensino infantil (pré-escola) ao ensino fundamental, fato que o tornaria obrigatório.

Embora a visão que se tenha de que último ano do ensino infantil incorporou à primeira série do ensino fundamental, ressalta-se que o Conselho Estadual de Edu-cação (Parecer 644/06), dispõe que “a partir do ano letivo de 2006, o ensino funda-mental de oito anos foi ampliado para nove anos de duração, com matrícula obriga-tória a partir dos seis anos de idade. A ampliação do ensino fundamental para nove

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anos alterou a organização da educação infantil e do ensino fundamental, que adotará a seguinte nomenclatura: - educação infantil de zero a 5 anos de idade: creche até três anos de idade; pré-escola de 4 a 5 anos de idade; ensino fundamental de 9 anos: com 5 anos de duração para anos iniciais, na faixa etária de 6 a 10 anos de idade, e com 4 anos de duração para os anos finais, na faixa etária de 11 a 14 anos de idade”.

O Conselho Estadual de Educação (Ceed) aprovou no dia 26 de outubro parecer no qual destaca que “o primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos deverá ser de-senvolvido como processo de aprendizagem de forma lúdica, respeitando a faixa etária das crianças, sua unicidade e sua lógica”. A presidente do Ceed, Sônia Veríssimo da Fonseca, lembra que a escola deve disponibilizar espaços, brinquedos, materiais didáti-cos e equipamentos que configurem o ambiente alfabetizador compatível com o desen-volvimento da criança nessa faixa etária e que a avaliação deve ser diagnóstica, voltada para o processo de alfabetização de forma contínua, sem a retenção do aluno. “A reali-dade mostra que muitos municípios e a iniciativa privada já incluem crianças de 6 anos no Ensino Fundamental. É preciso levar em conta um projeto pedagógico que valorize o letramento mas contemple acima de tudo a psicogênese dessas crianças”, aponta Sônia.

Aduz que o primeiro ano do ensino fundamental de nove anos tem por objetivo qualificar o ensino a aprendizagem dos conteúdos de alfabetização, em que pese não se restringir o desenvolvimento da criança de seis anos de idade exclusivamente à alfabetização. Entretanto, destaca-se que a alfabetização não deve ocorrer apenas no segundo ano do ensino fundamental, uma vez que o acesso à linguagem escrita é um direito de todas as crianças. Logo, o ensino fundamental de nove anos ampliou o tempo dos anos iniciais, de quatro para cinco anos, para dar à criança um período mais longo para as aprendizagens próprias desta fase, inclusive da alfabetização.

Nessa linha, o Parecer 644/2006 do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, prevê que:

9 – A partir do ano letivo de 2006, o ensino fundamental de oito anos foi ampliado para nove anos de duração, com matrícula obrigatória a partir dos seis anos de idade. A ampliação do ensino fundamental para nove anos alterou a organização da educação infantil e do ensino fundamental que adotará a seguinte nomenclatura:- educação infantil de zero a 5 anos de idade: creche até três anos de idade; pré-escola de 4 a 5 anos de idade;- ensino fundamental de 9 anos: com 5 anos de duração para anos iniciais, na faixa etária de 6 a 10 anos de idade, e com 4 anos de duração para os anos finais, na faixa etária de 11 a 14 anos de idade.10 - A criança matriculada na educação infantil, que está na faixa etária de zero a cinco anos de idade, ao completar seis anos de idade no início do ano letivo, ingressa no ensino fundamental de nove anos de duração. 11 - A criança que estiver cursando a educação infantil e que, no decorrer do ano completar seis anos de idade, deverá freqüentar a educação infantil até o final do ano letivo.

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(...) 14 – A ampliação do ensino fundamental para nove anos de duração será efetivada de forma progressiva, devendo o estabelecimento de ensino de-senvolver Plano de Estudos do Ensino fundamental de oito anos e o Plano de Estudos do ensino fundamental de nove anos, de forma concomitante, e administrar a convivência simultânea dessas duas ofertas.

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, não se destina a preparar

crianças para o ensino fundamental, já que têm objetivos próprios que devem ser al-cançados na perspectiva do desenvolvimento infantil.

Com relação às crianças que ainda não completaram os seis anos e têm intenção de ingressarem no ensino fundamental, salienta-se o fato trazido pela 9º Promotoria, referente às orientações da Secretaria Estadual de Educação no que tange aos métodos de avaliação para o acesso da criança no ensino fundamental antes da idade mínima exigida.

Em que pese a questão exigir situações excepcionais, à medida que requer aptidão e capacidade intelectual das crianças para o acesso ao ensino fundamental (com base no artigo 24, inciso III, alínea “c”, da LDB), é de ser salientado que a normativa ao estabelecer a idade mínima de 6 anos para o ingresso no ensino fundamental almejou que crianças abaixo dessa faixa etária permanecessem na pré-escola. Ao estabelecer a idade cronológica de 6 (seis) anos completos ou completar até o início do ano letivo, a legislação e as normas estabelecidas não se ocuparam, exclusivamente, com aspectos formais. Ocuparam-se, acima de tudo, com o direito da criança de ser criança, isto é, o direito da criança à educação infantil. Segundo o Conselho Nacional de Educação , a educação infantil deveria ser obrigatória, a fim de permitir um tratamento apropriado quando do seu ingresso na escola aos seis anos de idade para cursarem o ensino fun-damental ampliado para nove anos de duração.

A definição de tal idade mínima como indispensável para o início do ensino funda-mental não é arbitrária, pois leva em conta as fases do desenvolvimento normal da cri-ança, como esclarece o Conselho Nacional de Educação em seu Parecer n° 39/2006:

A principal atividade da criança até os seis anos é o brinquedo: é nele e por meio dele que ela vai se constituindo. Não se deve impor a seriedade e o rigor de horários de atividade de ensino para essa faixa etária. O trabalho com a criança até os seis anos de idade não é enformado pelo escolar, mas um espaço de convivência específica no qual o lúdico é o central. A Educação Infantil cuida das relações entre vínculos afetivos, compartilhamentos, interações entre as crianças pequenas, que precisam ser atendidas e compreendidas em suas especificidades, dando-se-lhes a oportunidade de ser criança e de viver essa faixa etária como criança. Por que diminuir esse tempo e forçar uma entrada prematura na escolari-dade formal? Não há ganhos nesse apressamento e, sim, perdas, muitas vezes irrecuperáveis: perda do seu espaço infantil e das experiências próprias e necessárias nessa idade.

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Sabe-se que, antes da ampliação em um ano do ensino fundamental (ou seja, na época em que o ingresso se dava aos sete anos de idade), compreendia o Ministério Público, de modo geral, que deveria ser assegurada vaga a toda criança que fosse completar sete anos durante o ano letivo, mesmo que, na data da matrícula, não tivesse ela a idade mínima exigida, em âmbito administrativo, pela Secretaria de Educação (normalmente seis anos e nove meses).

O objetivo era assegurar o direito à educação, pois as crianças não admitidas, já tendo completado a pré-escola (e ultrapassado, durante o ano letivo, a idade para esta), acabariam ficando simplesmente fora da escola. Como acima destacado, nessa época a LDB mencionava, com relação à idade mínima, apenas a obrigatoriedade de matrícula, pelos pais, aos sete anos, não vedando expressamente o ingresso em idade inferior, se esse fosse o desejo dos pais.

Dessa forma, várias ações foram ajuizadas, tanto no Rio Grande do Sul quanto em outros estados, buscando assegurar a matrícula a crianças com sete anos incompletos.

Agora, entretanto, com a ampliação do ensino fundamental para nove anos, e o ingresso na primeira série aos seis anos de idade, não se mostra apropriada a repetição, pelo Parquet, dos argumentos que fundamentavam tais ações, no sentido de que é pos-sível o ingresso da criança com idade inferior à prevista, pois a situação atual é outra.

De fato, estamos tratando, agora, de crianças com menos de seis anos quando da data da matrícula, portanto crianças muito novas, ainda em incipiente processo de sociali-zação e reduzida maturidade. Ora, quanto mais nova a criança, maiores os riscos de não adaptação ao ambiente escolar característico do ensino fundamental, onde a criança en-trará em contato com crianças mais velhas. As mudanças nessa época da vida são muito velozes e profundas, sendo que crianças de faixas etárias diferentes, ainda que próximas, podem apresentar níveis de desenvolvimento intelectual e emocional bastante distintos.

Em acréscimo, como antes destacado, a LDB agora fixa, em seu art. 32, a idade de seis anos como mínima para acesso, removendo a faculdade dos pais de matricular o filho antes disso, exigência que vem sendo reiterada pelos conselhos de educação.

Nesse sentido, em seu Parecer n° 18/2005, o Conselho Nacional de Educação estabeleceu “as condições para a matrícula de crianças de 6 (seis anos nas redes públicas: que tenham 6 (seis) anos completos ou que venham a completar seis anos no início do ano letivo”.

Da forma forma, o Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, no Parecer n° 644/2006, assim dispõe sobre a matéria:

10 - A criança matriculada na educação infantil, que está na faixa etária de zero a cinco anos de idade, ao completar seis anos de idade no início do ano letivo, ingressa no ensino fundamental de nove anos de duração. 11 - A criança que estiver cursando a educação infantil e que, no decorrer do ano completar seis anos de idade, deverá freqüentar a educação infantil até o final do ano letivo. (...) 17 – A implantação do ensino fundamental de nove anos de duração é obriga-

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tória a partir do ano letivo de 2006, considerando período de transição, para que as redes de ensino possam adaptar os seus critérios usuais de matrícula do ensino fundamental de oito anos de duração para a matrícula no ensino fundamental de nove anos de duração, com seis anos de idade.18 – No ano letivo de 2007, todas as crianças com seis anos de idade com-pletos até o início do ano letivo deverão ser matriculadas no 1º ano do ensino fundamental de nove anos de duração.

Diante disso, a exigência de que, para ingressar no ensino fundamental, a criança deverá contar com seis anos completos, ao menos até a data de início do ano letivo, deve ser mantida. Do contrário, poderão surgir situações graves de inadaptação envolvendo crianças novas demais para ingressar no ambiente do ensino fundamental, marcado por maiores restrições e pelo convívio com crianças mais velhas, perten-centes a séries mais avançadas.

Não obstante, situações pontuais podem ocorrem em que se evidencie a irrazoa-bilidade ou iniqüidade da aplicação, de forma literal e sem qualquer flexibilidade, da regra de seis anos de idade para ingresso, desde que demonstrada a inexistência de prejuízo à criança. Exemplo disso seria o caso de uma criança que completa seis anos uma semana após o início do ano letivo. Outro exemplo seria o de uma criança que já completou todas as fases da pré-escola, havendo demonstrações de que ela possui, de forma inequívoca, maturidade suficiente para ingressar na 1ª série. Nesses e em outros casos, poderia ser feita pela escola uma avaliação prévia, verificando a possibilidade ou conveniência da antecipação do ingresso.

Como se tratam, no entanto, de situações pontuais e excepcionais, definidas pelas condições pessoais de cada criança específica, não poderão tais hipóteses ser tuteladas de forma difusa ou coletiva. Não há viabilidade, por esse motivo, no enfrentamento de tais exceções mediante ações civis públicas promovidas pelo Ministério Público ou mesmo pelos demais legitimados para sua propositura. Pelo contrário, do ponto de vista coletivo lato sensu, o apropriado se mostra, como visto, a obediência da regra legal. Caberia, então, à família interessada em antecipar o ingresso do filho o ajuiza-mento da respectiva ação individual.

Outrossim, veja-se que, muito embora o direito à educação seja indisponível, ele não estará sendo suprimido, pois a criança de cinco anos que não puder ingressar no ensino fundamental deverá postular vaga na pré-escola.

Vale recordar, ainda, que a falta de vagas na pré-escola jamais deve ser motivo para o envio antecipado, em idade não recomendada, da criança ao ensino fundamen-tal. Tal deficiência na prestação do ensino infantil, infelizmente ainda comum, deve ser enfrentada através da ampliação do número de vagas na rede pública, se necessário via compromisso de ajustamento ou ação civil pública.

É o parecer. Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2008.

Mauro Luís Souza, Promotor de Justiça, Coordenador Substituto do CAO-IJ.

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e. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONA-LIDADE

RELATOR :MIN. RICARDO LEWANDOWSKIREQTE.(S) :GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SULADV.(A/S) :PGE-MS - RAFAEL COLDIBELLI FRANCISCO E OUTRO(A/S)

Trata-se de ação declaratória de constitucionalidade proposta pelo Governador do Estado de Mato Grosso do Sul, em que se objetiva a declaração de constitucionalidade dos artigos 24, II, 31 e 32, caput, da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação Nacional-LDB), com redação dada pela Lei 11.274/2006, in verbis:

Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organi-zada de acordo com as seguintes regras comuns:(...)II - a classificação em qualquer série ou etapa, exceto a primeira do ensino fundamental, pode ser feita:a) por promoção, para alunos que cursaram, com aproveitamento, a série ou fase anterior, na própria escola;b) por transferência, para candidatos procedentes de outras escolas;c) independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o grau de desenvolvimento e experiência do candi-dato e permita sua inscrição na série ou etapa adequada, conforme regula-mentação do respectivo sistema de ensino;(...)Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanha-mento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:(...).

Sustenta o requerente que o Tribunal de Justiça local tem, ordinariamente, em sede de mandados de segurança que tratam de limitação de matrícula no primeiro ano do ensino fundamental em unidades das redes públicas e particular de ensino, se manifestado favorável à tese de que a exigência de idade mínima de seis anos para ingresso no ensino fundamental atentaria contra a regra do art. 208, V, da Constituição Federal, que estabelece como dever do Estado a garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um.

Aduz, ainda, que o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, na mesma linha, “su-fragou decisões no sentido da inconstitucionalidade do requisito legal da idade mínima para ingresso no ensino fundamental” (fl. 13) Argumenta, entretanto, que essa exigência

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de idade mínima para o ingresso no ensino fundamental encontra respaldo nos citados artigos da LDB, que estipulam critérios exclusivamente cronológicos, relacionados à faixa etária, o que, segundo seu juízo, não contraria o Texto Constitucional.

Alega, nessa senda, que:

(...) a afirmação de que o progresso da criança deve ser condizente com a sua capacidade não implica ignorar que a educação é um sistema, e que a sua organização pode contemplar diversas formas de avaliação da capaci-dade individual(fl. 26).

Diz, mais, que o constituinte colocou o tema sob reserva legal ante a necessidade de edição de lei nacional acerca das diretrizes e bases da educação, o que, por conse-quência, não veda a possibilidade de eventual limitação ao direito ao acesso e à pro-gressão no sistema de ensino, desde que essa previsão legal condicionante se mostre razoável, como no caso.

Assim, a medida, à luz dos estudos pedagógicos, se revela necessária ao ade-quado aproveitamento de ambas as etapas do currículo escolar (educação infantil e ensino fundamental).

Pugna, por fim, pela declaração da constitucionalidade dos aludidos artigos do referido diploma legal, uma vez que a controvérsia “põe em risco a unidade e o desenvolvimento do sistema de ensino de nove anos de duração para a etapa ensino fundamental”.

Almeja a concessão de liminar para se impedir a proliferação de novas ações e, prin-cipalmente, de novas liminares a serem concedidas em sede de mandado de segurança.

Requer, dessa forma, sejam suspensos os julgamentos dos processos que envol-vam a aplicação dos atos normativos em questão, até seu julgamento definitivo.

Ao final, requer seja esta ação julgada procedente, declarando-se, assim, a cons-titucionalidade dos arts. 24, II, 31 e 32, caput, da Lei 9.394/1996. À fl. 149, requisitei prévias informações ao Ministro de Estado da Educação e determinei a abertura de vista ao Procurador-Geral da República, nos termos da Lei 9.868/1999.

A Procuradoria-Geral da República, por sua vez, manifestou-se pela extinção do processo, sem o seu julgamento de mérito, em parecer que traz a seguinte ementa (fls. 154-160):

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. DISPOSI-TIVOS DA LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIO-NAL – LDB. EXIGÊNCIA DE QUE A CRIANÇA TENHA SEIS ANOS DE IDADE PARA O INGRESSO NO ENSINO FUNDAMENTAL. PRELIMI-NAR. ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DO ART. 208, IV, DA LEI MAIOR, PELA EC 53/2006, POSTERIOR À PREVISÃO LEGAL INSERIDA NA LDB. MÉRITO. INTERPRETAÇÕES QUE PODEM SER EXTRAÍ-DAS DAS NORMAS OBJETO DA AÇÃO: (I) PARA EFETIVAÇÃO DA MATRÍCULA NO ENSINO FUNDAMENTAL, É NECESSÁRIO QUE A CRIANÇA POSSUA SEIS ANOS COMPLETOS NO INÍCIO DO ANO

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LETIVO (ÚNICA EXEGESE POSSÍVEL NA ÓTICA DO REQUE -RENTE); (II) BASTA QUE A CRIANÇA VENHA A COMPLETAR TAL IDADE AO LONGO DO ANO LETIVO. AMBAS AS INTERPRETAÇÕES SÃO POSSÍVEIS E CONSTITUCIONAIS. PARECER PELA EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO OU, SE ESTE FOR ALCANÇADO, PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

Às fls. 162-232, o Ministério da Educação prestou informações nas quais alegou, preliminarmente, a inexistência de controvérsia judicial e a aplicação da teoria da reserva do possível, e, no mérito, requereu a declaração de constitucionalidade dos arts. 24, II, 31 e 32, caput, todos da Lei 9.394/1996. No tocante à preliminar, extraio, por oportunos, os seguintes trechos:

A não utilização do requisito etário como forma de enquadramento da edu-cação básica, atrai a aplicabilidade da teoria da reserva do financeiramente possível, visto que o Estado estaria obrigado a realizar avaliações psico-pedagógicas específicas por experts em milhões de crianças para avaliar a capacidade intelectual, maturidade, desenvolvimento psicológico, dentre outros requisitos. (...)Em suma, seria necessária a alocação de recursos financeiros vultuosos do orçamento dos municípios, dos estados e da União com a finalidade de constituírem equipes multidisciplinares aptas a observarem em todos os casos específicos o devido enquadramento da criança na educação básica, sendo, consequentemente, imprescindível também a existência de comis-são avaliadora no âmbito das escolas públicas para analisar os pedidos de reavaliação a serem apresentados pelos pais irresignados com o resultado da primeira avaliação. Cumpre frisar que o critério cronológico como ins-trumento de definição dos estágios da educação básica não vulnera, dire -tamente ou indiretamente, qualquer dispositivo da Carta da República, uma vez que não impede o direito ao acesso à educação.Ao revés, as normas legais que são objetos da Ação Declaratória de cons-titucionalidade, apenas balizam o exercício do direito fundamental ora abordado, delineando a forma da sua concretização, não impedindo ou res-tringindo o acesso à educação.(...)(...) não merece ser conhecida a presente ação, sob pena de violação do princípio da separação de poderes, visto que a matéria em questão é afeta, tão somente, à implementação de políticas públicas.

É o breve relatório.

Passo a decidir.

Da atenta leitura das razões apresentadas pela requerente, não obstante a relevân-cia da controvérsia jurídica posta à apreciação desta Corte, não verifico, à primeira

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vista, a coexistência da plausibilidade do direito invocado e do risco de dano irrepe-rável pela demora no provimento da medida liminar, pressuposto indispensável à concessão da tutela de urgência.

Dos documentos acostados à inicial, não se pode concluir, de pronto, a ocorrência de generalização de decisões em que se questiona a legitimidade constitucional dos dispositivos sub examen ou mesmo de julgados em que sua incidência seja afastada. Portanto, neste juízo perfunctório, próprio deste momento processual, analisada a questão sob o ângulo da prudência, entendo que, na espécie, não se afigura a urgên-cia necessária a se cogitar do efeito inerente à concessão da medida cautelar na ação declaratória de constitucionalidade, qual seja, a determinação de suspensão do jul-gamento de todos os processos que envolvam a aplicação dos artigos 24, II, 31 e 32, caput, da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), com redação dada pela Lei 11.274/2006, objeto desta ação, até que sobrevenha a análise de seu mérito.

Isso posto, indefiro o pedido de medida liminar.

Solicitem-se informações ao Superior Tribunal de Justiça, bem como aos Tribu-nais de Justiça dos Estados de Mato Grosso do Sul, do Paraná, de São Paulo, do Amazonas e da Bahia, acerca da aplicação do dispositivo questionado nesta ação de-claratória de constitucionalidade no âmbito de sua jurisdição, no prazo de 30 (trinta) dias, nos termos do art. 20, §§ 2º e3º, da Lei 9.868/1999.

Publique-se.Brasília, 17 de dezembro de 2010.Ministro RICARDO LEWANDOWSKI- Relator -

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2. OS DOCUMENTOS LEGAIS: LEIS, DECRETOS, RESOLUÇÕES SOBRE A TEMÁTICA

a. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – ARTIGOS REFERENTES AO DI-REITO À EDUCAÇÃO

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a mo-radia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infân-cia, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010)

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovi-da e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; (Redação dada pela Emenda Cons-titucional nº 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 59, de 2009)II - progressiva universalização do ensino médio gratuito; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didáticoescolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (Redação dada pela Emenda Constitu-cional nº 59, de 2009)§ 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.§ 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.§ 3º - Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino funda-mental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao ado-lescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liber-dade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Alterado pela EC-000.065-2010)

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b. LEI 12.796/2013 QUE ALTERA ARTIGOS DA LDBEN 9394/96

LEI Nº 12.796, DE 4 DE ABRIL DE 2013Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e

bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da edu-cação e dar outras providências.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações:

Art. 3o ......................................................................................................................................................................... XII - consideração com a diversidade étnico-racial.” (NR) “Art. 4o .......................................................................... I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte forma: a) pré-escola; b) ensino fundamental; c) ensino médio; II - educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco) anos de idade; III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades, preferen-cialmente na rede regular de ensino; IV - acesso público e gratuito aos ensinos fundamental e médio para todos os que não os concluíram na idade própria;.............................................................................................. VIII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;....................................................................................” (NR) “Art. 5º O acesso à educação básica obrigatória é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, or-ganização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo. § 1o O poder público, na esfera de sua competência federativa, deverá: I - recensear anualmente as crianças e adolescentes em idade escolar, bem como os jovens e adultos que não concluíram a educação básica;....................................................................................” (NR) “Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos de idade.” (NR) “Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte

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diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos....................................................................................” (NR) “Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.” (NR) “Art. 30. ...................................................................................................................................................................... II - pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade.” (NR) “Art. 31. A educação infantil será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: I - avaliação mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento das crianças, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fun-damental; II - carga horária mínima anual de 800 (oitocentas) horas, distribuída por um mínimo de 200 (duzentos) dias de trabalho educacional; III - atendimento à criança de, no mínimo, 4 (quatro) horas diárias para o turno parcial e de 7 (sete) horas para a jornada integral; IV - controle de frequência pela instituição de educação pré-escolar, exigida a frequência mínima de 60% (sessenta por cento) do total de horas; V - expedição de documentação que permita atestar os processos de desen-volvimento e aprendizagem da criança.” (NR) “Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a mo-dalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desen-volvimento e altas habilidades ou superdotação....................................................................................” (NR) “Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com deficiên-cia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou super-dotação:...................................................................................” (NR) “Art. 60. ....................................................................... Parágrafo único. O poder público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo.” (NR) “Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em uni-versidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na mo-dalidade normal............................................................................................... § 4º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios adotarão mecani-smos facilitadores de acesso e permanência em cursos de formação de do -

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centes em nível superior para atuar na educação básica pública. § 5o A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios incentivarão a formação de profissionais do magistério para atuar na educação básica pública mediante programa institucional de bolsa de iniciação à docência a estudantes matriculados em cursos de licenciatura, de graduação plena, nas instituições de educação superior. § 6o O Ministério da Educação poderá estabelecer nota mínima em exame nacional aplicado aos concluintes do ensino médio como pré-requisito para o ingresso em cursos de graduação para formação de docentes, ouvido o Con-selho Nacional de Educação - CNE. § 7o (VETADO).” (NR) “Art. 62-A. A formação dos profissionais a que se refere o inciso III do art. 61 far-se-á por meio de cursos de conteúdo técnico-pedagógico, em nível médio ou superior, incluindo habilitações tecnológicas. Parágrafo único. Garantir-se-á formação continuada para os profissionais a que se refere o caput, no local de trabalho ou em instituições de educação básica e superior, incluindo cursos de educação profissional, cursos superi-ores de graduação plena ou tecnológicos e de pós-graduação.” “Art. 67. ...................................................................................................................................................................... § 3º A União prestará assistência técnica aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios na elaboração de concursos públicos para provimento de cargos dos profissionais da educação.” (NR) “Art. 87. ..................................................................................................................................................................... § 2º (Revogado). § 3o ............................................................................... I - (revogado);.............................................................................................. § 4º (Revogado)....................................................................................” (NR) “Art. 87-A. (VETADO).” Art. 2o Revogam-se o § 2º, o inciso I do § 3º e o § 4o do art. 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 4 de abril de 2013; 192o da Independência e 125o da República.

DILMA ROUSSEFFAloizio Mercadante

c. RESOLUÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

RESOLUÇÃO N° 01, de 14 de janeiro de 2010

Define Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.

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O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, em conformidade com o disposto na alínea “c” do § 1º do artigo 9º da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, bem como no § 1º do artigo 8º, no § 1º do artigo 9º e no artigo 90 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 22/2009, homologado por despacho do Senhor Ministro da Educação, publicado no DOU de 11 de janeiro de 2010, resolve:

Art. 1º Os entes federados, as escolas e as famílias devem garantir o atendimento do direito público subjetivo das crianças com 6 (seis) anos de idade, matriculando-as e mantendo-as em escolas de Ensino Fundamental, nos termos da Lei nº 11.274/2006.

Art. 2º Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter 6 (seis) anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

Art. 3º As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida no artigo 2º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.

Art. 4º Os sistemas de ensino definirão providências complementares de ade-quação às normas desta Resolução em relação às crianças matriculadas no Ensino Fundamental de 8 (oito) anos ou de 9 (nove) anos no período de transição definido pela Lei nº 11.274/2006 como prazo legal de implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.

§ 1º As escolas de Ensino Fundamental e seus respectivos sistemas de ensino que matricularam crianças que completaram 6 (seis) anos de idade após a data em que se iniciou o ano letivo devem, em caráter excepcional, dar prosseguimento ao percurso educacional dessas crianças, adotando medidas especiais de acompanhamento e avali-ação do seu desenvolvimento global.

§ 2º As crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário, que no seu percurso educacional estiveram matriculadas e frequentaram por mais de 2 (dois) anos a Pré-Escola, poderão, em caráter excepcional, no ano de 2010, prosseguir no seu percurso para o Ensino Fundamental.

Art. 5º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

CESAR CALLEGARI

RESOLUÇÃO Nº 5, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2009 (*)

Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art. 9º, § 1º, alínea “c” da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, e tendo em vista o Parecer CNE/CEB nº 20/2009, homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação, publicado no DOU de 9 de dezembro de 2009, resolve:

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Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil a serem observadas na organização de propostas pedagógicas na Educação Infantil.

Art. 2º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil articulam-se com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e reúnem princípios, fundamentos e procedimentos definidos pela Câmara de Educação Básica do Con-selho Nacional de Educação, para orientar as políticas públicas na área e a elaboração, planejamento, execução e avaliação de propostas pedagógicas e curriculares.

Art. 3º O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade.

Art. 4º As propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura.

Art. 5º A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, é oferecida em creches e pré-escolas, as quais se caracterizam como espaços institucionais não do-mésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social.

§ 1º É dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade, sem requisito de seleção.

§ 2° É obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

§ 3º As crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março devem ser matricu-ladas na Educação Infantil.

§ 4º A frequência na Educação Infantil não é pré-requisito para a matrícula no Ensino Fundamental.

§ 5º As vagas em creches e pré-escolas devem ser oferecidas próximas às residên-cias das crianças.

§ 6º É considerada Educação Infantil em tempo parcial, a jornada de, no mínimo, quatro horas diárias e, em tempo integral, a jornada com duração igual ou superior a sete horas diárias, compreendendo o tempo total que a criança permanece na instituição.

Art. 6º As propostas pedagógicas de Educação Infantil devem respeitar os seguintes princípios:

I – Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades.

II – Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática.

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III – Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais.

Art. 7º Na observância destas Diretrizes, a proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve garantir que elas cumpram plenamente sua função socio-política e pedagógica:

I - oferecendo condições e recursos para que as crianças usufruam seus direitos civis, humanos e sociais;

II - assumindo a responsabilidade de compartilhar e complementar a educação e cuidado das crianças com as famílias;

III - possibilitando tanto a convivência entre crianças e entre adultos e crianças quantoa ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas;IV - promovendo a igualdade de oportunidades educacionais entre as crianças de

diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às possibili-dades de vivência da infância;

V - construindo novas formas de sociabilidade e de subjetividade comprometidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com o rompimento de relações de dominação etária, socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional, linguística e religiosa.

Art. 8º A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve ter como objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças.

§ 1º Na efetivação desse objetivo, as propostas pedagógicas das instituições de Educação Infantil deverão prever condições para o trabalho coletivo e para a organi-zação de materiais, espaços e tempos que assegurem:

I - a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo indisso-ciável ao processo educativo;

II - a indivisibilidade das dimensões expressivo-motora, afetiva, cognitiva, lin-guística, ética, estética e sociocultural da criança;

III - a participação, o diálogo e a escuta cotidiana das famílias, o respeito e a valo-rização de suas formas de organização;

IV - o estabelecimento de uma relação efetiva com a comunidade local e de mecani-smos que garantam a gestão democrática e a consideração dos saberes da comunidade;

V - o reconhecimento das especificidades etárias, das singularidades individuais e coletivas das crianças, promovendo interações entre crianças de mesma idade e crianças de diferentes idades;

VI - os deslocamentos e os movimentos amplos das crianças nos espaços internos e externos às salas de referência das turmas e à instituição;

VII - a acessibilidade de espaços, materiais, objetos, brinquedos e instruções para as crianças com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habili-dades/superdotação;

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VIII - a apropriação pelas crianças das contribuições histórico-culturais dos povos indígenas, afrodescendentes, asiáticos, europeus e de outros países da América;

IX - o reconhecimento, a valorização, o respeito e a interação das crianças com as histórias e as culturas africanas, afro-brasileiras, bem como o combate ao racismo e à discriminação;

X - a dignidade da criança como pessoa humana e a proteção contra qualquer forma de violência – física ou simbólica – e negligência no interior da instituição ou praticadas pela família, prevendo os encaminhamentos de violações para instâncias competentes.

§ 2º Garantida a autonomia dos povos indígenas na escolha dos modos de edu-cação de suas crianças de 0 a 5 anos de idade, as propostas pedagógicas para os povos que optarem pela Educação Infantil devem:

I - proporcionar uma relação viva com os conhecimentos, crenças, valores, concepções de mundo e as memórias de seu povo;

II - reafirmar a identidade étnica e a língua materna como elementos de constituiçãodas crianças;

III - dar continuidade à educação tradicional oferecida na família e articular-se àspráticas sócio-culturais de educação e cuidado coletivos da comunidade;IV - adequar calendário, agrupamentos etários e organização de tempos, ativi-

dades e ambientes de modo a atender as demandas de cada povo indígena.§ 3º - As propostas pedagógicas da Educação Infantil das crianças filhas de agri-

cultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da reforma agrária, quilombolas, caiçaras, povos da floresta, devem:

I - reconhecer os modos próprios de vida no campo como fundamentais para a constituição da identidade das crianças moradoras em territórios rurais;

II - ter vinculação inerente à realidade dessas populações, suas culturas, tradições e identidades, assim como a práticas ambientalmente sustentáveis;

III - flexibilizar, se necessário, calendário, rotinas e atividades respeitando as diferenças quanto à atividade econômica dessas populações;

IV - valorizar e evidenciar os saberes e o papel dessas populações na produção de conhecimentos sobre o mundo e sobre o ambiente natural;

V - prever a oferta de brinquedos e equipamentos que respeitem as características ambientais e socioculturais da comunidade.

Art. 9º As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira, garantindo experiências que:

I - promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de ex-periências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança;

II - favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical;

III - possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação

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com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos;

IV - recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quantitativas, medidas, formas e orientações espaçotemporais;

V - ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades individuais e coletivas;

VI - possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração da auto-nomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-organização, saúde e bem-estar;

VII - possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos cul-turais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no diálogo e recon-hecimento da diversidade;

VIII - incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza;

IX - promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança, teatro, poesia e literatura;

X - promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento da biodi-versidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não desperdício dos recursos naturais;

XI - propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifestações e tradições culturais brasileiras;

XII - possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores, máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos.

Parágrafo único - As creches e pré-escolas, na elaboração da proposta curricular, de acordo com suas características, identidade institucional, escolhas coletivas e ar-ticularidades pedagógicas, estabelecerão modos de integração dessas experiências.

Art. 10. As instituições de Educação Infantil devem criar procedimentos para acompanhamento do trabalho pedagógico e para avaliação do desenvolvimento das crianças, sem objetivo de seleção, promoção ou classificação, garantindo:

I - a observação crítica e criativa das atividades, das brincadeiras e interações das crianças no cotidiano;

II - utilização de múltiplos registros realizados por adultos e crianças (relatórios, fotografias, desenhos, álbuns etc.);

III - a continuidade dos processos de aprendizagens por meio da criação de estra-tégias adequadas aos diferentes momentos de transição vividos pela criança (transição casa/instituição de Educação Infantil, transições no interior da instituição, transição creche/pré-escola e transição pré-escola/Ensino Fundamental);

IV - documentação específica que permita às famílias conhecer o trabalho da ins-tituição junto às crianças e os processos de desenvolvimento e aprendizagem da cri-ança na Educação Infantil;

V - a não retenção das crianças na Educação Infantil.

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Art. 11. Na transição para o Ensino Fundamental a proposta pedagógica deve prever formas para garantir a continuidade no processo de aprendizagem e desen-volvimento das crianças, respeitando as especificidades etárias, sem antecipação de conteúdos que serão trabalhados no Ensino Fundamental.

Art. 12. Cabe ao Ministério da Educação elaborar orientações para a implemen-taçãodessas Diretrizes.

Art. 13. A presente Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, revogan-do-se as disposições em contrário, especialmente a Resolução CNE/CEB nº 1/99.

CESAR CALLEGARI

d. NOTA TÉCNICA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

NOTA TÉCNICA DE ESCLARECIMENTO SOBRE A MATRÍCULA DE CRI-ANÇAS DE 4 ANOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E DE 6 ANOS NO ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS

(Aprovada por unanimidade pela Câmara de Educação Básica, em 5 de junho de 2012)Preliminarmente, é oportuno reafirmar que a Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional), em sua versão original, caracterizava, no seu art. 32, “o Ensino Fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública”. Nas Disposições Transitórias da mesma Lei, no caput do art. 87 e seu inciso I, definia que “cada Município, e supletivamente o Estado e a União, deverá matricular todos os educandos a partir dos sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis anos, no Ensino Fundamental”. A norma da LDB, obedecendo ao man-dato constitucional, é clara: a obrigação do estado brasileiro é a de garantir a matrícula no Ensino Fundamental de 8 anos a todos os educandos, a partir dos 7 anos de idade. A matrícula a partir dos 6 anos era facultativa, caso os sistemas e estabelecimentos de ensino tivessem condições para tanto. O acesso ao Ensino Fundamental obrigatório, esse sim, nos termos do art. 5º da mesma LDB, é caracterizado como “direito público subjetivo”, atendendo ao mandato § 1º do art. 208 da Constituição Federal. Por isso mesmo, de acordo com o § 1º e inciso I do mesmo art. 5º da LDB “compete aos Esta-dos e Municípios, em regime de colaboração e com a assistência da União, recensear a população em idade escolar para o Ensino Fundamental.” A seguir, o inciso II do mesmo artigo registra a competência de “fazer-lhes a chamada pública” e o inciso III, a de “zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola”.

A Lei nº 11.114/2005 alterou a redação do referido art. 32 da LDB, tornando o Ensino Fundamental “obrigatório e gratuito na escola pública, a partir dos seis anos de idade”. Nova redação dada ao mesmo artigo pela Lei nº 11.274/2006 caracteriza “o Ensino Fundamental obrigatório, com duração de nove anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos seis anos de idade”. Por sua vez, alterações promovidas no art. 87 da LDB, inicialmente pela Lei nº 11.114/2005 e, posteriormente, pelas Leis nº 11.274/2006 e nº 11.330/2006, definem simplesmente que “o Distrito Federal, cada

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Estado e Município e, supletivamente, a União, devem matricular todos os educandos, a partir dos seis anos de idade, no Ensino Fundamental”, isto é, no Ensino Fundamen-tal de 9 anos.

Em relação às normas constitucionais para a Educação Infantil, de acordo com a Emenda Constitucional nº 14/96, que alterou o § 2º do art. 211 da Constituição Fede-ral, “os Municípios atuarão prioritariamente no Ensino Fundamental e na Educação Infantil”. De acordo com a Emenda constitucional nº 53/2006, que alterou o inciso IV do art. 208, é dever do estado brasileiro garantir a “Educação Infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 anos de idade”. Finalmente, a Emenda Constitucional nº 59//2009, ao alterar o inciso I do art. 208 da Constituição Federal, define que é dever do estado brasileiro garantir a “Educação Básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria”. Essa nova redação dada ao art. 208, portanto, ampliou significativamente o âmbito do “direito público subjetivo”, em termos de “acesso ao ensino obrigatório e gratuito” definido no § 1º do referido art. 208.

A Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, na qualidade de órgão normativo da estrutura educacional brasileira, definido pelo § 1º do art. 9º da LDB, criado como tal pela Lei nº 9.131/95, que alterou dispositivos da Lei nº 4.24/61, imediatamente após a promulgação das referidas Leis nº 11.114/2005, nº 11.274/2006 e nº 11.330/206, definiu as primeiras orientações curriculares aos sistemas e estabele-cimentos de ensino para a organização da oferta desse novo Ensino Fundamental de 9 anos e seus consequentes reflexos na organização da oferta da Educação Infantil, especialmente na sua etapa de pré-escola. Assim, foram emitidos os Pareceres CNE/CEB nº 6/2005 e nº 39/2006, bem como a Resolução CNE/CEB nº 3/2005.

Esses atos normativos cumprem os mandamentos legais da Lei nº 9.131/95, bem como do § 1º do art. 8º da LDB, que atribui à União a incumbência de “coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas e exe -rcendo função normativa...”, e ainda do art. 90 da mesma Lei, o qual define que “as questões suscitadas na transição entre o regime anterior e o que se institui nesta Lei serão resolvidas pelo Conselho Nacional de Educação...”.

A Lei de criação do Conselho Nacional de Educação atribui claramente à sua Câmara de Educação Básica, na alínea “c” do § 1º do seu art. 9º, a incumbência de “deliberar sobre as Diretrizes Curriculares propostas pelo MEC”, na condição de órgão normativo da estrutura educacional, cumprindo a tarefa de “coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa”, conforme o § 1º do art. 8º da LDB. Cumprindo esse mandamento legal, presente em sua lei de criação e na LDB vigente, esta Câmara definiu novas Diretrizes Curriculares Nacionais, tanto para a Educação Infantil, quanto para o Ensino Fundamental de 9 anos.

Entretanto, considerando que o inciso IV do art. 9º da LDB define que a União “incumbir-se-á de estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a Educação Infantil, o Ensino Fun-damental e o Ensino Médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos,

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de modo a assegurar formação básica comum”, as Diretrizes Curriculares Nacionais foram definidas pela Câmara de Educação Básica após muito estudo e debate com os órgãos técnicos do Ministério da Educação e as instâncias normativas dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, representados pelo Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação e pela União Nacional de Conselhos Municipais de Educação, bem como, também, com a representação direta dos pró -prios Conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como com a participação de representantes do Conselho Nacional de Secretários Es-taduais de Educação e da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação.

Nesse sentido, tanto as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infan-til, definidas pela Resolução CNE/CEB nº 5/2009, com base no Parecer CNE/CEB nº 20/2009, quanto as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamen-tal de 9 anos, definidas pela Resolução CNE/CEB nº 7/2010, com base no Parecer CNE/CEB nº 11/2010, foram precedidas de inúmeras audiências públicas nacionais, as quais contaram com ampla participação dos Conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como com significativa representação de professores e dirigentes de ensino e representações de secretários estaduais e dirigen-tes municipais de educação.

É oportuno ressaltar que todos esses atos normativos da Câmara de Educação Básica, desde 2006, são absolutamente coerentes e culminaram com Resoluções que fixaram, nos termos legais, Diretrizes Curriculares Nacionais, estabelecendo, coeren -temente, a data de corte do dia 31 de março do ano em que o educando realiza sua matrícula inicial com 4 anos na pré-escola ou com 6 anos no Ensino Fundamental de 9 anos. Esta decisão foi tomada pela Câmara de Educação Básica, considerando todas as orientações anteriores, desde 2005 e 2006, referentes ao “início do ano letivo”. Esta expressão, que soara tão clara para a CEB, entretanto, acabou não merecendo trata-mento equânime por parte de todos os sistemas e estabelecimentos de ensino. Houve sistema de ensino que interpretou a expressão utilizada pela CEB de uma forma ex-cessivamente extensa, considerando como “início de ano letivo” todo o primeiro se-mestre do ano. Por mais incrível que possa parecer, também houve quem encontrasse para essa expressão um sentido ainda mais lato, contrariando frontalmente os manda-mentos da Constituição Federal e da LDB.

Outro fato relevante, que é oportuno destacar, é o de que os Conselheiros Adeum Hilário Sauer e Francisco Aparecido Cordão, representando a Câmara de Educação; a Conselheira Maria Beatriz Luce e o Conselheiro Paulo Speller, pela Câmara de Educação Superior, têm representado o Conselho Nacional de Educação nas reuniões do MERCOSUL Educacional e trabalhado, sobretudo, com as tabelas de equivalência de estudos da Educação Básica entre os diversos Países Membros e Associados do MERCOSUL. Neste particular, no que se refere à matrícula inicial na pré-escola e no Ensino Fundamental, respectivamente, aos 4 anos e aos 6 anos de idade, praticamente todos os países envolvidos adotam o dia 31 de março como a data de corte para finali-zação das matrículas e efetivo início do ano civil escolar. A adoção dessa mesma data facilita sobremaneira o trânsito de alunos entre os seus diversos países.

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As Resoluções CNE/CES nº 1/2010 e nº 6/2010, por sua vez, são reflexos dire-tos da morosidade com que as citadas decisões normativas do Conselho Nacional de Educação foram aplicadas nas diversas Unidades da Federação. Assim, de comum acordo com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC), com o Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação (FNCEE), com a União Nacional de Conselhos Municipais de Educação (UNCME), bem como com a efetiva participação do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (CONSED) e da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), foram defi-nidas Diretrizes Operacionais específicas para a implantação do Ensino Fundamental de 9 anos pela Resolução CNE/CEB nº 1/2010, com base no Parecer CNE/CEB nº 22/2009. Posteriormente, atendendo solicitações específicas formuladas por alguns sistemas de ensino, em nome do regime de colaboração definido no art. 8º da LDB e sensível às ocorrências e necessidades próprias derivadas de esforços de adaptação e de transição para os novos marcos regulatórios, novas Diretrizes Operacionais especí-ficas acabaram sendo definidas pela Câmara de Educação Básica para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil, ampliando o prazo de transição anteri-ormente definido por força da Resolução CNE/CEB nº 6/2010, com base no Parecer CNE/CEB nº 12/2010.

Essas Diretrizes Operacionais foram definidas para ajustar o compasso entre as matrículas iniciais ocorridas na Educação Infantil e no Ensino Fundamental de nove anos. Com esta última Resolução, concluiu-se uma importante fase de definição do marco regulatório nacional para orientar os sistemas e estabelecimentos de ensino na implantação do Ensino Fundamental de 9 anos no Brasil, em regime de colaboração com todos os entes federados. Tanto assim, que as famílias, as escolas, as redes e os sistemas de ensino, em sua esmagadora maioria, já se organizaram diante do novo marco regulatório, em regime de colaboração com o Ministério da Educação e com os diversos Conselhos e Secretarias de Educação das diferentes Unidades da Federação. Neste sentido, entendemos que seria prestar um enorme desserviço à educação bra-sileira e um desrespeito a esses esforços empreendidos, retroceder a um novo quadro de desalinhamento e de anarquia institucional, que acaba favorecendo muito mais uma competição espúria por matrículas, a qual é praticada em algumas poucas escolas e redes de ensino, prioritariamente privadas. As redes públicas de ensino praticamente já se alinharam ao novo marco regulatório definido no período de 2005 e 2006 até o período de 2010 a 2012. Houve tempo mais do que suficiente para o alinhamento e o ajuste a esse novo marco regulatório que envolve, não mais um Ensino Funda-mental de 8 anos, iniciado aos 7 anos de idade e sim a um Ensino Fundamental de 9 anos, iniciado aos 6 anos de idade. Essa é a nova norma da LDB, fundamentada nos citados mandamentos constitucionais, legalmente interpretada pela Câmara de Educação Básica.

A bem da verdade, são essas escolas públicas que, efetivamente, estão de-senvolvendo um enorme esforço para garantir o pleno cumprimento do direito público universal e obrigatório que todas as crianças brasileiras têm quanto a receber uma Educação Básica de qualidade, que lhes é garantida pelo inciso VII do

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art. 206 da Constituição Federal e pelo inciso IX do art. 3º da LDB. Esta é a dimen-são do direito público subjetivo (Cf. § 1º do art. 208 da Constituição Federal e art. 5º da LDB) que deve ser garantida como “obrigatória e gratuita, dos 4 aos 17 anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria” (inciso I do art. 208 da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 59/2009). É isto que deve ser garantido para todos e cada um dos cidadãos brasileiros – esta é a nossa meta e o nosso desafio. A resistência às medidas adotadas por esta Câmara de Educação Básica, felizmente, atinge um número muito pequeno de pais ou responsáveis que insistem em querer adiantar a fase de escolarização de seus rebentos, sem maiores preocupações em relação ao seu amadurecimento pessoal para ingresso na fase eminentemente esco-lar, no Ensino Fundamental de 9 anos, sem a necessária prontidão para a aprendi-zagem. Esta Câmara de Educação Básica tem perfilhado caminho diverso, de modo especial, desde a aprovação do Parecer CNE/CEB nº 4/2008, o qual reafirma, entre outros, os seguintes princípios:

O Ensino Fundamental ampliado para nove anos de duração é um novo En-sino Fundamental, que exige um projeto político-pedagógico próprio, para ser desenvolvido em cada escola. O Ensino Fundamental de nove anos, de matrícula obrigatória para crianças a partir dos seis anos – completos ou a completar até o início do ano letivo – deverá ser adotado por todos os sis-temas de ensino, até o ano letivo de 2010, o que significa dizer que deverá estar planejado e organizado até 2009, para que ocorra sua implementação no ano seguinte. A organização do Ensino Fundamental com nove anos de duração supõe, por sua vez, a reorganização da Educação Infantil, particu-larmente da Pré-Escola, destinada, agora, a crianças de 4 e 5 anos de idade, devendo ter assegurada a sua própria identidade. O antigo terceiro período da Pré-Escola não pode se confundir com o primeiro ano do Ensino Funda-mental, pois esse primeiro ano é agora parte integrante de um ciclo de três anos de duração, que poderíamos denominar de “ciclo da infância”. (...) Os três anos iniciais são importantes para a qualidade da Educação Básica. Vol-tados à alfabetização e ao letramento, é necessário que a ação pedagógica assegure, nesse período, o desenvolvimento das diversas expressões e o aprendizado das áreas de conhecimento estabelecidas nas Diretrizes Cur-riculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Dessa forma, entende-se que a alfabetização dar-se-á nos três anos iniciais do Ensino Fundamental. A avaliação, tanto no primeiro ano do Ensino Fundamental, com as crianças de seis anos de idade, quanto no segundo e no terceiro anos, com as crianças de sete e oito anos de idade, tem de observar alguns princípios essenciais. A avaliação tem de assumir forma processual, participativa, formativa, cumu-lativa e diagnóstica e, portanto, redimensionadora da ação pedagógica. A avaliação nesses três anos iniciais não pode repetir a prática tradicional limi-tada a avaliar apenas os resultados finais traduzidos em notas ou conceitos. A avaliação, nesse bloco ou ciclo, não pode ser adotada como mera verifi-cação de conhecimentos visando ao caráter classificatório. É indispensável a elaboração de instrumentos e procedimentos de observação, de acompa -

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nhamento contínuo, de registro e de reflexão permanente sobre o processo de ensino e de aprendizagem. A avaliação, nesse período, constituir-se-á, também, em um momento necessário à construção de conhecimentos pelas crianças no processo de alfabetização.

Estes princípios seguem a mesma linha de orientação já presente na conclusão do Parecer CNE/CEB nº 39/2006, no sentido de que, para além do formalismo da data de corte adotada, seja a do “início do ano letivo” ou, com maior clareza, a data do dia 31 de março, o que importa, sobretudo, é garantir à criança o direito de ser criança e de ser escolarizada na idade correta. Por isso mesmo, esta Câmara de Educação Básica definiu, após realização de diversas audiências públicas nacionais, claras e consisten-tes Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, assim entendida como etapa inicial da Educação Básica, e para o Ensino Fundamental, núcleo central da Educação Básica, agora estruturado com 9 anos de duração, o qual terá como sua etapa de aprofundamento e consolidação o Ensino Médio que, articulando as dimen-sões de educação, trabalho, ciência, cultura e tecnologia, conclui essa importante fase de preparação básica do educando para o trabalho e a cidadania, para continuar apren-dendo e se aprimorando como pessoa humana.

Quanto às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, a Resolução CNE/CEB nº 5/2009 estabelece que suas propostas pedagógicas devam “considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultu-ra”. Neste contexto, a Resolução define que a Educação Infantil, como etapa inicial da Educação Básica, é concluída na pré-escola, com matrícula aos 4 e aos 5 anos de idade, devendo ser matriculadas no Ensino Fundamental de 9 anos as crianças que completarem 6 anos de idade até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. Quem completar 6 anos de idade após essa data, continuará tendo a sua matrícula garantida na pré-escola, já que o período da Educação Básica obrigatória e gratuita tem início aos 4 anos de idade, na etapa da pré-escola, até os 5 anos de idade, nos termos do inciso IV do art. 208 da Constituição Federal. Para tanto, inclusive, a Reso-lução CNE/CEB nº 5/2009 determina que, na transição para o Ensino Fundamental, a proposta pedagógica da Educação Infantil na etapa da pré-escola, deve prever formas para garantir a continuidade no processo de aprendizagem e desenvolvimento das cri-anças, respeitando as especificidades etárias, sem antecipação de conteúdos que serão trabalhados especificamente no Ensino Fundamental.

As Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental “obrigatório com duração de 9 anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 anos de idade”, foram defi-nidas pela Resolução CNE/CEB nº 7/2010, com o objetivo de orientar os sistemas e estabelecimentos de Ensino Fundamental para o desenvolvimento do educando, assegurando-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecendo-lhe os meios necessários para progredir no trabalho e em estudos posteri-

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ores, mediante os seguintes objetivos previstos para esta etapa da escolarização pelo artigo 32 da LDB: “desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, das artes, da tecnologia e dos valores em que se fundamenta a sociedade; aquisição de conhecimentos e habilidades, e a formação de atitudes e valores como instrumentos para uma visão crítica do mundo; o fortale-cimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social”.

Também em relação à matrícula inicial nessa importante etapa da Educação Básica, as referidas Diretrizes Curriculares Nacionais determinam que ela deverá ser efetivada apenas para crianças que completarem seus 6 anos de idade até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula no Ensino Fundamental de 9 anos. Aquelas que completarem 6 anos após essa data, serão matriculadas na Educação Infantil, na etapa da pré-escola, tal como já foi orientado pelas Diretrizes Curricu-lares Nacionais para a Educação Infantil.

As questionadas Diretrizes Operacionais, definidas pelas Resoluções CNE/CEB nº 1/2010 e nº 6/2010, tão somente reafirmam essa mesma orientação das Diretrizes Curriculares Nacionais que foram definidas, respectivamente, pela Resolução CNE/CEB nº 5/2009, para a Educação Infantil, e pela Resolução CNE/CEB nº 7/2010, para o Ensino Fundamental de 9 anos.

Finalmente, sobre este assunto, é sempre oportuno ressaltar que qualquer “data de corte” sempre pode ser questionada por aqueles que se sentirão prejudicados porque a data escolhida foi a do dia anterior daquela que eles queriam que fosse definida para melhor atender aos seus interesses pessoais. Este questionamento faz parte do universo de nossas naturais limitações. Estamos irremediavelmente limitados pelas categorias kantianas de espaço e de tempo. A humanidade tem lutado bravamente para expandir essas categorias vinculadas a espaço e tempo, inclusive com relativo suces-so, expandindo os limites iniciais de um e de outro sem, contudo, extingui-los. En-tretanto, em relação à polêmica data do dia 31 de março do ano em que for efetivada a matrícula inicial na pré-escola aos 4 anos de idade, ou no Ensino Fundamental de 9 anos aos 6 anos de idade, é relevante anotar uma última observação: não há pai ou mãe neste planeta azul que não tenha clareza absoluta quanto à data em que seu rebento completa um ano de vida. Tanto é assim que convida parentes e amigos para festas e comemorações, inclusive, distribuindo lembranças do 1º, do 2º, do 3º, do 4º, do 5º, do 6º ou do 7º aniversário. Quanto a isso, de fato, não há nenhuma dúvida. Certamente, a dúvida é de outra ordem e afronta os princípios legais e constitucionais definidos, tanto em relação à educação escolar, quanto em outros setores como, por exemplo, à legislação eleitoral, que conta com similares regras normatizadoras, orientadas para manter a necessária ordem social. Estas sequer são questionadas, diversamente do que ocorre em relação à educação Infantil e ao Ensino Fundamental de 9 anos, sem considerar adequadamente o estágio de desenvolvimento das crianças.

FRANCISCO APARECIDO CORDÃOPresidente da Câmara de Educação Básica

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3. OS DOCUMENTOS DA SECRETARIA DE ESTADO DE MINAS GERAIS

a. RESOLUÇÃO DE CADASTRO PUBLICADA EM 2012É importante esclarecer que a resolução transcrita abaixo foi a terceira

versão, depois de vários debates com a Secretaria de Estado sobre a aplicação da liminar de Pernambuco.

RESOLUÇÃO SEE Nº 2.108, DE 20 DE JUNHO DE 2012

PUBLICADA EM 26 DE JULHO DE 2012 – PÁGINA 50 DO MINAS GERAIS

Estabelece normas para a realização, em 2012, do Cadastro Escolar para o ensino fundamental e da matrícula nas redes públicas de ensino em Minas Gerais .

A Secretária de Estado de Educação, no uso de suas atribuições e considerando o disposto no parágrafo 3º do artigo 208 e no artigo 211 da Constituição Federal, no parágrafo 3º do artigo 198 da Constituição Estadual, na Emenda Constitucional nº 14/96, no inciso II do parágrafo 1º do artigo 5º da Lei Federal nº 9.394/96, na Reso-lução SEE nº 521/2004 e na Lei n° 16056, de 24/04/2006,

RESOLVE:Capítulo IDo Cadastramento

Art. 1º O Cadastro Escolar objetiva proceder à inscrição dos candidatos a vagas no ensino fundamental em 2013 e será unificado nas redes públicas de ensino, integrando municípios e Estado.

Art. 2º Cabe às Superintendências Regionais de Ensino coordenarem o Cadas-tro Escolar, organizando, em cada município, a Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula, constituída pelos seguintes membros:

I- Secretário Municipal de Educação;II- 01 diretor ou 01 coordenador e 01 professor representando as escolas municipais;III- 01 representante da Superintendência Regional de Ensino;IV- 01 diretor e 01 especialista representando as escolas estaduais;V- 02 representantes de pais de alunos;VI- 01 representante do Conselho Tutelar do Município;VII- 01 representante do Conselho Municipal de Educação. Parágrafo único . A Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula escolherá, entre

os pares, um representante que presidirá os trabalhos.Art . 3º A inscrição para o Cadastro Escolar, inclusive de candidatos com deficiên-

cia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, será

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realizada no período de 06/08/2012 a 10/08/2012, em postos de inscrição indicados pela Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula .

Parágrafo único - A inscrição é isenta de pagamento de taxas por parte do candidato.Art . 4º Deve inscrever-se no Cadastro Escolar:I- em razão da decisão Judicial do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, publi-

cada no DOU de 02/07/2012, toda criança que completar 6 (seis) anos de idade até 31 de março de 2013, para início do ensino fundamental, conforme as diretrizes da Resoluções CNE/CEB, nº 01/10 e 06/10;

II- candidato a vaga nos demais anos ou ciclos do ensino fundamental, que deseja ingressar nas redes públicas de ensino.

Art . 5º A inscrição no Cadastro Escolar será realizada pelo pai, mãe ou responsável pelo aluno, mediante a apresentação (original e cópia) dos seguintes documentos:

I- certidão de nascimento do candidato;II- comprovante de residência;III- caderneta ou boletim da escola de origem, nos casos de transferência para as

redes públicas ou de retomada de estudos.Art . 6º O encaminhamento para matrícula dos candidatos inscritos no Cadastro

Escolar será feito pela Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula . Parágrafo único. A Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula, quando com-

provada a necessidade, deverá providenciar o zoneamento do município, para atendi-mento ao Cadastro Escolar.

Art . 7º Não deverá inscrever-se no Cadastro Escolar o aluno já matriculado no ensino fundamental nas redes públicas.

Parágrafo único. A garantia de vaga prevista neste artigo dependerá da renovação de matrícula em período a ser estipulado pela própria escola .

Art . 8º A realização do Cadastro Escolar em belo Horizonte obedecerá a normas específicas.

Capítulo IIDa MatrículaArt. 9º O período de matrícula dos inscritos no Cadastro Escolar será unificado na rede

pública de ensino – estadual e municipal – no período de 17 a 21 de dezembro de 2012.§ 1º Terá vaga assegurada o candidato cadastrado que efetuar a matrícula no prazo

estabelecido.§ 2º O candidato que não realizar matrícula no prazo previsto será reencaminhado

para escola onde houver vaga remanescente.§ 3º Não será permitida a realização de exames de seleção para fins de matrícula

em escolas das redes públicas.§ 4º Os candidatos e os alunos que possuírem carteira de identidade deverão apre-

sentá-la no ato de matrícula ou de sua renovação, cabendo à escola registrar na Ficha do Aluno o número do respectivo RG, o nome do órgão expedidor do documento e a data de sua expedição .

Art . 10 Em nenhuma hipótese, a matrícula em escola pública poderá ser condicio-

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nada ao pagamento de taxa ou a qualquer forma de contribuição compulsória .Art . 11 As escolas estaduais e municipais de ensino fundamental deverão forne -

cer, à Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula, a relação nominal dos concluintes dos anos iniciais e finais do ensino fundamental .

Parágrafo único. A Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula organizará o encaminhamento desses alunos para continuidade de estudos nas redes públicas .

Art . 12 Será garantida vaga a todos os alunos para prosseguimento de estudos, no ensino fundamental, em escola das redes públicas .

Art . 13 O encaminhamento dos concluintes do ensino fundamental, para con-tinuidade de estudos no ensino médio, preferencialmente no diurno, será organizado pela Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula, observando as seguintes situações:

I- quando a escola oferecer ensino fundamental e ensino médio, no limite das vagas, o concluinte deve permanecer na própria escola;

II- quando o número de vagas for insuficiente ou a escola não oferecer ensino médio, o encaminhamento para outras escolas, no limite das vagas existentes, será realizado prioritariamente na ordem crescente de idade dos candidatos e observada a facilidade de acesso à escola que ministra o ensino médio.

Art 14 A Comissão Municipal de Cadastro e Matrícula deverá indicar a necessi-dade de criação de novas vagas quando constatado déficit de oferta .

Capítulo IIIDa Organização do Atendimento EscolarArt . 15 O Planejamento do Atendimento Escolar para 2013 deve ser formulado

com base nos dados obtidos no Cadastro Escolar, na análise do fluxo escolar, na capacidade física das escolas, com vistas à apresentação de proposta de expansão e/ou reorganização, buscando compatibilizar a demanda e oferta de vagas nas redes públicas de ensino, e objetivando o atendimento com mais qualidade .

Parágrafo único- As Superintendências Regionais de Ensino deverão apresen-tar o Planejamento do Atendimento Escolar à Superintendência de Organização e Atendimento Educacional SOE/SD, a partir de 10 de setembro de 2012, conforme cronograma a ser divulgado.

Art. 16 Cabe à Subsecretaria de Desenvolvimento da Educação Básica orientar as Superintendências Regionais de Ensino no cumprimento desta Resolução.

Art . 17 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação e revoga a Reso-lução nº 1849, de 13 de maio de 2011.

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, em Belo Horizonte, aos 25 de julho de 2012 .

ANA LÚCIA ALMEIDA GAZZOLA Secretária de Estado de Educação

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(*) Republicada por sofrer alterações no Art. 4º da publicação do “Minas Gerais” de 21/06/2012 e das republicações do “Minas Gerais” de 22/06/2012 e 05/07/2012.

b. OFÍCIO ENCAMINHADO PARA AS ESCOLAS ORIENTANDO QUAN-TO À AVALIAÇÃO DE CRIANÇAS QUE COMPLETAM SEIS ANOS APÓS 31 DE MARÇO.

Ofício Circular nº 001 /2013

Assunto: Orientação às escolas da rede pública estadual para avaliação psico-pedagógica das crianças que completam (seis) anos após 31 /03/13

Belo Horizonte, 04 de janeiro de 2013

Senhor(a) Diretor(a)

Considerando o Ofício Circular nº 06/2012 da Subsecretaria de Desenvolvimen-to da Educação Básica e em cumprimento à decisão proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais, na Ação Civil Pública cadastrada sob nº 0050861-51.2012.4.01. 3800, encaminhamos a avaliação psicopedagógica que deverá ser aplicada às crianças que completarão 06 (seis) anos, em 2013, cujos pais solicita-ram matrícula no 1º Ano do Ensino Fundamental.

Para a realização da avaliação, a escola deverá observar as seguintes orientações:

1º - Marcar o dia e o horário para a realização da avaliação.2º - A avaliação deverá ser aplicada pelo Especialista em Educação Básica(Supervisor Pedagógico) em conjunto com o Orientador Educacional ou com um

Professor com experiência no 1º Ano do Ensino Fundamental.3º - O espaço para a realização da avaliação deverá estar organizado antes da che-

gada da criança ao local da aplicação.4º - Todo o material a ser utilizado na avaliação deverá estar organizado previamente.5º - Os responsáveis pela avaliação deverão estabelecer uma relação de confiança

e acolhimento à criança, estabelecendo um clima de segurança, afetividade e conforto.6º - Durante a aplicação, não será permitido o uso de celular pelo aplicador.7º - Após a realização da avaliação, os aplicadores deverão registrar os resultados

no Mapa de Resultados 1(socialização, autonomia, escrita, motricidade e linguagem oral), ), Mapa de resultados 2(Língua Portuguesa) e Mapa de Resultado 3(Matemáti-ca) assinalando com um X em cada habilidade avaliada, um dos seguintes conceitos:

R (Regular B(Bom ) MB (Muito Bom) 8º - Os aplicadores deverão considerar as orientações dadas na chave de correção

de cada aspecto avaliado (socialização, autonomia, escrita, motricidade, linguagem

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oral. Língua Portuguesa e Matemática) para completar suas respectivas tabelas de Resultado de Proficiência Parcial.

9º- A partir dos dados das tabelas de Resultado de Proficiência Parcial de cada as-pecto avaliado, o aplicador deverá completar a tabela de Resultado de Proficiência Final e, considerando as orientações dadas na chave de correção, definir se a criança está Apta ou Não Apta a frequentar o primeiro ano de escolaridade do Ensino Fundamental.

10º - Todas as atividades realizadas pela criança durante a avaliação, bem como o Mapa de Resultados , deverão ser arquivados na escola e apresentados aos pais ou responsáveis, se solicitados.

11º - As Escolas deverão se organizar de tal forma que os alunos considerados aptos para a matrícula no 1º ano do Ensino Fundamental possam iniciar seu ano letivo na mesma data dos alunos já matriculados.

Colocamo-nos à disposição de V. Sª para maiores esclarecimentos, se necessário.

Atenciosamente,

RAQUEL ELIZABETE DE SOUZA SANTOSSubsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica

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4. TEXTOS TEÓRICOS

TEXTO1: CORTE ETÁRIO - EM DEFESA DA INFÂNCIA E DA EDUCAÇÃO INFANTIL

João Paulo Faustinoni e Silva INTRODUÇÃO

Início de ano letivo e repete-se a corrida ao Poder Judiciário em busca de tutela que permita a crianças o ingresso no ensino fundamental antes de completarem os seis anos de idade.

Pais argumentam que os pequenos filhos estão aptos a aprender a ler e escrever e advogados sustentam, basicamente, que normas fixadoras de limite etário para in-gresso no ensino fundamental desrespeitariam o princípio da igualdade, impedindo a avaliação das competências individuais de cada um dos cidadãos com cinco anos de idade, cinco anos e alguns meses.

O presente artigo tem por objetivo trazer contribuição ao debate, abordando aspec-tos legais a respeito da questão do denominado “corte etário”, considerando a lição de outras áreas do conhecimento sobre o tema, tecendo considerações sobre o papel do Ministério Público na tutela do direto à infância, destacando a importância de se ter em conta os anseios e a mobilização da sociedade civil organizada, as manifes-tações de especialistas em educação infantil e a necessidade, sobretudo, de considerar o direito das crianças – em sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento - de viverem a infância em sua plenitude.

DAS NORMAS RELATIVAS AO CORTE ETÁRIO

As demandas judiciais atualmente em curso afirmam, em linhas gerais, ser incons-titucional norma inserta na Resolução nº 01/2010 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação que impõe, para ingresso no primeiro ano do ensino fundamental, tenha a criança completado seis anos de idade até o dia 31 de março do ano da respectiva matrícula.

Argumentam – os que discordam da regra, que ela violaria princípio constitucional de igualdade – e postulam a necessidade de análise da capacidade intelectual do indi-víduo, costumeiramente por meio de avaliações psicopedagógicas.

No Estado de São Paulo, regra similar, embora com data de corte distinta, também é objeto dos mesmos questionamentos.

Para melhor compreensão, transcrevo algumas das normas em debate:

Resolução nº 01/2010 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação:

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18 - Promotor de Justiça da Infância e da Juventude integrante do Grupo de Atuação Especial de Educação do Ministério Público do Estado de São Paulo.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOCONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA - RESOLUÇÃO Nº 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010. Define Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Edu-cação, no uso de suas atribuições legais, em conformidade com o disposto na alínea “c” do § 1º do artigo 9º da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, bem como no § 1º do artigo 8º, no § 1º do artigo 9º e no artigo 90 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 22/2009, homologado por despacho do Senhor Ministro da Edu-cação, publicado no DOU de 11 de janeiro de 2010, resolve:Art. 1º Os entes federados, as escolas e as famílias devem garantir o aten-dimento do direito público subjetivo das crianças com 6 (seis) anos de idade, matriculando-as e mantendo-as em escolas de Ensino Fundamental, nos termos da Lei nº 11.274/2006.Art. 2º Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter 6 (seis) anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.Art. 3º As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data defi-nida no artigo 2º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.Art. 4º Os sistemas de ensino definirão providências complementares de adequação às normas desta Resolução em relação às crianças matriculadas no Ensino Fundamental de 8 (oito) anos ou de 9 (nove) anos no período de transição definido pela Lei nº 11.274/2006 como prazo legal de implan-tação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.§ 1º As escolas de Ensino Fundamental e seus respectivos sistemas de en-sino que matricularam crianças que completaram 6 (seis) anos de idade após a data em que se iniciou o ano letivo devem, em caráter excepcional, dar prosseguimento ao percurso educacional dessas crianças, adotando medidas especiais de acompanhamento e avaliação do seu desenvolvimento global.§ 2º As crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário, que no seu percurso educacional estiveram matriculadas e frequentaram por mais de 2 (dois) anos a Pré-Escola, poderão, em caráter excepcional, no ano de 2010, prosseguir no seu percurso para o Ensino Fundamental. Art. 5º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, revoga-das as disposições em contrário.

CESAR CALLEGARI

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOCONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃOCÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA - RESOLUÇÃO Nº 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010 - Define Diretrizes Operacionais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, em conformidade com o dis

-

posto na alínea “c” do § 1º do artigo 9º da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, bem como no § 1º do artigo 8º, no § 1º do artigo 9º e no artigo 90 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, nos Pareceres CNE/CEB nº 20/2009 e nº 22/2009, nas Resoluções CNE/CEB nº 5/2009 e nº 1/2010, e com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 12/2010, homologado por despa

-

cho do Senhor Ministro da Educação, publicado no DOU de 18 de outubro de 2010, resolve: Art. 1º Os entes federados, as escolas e as famílias devem garantir o ate-ndimento do direito público subjetivo das crianças com 6 (seis) anos de idade, matriculando-as e mantendo-as em escolas de Ensino Fundamental, nos termos da Lei nº 11.274/2006. Art. 2º Para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter idade de 4 (quatro) anos completos até o dia 31 de março do ano que ocorrer a matrícula. Art. 3º Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. Art. 4º As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida no artigo 3º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.Art. 5º Os sistemas de ensino definirão providências complementares para o Ensino Fundamental de 8 (oito) anos e/ou de 9 (nove) anos, conforme definido nos Pareceres CEB/CNE nº 18/2005, nº 5/2007 e nº 7/2007, e na Lei nº 11.274/2006, devendo, a partir do ano de 2011, ma

-

tricular as crianças, para o ingresso no primeiro ano, somente no Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.§ 1º As escolas de Ensino Fundamental e seus respectivos sistemas de en-sino que matricularam crianças, para ingressarem no primeiro ano, e que completaram 6 (seis) anos de idade após o dia 31 de março, devem, em caráter excepcional, dar prosseguimento ao percurso educacional dessas crianças, adotando medidas especiais de acompanhamento e avaliação do seu desenvolvimento global.§ 2º Os sistemas de ensino poderão, em caráter excepcional, no ano de 2011, dar prosseguimento para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos às crianças de 5 (cinco) anos de idade, independentemente do mês do seu aniversário de 6 (seis) anos, que no seu percurso educacional es -tiveram matriculadas e frequentaram, até o final de 2010, por 2 (dois) anos ou mais a Pré-Escola.§ 3º Esta excepcionalidade deverá ser regulamentada pelos Conselhos de Educação dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, garantindo medidas especiais de acompanhamento e avaliação do desenvolvimento global da criança para decisão sobre a pertinência do acesso ao início do 1º ano do Ensino Fundamental.

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Art. 6º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, revoga-das as disposições em contrário.

FRANCISCO APARECIDO CORDÃO

No Estado de São Paulo, como dissemos, continuam vigentes as regras estabele-cidas na Deliberação nº 73/08 do Conselho Estadual de Educação e na Resolução nº 61/2010 da Secretaria de Estado da Educação, esta, a seguir transcrita na parte em que trata especificamente dos cortes etários para matrícula:

Resolução SE nº 61, de 11-8-2010.Dispõe sobre o processo de cadastramento de alunos, coleta de vagas, com-patibilização demanda/ vaga e matrícula para o atendimento à demanda escolar do ensino fundamental, no ano letivo de 2011, na rede pública de ensino do Estado de São Paulo.O Secretário da Educação, considerando:o esforço empreendido pelo Governo do Estado de São Paulo e Municípios Paulistas no cumprimento dos artigos 208 e 211 da Constituição Federal, mediante mútua colaboração, para assegurar a universalização do ensino obrigatório;o Decreto nº 40.290, de 31 de agosto de 1995, que institui o Cadastramento Geral de Alunos do Estado de São Paulo; a Deliberação CEE nº 2/00, que dispõe sobre o cadastramento geral dos alunos; a Deliberação CEE nº 73/08 e a Indicação CEE nº 76/08, que regulamentam a implantação do ensino fundamental de nove anos, no âmbito do Sistema Estadual de Ensino;a formação da Rede Pública de Ensino, composta pela integração das redes estadual e municipal, visando a acomodar integralmente a demanda do en-sino fundamental;a continuidade do processo de planejamento antecipado para o atendimento adequado da demanda escolar, na Rede Pública de Ensino, Resolve:(...)Art. 4º - O cadastramento dos alunos demandantes de vaga no ensino funda-mental, no Programa de Matrícula Antecipada, será efetuado em três fases:I - a primeira fase abrangerá o período de 01 a 30 de setembro, quando serão definidos no Sistema de Cadastro de Alunos do Estado, os alunos que frequentam a pré-escola na rede pública e que vão completar 6 (seis) anos até 31/03/2011, candidatos ao ingresso no ensino fundamental;II - a segunda fase será realizada no período de 01 a 30 de setembro, com a chamada escolar das crianças que não frequentam a pré-escola na rede pública, candidatas ao ingresso no ensino fundamental, em escola estadual ou municipal, obedecendo ao limite de idade estabelecido no inciso anterior;III - a terceira fase realizar-se-á no período de 01 a 30 de setembro, com a chamada escolar das crianças e jovens que se encontram fora da escola pública, com idade a partir de 7 (sete) anos completos em 2010, candidatos

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à matrícula em qualquer série/ano do ensino fundamental, inclusive na mo-dalidade de educação de jovens e adultos, em escola estadual ou municipal. Parágrafo único - em consonância com o previsto no artigo 2º da Delibe-ração CEE nº 73/08, o limite de idade poderá ser estendido para 6 anos completos até 30/06/2011.Art. 5º - no caso de Município onde, após o estudo da demanda, for identi-ficada a possibilidade de atendimento além dos limites previstos no artigo anterior, e à vista do disposto na Indicação CEE nº 76/08, a data limite poderá ser estendida para 6 anos completos até 31/12/2011, considerando o prosseguimento de estudos.(...)Art. 15 – Não se aplica ao município da Capital o disposto nesta resolução, dada a peculiaridade do atendimento à demanda escolar a qual será objeto de normas específicas.Art. 16 - Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS

A Constituição da República Federativa do Brasil traz em seu bojo, expressa-mente, algumas delimitações de idade e sua correlação com determinadas fases do processo de educação formal dos brasileiros.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:I – educação básica, obrigatória e gratuita dos4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria. (...)IV- educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade.

Vale consignar, desde logo, que o texto original não vinculava o direito/dever à

educação a determinadas idades, mas fazia referência a “ensino fundamental obriga-tório e gratuito”, conforme redação dada pela EC nº 14, de 12-9-1996.

A alteração da norma constitucional, portanto, trouxe de forma proposital a idade como critério a estabelecer direitos e deveres para o estado, para os representantes legais e para crianças e adolescentes de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos de idade.

É dizer: basta completar 4 (quatro) anos de idade até o início do ano letivo para se obter o direito inafastável ao início da educação básica. O transcurso do tempo e as consequentes transformações emocionais, maturacionais, cognitivas, motoras, cul-turais e psíquicas respectivas, dos três para os quatro anos de idade, geram, do mesmo modo, obrigação aos pais de realizarem as matrículas de seus filhos e dever ao Estado de garantir acesso e permanência dos infantes em estabelecimento de ensino.

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De outro lado, basta o indivíduo completar 18 anos para não mais subsistirem as obrigações referentes à educação básica, restando, em tal caso, o direito a frequentar a escola fora da “idade própria”.

A Constituição da República Federativa do Brasil, portanto, estabelece no artigo 208 que há “idade própria” para acesso à educação básica.

Não há, a priori, qualquer ilegalidade em se estabelecer a idade como fonte de obrigações ou aquisição de direitos.

Há critério etário para conquista do direito a votar e ser votado, para casar, para as-sumir determinadas obrigações contratuais, para exercer determinados cargos públi-cos, etc., sem que se questione a razoabilidade de tais disposições, espalhadas em nosso ordenamento jurídico.

A Constituição assegura direitos previdenciários, adotando também critérios etá-rios (artigo 201, §7º, II); estabelece que é vedado o trabalho aos menores de 16 anos e fixa idade mínima de 14 anos para programas de aprendizagem profissional.

O Estatuto da Criança e do Adolescente define também juridicamente as idades correspondentes a cada um dos citados períodos do desenvolvimento humano e dis-põe que apenas aos 12 anos completos surge, legalmente, a adolescência e seus di-reitos e responsabilidades específicas, alguns diversos daqueles observados até os 11 anos e 11 meses de idade.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 9.394/96, também traz inúmeros di-reitos e deveres atrelados a critérios objetivos de idade:

Art.4º - O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:(...)IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;(...)X – vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que com-pletar 4 (quatro) anos de idade. Art. 6º - É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental.Art. 29 – A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Mais tarde retornaremos ao exame de alguns dos dispositivos acima transcritos.

Por ora, servem para reforçar a tese de que a Constituição e a legislação infraconstitu-cional valeram-se da idade como critério fundamental e, em muitas hipóteses, único para a estipulação de direito e deveres.

A LDB também traz regra claríssima a respeito do início e da duração do en-sino fundamental:

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Art. 32 – O ensino fundamental obrigatório, com duração de nove anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos seis anos de idade,terá por ob-jetivo a formação básica do cidadão, mediante...

Sobre o ensino médio, dispõe o mesmo Diploma Legal que terá ao menos três anos de duração.

Verificamos, portanto, que, excluída a fase obrigatória de educação infantil – ini-ciada aos 4 quatro anos – restam nove anos de ensino fundamental e três de ensino médio. Doze anos, portanto.

Se o último ano de ensino básico obrigatório deve ocorrer aos 17 anos – idade própria, segundo a Lei Maior, segue, logicamente, a seguinte cadeia de correlação entre idade e ano de escolarização:

17 anos de idade = 3º ano do ensino médio;16 anos de idade = 2º ano do ensino médio;15 anos de idade = 1º ano do ensino médio;14 anos de idade = 9º ano do ensino fundamental;13 anos de idade = 8º ano do ensino fundamental;12 anos de idade = 7º ano do ensino fundamental;11 anos de idade = 6º ano do ensino fundamental;10 anos de idade = 5º ano do ensino fundamental;09 anos de idade = 4º ano do ensino fundamental;08 anos de idade = 3º ano do ensino fundamental;07 anos de idade = 2º ano do ensino fundamental;06 anos de idade = 1º ano do ensino fundamental.05 anos de idade = 2º ano da educação infantil obrigatória;04 anos de idade = 1º ano da educação infantil obrigatória.

Verifica-se, portanto, que é a Constituição que estabelece o critério de idade própria para frequência ao ensino básico obrigatório e ingresso em cada uma de suas etapas.

Não é preciso socorro ao dicionário para se compreender que, ao estabelecer o dever de se garantir a oferta de ensino às pessoas que não tiveram acesso na idade própria, apropriada – dos 04 aos 17 anos, como visto – está a Carta Magna a afirmar que existe, como regra, idade adequada, oportuna, exata, para a frequência à educação básica.

Quando o legislador adota o critério etário de desenvolvimento biológico, psíqui-co, neurológico, cultural, do sujeito no tempo, o faz exigindo o transcurso comple-to dos anos, meses, dias, horas que correspondam ao momento estabelecido para a aquisição de determinados direitos e assunção de certas obrigações.

Ao fixar, por exemplo, a idade mínima de trinta e cinco anos como condição de elegibilidade para Presidente da República (artigo 14, §3º, VI, a, da CF), ninguém dirá que um dia ou onze meses após completar trinta e quatro anos o interessado já tenha alcançado tal limite etário, ainda que da perspectiva de supostos méritos subjetivos estivesse apto a exercer tal mister.

Ao disciplinar, portanto, que até os cinco anos de idade as crianças devem ser aten-

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didas em educação infantil, estipula a Constituição, da mesma maneira, que apenas ao deixar tal idade – ao completar seis anos –, poderão ingressar no ensino fundamental.

Parece-nos muito claro que uma criança com cinco anos e dez dias, cinco anos e três meses ou cinco anos e onze meses, ainda não tem seis anos de idade.

A Lei nº 11.494/2007, que regulamentou o Fundo de Manutenção e Desenvolvi-mento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, é ainda mais inequívoca a respeito do tema:

Art. 10. A distribuição proporcional de recursos dos Fundos levará em conta as seguintes diferenças entre etapas, modalidades e tipos de estabele-cimento de ensino da educação básica: (...)§ 4o O direito à educação infantil será assegurado às crianças até o término do ano letivo em que completarem 6 (seis) anos de idade.

Conclui-se, destarte, que a Resolução nº 01/2010 do Conselho Nacional de Edu-

cação não inova, não viola a Constituição e está em consonância, sob o aspecto do direito positivo, com a legislação infraconstitucional acima exposta.

Não nos parece haver, na hipótese, violação ao princípio de igualdade. Em primei-ro lugar, lembrando a advertência do ilustrado mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, não se está utilizando o tempo, “fator neutro”, como razão de distinção:

Sucede, isto sim, que o tempo é um condicionante lógico dos seres hu-manos. A dizer, as coisas decorrem numa sucessão que demarcamos por força de uma referência cronológica irrefragável. Por isso, quando a lei faz referência ao tempo, aparentemente tomando-o como elemento para discriminar situações ou indivíduos abrangidos pelo período demarcado, o que na verdade está prestigiando como fator de desequiparação é a própria sucessão de fatos ou de “estados” transcorridos ou a transcorrer. (Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª. Edição, São Paulo: Malheiros,1993, p. 30/31).

Idade, ademais, não é sinônimo de tempo, mas conceito que traz em seu bojo – além de construção social, cultural, simbólica e histórica - referências ao desenvolvimento humano em suas várias características.

O brilhante professor aduz, ainda, que deve existir “adequação racional en-tre o tratamento diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo.” (ob. Cit., p. 39).

Em decisão recente, o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo apontou a mencionada pertinência lógica ao asseverar que as regras de corte etário guardam relação com estágios próprios de amadurecimento da criança:

PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

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ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRAT1CAREGISTRADO(A) SOB N° 03396369

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n° 0006851-75.2011.8.26.0000,da Comarca de Itu, em que é agravante MAS-SIMO SCHINCARIOL ANDRADE (MENOR(ES) REPRESENTADO(S)) sendo agravados DIRETORIA DO CENTRO EDUCACIONAL E ASSISTEN -CIAL DIVINO SALVADOR CEADIS e DIRETORIA REGIONAL DE ENSINO DE ITU.ACORDAM, em 10a Câmara de Direito Público do Tri-bunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores URBANO RUIZ (Presidente sem voto),TORRES DE CARVALHO E TERESA RAMOS MARQUES.São Paulo, 31 de janeiro de 2011.ANTÔNIO CELSO AGÜILAR CORTEZRELATOR

SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICORECURSO AGRAVO DE INSTRUMENTO N.0006851-75.2011.8.26.0000.NATUREZA MANDADO DE SEGURANÇA ENSINO.COMARCA ITU - 3o OF - N. 286.01.2010.012560-9.AGRAVANTE(S) MASSIMO SCHINCARIOL ANDRADEAGRAVADO(S) CENTRO EDUCACIONAL E ASSISTENCIAL DIVI-NO SALVADOR CEADIS E OUTRO.VOTO N. 1666/11Mandado de segurança. Pretensão de matrícula de menor impúbere no segu-ndo estágio de educação infantil/pré-escola II em escola particular. Inde -ferimento em razão de fixação de idade limite pelo Estado. Autorização de matrícula apenas para as crianças vindas do primeiro estágio que comple-tem cinco anos no primeiro semestre do ano letivo visado.Medida liminar indeferida. Exclusão da entidade escolar da relação proces-sual por ilegitimidade passiva. Ato determinado por norma administrativa. Ausência de demonstração de lesão a direito líquido e certo. Agravo de instrumento não provido.VISTOS.Contra decisão que, em mandado de segurança visando à matrícula no segu-ndo estágio de educação infantil - pré-escola II para o ano letivo de 2011, indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo em relação à diretoria do Centro Educacional e Assistencial Divino Salvador - Ceadis, com base nos artigos 267, VI e 295, II, do Código de Processo Civil e indeferiu a me-dida liminar em relação à Diretoria Regional de Ensino de Itu (fls. 45/47 e 55/60), opôs o impetrante agravo de instrumento alegando que a entidade mantenedora do Colégio Divino Salvador de Itu tem legitimidade passiva para a impetração, juntamente com a Diretoria Regional de Ensino de Itu, e que a matrícula deve ser feita até 20.01.11 para que não tenha que cumprir

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duas vezes a mesma série ou estágio; anotou que concluiu o 1o estágio, de pré-escola I, que há risco de danos irreparáveis e que a escola é vinculada ao órgão público, cujas normas aplica; disse que houve consulta e que a entidade particular age por delegação e mencionou julgado sobre a matéria.É o relatório.Tratando-se de medida de tutela de urgência, apreciável inaudita altera parte, impõe-se desde já seu julgamento. Não se cuida aqui de mero ato interna corporis do estabelecimento de ensino privado, mas de ato praticado em cumprimento de norma administrativa contida na Deliberação CEE n. 73/2008 e no Comunicado CEE/SEE de 16.06.10. O Centro Educacional e Assistencial Divino Salvador - CEADIS não tem liberdade para descumprir essas normas nem autoridade própria para admitir a matrícula pretendida, de modo que sua ilegitimidade passiva foi bem reconhecida pelo Juízo.A concessão de medida liminar “não é uma liberalidade da Justiça; é me-dida acauteladora do direito do impetrante, que não pode ser negada quando ocorrem os seus pressupostos, como também não deve ser concedida quan-do ausentes os requisitos de sua admissibilidade” (Hely Lopes Meirelles, Mandado de Segurança e Ação Popular, 9a Ed. RT, 1983, p. 46). A lição continua aplicável na vigência da Lei n. 12.016 de 07.08.09.Não se pode, à vista da regra do artigo 7o, § 1o da Lei n.12.016/09, negar a possibilidade de agravo contra decisão de concessão ou de denegação de medida liminar em mandado de segurança, sem perder de vista que os requisitos de concessão dessa medida liminar não são apenas os mesmos da ação cautelar, relativos ao fumus boni júris e ao periculum in mora, sendo imprescindível demonstração de plano de lesão ou ameaça a direito líquido e certo. A medida se aproxima muito mais da tutela antecipada.No caso concreto, os elementos de convicção constantes dos autos mostram que o impetrante, nascido em 23.08.06 e matriculado no 1º.estágio em 2010, só completará cinco anos de idade após a data limite de 30.06.11, im-posta pela Deliberação CEE n. 73/2008 e pelo Comunicado CEE/SEE de 16.06.10 c.c. Resolução n. 6 de 20.10.10 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para matrícula no 2º. estágio (v. fls. 28/44).Como já decidiu esta Câmara em caso semelhante, mencionado aqui pelo Juízo (fls. 59), o indeferimento da medida liminar pelo Juízo não impediu o acesso do impetrante à escola, mas apenas manteve como válida a exigên-cia da autoridade impetrada para efeito de acesso ao estágio de pré-escola II de educação infantil.A limitação de idade tem vinculação com o processo de maturação da cri-ança e, qualquer seja o limite, sempre haverá quem se situe além ou aquém por causa de dias ou horas.A Constituição Federal apenas dispõe que a “educação é direito de todos e dever do Estado e da família...” (artigo 205) e estabelece a obrigatoriedade do ensino fundamental (artigo 208, I), além de garantir a “educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até cinco anos de idade” (artigo 208, IV, cf. EC 53/2006). A exigência por norma estadual de limite de tempo para alcance da idade admitida em cada estágio não vulnera o artigo 206, I da

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CF). O fato de não ter sido admitida a matrícula, no segundo estágio de edu-cação infantil, das crianças que completem cinco anos depois do primeiro semestre do ano letivo não vulnera o direito líquido e certo à igualdade de condições para acesso e permanência na escola. Essa igualdade prevista na norma constitucional não iguala os desiguais.Assim, não se mostra recomendável a concessão da medida liminar, ante a falta de demonstração de risco de violação de direito líquido e certo, ao menos até que se ultime a instrução em procedimento que é célere por natureza.Certo é que a data limite indicada para matrícula já está superada e a autori-dade administrativa já se posicionou sobre a pretensão do ora impetrante e deverá prestar informações ao Juízo, não havendo qualquer risco de lesão a direito liquido e certo até a sentença.Ante o exposto, nega-se provimento ao agravo de instrumento.

DO EXAME INTERDISCIPLINAR DA MATÉRIA

O operador do direito, chamado a se manifestar e decidir sobre a incidência de de-terminada norma, não pode se limitar a uma análise jurídico-positiva, máxime quando esteja lidando com direitos da infância e da juventude e sobre realidade que incidirá sobre a condição peculiar da criança como pessoa em desenvolvimento, consoante o que determina o artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Não é sem razão que o mesmo Estatuto prevê a existência obrigatória de serviço auxiliar composto por equipe interprofissional para assessorar tecnicamente a Justiça da Infância e da Juventude (art.150).

Assim, para questionar regras de incidência geral, de organização do sistema edu-cacional, com direta repercussão no próprio direito social de proteção à infância como fase curta e de suma importância na formação do indivíduo, deve o profissional do di-reito buscar subsídios de outras áreas da ciência para que não corra o risco de transpor para o campo do direito, da consecução de políticas públicas, meras opiniões, pontos de vistas e palpites pessoais.

Estudos científicos dão conta da importância de investimentos específicos na primeira infância, apontando diferenças no funcionamento dos circuitos cerebrais/hormonais, dos circuitos sensoriais, nesta primeira fase da vida e nos demais estágios do desenvolvimento cerebral nos seres humanos (sobre o tema: YOUNG, Mary Eming (org.). Do Desenvolvimento da Primeira Infância ao Desenvolvimento Humano, São Paulo, Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, 2010).

A Psicologia do Desenvolvimento, área do conhecimento que estuda o desenvolvi-mento humano em seus aspectos físico-motor, intelectual, afetivo-emocional e social, também estabelece parâmetros etários e características comuns a eles relacionadas.

Segundo Jean Piaget, dos 2 aos 7 anos situa-se a primeira infância e o período pré-operatório. (BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TRASSI TEIXEIRA, Maria de Lourdes.Psicologias, uma Introdução ao Estudo de Psicologia. 13ª. Ed. São Paulo: Saraiva, p. 101).

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Explica a professora Clara Regina Rappaport:

A criança pré-operacional adapta-se às exigências concretas da vida utili-zando-se dos recursos adquiridos na fase anterior, mas, no nível de com-preensão, de explicação das situações que está vivenciando, ela estará de-sequilibrada. E isto, principalmente porque não trabalha realmente com as coisas e as ideias, mas brinca com elas (mágica, imaginação, fantasia), e nelas acredita sem tentar saber a verdade.(...)Sim, porque uma das características do pensamento egocêntrico se constitui justamente na ausência de confrontação de suas ideias com as das demais pessoas. (...)Neste sentido verificamos que, quanto mais jovem a criança, mais egocên-trico será seu pensamento, e quanto mais se aproximar dos 7 anos, mais próxima estará do pensamento socializado.” (RAPPAPORT, Clara Regina; FIORI, Wagner Rocha; DAVIS, Claudia. Psicologia do Desenvolvimento: A Idade Pré-escolar. São Paulo: EPU, 1981, Volume 3, p. 43/44).

A mesma professora, ao apontar os 7 anos de idade como o período em que se deveria iniciar a escola elementar, acrescenta que perto desta idade (7 anos) significa-tivas mudanças são constatadas:

Observa-se marcante declínio do egocentrismo intelectual e um cres-cente incremento do pensamento lógico. Isto é, em função da capacidade, agora adquirida, de formação de esquemas conceituais, de esquemas men-tais verdadeiros, a realidade passará a ser estruturada pela razão e não mais pela assimilação egocêntrica, como ocorria na fase anterior. A criança terá um conhecimento real, correto e adequado de objetos e situações da reali-dade externa (esquemas conceituais), e poderá trabalhar com eles de modo lógico. (obra citada, p.72)

Interessante observar que também na teoria freudiana haverá relação entre o início do período de latência e o fim do pensamento pré-operatório da teoria de Piaget.Sobre a questão, parece-nos muito importante a advertência do professor Wagner Rocha Fiori:

A fase fálica começa a se encerrar, e o período de latência que surge é o grande momento das aquisições na conquista do real. É característico que, no modelo de Piaget, seja neste momento que a criança deixa o pensamento pré-operatório para assumir o mundo da lógica. Em todas as culturas, este é o momento em que a criança entra para uma escolarização formalou para o aprendizado profissional.A evolução maturacional traz consigo etapas de desenvolvimento afetivo e intelectual. Os dois processos são paralelos, mas interdependentes.A cri-ança, ainda edipicamente presa à mãe sedutora e à figura paterna ausente ou inadequada, não terá a organização e o desenvolvimento da etapa fálica. Se as sublimações não se efetuarem, a energia da criança continuará buscando

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descargas em um erotismo infantil, e o prazer de refletir sobre o mundo e dominá-lo não será adequadamente instalado. A escolaridade está fadada ao fracasso.(ob. cit., Volume 3, p.25).

Verificações semelhantes sobre o desenvolvimento da criança foram realizadas pelo filósofo, médico e estudioso da psicologia da infância Henri Wallon.

Para o festejado mestre, dos 3 aos 6 anos de idade a criança se encontra no está-gio do personalismo e “para Wallon, a pré-escola teria o papel de preparar a criança para o período seguinte do desenvolvimento (...). As relações que estabelecerão na pré-escola serão ainda relações elementares, portanto a disciplina não poderá ser a mesma da escola fundamental. (...) De acordo com Wallon, entre os 6 e 11 anos, a criança encontra-se no estágio categorial de desenvolvimento. É uma idade que aparece no conjunto da evolução mental como de estabilidade relativa, com progressos regulares, se comparada ao período de crises profundas que se abrem na adolescência.” (ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; MAHONEY, Abigail Alva-renga, (organizadoras). Henri Wallon, Psicologia e Educação. São Paulo: Edições Loyola, 2010, p. 45 e 51).

Referidos autores apontam os seis ou sete anos de idade como marcos impor-tantes do desenvolvimento infantil.

Note-se que, sem evidentemente ignorar a singularidade de cada criança, mas considerando que estamos tratando de direito universal ao acesso e permanência em estabelecimento educacional de qualidade, não soa desarrazoado certo grau de universalização também na utilização de parâmetros científicos para a fixação de regras de ingresso e progressão no percurso da educação básica.

O critério constitucional, ademais, protege a infância, permite o correto plane-jamento de espaços, métodos e recursos pedagógicos e evita a alternativa sugerida de submissão dos pequenos, em larga escala, a testes preditivos de prontidão

Bastante oportuna é a obra do professor David Elkind, com o sugestivo título “Sem Tempo Para Ser Criança”:

Nos últimos anos têm-se acumulado evidências em apoio aos estágios des-critos por Piaget. (...)as crianças pressionadas têm problemas para atingir um senso seguro de identidade pessoal. (...) Da mesma maneira, crianças que são pressionadas a tomadas de decisões e a uma responsabilidade ma-duras podem ter um senso distorcido do seu potencial e das suas habilidades a esse respeito – o senso de identidade pessoal pode parecer mais maduro e seguro do que de fato é. (...)Por enquanto, cabe reiterar o principal conteúdo deste capítulo, ou seja, que o crescimento como pessoa na nossa sociedade contemporânea requer tempo e não pode ser apressado. Como sabemos, o crescimento ocorre em uma série de estágios que estão relacionados com a idade. Cada estágio produz mu-danças dramáticas na habilidade intelectual, nos vínculos emocionais e nas relações sociais. A elaboração dessas novas habilidades em toda a sua com-plexidade e complicação é um processo lento e deliberado. Quando as crian-

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ças são pressionadas a crescer depressa, aquisições importantes são omitidas ou desviadas, o que pode provocar sérios problemas mais tarde. (ELKIND, David. Sem Tempo para Ser Criança – A Criança Estressada.3ª. ed., Porto Alegre: Artmed Editora, páginas 145 e 165).

O citado professor de desenvolvimento infantil encerra sua obra com ensinamento que merece transcrição:

Não importa que filosofia de vida abracemos, é importante encarar a infân-cia como um estágio da vida, não simplesmente como a ante-sala da vida. Pressionar as crianças para serem adultas viola a santidade da vida, priori-zando um período em detrimento de outro. Mas se realmente valorizamos a vida humana, vamos valorizar cada período igualmente e dar a cada estágio da vida o que é adequado a esse estágio.Uma filosofia de vida, uma arte de viver, é essencialmente uma maneira de descentralizar, uma maneira de enxergar nossas vidas em perspectiva e de reconhecer as necessidades e os direitos dos outros. Se conseguirmos su-perar alguns estresses das nossas vidas adultas e descentralizar, poderemos começar a apreciar o valor da infância com suas próprias alegrias, tristezas, preocupações e recompensas. Valorizar a infância não significa enxergá-la como um período feliz e inocente, mas sim como um período importante da vida, ao qual as crianças têm direito. As crianças têm direito de ser crianças, de desfrutar dos prazeres e de sofrer as dores de uma infância que é violada pela pressão. Concluindo, ter uma infância é o direito mais fundamental das crianças. ( ob. cit., p. 240)

Mesmo os críticos da teoria de Piaget, ainda que valorizando aspectos da interação social das crianças, acabam por reforçar que “não obstante diferenças quantitativas e qual-itativas referentes às ações de crianças de quatro, cinco e seis anos, tais idades correspon-dem a uma mesma época do desenvolvimento infantil, denominada idade pré-escolar...” (MARTINS, Lígia M. Especificidades do Desenvolvimento Afetivo-Cognitivo de Cri-anças de 4 a 6 Anos. In: ARCE, Alessandra; MARTINS, Lígia Márcia (Organizadoras). Quem Tem Medo de Ensinar na Educação Infantil. Campinas-SP: Alínea, página 6).

Também sob a perspectiva social e histórica do desenvolvimento há que se ter olhar atento para o coletivo, tornando-se a escola espaço privilegiado de interação e, portanto, pensado e planejado para tanto.

DA IMPORTÂNCIA DA VALORIZAÇÃO E DAS ESPECIFICIDADES DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Cabe mencionar que a passagem da educação infantil para o ensino fundamental não é uma simples medalha, um prêmio à criança por sua superior capacidade cogni-tiva em detrimento de outras que não tiveram o mesmo desempenho acadêmico.

Referida mudança, no sistema educacional público vigente, implica radical transfor-

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mação pedagógica e grave transformação na rotina escolar da criança, na forma de intera-gir com o espaço e com o outro, em lidar com o tempo e com novas responsabilidades.

Do ponto de vista legal, do mesmo modo, há tratamento absolutamente distinto entre referidas etapas do ensino.

De fato, a Lei de Diretrizes e Bases distingue as finalidades, estratégias, recur-sos didáticos, materiais e até mesmo os espaços físicos da educação infantil e do ensino fundamental.

A educação infantil demanda espaços adequados para que a criança possa brincar, descansar, experimentar e realizar atividades ora estruturadas, ora espontâneas e livres.

A mesma Lei de Diretrizes e Bases dispõe que o ensino fundamental tem objetivos diversos, conteúdos e formas mais rígidas.

Na educação infantil as classes devem ser menos numerosas do que aquelas previstas para o ensino fundamental. O Ministério da Educação, aliás, produziu documento apresentando parâmetros básicos de infraestrutura para os estabeleci-mentos de educação para crianças de 0 a 6 anos. Em referido documento, a res-peito da crucial importância do espaço nessa fase do desenvolvimento humano, encontram-se as seguintes lições:

O espaço físico não apenas contribui para a realização da educação, mas é em si uma forma silenciosa de educar. Como afirma Antônio ViñaoFrago, referindo-se ao espaço escolar, este não é apenas um “cenário” onde se desenvolve a educação, mas sim “uma forma silenciosa de ensino” (BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Parâmetros Básicos de Infra-estrutura Para Instituições de Educação Infantil. Dis-ponível em <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Educinf/eduinfparinfesten-carte.pdf.>.Acesso em 22/03/2012.)

II. Salas de atividades para crianças de 1 a 6 anosO espaço físico para a criança de 1 a 6 anos deve ser visto como um su-porte que possibilita e contribui para a vivência e a expressão das culturas infantis – jogos, brincadeiras, músicas, histórias que expressam a especifi-cidade do olhar infantil. Assim, deve-se organizar um ambiente adequado à proposta pedagógica da instituição, que possibilite à criança a realização de explorações e brincadeiras, garantindo-lhe identidade, segurança, confi-ança, interações socioeducativas e privacidade, promovendo oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento.” (íntegra do documento no Portal do MEC na rede mundial de computadores. (http://portal.mec.gov.br/seb/ar-quivos/pdf/Educinf/eduinfparinfestencarte.pdf).

No ensino fundamental, como dito, as classes são mais numerosas, os espaços menos atrativos para as brincadeiras e atividades lúdicas (cadeiras enfileiradas, em regra) e inicia-se preocupação com desenvolvimento de conteúdos específicos. Ape-nas a título de exemplo, exige-se jornada de ao menos quatro horas em sala de aula (artigo 34 da LDB), pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, ensino religioso, de matrícula facultativa etc.

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Inserir a criança prematuramente no ensino fundamental, portanto, é suprimir parte da educação que se destinava ao “desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social” (artigo 29 da LDB), sen-do certo que, de acordo com os estudiosos anteriormente citados, tal desenvolvimento, saudável e sem pressão, deveria ocorrer em ambiente acolhedor e que privilegiasse a brincadeira, a arte, a criatividade, a liberdade, sem pressão de horários e metas.

Empublicação do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação e Ação Comuni-tária (Cenpec)-, denominada Brincar: o brinquedo e a brincadeira na infância, depois de expor as contribuições de diferentes campos do conhecimento e de importantes estudiosos como Wallon, Vygotsky, Piaget, Freud, Melaine Klein e Winnicott, ressal-ta-se a advertência de que, “embora com diferentes enfoques, tanto a Psicologia do Desenvolvimento quanto a Psicanálise enfatizam a importância da brincadeira para o ser humano” (MEDEIROS, Maria Lúcia; SILVA, Zoraide Inês Faustinoni da. Brincar: o brinquedo e a brincadeira na infância. São Paulo: 2009, página 34).

DA IMPOSSIBILIDADE LEGAL DE AVALIAÇÃO OU PROGRESSÃO PARA

INGRESSO NO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Com o devido respeito, ao contrário do que alegam alguns intérpretes da Lei, o artigo 208, VI, da Constituição da República, ao garantir o acesso aos níveismais eleva-dos do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um, não se aplica à educação básica e, especialmente, ao primeiro ano do ensino fundamental.

O direito de acesso e permanência no ensino básico é público subjetivo e, ademais, é obrigatório, ou seja, independe de aferição de maior ou menor capacidade do sujeito.

O artigo sobredito faz evidente referência às fases posteriores ao ensino básico e, mesmo assim, é merecedor de críticas:

Ao oferecer um número insuficiente de vagas gratuitas no ensino superior, o Poder Público omite sua incapacidade de proporcionar “acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística” a todos que quiserem, por meio do discurso sobre a capacidade (e/ou competência) dos jovens estudantes para ingressar na Universidade pública, ou seja, o condi-cional “segundo a capacidade de cada um” passa a ser, sutilmente, um fator de legitimação de uma política educacional que, na prática, não prioriza o acesso de todos ‘aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da cri-ação artística’, sendo também um fator que limita o direito constitucional dos jovens estudantes de terem acesso ao ensino superior público gratuito. (BRANDÃO, Carlos da Fonseca. LDB Passo a Passo. São Paulo: Aver-camp, 4ª. Edição, página 30)

O artigo 22 da LDB deixa ainda mais clara a conclusão de que é jus-tamente a educação básica que tem por finalidade desenvolver a formação comum do educando para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir em estudos posteriores. Posteriores à educação básica, portanto; esta, formadora da cidadania.

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A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, aliás, veda qualquer forma de classificação subjetiva ou de avaliação dos ingressantes ao primeiro ano do ensino fundamental:

Art.24 – A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organi-zada de acordo com as seguintes regras comuns: (...)II – A classificação em qualquer série ou etapa, exceto a primeira do ensino fundamental, pode ser feita:Por promoção (...);Por transferência (...);Independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o grau de desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua inscrição na série ou etapa adequada, conforme regulamen-tação do respectivo sistema de ensino.

O artigo 31 da Lei de Diretrizes e Bases, na mesma linha, diz que a avaliação na educação infantil não terá objetivo de promoção para o acesso ao ensino fundamental.

Destarte, proíbe a Lei, para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental, o uso de critérios de promoção, transferência ou avaliação.

Resta, por consequência lógica, a conclusão de que tal acesso se trata de direito público subjetivo adquirido por idade, sem outras condicionantes.

Aliás, trazer a meritocracia para o início da vida escolar das crianças é buscar transferir do mundo adulto para o infantil, mais uma vez, realidade que dele de-veria ser afastada.

Vale, aqui, a incisiva observação do professor Luiz Guilherme Brom:

Não há mal maior ao futuro adulto do que retirar-lhe a infância e a juven-tude. Não há violência maior do que obrigar a criança e o adolescente a viver em um mundo que não é deles, ou seja, o mundo dos adultos. (...) Cri-anças sem infância, crianças que deveriam estar brincando e aprendendo. Mas a abundância material – ao contrário do que se pensa – também não garante à criança uma infância digna. A sociedade de consumo, o individu-alismo e a competição extrema da vida contemporânea também destroem a infância. (BROM, Luiz Guilherme; AGUIAR, Tânia. Educação: Mito e Ficção. São Paulo: Cengage Learning, 2010, p.13)

No discurso da meritocracia infantil estão embutidos, evidentemente, valores de disputa, competição e exclusão.

Contraria o artigo 2º da LDB fomentar na educação infantil e no início da edu-cação básica a concorrência, o enxergar o outro como adversário na corrida pela con-clusão célere da educação formal, quando, em verdade e por força de lei, os ideais que devem nortear a educação são aqueles de solidariedade humana e apreço à tolerância (artigo 3º, IV, da LDB).

Com efeito, dizer que determinada criança de cinco anos e dez meses tem mérito, capacidade e/ou competências cognitivas, intelectuais, para galgar o primeiro ano do

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ensino fundamental antes de outras é afirmar que estas, por consequência, são inca-pazes, menos competentes e não merecedoras de mérito.

Tal rotulação, máxime na primeira infância, parece-nos totalmente indevida.O espírito da lei, ao contrário, busca construir na escola e, em especial, na edu-

cação infantil e nos primeiros anos da educação básica, valores de solidariedade (ar-tigo 3º da CF), cooperação, resolução pacífica de conflitos e acolhimento das diversi-dades (“laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social”, na dicção do artigo 32 da LDB).

A alternativa sugerida, de submissão dos milhões de infantes brasileiros a avalia-ções, testes ou exames de aptidão, prontidão, capacidade cognitiva traz, além das óbvias dificuldades operacionais e dos demais problemas acima referidos, campo fér-til para novas lides judiciais, gerando situação de insegurança jurídica ainda maior.

Se hoje discutimos a legalidade de um critério objetivo, o que se dirá caso se permita a regra de ingresso prematuro no ensino fundamental por força de análises subjetivas? Quais serão os testes preditivos utilizados? Quaismétodos serão emprega-dos? Quais serão os profissionais habilitados? Os pais aceitarão os atestados de falta de competência de seus filhos de cinco, ou, por que não, quatro anos de idade?

Em síntese, o corte etário questionado decorre de norma constitucional e do orde-namento jurídico infraconstitucional, sendo certo que possui embasamento teórico e, a nosso ver, com o devido respeito às vozes discordantes, razão de existir.

DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA DEFESA DO DIREITO À

INFÂNCIA

Exige o Estatuto da Criança e do Adolescente que na interpretação de suas normas tenha-se sempre em consideração a condição peculiar da criança como pessoa em desenvolvimento.

Explica o saudoso pedagogo Antônio Carlos Gomes da Costa:

A afirmação da criança e do adolescente como ‘pessoas em condição pe-culiar de desenvolvimento’ não pode ser definida apenas a partir do que a criança não sabe, não tem condições e não é capaz. Cada fase do desen-volvimento deve ser reconhecida como revestida de singularidade e de com-pletude relativa, ou seja, a criança e o adolescente não são seres inacabados, a caminho de uma plenitude a ser consumada na idade adulta, enquanto portadora de responsabilidades pessoais, cívicas e produtivas plenas. Cada etapa é, a sua maneira, um período de plenitude que deve ser compreendida e acatada pelo mundo adulto, ou seja, pela família, pela sociedade e pelo Estado.” (GOMES DA COSTA, Antônio Carlos. In: CURY, Munir (org.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado – Comentários Jurídicos e Sociais. 10ª. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.59).

De início, portanto, há sempre que se recordar que o direito a ser garantido e concretizado é o da criança e nem sempre este terá correspondência com o desejo da família, do estado ou do mundo adulto.

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Por força dos Atos Normativos nº 670 de 2010 e 721, de 16 de dezembro de 2011, a Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo estabele-ceu como uma das metas do Plano Geral dos Promotores de Justiça na área da educação a cobrança de efetiva implementação de políticas públicas de educação infantil.

Mencionado plano, assim, aponta a necessidade de esforços da instituição para a concretização de direito fundamental de crianças e fortalecimento da educação infan-til como etapa específica da educação básica.

Em 2010 a Promotoria de Justiça de Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos da Infância e da Juventude da Capital foi provocada a examinar a legalidade de normas de fixação de idade própria para ingresso no ensino fundamental.

Dentre outros argumentos, na ocasião, sustentou a Excelentíssima Promotora de Justiça, Dra. Carmen Lucia P. de Mello Cornacchioni:

A fixação dos 6 anos completos ou a completar no início do ano letivo, não fere a Constituição, nem mesmo a legislação federal que disciplina a matéria. A um, porque a LDB estabelece essa idade – 6 anos e não 5 anos. A dois, porque a entrada precoce no ensino fundamental, segundo especia-listas, interrompe a segunda infância e é prejudicial para o desenvolvimento global das crianças.No trabalho publicado pelas profissionais Virgínia Savicius Raimundo Fioravanti, pedagoga, psicopedagoga institucional, formada no Curso de Especialização em Distúrbios de Aprendizagem (Faculdade de Medici-na do ABC), Diretora Pedagógica do Colégio Graphein, e Sônia Maria Romagnolo Campos, pedagoga, pós-graduada em educação (PUC-SP) e em Distúrbios de Aprendizagem (Faculdade de Medicina do ABC), coor-denadora pedagógica do Colégio Graphein, intitulado Imaturidade Es -colar – a importância do brincar e o Ensino Fundamental de nove anos, as especialistas discorrem sobre a ânsia dos pais em matricular os filhos mais cedo no ensino fundamental, a diminuição do tempo da infância, a insegurança, o desinteresse e falta de motivação pelo aprendizado ou pela escola relacionados à imaturidade escolar, a ascensão da ‘criança adultificada’, o pouco tempo que as crianças brasileiras brincam, a im-portância das brincadeiras na infância e os prejuízos da escolarização precoce na formação da criança.(...)Outros especialistas comungam do mesmo pensamento:“Começar um ensino sistemático com 5 anos não serve para nada e, sob o ponto de vista do desenvolvimento, é muito ruim”(Francisco Baptista Assumpção Júnior, psiquiatra especializado em transtornos de escolari-dade e professor associado do Instituto de Psicologia da USP).Se entrar antes dos 6 anos, você encurta a infância. No primeiro ano, a criança enfrenta a rotina escolar progressivamente mais organizada, com lição de casa e atividades mais dirigidas, que exigem mais concentração. É dinâmica de trabalho mais controlada e que exige maior autocontrole. A educação infantil garante abordagem mais livre em relação à arte e à brincadeira. (Fernanda Flores, coordenadora do Centro de Estudos da Es-cola da Vila, credenciada pelo MEC para curso de Pós-graduação voltado à

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educação infantil, alerta que entrar antes dos 6 anos no ensino fundamental encurta a infância). (...)Enfim, outra conclusão não há senão a de que, ao contrário do alegado pelo requerente, a medida é benéfica à criança e observa integralmente o pre-conizado pelo estatuto da criança e do adolescente. (manifestação encartada aos autos de representação nº 216/10).

Por não vislumbrar ilegalidade em normas que fixam critérios de idade para in-gresso no ensino fundamental, a insigne Promotora de Justiça promoveu o arquiva-mento de referido expediente.Citada Promoção de Arquivamento foi homologada pelo Egrégio Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Mas não é só. O Promotor de Justiça, ao avaliar a pertinência de adoção de medi-das extrajudiciais ou judiciais na tutela de interesses transindividuais, máxime rela-cionadas à exigência e controle de políticas públicas, com repercussão social ampla, deve, na escorreita lição de Eurico Ferraresi, oportunizar o debate com a comunidade a respeito dos interesses prioritários.

Ressalta o douto membro do Ministério Público a importância de audiências públicas, transformando eventual demanda judicial não em ato isolado do representan-te do Parquet, “mas sim a exigência por intermédio do Poder Judiciário do que foi discutido com o corpo social.” (FERRARESI, Eurico. A Responsabilidade do Minis-tério público No Controle Das Políticas Públicas. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo (Coordenadores). O Controle Jurisdicional de Políticas Públi-cas. Rio de Janeiro: Gen; Forense, 2011, p. 498).

O Promotor de Justiça, cada dia mais chamado a intervir em situações que de-mandam diálogo e compreensão de outros ramos do conhecimento, não pode atuar segundo sua impressão, experiência ou convicção puramente pessoal.

Assim, ao examinar a questão do corte etário, além do contato com diversos edu-cadores, médicos e especialistas em primeira infância, há que se ter o cuidado de veri-ficar também a possibilidade de discussão do tema com a participação da sociedade.

No caso específico da data apropriada para ingresso no ensino fundamental, no Congresso Nacional, na Comissão de Educação e Cultura, intenso debate ocorreu em 2010, com a participação da sociedade civil organizada.

Com efeito, o Senador Flávio Arns apresentou projeto de Lei que pretendia, justa-mente como querem aqueles que questionam judicialmente a mencionada resolução do Conselho Nacional de Educação, autorizar o início do ensino fundamental aos 5 (cinco) anos de idade – PLS 414/2008.

Os inúmeros debates que se sucederam foram compilados em publicação denomi-nada Cadernos CEC 02/2010, que pode ser acessada na rede mundialdecomputadores.(http://cordiolli.files.wordpress.com/2010/05/cec_caderno02_2010_o_direito_a_educacao_infantil_vers003.pdf)

Destaco algumas das abalizadas manifestações de especialistas e menciono que o repúdio ao ingresso precoce no ensino formal foi subscrito por mais de cem entidades representativas dos interesses da infância.

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Rede Nacional Primeira Infância:

A Rede Nacional Primeira Infância, formada por 74 organizações da so-ciedade civil, do governo, do setor privado, de organizações multilaterais e outras redes de organizações, vem solicitar a Vossas Excelências a rejeição do dispositivo constante do PL nº 6755/ 2010 (original PLS nº 414/2008) que pretende obrigar as crianças de cinco anos a ingressar no ensino fun-damental. O Projeto se encontra na Comissão de Educação, em regime de prioridade. Diz o texto:“Art. 6º. É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos 5 (cinco) anos de idade, no ensino fundamental.Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 5 (cinco) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante...Art. 87............... § 3º .............................................................I - matricular todos os educandos a partir dos 5 (cinco) anos de idade no ensino fundamental”.A proposta é um atentado contra a infância e um desserviço à educação básica brasileira. Além disso, muda o processo educacional de 3 milhões de crianças, implica qualificação de 100 mil professores e impõe novas exigências aos sistemas de ensino dos 5.563 municípios, que não foram ouvidos sobre essa matéria.O argumento do Projeto repousa na intenção de estabelecer coerência entre o início do ensino fundamental e o término da educação infantil (“até cinco anos de idade”, segundo o texto constitucional, art. 208, IV). Interpreta que as Leis nº 11.114/ 2005 e 11.274/ 2006 estão incorretas ao estabelecer o iní-cio do ensino fundamental aos seis anos, como se houvesse um vácuo entre o ‘até cinco” e “aos seis”. Ora, a faixa etária da educação infantil foi altera-da pela Emenda Constitucional nº 53/ 2006 precisamente para adequá-la à modificação introduzida pelas leis acima citadas.Consideremos, preliminarmente, o significado etário da expressão “até cinco anos”. Não nos parece válido interpretar “até cinco” como: “nenhum dia além da data de aniversário do quinto ano”. Se fosse correta essa inter-pretação, o adolescente com 17 anos e um dia já estaria fora da inimputa-bilidade penal e desnecessárias seriam as inúmeras e felizmente frustradas tentativas para baixar a idade penal (...) Diríamos, também, que um bebê de um dia de vida, com um mês, com dois meses (...) tem um ano de idade e deve ser cuidado como criança de um ano. Seria um desastre para sua sobrevivência, saúde e educação. Da mesma forma, ninguém diz, no dia seguinte ao aniversário de 50 anos, que tem 51. Ora, o argumento do PL 6755/ 2010 (PLS 414/2008) de que o ensino fundamental começa aos seis anos de idade e, portanto, de que a matrícula deve ocorrer a partir do dia imediatamente posterior à celebração do aniversário de cinco anos comete esse deslize de interpretação.O que está em jogo, no entanto, não é um número – cinco ou seis – mas a infância, o direito de ser criança e tudo o que este direito implica, inclusive a aprendizagem de acordo com as características da idade. Começar o en-

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sino fundamental aos cinco anos equivale a estar a criança impedida de ser criança, a perder a infância e ser proibida de brincar. Não apenas pelo fato de estar no 1º ano, mas por aquilo a que ela será submetida. Basta ler as fre-quentes reportagens sobre as conseqüências perversas de um atendimento inadequado: (a) estresse, por ver-se diante de exigências de aprendizagem, de testes de avaliação e ter que corresponder à expectativa da professora e dos pais, (b) problemas de saúde causados pela inadequação dos longos horários estáticos e das cadeiras escolares muito grandes para o tamanho da criança, (c) diminuição radical, quando não a supressão do tempo de brincar, substituição da ludicidade pelo ensino formal e impositivo, a que o próprio professor se vê condicionado, (d) aumento da reprovação e sua repercussão sobre a auto-estima e a expectativa da criança em relação à escola.A antecipação do início do ensino fundamental para cinco anos será, for-çosamente, um fracasso pedagógico, aumentando a reprovação e a exclusão escolar, além de uma violência contra a infância. O que se pretende obter com essa antecipação?Não o desenvolvimento sadio das crianças, porque lhes rouba um ano de infância e da experiência pedagógica da educação infantil. A pedagogia, a psicologia e a própria neurociência atestam que o tipo de vivência edu-cacional que as crianças têm na educação infantil é fator determinante de um amplo desenvolvimento de sua personalidade e das estruturas cogniti-vas, sociais e afetivas que vão sustentar todo desenvolvimento posterior da pessoa. Processos formais precoces de ensino entram na linha do “treina-mento” e da robotização.Não o aumento da escolaridade, porque a maioria das crianças de cinco anos já está na pré-escola. Com a obrigatoriedade estabelecida pela EC 59/2009, brevemente o universo delas estará sendo atendido pela pré-esco-la. E de forma mais adequada, por ser esta desenhada segundo a pedagogia da primeira infância.Não um benefício às famílias, porque seus filhos têm direito à educação infantil até a entrada no ensino fundamental, cujo início a lei fixa aos seis anos de idade. A Resolução 1/ 2010 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação determina que a criança tenha seis anos completos até 31 de março no ano de matrícula para o ensino fundamental.Não o aprimoramento do ensino fundamental, que, em grande parte, ainda se encontra imerso no desafio de adaptar espaços, mobiliário e material didático para as crianças de seis anos de idade. Empurrar-lhe, por força de uma determinação legal, mais três milhões de crianças de cinco anos, é provocar deliberadamente o caos.Além desses equívocos, o PL 6755/ 2010 não pode escamotear uma velada submissão aos interesses privatistas na educação, que visam ao aumento de lucro com o aumento da clientela de ensino fundamental.Confiamos no elevado espírito democrático de Vossas Excelências em per-mitir o debate da matéria e convocar para discuti-la as organizações que reúnem os gestores da educação, técnicos e especialistas em temas de infân-cia e aprendizagem, uma vez que um dispositivo legal de tanta relevância

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pedagógica não pode ser decidido à revelia do conhecimento especializado.Agradecemos a compreensão de Vossas Excelências e colocamo-nos à dis-posição para quaisquer outros esclarecimentos.Brasília, 2 de maio de 2010Rede Nacional Primeira InfânciaOMEP/Secretaria Executiva

Não foi diferente a manifestação da Associação Brasileira de Magistrados, Promo-tores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude – ABMP:

Finalmente, os signatários desta Carta encarecem a necessidade de preser-var a infância, respeitando as etapas do desenvolvimento infantil. Que as tendências de antecipar exigências e expectativas que seriam mais apro-priadas para idades posteriores sejam contrapostas por uma defesa firme do direito da criança ser criança, de brincar, de aprender ludicamente, de conviver em espaços de liberdade e expressão criativa. Antecipar a entrada no ensino fundamental para a idade de cinco anos é uma forma de reduzir a infância e impor exigências que acabarão por produzir efeito contrário do desejado: estresse, desinteresse pela escola, reprovação e abandono. Mas o efeito mais pernicioso se instala no íntimo da criança e esse dificilmente será reparado, porque criança sem infância é, na grande parte dos casos, adulto infeliz. Brasília, 5 de maio de 2010.

Houve mobilização também da Campanha Nacional pelo Direito à Educação:

1. O espaço e o tempo adequados para a criança de 5 anos viver experiên-cias educacionais significativas é a educação infantil. Para todos aqueles que lutam pelo direito ao pleno desenvolvimento de nossas crianças, o fun-damental é garantir o direito de ser criança e tudo o que este direito implica, inclusive a aprendizagem de acordo com as características da idade.2. Não considera o acúmulo obtido por meio dos debates realizados pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) para construir a Resolução da Câ-mara de Educação Básica (CEB) no 5/2009 que determina que até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, a criança deve completar quatro ou cinco anos para ingressar ou cursar a pré-escola.3. Desconsidera também, e especialmente, a Resolução da CEB/CNEnº01/2010 que estabelece que, até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, a criança deve completar seis anos para ingressar no primeiro ano do ensino fundamental.4. Antecipar o ingresso da criança no ensino fundamental é colocar em risco a infância. Nesse período devem ser proporcionadas as brincadeiras, atividades lúdicas e o aprendizado de acordo com as características da idade. Esse pro-cesso é fundamental para o pleno desenvolvimento da criança, para sua adap-tação à escola e para sua alfabetização. A antecipação de um ano para o início do ensino fundamental poderia repercutir negativamente em sua vida escolar.A Campanha Nacional pelo Direito à Educação confia que o Congresso

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Nacional, espaço que deve expressar com responsabilidade a vontade democrática do povo brasileiro, reforçará o direito de nossas crianças de cinco anos ao acesso à educação infantil de qualidade.Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à EducaçãoAção Educativa

Entidades representativas de profissionais da área de educação pública também reforçaram o coro de descontentamento com a proposta de antecipação do ingresso das crianças no ensino fundamental:

Não ao ingresso de crianças de 5 anos no Ensino Fundamental representou a manifestação de vários segmentos da sociedade:A Infância, tempo sagrado do ser humano, onde a inquietude, a tagarelice, a brincadeira, a descoberta de um mundo novo a cada dia, o desenvolvimento da motricidade, do afeto, a descoberta das diferenças que marcam cada um de nós, é uma só e deve ser respeitada.Antecipar para 5 anos a entrada das crianças no Ensino Fundamental seria ingressar as crianças na formalidade do ensino, com regras, horários, tare-fas, deveres, provas, sem que estivessem neurologicamente e emocional-mente preparadas para tal.Pesquisas científicas demonstram que até os 6 anos de idade as crianças adquirem o conhecimento brincando e precisam de experiências afetivas com as quais irão aprender a se relacionar com o mundo. Neste período é o desenvolvimento emocional que impulsiona o intelectual.A diferença básica entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental con-siste na forma de oferecer o estímulo e a sua adequação à maturidade neu-rológica e emocional da criança. Ou seja, a Educação Infantil é o espaço das aprendizagens espontâneas e o Ensino Fundamental é o espaço escolar em que se desenvolvem as aprendizagens científicas. Assim sendo, matricular precocemente crianças de 5 anos no Ensino Fundamental poderá gerar di-ficuldades de aprendizagem, baixa autoestima, fadiga, capacidade de aten-ção deficiente ou falta de motivação.Crianças que brincam, que vivem tudo ao seu tempo, são mais felizes e confiantes e consequentemente terão um processo de aprendizagem mais eficiente e seguro.A Educação Infantil não é, portanto, uma sala de espera, onde nada acontece e onde o tempo passa, mas sim um lugar mais preparado e eficaz de aprendizagem para as crianças de até 6 anos, onde as crianças no brincar, e na imitação dos adultos adquirem capacidades básicas de linguagem, habilidades sociais, valores éticos e morais. O lema não deveria ser, portanto, “tudo cada vez mais cedo”, mas sim, “tudo ao seu tempo”. O que cabe aos deputados é regulamentar e ao governo garantir o acesso ao Ensino Infantil, já previsto na Lei 11.700/2008.O Conselho Nacional de Educação, através da Resolução nº 01/2010 não determinou a idade de 6 anos completos até 31 de março do ano letivo para o ingresso no Ensino Fundamental de modo aleatório. Es-tudiosos da Educação estipularam esta data pensando no respeito ao desenvolvimento infantil.

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Diversos centros universitários de excelência também reafirmaram a necessidade de garantir aos infantes a permanência na educação infantil até os 5 anos e 11 meses de idade:

A título de exemplo transcrevemos, em parte, carta de repúdio da Congregação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo:

Estudos nacionais e internacionais indicam a necessidade da per-manência de crianças de 0 a 5 anos e 11 meses na educação infantil em decorrência de sua especificidade: exigência de uma pedagogia apropriada à criança dessa idade; espaço físico estruturado para sua educação, com mobiliário, materiais, brinquedos tanto na área interna como externa; atividades, espaços e tempos que respeitam a forma da criança aprender e profissionais com formação em educação infantil. A vulnerabilidade da criança requer uma atenção que integra vários setores, da educação, saúde, assistência, além da família e comunidade e uma educação voltada para as necessidades desta fase da primeira infância. Essas exigências não são encontradas no ensino fundamental, caracterizado pelo currículo disciplinar, com estrutura física, mobili-ário, materiais, mesas e cadeiras inadequadas ao tamanho e à forma de aprendizagem da criança.A educação da criança pequena tem como finalidade o desenvolvimento integral em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, linguístico e social, complementando a ação da família, e da comunidade (Lei nº 9.394/96, Art.29). Dessa forma, “o currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, científico e tecnológico. Tais práticas são efetivadas por meio de relações sociais que as crianças desde bem pequenas estabelecem com os professores e as outras crianças, e afetam a construção de suas identidades” (Parecer CNE/CEB nº 20/2009).Os Indicadores de Qualidade da Educação Infantil (MEC, 2009) mencio -nam que a Educação Infantil inclui na Creche, bebês (crianças de até 1 ano e meio) e/ou crianças pequenas (de 1 ano e meio até 3 anos) e no segmento pré-escolar, crianças de 4 até 6 anos. Pensando na qualidade da Educação Infantil e para dirimir dúvidas, as Diretrizes Curriculares de Educação In-fantil, aprovadas em dezembro de 2009, indicam que a educação infantil inclui crianças de 0 a 5 anos e 11 meses; de modo que somente aos 6 anos completos inicia-se o ensino fundamental (Art.5º - § 2 e § 3 - Resolução CNE/CEB nº 5, de 17 de dezembro de 2009).Tais esclarecimentos são essenciais para não prejudicar a criança de 5 anos e 11 meses que tem o direito a uma educação de qualidade e, por sua vul-nerabilidade, requer atenção diferenciada e não deve, ainda, ingressar no ensino fundamental.Diante das considerações, a Congregação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, reunida nesta data, manifestou-se contrária ao teor do projeto de lei do Senado Nº 414/2008 Parecer Nº 2.532/2009, exigindo sua revogação e a revisão dos documentos citados.São Paulo, 29 de abril de 2010.

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404ª Reunião Ordinária Congregação da Faculdade de Educação daUniversidade de São Paulo

Em depoimento na Comissão de Educação e Cultura no Senado Federal, a Professora Fúlvia Rosemberg lembrou que, se adotada a regra de ingresso precoce no ensino fundamental:

estaríamos, no Brasil, caminhando no sentido inverso ao da tendência inter-nacional, particularmente dos países mais ricos e desenvolvidos. Com efeito, informações colhidas junto ao Instituto de Estatística da UNESCO referentes a 207 países/territórios, informam que apenas 14,4% deles iniciam a escola primária antes dos 6 anos. E dentre esses países, pelo menos 16 integraram ou integram o Reino Unido, sendo a Inglaterra um dos raros países europeus a iniciar a escola primária aos 5 anos.O contra-senso, em sentido literal, do PLS 414/08 fica mais nítido, quando apreendemos, conforme pesquisa extensa realizada pela Cambridge Primary Review sobre a escola primária inglesa, um movimento naquele país de críti-ca ao início precoce, aos 5 anos, da experiência curricular da escola primária (www.primaryreview.org.un – p. 49 do referido caderno). O Ministério Público de São Paulo, por meio de seu Centro de Apoio Oper-acional, elaborou também material de orientação publicado no informativo nº 08 – novembro de 2010, no qual apresentava interpretação das normas vigentes e fazia os seguintes alertas a respeito da escolarização prematura:

Deve-se ter a cautela quanto a esta questão, uma vez que a Constituição Fede-ral estabelece a obrigatoriedade da educação básica a partir dos 4 anos de idade e, logicamente, o ensino fundamental a partir dos 6 anos de idade.A matrícula de uma criança no ensino fundamental com cinco anos e alguns meses afronta o espírito da legislação e os princípios pedagógicos quanto ao seu adequado desenvolvimento;Não se deve pular etapa do desenvolvimento da criança, que juntamente com o direito à educação também tem o direito de brincar e amadurecer psicologicamente, de acordo com as fases de crescimento.

O Grupo de Atuação Especial de Educação e o Centro de Apoio Operacional da Área de Educação, atentos à necessidade de uniformização da data para ingresso no ensino fundamental e observando que as divergências entre as normas dos Conselhos Nacional e Estadual de Educação geravam ainda maior insegurança e potencial para o litígio, realizaram gestões no Conselho Estadual de Educação para revisão da norma local, elaborando documento encaminhado ao presidente de tal órgão pela Procurado-ria-Geral de Justiça.

A atuação do Ministério Público em âmbito difuso há que se dar na busca da garantia do Direito universal à educação de qualidade em suas diversas etapas e, em especial, à defesa da infância como período ímpar e curto da vida que merece ser vivido de forma plena.

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Batalha constante tem sido travada para garantir o acesso de milhares de cri-anças a creches e pré-escolas, bem como para melhoria da qualidade do serviço prestado em tais instituições.

Note-se que eventual medida para permitir o acesso de menores de seis anos ao ensino fundamental afrontaria todos os esforços até então realizados, permitindo ao gestor público menos escrupuloso avaliações subjetivas de crianças com cinco anos e “progressão” destas para o ensino fundamental, superlotando as salas de aula da respectiva rede e criando, artificialmente, outras tantas vagas no ensino infantil.

Estar-se-ia, assim, atuando em prejuízo da infância e de todo o sistema educacional.De um lado, encurta-se a infância e remete-se o infante para espaço educacional

inadequado. De outro, impõe-se ao ensino fundamental a absorção de milhares de cri-anças ainda não devidamente amadurecidas, em espaços inapropriados e aos cuidados de educadores preparados para lidar com outro público.

Tal armadilha foi observada e mereceu o alerta da psicóloga e educadora Fúlvia Rosemberg:

A tentação nessa nova etapa pós-Fundeb, no que se refere à escolari-zação precoce, consiste tanto em transformar a creche e a pré-escola em vestíbulo, sala de espera, apenas fase preparatória para o ensino fundamental, quanto em reduzir progressivamente a idade para ingres-so no ensino fundamental. Afinal, o sistema público de ensino fun-damental está institucionalizado no Brasil. O fluxo demográfico vem mostrando uma diminuição das faixas etárias mais jovens. Nada mais simples que reciclar vagas sobrando, salas sobrando, professores(as) sobrando, para uma classe anexa de EI, para uma classe de 1º ano do EF com crianças de 5, quem sabe, de 4 anos. Criamos a categoria ‘crianças fora do lugar’, categoria nossa velha conhecida. (ROSEM-BERG, Fúlvia. Educação Infantil Pós-Fundeb – Avanços e Tensões. In: SOUZA, Gisele de. Educar na Infância – Perspectivas Histórico-sociais. São Paulo-SP, Contexto, 2010, p. 180)

Há que se perquirir, ademais, a quem de fato interessa a revogação da norma de idade fixada pelo Conselho Nacional de Educação.

A Resolução CNE/CEB nº 05/2009 previa desde o final de 2009 as seguintes regras:

Art. 5º A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, é oferecida em creches e pré-escolas, as quais se caracterizam como espaços institucio-nais não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públi-cos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social.§ 1º É dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gra-tuita e de qualidade, sem requisito de seleção.§ 2° É obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

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§ 3º As crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março devem ser matriculadas na Educação Infantil.

Ora, se referida regra vale desde o ano letivo de 2010, qual a razão para que ainda

tenhamos discussão sobre a idade de ingresso no ensino fundamental em 2012?De fato, se as escolas tivessem respeitado, na fase pré-escolar, referida disposição,

matriculando, respectivamente, nos primeiro e segundo anos do ensino infantil obriga-tório, as crianças com 4 ou 5 anos completos até 31 de março de 2010, evidentemente não encontraríamos problemas de antecipação da vida escolar no início do ensino fundamental em 2012.

Ao invés de acelerar o percurso escolar dos pequenos, não seria o caso de pais, eventualmente prejudicados pela aceitação indevida da matrícula de seus filhos ou falta de orientação quando da matrícula na pré-escola, buscarem a reparação de eventuais prejuízos financeiros e/ou responsabilização de quem agiu em desrespeito à norma?

No âmbito de nossa atuação, todavia, devemos levar em consideração a precisa lição do Professor Vital Didonet em depoimento prestado na audiência pública da comissão de educação e cultura da Câmara dos Deputados sobre o PL 6755/2010:

A criança é o centro para o qual as leis, as políticas sociais e as ações públicas sobre infância devem voltar-se. Não é o sistema de ensino, não é o desejo dos pais, não é o interesse do mercado, não é a urgência do desenvolvimento econômico e social do País que determinam o que exi-gir da criança desde a primeira infância, mas a compreensão e o respeito ao seu complexo e dinâmico processo de desenvolvimento físico, social, psicológico e cognitivo. Ignorar a centralidade da criança quando se trata de assunto que lhe diz respeito é, muitas vezes, como entrar no jardim com pés de elefante. (disponível em <(http://cordiolli.files.wordpress.com/2010/05/cec_caderno02_2010_o_direito_a_educacao_infantil_vers003.pdf>. Aces-so aos 23.03.2012).

Na mesma trilha o preciso ensaio da estudiosa Sueli Machado Pereira de Oliveira: O INGRESSO NO ENSINO FUNDAMENTAL COM CINCO ANOS: Direito à es-colarização ou negação do direito à infância?

Em uma sociedade que, cada vez mais, valoriza a competitividade, está se tornando comum as famílias das camadas médias e altas pressionarem as escolas privadas para o ingresso cada vez mais precoce das crianças no en-sino fundamental. Neste final de ano foram inúmeras as demandas jurídicas para matrícula de crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março. Numa rápida pesquisa, encontrei decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça nos estados de Pernambuco, Distrito Federal, Minas Gerais, Para-ná e Mato Grosso do Sul. Busquei as argumentações em duas delas para análise, uma de 2007 e outra de 2011. Mas, para além da questão da idade, o olhar que me move é a compreensão da infância como fase única da vida e a defesa da educação infantil como a etapa mais preparada pedagogicamente

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para receber a criança de 5 anos, assim como a premissa de que é necessária uma maior interlocução entre o sistema educativo e o sistema jurídico em benefício da criança e da infância.

Desenvolvimento

Antes mesmo da Lei nº 11.274/2006 alterar o ensino fundamental para 9 anos, com prazo para implantação até 2010, já era polêmica a questão em torno da idade mínima para a entrada nesta etapa da educação básica. Nos sistemas de ensino nos quais a ampliação do ensino fundamental se deu mais cedo, como Belo Horizonte, Curitiba, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás entre outros, esta já era uma questão controversa.Historicamente, a idade de 7 anos era considerada um marco e se deveu à “tradição hipocrática de se dividir a infância em três períodos: infantia, do nascimento aos 7 anos; puerícia, dos 7 aos 12 anos para meninas, e dos 7 aos 14 para meninos, e adolescentia, dos 12 ou 14 até os 21” (HEYWOOD, 2004, p. 26). Também na tradição cristã, é considerada como passagem para a idade da razão e das primeiras responsabilidades, influenciando o ingresso nas escolas e atividades mais sistematizadas de aprendizagem. A idade de 7 anos, como um marco para a escolarização, vai sendo aos poucos alterada nos sistemas educacionais e, por diversas razões já bastante explo-radas em pesquisas, inclusive apontadas em minha pesquisa de mestrado (OLIVEIRA, 2011), se altera, no ano de 2005, para todo o Brasil, através da Lei nº 11.114/05 que determina, para início no ano de 2006, a matrícula obrigatória no ensino fundamental “a partir dos 6 anos de idade”.(...)O caráter excepcional para matrícula de crianças com 5 anos de idade, in-dependente da data de aniversário, foi preconizado através da Resolução CNE/CEB nº 1, de 14 de janeiro de 2010 e da de nº 6, de 20 de outubro de 2010, que estabeleceram, respectivamente para os anos de 2010 e 2011, que seriam aceitas as matrículas de crianças com 5 anos de idade, sem limite para data de aniversário, se “no seu percurso educacional estiveram ma-triculadas e frequentaram por dois anos ou mais a pré-escola”. Portanto, as escolas tiveram dois anos para alinharem as matrículas das crianças na educação infantil de forma a não terem, em 2012, crianças completando 6 anos após o dia 31 de março. No entanto, muitas escolas não seguiram as orientações e agora grassam pelo país ações judiciais determinando a matrícula de crianças de 5 anos, independente da data em que as crianças completam 6 anos. Diante desta situação, nos perguntamos se não está havendo um descum-primento à Lei nº 11.114/2005, que determina a matrícula no ensino funda-mental a partir dos 6 anos de idade. A lei é clara: não é a partir de 5 anos, e sim a partir de 6 anos. Não é fácil determinar quem se beneficia desta entrada precoce, antecipada e apressada da criança: a criança, os pais, o governo ou a lógica de mercado de nossa sociedade neo-liberal?Assim como em outros lugares, na escola é melhor sair na frente para ter certeza de estar sempre “na hora”. Ninguém questiona as origens dessa

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aceleração da corrida das agulhas: estas designam a norma e fora desta, não há salvação. (MOLLO-BOUVIER, 2005, p. 395)Pode parecer dramático o excerto acima, mas o interesse das famílias em matricular a criança com 5 anos no ensino fundamental parece ser o de aproximá-las mais cedo da racionalidade adulta; senão, por que geraria tanta ansiedade nos pais a criança permanecer na educação infantil? Outra questão que deve ser levada em consideração é que a evolução e construção das políticas tem assinalado algumas constantes, “nomeadamente as que insistem na deslocação do centro da agenda política educativa do eixo da inclusão e igualdade social das crianças e jovens para objectivos associados à competitividade e à eficácia dos resultados”. (SARMENTO, 2005, p. 27)E, não tanto para responder, mas mais como uma provocação, pergunto: qual é o papel que a mídia e o judiciário tem desempenhado neste processo?(...)Além da ausência das crianças na discussão, também é possível afirmar que esses fragmentos nos mostram o potencial que o assunto engendra e como os debates para a delimitação de uma data não foram amplos o suficiente e, possivelmente, essa discussão tenha que considerar o que a criança repre-senta hoje para a sociedade e ser mais abrangente e visível. As discussões, muito além de mercadológicas ou de desenvolvimento cognitivo, devem incluir o que tudo isso significa para as crianças, para o seu bem-estar e para o seu desenvolvimento social e cultural. Coaduno com Qvortrup (2011) em seu estudo de 1993, intitulado “Nove teses sobre a infância como um fenô-meno social”, e, com isso, não pretendo afirmar que cada criança, em par-ticular, deva manifestar-se sobre cada questão que as envolvem; significa, contudo, que “todos os eventos, grandes e pequenos, terão repercussões sobre as crianças, como parte da sociedade e, em consequência, elas terão reivindicações a serem consideradas nas análises e nos debates acerca de qualquer questão social maior.” (QVORTRUP, 2011, p. 202). Além disso, é necessário levantar ainda outras questões: o que as famílias esperam da escola? Por que, sobretudo, os sindicatos das escolas particulares defendem a derrubada da data-limite? Qual constrangimento pode haver para as crian-ças de 5 anos o fato de ficarem um ano a mais com atividades mais lúdicas na educação infantil? Por que muitas famílias entendem que se a criança de 5 anos continuar na educação infantil ela estará repetindo de ano ou sendo reprovada?A matrícula da criança de 5 anos no ensino fundamental e a judicialização da educação.Cury e Ferreira (2009), analisando as consequências da relação entre justiça e educação, apontam três questões importantes em relação ao sistema de educação: a) a transferência de responsabilidades de questões que podem ser resolvidas na própria escola para o sistema jurídico; b) o desconheci-mento pela escola das atribuições do sistema de garantia de direitos; c) a necessidade de ações integradas entre a escola e o sistema de proteção da criança e do adolescente. Igualmente apontam três questões que se colo-cam em relação ao sistema de proteção: a) o desconhecimento dos inte-grantes do sistema jurídico sobre o sistema de ensino e despreparo dos seus

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membros para lidar com os problemas da educação; b) o exagero na forma de agir, levando a uma indevida invasão do sistema legal no educacional e, por fim, c) a burocratização das ações, levando a efeitos tardios e inócuos. (CURY; FERREIRA, 2009, p. 43-44)

Ao analisar decisões judiciais que autorizaram a matrícula de crianças com cinco anos no ensino fundamental, observou a especialista que os Juízes valorizaram a avalia -ção individual e multidisciplinar como critério de progressão, o que, como dissemos anteriormente, é, inclusive, vedado pela LDB.

Segue a ilustre professora:

O jurista coloca que uma data-limite fere o princípio da razoabilidade e dá ên-fase à capacidade da criança de aprender, ‘que poderá ser conferida pelas es-colas, de forma individualizada, por meio de testes psicológicos/pedagógicos’.Para garantir direitos iguais para todos, seria necessário que nossas escolas estivessem preparadas para aplicar “testes psicológicos/pedagógicos” em todos os seus alunos, independentemente de serem instituições públicas ou privadas, o que, sabidamente, não é o caso. Ressalto, além disso, que as demandas na justiça são de famílias das camadas média e alta e “os grupos mais vulneráveis socialmente tendem a ter menor capacidade para trans-formar a experiência da lesão em litígio. (SOUSA SANTOS et al. apud SILVEIRA, 2011, p. 5)

Também na mesma lógica da avaliação da criança, trago o trecho abaixo que se refere à decisão favorável à matrícula das crianças pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul:

Para privar o acesso ao ensino fundamental, o Estado ou Municípios de-vem provar, então, que a criança não possui capacidade para iniciar o seu aprendizado, isto de forma individual, não genérica, porque a capacidade de cada um, prevista constitucionalmente como garantia à educação, bem assim na LDB e no ECA, não se afere única e exclusivamente pela idade cronológica. Com isso, não é difícil concluir que uma criança prematura-mente capaz possa ingressar no ensino fundamental antes de cinco, seis ou sete anos, porque a sua capacidade lhe assegura o direito à educação, e tal circunstância não estaria a burlar qualquer legislação[...] julga-se pro-cedente a presente ação civil pública para, em confirmando liminar conce-dida anteriormente, determinar ao Estado de Mato Grosso do Sul e Municí-pios de Ivinhema e Novo Horizonte do Sul que matriculem e mantenham matriculados no ensino fundamental as crianças menores de seis anos que comprovarem, através de submissão à avaliação da equipe nomeada pelo juízo, terem a capacidade para o início dos estudos[...].A determinação é para que uma equipe multidisciplinar – composta por um professor da rede estadual, um professor da rede municipal e uma psicóloga – avalie as crianças. Não há na sentença nenhuma dúvida sobre ser ou não o ensino fundamental o melhor lugar para a criança de 5 anos e mesmo “antes

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de 5” como diz o relator. Nas duas jurisprudências analisadas, o parâmetro foi a “capacidade” da criança e não o seu desenvolvimento sócio-afetivo. Não observei uma visão global da criança e nem a referência à infância como etapa propícia para o desenvolvimento de atividades mais lúdicas e de brincadeiras. Dessa forma, fica a pergunta: o que é, afinal de contas, ser criança neste início de século?

O direito a ter infância

Muitos argumentos encontrados para adiantar, apressar e acelerar as aprendizagens e os processos escolares, com a matrícula da criança aos 5 anos no ensino fundamental, não se apoiaram no bem-estar da criança e no que é melhor para a infância. Queimar etapas no desenvolvimento pode ser prejudicial à criança e cada vez mais os consultórios de psicolo-gia estão recebendo crianças forçadas precocemente a atender às expec-tativas dos adultos. Defendo que a criança pequena, antes de completar 6 anos, deva permanecer na educação infantil, cuja preparação do tempo e do espaço é feita para que as crianças possam brincar e interagir, o que não acontece no ensino fundamental, e que é essencial para o pleno desenvolvimento da criança, tendo inclusive influência sobre o seu desem-penho escolar futuro. “Antecipar muitas vezes é perder tempo e não ganhar tempo.”(CRAIDY; BARBOSA, 2011, p.35)Há um senso comum de que, simplesmente por já estar alfabetizada, a cri-ança necessita entrar logo no ensino fundamental. Mas o fato é que, cada vez mais, muitas crianças se alfabetizam mais cedo, devido ao maior núme-ro de estímulos presentes em nossa sociedade. Este deixa, portanto, de ser um critério a ser considerado para a entrada nesta etapa de ensino. Em geral, parece não ser consenso a importância e a especificidade da educação infan-til e muitas famílias consideram que as crianças estariam perdendo tempo nesta etapa, pois as crianças “só brincam e não fazem nada”. Sendo assim, a escola “de verdade” é associada ao ensino fundamental, no qual “as cri-anças de fato aprendem”. E, nesse sentido, é ainda pertinente a pergunta de Mollo-Bouvier (2005), se “seriam as aprendizagens precoces um antídoto contra o temor dos pais diante do futuro?” ou ainda a sua afirmação de que “hoje em dia, o tempo social concedido à infância segmenta-se, encurta e, às vezes, cai no esquecimento”. (MOLLO-BOUVIER, 2005, p. 394-400). Para Craidy e Barbosa (2011), As decisões políticas e as tendências cul-turais apontam para que as crianças tornem-se adolescentes cada vez mais cedo e, de acordo com a classe social, lhes exige que sejam produtivas, precoces, competitivas, erotizadas. Paradoxalmente a adolescência e a vida adulta são momentos que vêm se prolongando. Por que antecipar o final da infância? Por que não dar mais tempo para este período da vida onde construímos os primeiros sentidos para aquilo que nos torna humanos? Por que não ter mais tempo para brincar, conviver, ouvir histórias, conversar, construir mundos? (CRAIDY; BARBOSA, 2011, p. 33)Envolvida cada vez mais cedo em processos de escolarização, a criança tem alguma coisa roubada de sua infância. São criados tempos, espaços

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e atividades para cada idade da criança que se encarregam de sua vida e socialização.(...)E, assim, outra pergunta que me faço é quais são os entendimentos e os significados sobre a infância e o que é ser criança na concepção de profes-sores e famílias neste início de século? Compreender esta questão pode nos ajudar a compreender o anseio para que elas “cresçam rápido”, “aprendam rápido” e “entrem logo na escola”.Considerações Finais(...)E, finalmente, levanto aqui a questão de que é, mais uma vez, a sociedade adultocêntrica que está a decidir a vida da criança a partir de seus próprios anseios e visão. Além disso, precisamos pensar modos de deixar que as próprias crianças sejam sujeitos ativos na construção e determinação de sua própria vida educacional e social. Dessa forma, será possível iniciar o processo de reconstrução do lugar social da infância em nossa sociedade.

CONCLUSÕES

O que se pretende afirmar, em resumo, portanto, é que o ingresso precoce no ensino fundamental viola direitos fundamentais das crianças pequenas, desrespeitando critérios etários constitucionalmente estabelecidos.

A mobilização da sociedade civil organizada, de inúmeros especialistas e de entidades de defesa da infância e da educação infantil, não pode ser desconsiderada pelo Ministério Público. Reforça, ademais, a convicção de que a regra limitadora de ingresso prematuro no ensino fundamental tem sólida fundamentação teórica e importância para a efetiva execução de políticas públicas para oferecimento, univer-sal e com equidade, de educação de qualidade em cada uma das etapas do ensino básico.

A escolarização precoce, por fim, parece carregada do que o teólogo, psicanalista e educador Rubem Alves denominou a “inutilidade da infância”. Com sua imensa sabedoria, alerta que seguimos a conduzir a vida das crianças com fundamento na indagação do que serão quando crescerem.

Mas, e a infância? E o dia que não se repetirá nunca mais?(ALVES, Rubem. Os Grandes Contra os Pequenos. In: Estórias de Quem Gosta de Ensinar. 12ª.ed. Campinas-SP. Papirus. 2009, p.60)

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TEXTO 2: O INGRESSO NO ENSINO FUNDAMENTAL COM CINCO ANOS: DIREITO À ESCOLARIZAÇÃO OU NEGAÇÃO

DO DIREITO À INFÂNCIA?

Sueli Machado Pereira de Oliveira

INTRODUÇÃOBusco neste ensaio analisar o ingresso de crianças de cinco anos no ensino fun-

damental com foco nas recentes notícias na mídia e a judicialização da educação a partir da análise de duas decisões jurídicas sobre o assunto. Tomo as últimas notícias divulgadas pela mídia, principalmente as veiculadas nos últimos meses, de forma a evidenciar as polêmicas e tensões que se instalaram na sociedade em relação à Reso-lução CNE/CBE nº 6, do Conselho Nacional de Educação (CNE), que define que, para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março. O aporte teórico é o da Sociologia da Infância com a concepção de infância como uma construção social que não é natural ou universal, mas sim um componente específico estrutural e cultural das sociedades.

Em uma sociedade que, cada vez mais, valoriza a competitividade, está se tor-nando comum as famílias das camadas médias e altas pressionarem as escolas priva-das para o ingresso cada vez mais precoce das crianças no ensino fundamental. Neste final de ano foram inúmeras as demandas jurídicas para matrícula de crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março. Numa rápida pesquisa, encontrei decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça nos estados de Pernambuco, Distrito Federal, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul. Busquei as argumentações em duas delas para análise, uma de 2007 e outra de 2011. Mas, para além da questão da idade, o olhar que me move é a compreensão da infância como fase única da vida e a defesa da educação infantil como a etapa mais preparada pedagogicamente para receber a criança de 5 anos, assim como a premissa de que é necessária uma maior interlocução entre o sistema educativo e o sistema jurídico em benefício da criança e da infância.

DesenvolvimentoAntes mesmo da Lei nº 11.274/2006 alterar o ensino fundamental para 9 anos, com

prazo para implantação até 2010, já era polêmica a questão em torno da idade mínima para a entrada nesta etapa da educação básica. Nos sistemas de ensino nos quais a ampliação do ensino fundamental se deu mais cedo, como Belo Horizonte, Curitiba, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás entre outros, esta já era uma questão controversa.

Historicamente, a idade de 7 anos era considerada um marco e se deveu à “tradição hipocrática de se dividir a infância em três períodos: infantia, do nascimento aos 7 anos; puerícia, dos 7 aos 12 anos para meninas, e dos 7 aos 14 para meninos, e ado-lescentia, dos 12 ou 14 até os 21” (HEYWOOD, 2004, p. 26). Também na tradição cristã, é considerada como passagem para a idade da razão e das primeiras respon-

19 - Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação - Conhecimento e Inclusão Social, da Universidade Federal de Minas Gerais. Bolsista da FAPEMIG.

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sabilidades, influenciando o ingresso nas escolas e atividades mais sistematizadas de aprendizagem. A idade de 7 anos, como um marco para a escolarização, vai sendo aos poucos alterada nos sistemas educacionais e, por diversas razões já bastante explora-das em pesquisas, inclusive apontadas em minha pesquisa de mestrado (OLIVEIRA, 2011), se altera, no ano de 2005, para todo o Brasil, através da Lei nº 11.114/05 que determina, para início no ano de 2006, a matrícula obrigatória no ensino fundamental “a partir dos 6 anos de idade”.

Em relação às orientações para matrícula, diversos pareceres do Conselho Na-cional de Educação estabeleciam que a criança deveria ter 6 anos completos no início do ano letivo para o ingresso no 1º ano, bem como 4 anos para ingresso na pré-escola, também no início do ano letivo. Mas o fator “no início do ano letivo” não foi claro o suficente para regular a questão e esta acabou tendo interpretação polissêmica nos di-versos sistemas educacionais brasileiros. No estado do Paraná, a data limite estende-se até 31 de dezembro e, ainda, a mesma cidade tinha datas-limite diferenciadas para matrícula, como por exemplo a cidade de Belo Horizonte, que, na rede estadual, era 30 de junho e, na rede municipal, 30 de abril. Para resolver a questão do desalin-hamento entre os entes federados, em janeiro de 2010 a Resolução CNE/CEB nº 1 define a data de 31 de março como a data-limite para a criança completar 6 anos. En-contramos vários argumentos para a escolha da data, tais como: o Conselho Nacional de Educação (CNE) teria definido o dia 31 de março, por ser esta a data-limite para o início das aulas em várias instituições do país (IDADE..., 2011) e, ainda, em um Blog na Internet, do dia 10 de dezembro de 2011, o conselheiro Francisco Aparecido Cordão salientou que

após inúmeras audiências públicas e concorridas reuniões de trabalho, de-cidiu adotar a mesma data de corte que já é adotada em situação seme-lhante por todos os nossos “hermanos” dos países membros e associados do mercosul, facilitando assim o livre trânsito dos nossos alunos no âmbito do mercosul, bem como entre as diversas unidades da federação brasileira. (CORDÃO apud CARBONARI, 2011)

O caráter excepcional para matrícula de crianças com 5 anos de idade, indepen -dente da data de aniversário, foi preconizado através da Resolução CNE/CEB nº 1, de 14 de janeiro de 2010 e da de nº 6, de 20 de outubro de 2010, que estabeleceram, respectivamente para os anos de 2010 e 2011, que seriam aceitas as matrículas de crianças com 5 anos de idade, sem limite para data de aniversário, se “no seu per-curso educacional estiveram matriculadas e frequentaram por dois anos ou mais a pré-escola”. Portanto, as escolas tiveram dois anos para alinharem as matrículas das crianças na educação infantil de forma a não terem, em 2012, crianças completando 6 anos após o dia 31 de março. No entanto, muitas escolas não seguiram as orientações e agora grassam pelo país ações judiciais determinando a matrícula de crianças de 5 anos, independente da data em que as crianças completam 6 anos.

Diante desta situação, nos perguntamos se não está havendo um descumprimento

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20 - Em maio de 2010, há uma tentativa de mudança através de um projeto de lei do Senado, de autoria do senador Flávio Arns (PSDB-PR) que queria tornar obrigatória a matrículade crianças aos 5 anos de idade sob a alegação de que a lei não é clara quanto à idade corte para a matrícula da criança, o que gerou inúmeras mobilizações contra a proposta.21 - Lei Estadual 16.049 de 19/02/2009.

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à Lei nº 11.114/2005, que determina a matrícula no ensino fundamental a partir dos 6 anos de idade. A lei é clara: não é a partir de 5 anos, e sim a partir de 6 anos. Não é fácil determinar quem se beneficia desta entrada precoce, antecipada e apressada da criança: a criança, os pais, o governo ou a lógica de mercado de nossa sociedade neo-liberal?

Assim como em outros lugares, na escola é melhor sair na frente para ter certeza de estar sempre “na hora”. Ninguém questiona as origens dessa aceleração da corrida das agulhas: estas designam a norma e fora desta, não há salvação. (MOLLO-BOUVIER, 2005, p. 395)

Pode parecer dramático o excerto acima, mas o interesse das famílias em matricu-lar a criança com 5 anos no ensino fundamental parece ser o de aproximá-las mais cedo da racionalidade adulta; senão, por que geraria tanta ansiedade nos pais a criança permanecer na educação infantil? Outra questão que deve ser levada em consideração é que a evolução e construção das políticas tem assinalado algumas constantes, “no-meadamente as que insistem na deslocação do centro da agenda política educativa do eixo da inclusão e igualdade social das crianças e jovens para objectivos associados à competitividade e à eficácia dos resultados”. (SARMENTO, 2005, p. 27)

E, não tanto para responder, mas mais como uma provocação, pergunto: qual é o papel que a mídia e o judiciário tem desempenhado neste processo?

A MATRÍCULA AOS 5 ANOS NA MÍDIA

Tenho observado diversas reportagens sobre o assunto, mostrando a polêmica que se instalou e as posições divergentes postuladas. Muitas delas mostram certo exagero que não cabe aqui discutir. Exemplifico com algumas manchetes dos últimos dois meses:

Agência Brasil – “Idade mínima para ensino fundamental pode cair” (CIEGLINSKI,2011a); “Justiça Federal derruba idade mínima de 6 anos para entrar na escola” (CIEGLINSKI, 2011b); “MEC vai recorrer de decisão que permite matrícula de cri-anças menores de 6 anos no ensino fundamental” (CIEGLINSKI, 2011c); “Ministério Público quer derrubar regra que estabelece idade mínima para matrícula no Ensino Fundamental” (CIEGLINSKI, 2011d);

Correio Brasiliense – “Idade mínima escolar vai à justiça” (IDADE..., 2011); “Matrícula garantida às crianças do DF” (MATRÍCULA..., 2011);

Diário de Pernambuco – MPF: “Crianças com 6 anos incompletos podem ser matriculadas no ensino fundamental” (MPF..., 2011);

Estado de Minas – “Crianças barradas na escola” (TUPINAMBÁS, 2011a); “Matrícula vira briga judicial” (TUPINAMBÁS, 2011b);

Folha de São Paulo – “Contra regra de idade, pais vão à justiça matricular filhos” (CONTRA..., 2011); “Pais recorrem à justiça para matricular filhos” (PAIS..., 2011c);

G1 – “Educadores em Pernambuco criticam Resolução ‘polêmica’ do CNE”

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(EDUCADORES..., 2011); “Resolução do CNE é alvo de críticas de educadores e pais em Pernambuco” (RESOLUÇÃO..., 2011);

PAIS..., 2011a); O Estado de São Paulo – “Adiantar processo pode prejudicar a criança” (MAN-

DELLI, 2011a); “Conselho mantém regras para escolas Waldorf” (MANDELLI, 2011b); “Escolas Waldorf contestam resolução que exige aluno de seis anos na 1ª série” (MANDELLI, 2011c);

O Globo – “Ação questiona limite de idade para o ensino básico” (AÇÃO..., 2011) Portal Última Instância – “Pais podem ir à justiça para matricular filhos no en-

sino fundamental, diz advogada” (PAIS..., 2011b).É clara a atualidade das discussões por elas encetadas e isso nos mostra a evi-

dência que essa questão afeita à criança e à escolarização tem ganhado na mídia. É importante destacar que as reportagens acima colocaram em evidência as opiniões de pais, professores, sindicatos, juízes e gestores públicos, como as que se seguem:

- Ângela Soligo (Professora da Faculdade de Educação-Unicamp) – “É muito mais preocupante discutir o caso dessas escolas que prometem alfa-betizar o aluno aos 3 anos de idade que essa questão do ingresso aos 7 anos referente à pedagogia Waldorf.” (MANDELLI, 2011a)- Bernadete Lima (Assessora do Sindicato das Escolas Particulares-PB) – “A escola não deve fazer a matrícula porque o pai acha que o filho tem maturidade para a alfabetização. Existe uma coordenação pedagógica e psicológica nas escoolas que pode avaliar se a criança tem tanto o conheci-mento, como condições de acompanhar a turma. Portanto, há muitos casos em que a criança com 5 anos já está apta, sabendo ler e escrever. Não seria justo não poder passar para o ensino fundamental. Talvez, a resolução fun-cionasse apenas para as escolas públicas, nas quais as crianças começam a estudar a partir da alfabetização.” (PAIS..., 2011a)- Cesár Calegari (Conselheiro do CNE) “Uma eventual frouxidão nas normas pode levar uma escola particular a oferecer o ingresso mais cedo ao aluno por uma disputa mercadológica, atendendo a ansiedade de pais aflitos que querem que a criança comece logo a estudar. A norma preserva o direito que uma criança tem de viver plenamente sua infância e não submetê-la a exigências de rendimento que são próprias do ensino funda-mental.” (CIEGLINSKI, 2011d)- Cláudia Gama (Professora de uma escola Waldorf) – “Não é só maturi-dade intelectual, mas a emocional também. Ela aprende a lidar melhor com problemas, frustações e autoestima.” (MANDELLI, 2011a)- Cláudio Kitner (Juiz da 2ª Vara da Justiça Federal-PE) “As resoluções do CNE põem por terra a isonomia, deixando que a capacidade de aprendi-zagem da criança individualmente considerada seja fixada de forma gené-rica e exclusivamente com base em critério cronológico, que não tem qualquer cientificidade comprovada.” (TUPINAMBÁS, 2011b)- Francisco Aparecido Cordão (Relator da Resolução 6/2010, em ofício enviado ao Procurador da República, datado de 17/11/11) – “As normas,

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diálogos e entendimentos, há 5 anos, já vem orientando um enorme e bem sucedido esforço de alinhamento por parte das famílias, escolas, redes e sistemas de ensino em torno de um marco regulatório quanto aos procedi-mentos de matrícula das crianças no 1º ano do EF. A liberdade e a autono-mia dos sistemas de ensino não podem significar soberania dos mesmos, de modo que coloque em risco o direito subjetivo universal das crianças brasileiras à Educação obrigatória. (PAIS..., 2011a)- Isabella Menta Braga (Advogada especialista em direito civil) – “Os pais não podem ser obrigados a arcar com 12 meses de mensalidade para que seus filhos cursem a mesma grade que cursaram no ano anterior. Essa situ-ação não pode ser admitida ou, se o for, os pais não podem ser obrigados a arcar com o pagamento da mensalidade, já que pagarão duas vezes para receber o mesmo serviço.” (PAIS..., 2011b)- Luciana Oliveira (Chefe do Núcleo de Desenvolvimento Curricular e Políticas Públicas do Ensino Fundamental – Anos Iniciais-DF) – “Se houver muito questionamento em relação à norma, o MEC terá de chamar a sociedade para uma nova discussão e verificar a real necessidade de mudanças.” (MATRÍCULA..., 2011)- Luis Cláudio Megiorin (Presidente da Associação de Pais e Alunos do DF (Aspa-DF)) – “Isso se tornou uma data de corte. É arbitrária, casuística. Demonstra falta de sintonia entre o Conselho, a Secretaria de Educação e o sindicato das escolas para discutir a melhor saída.” (MATRÍCULA..., 2011)- Nilton Alves (Presidente do Conselho de Educação do DF e relator do Parecer 228/2011) – “A melhor instituição para avaliar a capacidade da criança é a escola, juntamente aos familiares. Se a criança mostrar matu-ridade e bom desempenho educacional, o colégio tem autonomia e deve promovê-la.” (MATRÍCULA..., 2011)- Sinep/MG - “A resolução do Conselho Nacional de Educação criou uma situ-ação complicada para famílias cujos filhos já estudavam dentro da regra ante-rior. As crianças teriam que passar pelo constrangimento da repetência e os pais sofreriam uma ansiedade enorme.” (TUPINAMBÁS, 2011b)

Além da ausência das crianças na discussão, também é possível afirmar que es-ses fragmentos nos mostram o potencial que o assunto engendra e como os debates para a delimitação de uma data não foram amplos o suficiente e, possivelmente, essa discussão tenha que considerar o que a criança representa hoje para a sociedade e ser mais abrangente e visível. As discussões, muito além de mercadológicas ou de desen-volvimento cognitivo, devem incluir o que tudo isso significa para as crianças, para o seu bem-estar e para o seu desenvolvimento social e cultural. Coaduno com Qvortrup (2011) em seu estudo de 1993, intitulado “Nove teses sobre a infância como um fenômeno social”, e, com isso, não pretendo afirmar que cada criança, em particular, deva manifestar-se sobre cada questão que as envolvem; significa, contudo, que “to-dos os eventos, grandes e pequenos, terão repercussões sobre as crianças, como parte da sociedade e, em consequência, elas terão reivindicações a serem consideradas nas análises e nos debates acerca de qualquer questão social maior.” (QVORTRUP, 2011, p. 202). Além disso, é necessário levantar ainda outras questões: o que as famílias

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esperam da escola? Por que, sobretudo, os sindicatos das escolas particulares defen-dem a derrubada da data-limite? Qual constrangimento pode haver para as crianças de 5 anos o fato de ficarem um ano a mais com atividades mais lúdicas na educação infantil? Por que muitas familias entendem que se a criança de 5 anos continuar na educação infantil ela estará repetindo de ano ou sendo reprovada?

A E LATNEMADNUF ONISNE ON SONA 5 ED AÇNAIRC AD ALUCÍRTAM AJUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

Segundo Cury e Ferreira (2010), cada vez mais o poder judiciário está sendo chamado a dirimir as mais variadas questões que antes não eram levadas ao seu con-hecimento. Asseveram que o processo de judicialização da educação ocorre “quando aspectos relacionados ao direito à educação passam a ser objeto de análise e de jul-gamento pelo poder judiciário”, o que significa a “intervenção do poder judiciário nas questões educacionais em vista da proteção desse direito até mesmo para se cumprir as funções constitucionais do Ministério Público e outras instituições legitimadas”. (CURY; FERREIRA, 2010, p.3-5)

De acordo com Silveira (2011), “a maioria das ações é levada a litígio em perío-dos específicos, ocasionadas por alterações nas políticas de oferta do atendimento educacional e na legislação”, o que de fato ocorreu com a mudança no atendimento educacional à criança de seis anos, pois nos últimos anos a judicialização da educação tem se apresentado como uma estratégia para a garantia do direito de matrícula de crianças de cinco anos no ensino fundamental; contudo não é de forma clara que o debate se realiza no Judiciário.

Cury e Ferreira (2009), analisando as consequências da relação entre justiça e educação, apontam três questões importantes em relação ao sistema de educação: a) a transferência de responsabilidades de questões que podem ser resolvidas na própria escola para o sistema jurídico; b) o desconhecimento pela escola das atribuições do sistema de garantia de direitos; c) a necessidade de ações integradas entre a escola e o sistema de proteção da criança e do adolescente. Igualmente apontam três questões que se colocam em relação ao sistema de proteção: a) o desconhecimento dos inte-grantes do sistema jurídico sobre o sistema de ensino e despreparo dos seus membros para lidar com os problemas da educação; b) o exagero na forma de agir, levando a uma indevida invasão do sistema legal no educacional e, por fim, c) a burocratização das ações, levando a efeitos tardios e inócuos. (CURY; FERREIRA, 2009, p. 43-44)

Em Minas Gerais, no último mês, sete liminares foram concedidas para a matrícu-la de crianças com idade fora da exigência legal em colégios particulares. Em Per-nambuco, os sindicatos de escolas particulares orientavam os pais a procurarem a justiça para conseguirem matricular as crianças pequenas, com a alegação de que “No momento em que ele [o pai] tem um instrumento legal, como uma liminar, as escolas estarão obrigadas a fazer a matrícula.” (EDUCADORES..., 2011). No final de novembro de 2011, dia 22, em caráter liminar, o Ministério Público deste estado

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determinou a suspensão da Resolução CNE/CEB nº 6/2010, válida para todo o país até que o mérito da ação seja julgado.

Com o mesmo objetivo, no Distrito Federal, no mês de novembro de 2011, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPFDT) ingressou com uma ação civil para suspender os efeitos da Resolução CNE/CEB nº 6, sob a alegação de que a mesma feriu a liberdade/autonomia de organização dos sistemas de en-sino estadual, municipal e distrital, prevista constitucionalmente, para adotar outros critérios de acesso ao ensino fundamental além do critério da idade. Em reportagem do Correio Brasiliense do dia 23/11, o procurador responsável pela ação Carlos Henrique Martins Lima “pede que ela passe de condição de obrigatória para a de referência”. (IDADE..., 2011).

Em uma breve pesquisa na jurisprudência sobre o assunto, foi possível observar que não há consenso sobre a matéria e os argumentos se diferenciam bastante. Em um único processo, solicitando a matrícula de uma criança, o pedido foi negado e, em instância superior, concedido sob diferentes alegações. Neste primeiro excerto, o pedido foi indeferido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. A fixação de idade mínima para cursar o ensino fundamental tem por finalidade garantir que as crianças já estejam aptas a frequentar o ambiente escolar com reais condições de aprendi-zado e socialização, sem correr riscos de danos psicológicos e emocionais devido à tenra idade.Assim, o CNE, no exercício do seu poder de regulamentar assuntos pertinentes à educação, houve por bem, ao editar a referida resolução, destinar as matrícu-las no 1º ano do ensino fundamental somente àquelas crianças que completas-sem 06 anos de idade até 31/03, não se percebendo nenhuma ilegalidade ou abuso de poder em tal ato.Aliás, pelo contrário. Denota-se uma preocupação do Estado em proteger as crianças que não estão aptas a enfrentar um ambiente educacional/escolar.Ora, uma vez que é materialmente impossível a verificação da maturidade neurológica de cada criança, é preciso estabelecer um critério objetivo, que, in casu, foi a idade, o que, considerada a natureza da questão, é perfeitamente admissível. (BRASIL, 2011)

É evidente a posição adotada pela jurista favorável a uma idade mínima para a matrícula da criança pequena e a uma data-limite estipulada pelo CNE. Contudo a decisão final favorável à matrícula da criança sem data-limite para completar 6 anos foi proferida, neste mesmo processo, conforme se segue:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. 6. A princípio, parece que razão assiste à agravante, visto que o acesso à educação é um direito garantido pela Cons -tituição Federal, resguardado no art. 227, que dispõe ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à educação. 7. Parece que a Lei nº 9.394/1996, ao esta-belecer as diretrizes e bases da educação nacional, nada dispôs sobre o esta-

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belecimento de data de corte/limite referente à idade de acesso à educação infantil ou ensino fundamental. 8. Dessa forma, estabelecer limitação de acesso à educação em razão de data em que a criança completa a idade de acesso ao nível escolar não me parece revestido de razoabilidade visto não haver previsão legal para tanto, bem como pelo fato de que a capacidade de aprendizado é individual, podendo ser determinada não somente pela idade, mas também pela capacidade intelecto/psicológica de cada criança, que poderá ser conferida pelas escolas, de forma individualizada, por meio de testes psicológicos/pedagógicos. (BRASIL, 2011)

O jurista coloca que uma data-limite fere o princípio da razoabilidade e dá ênfase à capacidade da criança de aprender, “que poderá ser conferida pelas escolas, de forma individualizada, por meio de testes psicológicos/pedagógicos”. Para garantir direitos iguais para todos, seria necessário que nossas escolas estivessem preparadas para apli-car “testes psicológicos/pedagógicos” em todos os seus alunos, independentemente de serem instituições públicas ou privadas, o que, sabidamente, não é o caso. Ressalto, além disso, que as demandas na justiça são de famílias das camadas média e alta e “os grupos mais vulneráveis socialmente tendem a ter menor capacidade para transformar a experiência da lesão em litígio”. (SOUSA SANTOS et al. apud SILVEIRA, 2011, p. 5)

Também na mesma lógica da avaliação da criança, trago o trecho abaixo que refere-se à decisão favorável à matrícula das crianças pelo Ministério Público do Es-tado de Mato Grosso do Sul:

Para privar o acesso ao ensino fundamental, o Estado ou Municípios de-vem provar, então, que a criança não possui capacidade para iniciar o seu aprendizado, isto de forma individual, não genérica, porque a capacidade de cada um, prevista constitucionalmente como garantia à educação, bem assim na LDB e no ECA, não se afere única e exclusivamente pela idade cronológica. Com isso, não é difícil concluir que uma criança prematura-mente capaz possa ingressar no ensino fundamental antes de cinco, seis ou sete anos, porque a sua capacidade lhe assegura o direito à educação, e tal circunstância não estaria a burlar qualquer legislação[...] julga-se pro-cedente a presente ação civil pública para, em confirmando liminar conce-dida anteriormente, determinar ao Estado de Mato Grosso do Sul e Municí-pios de Ivinhema e Novo Horizonte do Sul que matriculem e mantenham matriculados no ensino fundamental as crianças menores de seis anos que comprovarem, através de submissão à avaliação da equipe nomeada pelo juízo, terem a capacidade para o início dos estudos[...].

A determinação é para que uma equipe multidisciplinar – composta por uma professor da rede estadual, um professor da rede municipal e uma psicóloga – avalie as crianças. Não há na sentença nenhuma dúvida sobre ser ou não o ensino fundamental o melhor lugar para a criança de 5 anos e mesmo “antes de 5” como diz o relator. Nas duas jurisprudên-cias analisadas, o parâmetro foi a “capacidade” da criança e não o seu desenvolvimento sócio-afetivo. Não observei uma visão global da criança e nem a referência à infância

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como etapa propícia para o desenvolvimento de atividades mais lúdicas e de brincadeiras. Dessa forma, fica a pergunta: o que é, afinal de contas, ser criança neste início de século?

O DIREITO A TER INFÂNCIA

Muitos argumentos encontrados para adiantar, apressar e acelerar as aprendiza-gens e os processos escolares, com a matrícula da criança aos 5 anos no ensino fun-damental, não se apoiaram no bem-estar da criança e no que é melhor para a infância. Queimar etapas no desenvolvimento pode ser prejudicial à criança e cada vez mais os consultórios de psicologia estão recebendo crianças forçadas precocemente a atender às expectativas dos adultos. Defendo que a criança pequena, antes de completar 6 anos, deva permanecer na educação infantil, cuja preparação do tempo e do espaço é feita para que as crianças possam brincar e interagir, o que não acontece no ensino fundamental, e que é essencial para o pleno desenvolvimento da criança, tendo in-clusive influência sobre o seu desempenho escolar futuro. “Antecipar muitas vezes é perder tempo e não ganhar tempo.” (CRAIDY; BARBOSA, 2011, p.35)

Há um senso comum de que, simplesmente por já estar alfabetizada, a criança necessita entrar logo no ensino fundamental. Mas o fato é que, cada vez mais, muitas crianças se alfabetizam mais cedo, devido ao maior número de estímulos presentes em nossa sociedade. Este deixa, portanto, de ser um critério a ser considerado para a entrada nesta etapa de ensino. Em geral, parece não ser consenso a importância e a especificidade da educação infantil e muitas famílias consideram que as crianças es-tariam perdendo tempo nesta etapa, pois as crianças “só brincam e não fazem nada”. Sendo assim, a escola “de verdade” é associada ao ensino fundamental, no qual “as crianças de fato aprendem”. E, nesse sentido, é ainda pertinente a pergunta de Mollo-Bouvier (2005), se “seriam as aprendizagens precoces um antídoto contra o temor dos pais diante do futuro?” ou ainda a sua afirmação de que “hoje em dia, o tempo social concedido à infância segmenta-se, encurta e, às vezes, cai no esquecimento”. (MOLLO-BOUVIER, 2005, p. 394-400).

Para Craidy e Barbosa (2011),

As decisões políticas e as tendências culturais apontam para que as crian-ças tornem-se adolescentes cada vez mais cedo e, de acordo com a classe social, lhes exige que sejam produtivas, precoces, competitivas, erotizadas. Paradoxalmente a adolescência e a vida adulta são momentos que vêm se prolongando. Por que antecipar o final da infância? Por que não dar mais tempo para este período da vida onde construímos os primeiros sentidos para aquilo que nos torna humanos? Por que não ter mais tempo para brin-car, conviver, ouvir histórias, conversar, construir mundos? (CRAIDY; BARBOSA, 2011, p. 33)

Envolvida cada vez mais cedo em processos de escolarização, a criança tem al-guma coisa roubada de sua infância. São criados tempos, espaços e atividades para

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cada idade da criança que se encarregam de sua vida e socialização.Qvortrup (2011) relata duas características – a prática e a legal – definidoras da infân-cia na sociedade moderna:

primeiramente uma, relacionada à prática, principalmente à escolarização das crianças ou, em termos mais gerais, à institucionalização das crianças; o que pode significar uma situação de confinamento até o final da infância, que coincidiria, então, com o final da escolarização compulsória. Em se -gundo lugar, em termos legais, o lugar da criança como menor – um lugar que é dado pelo grupo dominante correspondente, os adultos. Em nenhum desses casos nós precisamos ter idades fixadas em termos biológicos, mas definições determinadas socialmente. (QVORTRUP, 2011, p. 204-205)

A concepção de infância tem uma variabilidade histórica e, para ser compreen-dida, não é possível separar a infância da sociedade na qual vive. Interessa à Sociolo-gia da Infância compreender essas mudanças na concepção de infância, pois, presumi-velmente, refletem em mudanças de atitude em relação às crianças. (QVORTRUP, 2011b). Momo e Costa (2009) apresentam, em seus estudos sobre a pós-modernidade, como as crianças nas escolas são produzidas, formatadas, fabricadas na sociedade da mídia e do consumo, configurando os novos modos de ser criança e de viver a infân-cia, que já não são mais definidos pela idade. Dessa forma, o que define a infância são os entendimentos, os significados e as práticas que estão a elas relacionados. E, assim, outra pergunta que me faço é quais são os entendimentos e os significados sobre a infância e o que é ser criança na concepção de professores e famílias neste início de século? Compreender esta questão pode nos ajudar a compreender o anseio para que elas “cresçam rápido”, “aprendam rápido” e “entrem logo na escola”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

São necessários mais estudos e reflexões para avaliar o impacto na vida das crian-ças e na infância desse apressamento da escolarização que a coloca mais cedo – com apenas cinco anos – no ensino fundamental. Ampliar estes estudos pode nos ajudar a compreender qual é a influência desse novo contexto na subjetividade infantil.

Entender melhor esse “empurramento” que as políticas educacionais e as famílias vêm fazendo, e que a jurisprudência muitas vezes tem ajudado, apressando a entrada da criança no ensino fundamental, constitui uma tarefa necessária para compreender como vem se constituindo a infância na sociedade contemporânea e como responder às complexas questões sobre a escolarização da infância que emergem neste século 21.

E, finalmente, levanto aqui a questão de que é, mais uma vez, a sociedade adul-tocêntrica que está a decidir a vida da criança a partir de seus próprios anseios e visão. Além disso, precisamos pensar modos de deixar que as próprias crianças sejam sujeitos ativos na construção e determinação de sua própria vida educacional e social. Dessa forma, será possível iniciar o processo de reconstrução do lugar social da infân-cia em nossa sociedade.

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TEXTO 3: A JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

Carlos Roberto Jamil Cury Luiz Antonio Miguel Ferreira

1. Introdução. 2. Justiça e Educação. 3. Educação e a proteção judicial à educação. 4. Ato infracional. 5. Evasão Escolar; 6. Qualidade da Educação; 7. Conseqüências da judicialização da educação. 8. Considerações finais. 9. Referência bibliográfica.

Resumo: O presente texto busca apresentar as relações que se firmam entre o direito e à educação, com a conseqüente intervenção do Poder Judiciário, Ministério Público e Conselho Tutelar no cotidiano escolar, e os reflexos que apresenta esta relação.

1. INTRODUÇÃO

A atual Constituição Federal de 1988 representou um marco significativo no en-caminhamento dos problemas relativos à educação brasileira, posto que estabele-ceu diretrizes, princípios e normas que destacam a importância que o tema merece. Reconheceu a educação como “um direito social e fundamental, possibilitando o de-senvolvimento de ações por todos aqueles responsáveis pela sua concretização, ou seja, o Estado, família, sociedade e a escola (educadores)” (FERREIRA, 2008, p. 37), bem como a concebeu como um direito público subjetivo, assim compreendido como a faculdade de se exigir a prestação prometida pelo Estado .

Na verdade, estabeleceu uma verdadeira declaração de direitos relativos à educação, que, segundo Oliveira (2001, p. 41) resumem-se em:

perspectiva da obrigatoriedade do ensino médio, substituída pela perspectiva de sua universalização com a EC. 14;

atendimento, em creche e pré-escola, às crianças até cinco anos de idade (redação de acordo com a Emenda Constitucional n. 53/06);

Esta versão legal do direito à educação, dentro desse conjunto, não se mostrava presente nas constituições passadas, e por conseqüência, no ordenamento jurídico vi-gente. Até então, tínhamos boas intenções e proteção limitada com relação à educação, mas não uma proteção legal, ampliada e com instrumentos jurídicos adequados à sua efetivação. Basta analisar o que afirma KOZEN (199, p. 659) a respeito do assunto:

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22 - Professor Titular da UFMG (aposentado); Professor Adjunto da PUC Minas.23 - Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em educação pela UNESP. Autor do livro:O Estatuto da Criança e do Adolescente e o Professor (Cortez, 2008). 24- E “se há um direito público subjetivo à educação, o Estado pode e tem de entregar a prestação educacional” (José Cretella Júnior, apud MUNIZ: 2002, pág. 99).

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Até a vigência da atual Constituição Federal, a educação, no Brasil, era havida, genericamente, como uma necessidade e um importante fator de mudança social, subordinada, entretanto, e em muito, às injunções e aos acontecimentos políticos, econômicos, históricos e culturais. A norma-tividade de então limitava-se, como fazia expressamente na Constituição Federal de 1967, com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 01, de 17 de outubro de 1969, ao afirmar da educação como um direito de todos e dever do Estado, com a conseqüente obrigatoriedade do ensino dos 7 aos 14 anos e a gratuidade nos estabelecimentos oficiais, restringindo-se, quanto ao restante, inclusive na legislação ordinária, a dispor sobre a organização dos sistemas de ensino. Em outras palavras, a educação, ainda que afirmada como um direito de todos, não possuía, sob o enfoque jurídico e em qualquer de seus aspectos, excetuada a obrigatoriedade da matrícula, qualquer instrumento de exigibilidade, fenômeno de afirmação de determi-nado valor como direito suscetível de gerar efeitos práticos e concretos no contexto pessoal dos destinatários da norma.

Assim, a partir da atual Constituição e das leis que se seguiram, a educação passou a ser efetivamente regulamentada, com instrumental jurídico necessário para dar ação concreta ao que foi estabelecido, pois de nada adiantaria prever regras jurídicas com relação à educação (com boas intenções) se não fossem pre-vistos meios para a sua efetividade.

Desta forma, a partir de 1988, o Poder Judiciário passou a ter funções mais sig-nificativas na efetivação desse direito. Inaugurou-se no Poder Judiciário uma nova relação com a educação, que se materializou através de ações judiciais visando a sua garantia e efetividade. Pode-se designar este fenômeno como a JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO, que significa a intervenção do Poder Judiciário nas questões edu-cacionais em vista da proteção desse direito até mesmo para se cumprir as funções constitucionais do Ministério Público e outras instituições legitimadas.

Esta nova relação foi bem analisada, por exemplo, no artigo denominado A JUDI-CIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES ESCOLARES E A RESPONSABILIDADE CIVIL-DOS EDUCADORES de autoria de Álvaro Chrispino e Raquel S. P. Chrispino, onde o tema educação e direito voltou a ser debatido.

Como destacado no texto, os autores caracterizaram “a judicialização das relações escolares como aquela ação da Justiça no universo da escola e das relações escolares, resultando em condenações das mais variadas”, destacando que os profissionais da educação não estão sabendo lidar com todas as variáveis que caracterizam as relações escolares. Fundamentaram o texto no Código Civil, Estatuto da Criança e do Adoles-cente e Código de Defesa do Consumidor para destacar a responsabilidade civil dos educadores, apresentando várias decisões da Justiça brasileira de ações envolvendo as escolas. Destacam, por fim, a necessidade de se firmar um novo pacto entre os atores educacionais (professores, gestores e comunidade) a fim de preparar os educadores para que possam dar direção e tomar decisões sobre o universo escolar.

Os autores apontam a responsabilidade objetiva (dano e relação de causalidade, sem a necessidade de demonstração de culpa) dos estabelecimentos de ensino (públi-

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cos ou privados) nas relações escolares, como, por exemplo, na obrigação de guarda e vigilância do aluno, acidentes que ocorrem em laboratório de química ou na aula de educação física, e outras hipóteses, citando várias decisões a respeito.

Não obstante o citado artigo revelar, com muita propriedade, uma face da judi-cialização das relações que se firmam com a escola e os educadores, ou seja, a respon-sabilidade civil, não há como negar que outras relações também se verificam e

acabam por colocar a educação sob atribuições do poder judiciário. Este estudo busca apresentar estas outras situações. Isto porque, como já afirmado, a partir da Constituição Federal de 1988, com o efetivo reconhecimento da educação como di-reito social e direito público subjetivo e da judicialização destes direitos (saúde, edu-cação, proteção à maternidade e a infância, trabalho, segurança, lazer moradia), cada vez mais o poder judiciário está sendo chamado a dirimir questões das mais variadas e que antes não eram levadas ao seu conhecimento.

De sorte que, além da responsabilidade civil da escola e dos educadores, outras demandas surgiram envolvendo estes atores. A consolidação dos direitos sociais apre-sentou como reflexo uma nova faceta, que não tem precedente na história do direito: uma relação direta entre a justiça e educação. Como a mesma ocorre? É o que se passa a demonstrar.

2. JUSTIÇA E EDUCAÇÃO

A educação está regulamentada por meio do capítulo de educação na Constitu-ição Federal de 1988, e por meio de leis, como a do Estatuto da Criança e do Ado-lescente (Lei n. 8.069/90), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/96), o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF, agora substituído pelo Fundo de Ma-nutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissio -nais da Educação –FUNDEB, o Plano Nacional de Educação, e inúmeros decretos e resoluções que direcionam toda a atividade educacional, com reflexos diretos para os estabelecimentos escolares e os sistemas de ensino onde estão presentes res -ponsáveis pelo ensino como diretores, coordenadores pedagógicos, supervisores, professores, os próprios alunos e dirigentes de ensino seja dos órgãos executivos, seja dos órgãos normativos.

Essa legislação, em síntese, regulamentou a educação como um direito de todos e um dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. Buscou a universalização do ensino público (em especial, do ensino funda-mental, dado seu caráter obrigatório), garantindo escola para todos, inclusive àqueles que não tiveram acesso na idade própria, ou seja, uma educação para todos, criando mecanismos para a sua garantia.

Não há como negar uma relação especial entre o direito (a lei) e a educação e a necessidade de seu conhecimento para o pleno desenvolvimento de suas atividades, apesar do desconhecimento de aspectos específicos da parte de muitos educadores o que pode gerar posturas de resistência a essa novidade.

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Com este paradigma, novas situações surgiram, envolvendo a escola e outros atores que até então não participavam diretamente da questão educacional a não ser esporadicamente. Com efeito, como a universalização e obrigatoriedade do ensino (fundamental) implicam em colocar todas as crianças na escola, ou seja, todas as crianças com suas características pessoais, o sistema educacional passou a conviver com uma maior grandeza de diversidade sócio-cultural em que adentram a escola pe-las crianças com peculiaridades próprias. Tal situação faz aparecer pessoas com suas individualidades rompendo com um imaginário homogeneizante.

Não que tal realidade relativa às peculiaridades não existisse, mas como a edu-cação era elitista e seletiva, a grandeza numérica associada a um perfil sócio-cultural mais homogêneo não ganhava tanta expressão. Por exemplo, em 1950, de acordo com o IBGE, pouco mais de 17% possuía o grau primário completo, o que impunha sérios obstáculos à democratização do ensino para todos .

Por outro lado, a atual legislação também acabou por estabelecer um sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente (entre eles o direito à educação) envolvendo o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Segurança Pública, Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente e Conselho Tutelar. Estas

instituições, chamadas a operar na área educacional e da infância e da juventude, também não se apresentavam devidamente preparadas para tal desafio, até porque, os conselhos de direitos e conselhos tutelares foram criados nesta oportunidade, ou seja, inexistiam antes da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente. O Poder Judiciário e Ministério Público desempenhavam outras atividades na área menorista, pouco voltada à questão educacional. A entrada da LDB e das leis reguladoras do FUNDEF e do FUNDEB criaram os Conselhos de Acompanhamento e Controle dos Recursos que devem ser aplicados na educação escolar.

Soma-se a esta situação o reconhecimento na Constituição Federal da educação como o primeiro dos direitos sociais. Assim foi estabelecido:

Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infân-cia, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Este reconhecimento implica na obrigação do Poder Público de garantir a edu-cação visando a igualdade das pessoas e por outro lado, garante ao interessado o poder de buscar no Judiciário a sua concretização.

A Constituição de 1988 foi além, estabelecendo, em capítulo próprio, várias dis-posições relacionadas ao direito a educação e apontando ao Estado algumas obriga-ções como, por exemplo:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno

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25 - Nesse sentido afirma ESTEVES (1995, p. 96): A passagem de um sistema de ensino de elite para um sistema de ensino de massas implica um aumentoquantitativo de professores e alunos, mas também o aparecimento de novos problemas qualitativos, que exigem uma reflexão profunda. Ensinar hoje é diferentedo que era há vinte anos atrás. Fundamentalmente, porque não tem a mesma dificuldade trabalhar com um grupo de crianças homogeneizadas pela seleção ou enquadrara cem por cento as crianças de um pais, com os cem por cento de problemas sociais que essas crianças levam consigo.

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desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante agarantia de:I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria;II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criaçãoartística, segundo a capacidade de cada um;VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de progra-mas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.§ 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.§ 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.§ 3º - Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino funda-mental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

Em face destes dispositivos, com eficácia plena, fica evidente que se o Poder Públi-co como Poder Executivo não cumpre com a sua obrigação poderá o interessado acionar o Poder Judiciário visando a sua responsabilização.

Nesse sentido afirma MUNIZ (2002, p. 122) que as normas constitucionais que disci-plinam o direito à educação, ora visto como integrante do direito à vida, ora como direito social, hão de ser entendidas como de eficácia plena e aplicabilidade imediata, produzindo efeitos jurídicos, onde todos são investidos no direito subjetivo público, com o efetivo exercício e gozo, indispensáveis para o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Resulta desta situação uma relação direta envolvendo o direito e a educação, sendo que a justiça passou a ser chamada amiúde a solucionar conflitos no âmbito escolar, que extrapolam a questão da responsabilidade civil , ou seja, se antes se contemplava na esfera do judiciário, ações de indenizações ou reparação de danos envolvendo o sistema educacional, ou mandados de segurança para garantia de atribuições de aulas a profes-sores, hoje, a realidade é bem diversa, e várias são as situações em que se provoca o judiciário com questões educacionais. A efetividade do direito à educação prevista no Constituição Federal, a ocorrência de atos infracionais ocorridos no ambiente escolar e a garantia da educação de qualidade passaram a ser objeto de questionamento judicial.

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26 - E até mesmo a responsabilidade penal, posto que poucas são as informações que mostram a aplicação do art. 246 do Código Penal, que estabelece o crime e abandonointelectual, prevendo: Art. 246 – Deixar sem justa causa de prover à instrução primaria de filho em idade escolar – Pena: Detenção de quinze dias a um mês e multa.

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3. EDUCAÇÃO E A PROTEÇÃO JUDICIAL À EDUCAÇÃO

Do que foi exposto, pode-se resumir que a garantia do direito à educação, sob o enfoque legal, ocorre nos seguintes tópicos:

Atendimento especializado aos portadores de deficiência; Atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de idade; Oferta de ensino noturno regular e adequado às condições do adolescente trabalhador; Atendimento no ensino fundamental por meio de programas suplementares de mate-

rial didático-escolar, transporte alimentação e assistência à saúde;

Direito de contestar os critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias esco-lares superiores;

rganização e participação em entidades estudantis; Acesso à escola próximo da residência; Ciência dos pais e ou responsáveis do processo pedagógico e participação na

definição da proposta educacional;

Quando um destes direitos relacionados à educação não for devidamente satisfeito pelos responsáveis públicos ou, quando for o caso, privados, gera aos interessados, a possibilidade do questionamento judicial. Daí o surgimento da JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO, que ocorre quando aspectos relacionados ao direito à educação passam a ser objeto de análise e julgamento pelo Poder Judiciário.

Em outros termos, a educação, condição para a formação do homem é tarefa fun-damental do Estado, é um dos deveres primordiais, sendo que, se não o cumprir, ou o fizer de maneira ilícita, pode ser responsabilizado (MUNIZ, 2002, p. 211). Esta responsabilização com a intervenção do Poder Judiciário consolida o processo de ju-dicialização da educação.

Este fenômeno se verifica em face da ocorrência de fatores que impliquem na ofensa a esse direito decorrentes de:

a) Mudanças no panorama legislativo;b) Reordenamento das instituições judicial e escolar;c) Posicionamento ativo da comunidade na busca pela consolidação dos direitos sociais.A nova legislação, que reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de di-

reitos; a educação como direito social e público subjetivo; que garante a busca pelos interessados da efetividade e consolidação deste direito; a acessibilidade da Justiça, com mudança de paradigma em relação a questões como educação, saúde, criança e adolescente; o surgimento da intervenção de outras instituições como Conselho Tute-

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mentos, inclusive os envolvidos na preparação (açúcar, óleo, gás de cozinha, água filtrada, etc.), promovendo a adequação do programa a todas as

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lar e Ministério Público apresentam-se como fatores determinantes deste novo fenô-meno: a judicialização da educação.

Como afirmado, o paradigma atual é o da educação para todos. Os índices de es-colaridade aumentaram significativamente, demonstrando que após o novo comando constitucional, está ocorrendo a efetiva matrícula das crianças no ensino obrigatório, cumprindo-se a determinação legal. Diante desta nova realidade e dos conflitos e problemas oriundos desta relação, fica evidente que a intervenção judicial não mais se limita a questões como a da responsabilidade civil dos educadores ou criminal dos pais ou responsáveis. Novos questionamentos relacionados à educação são levados diariamente ao Poder Judiciário, que passou a ter uma relação mais direta, com uma visão mais social e técnica dos problemas afetos à educação.

Decorre desta nova realidade, o chamamento do Poder Judiciário por parte do próprio interessado (aluno e/ou responsável), Ministério Público, Defensores Públi-cos ou Conselho Tutelar com inúmeras hipóteses de judicialização das relações edu-cacionais . Para além da garantia de acesso ao ensino público de qualidade, são exem-plos de situações que envolvem o Poder Judiciário e a educação, entre outras :

a. MERENDA ESCOLAR:

A Constituição Federal (art. 208, VII), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 54, VII) e a LDB (art. 4.º, VIII) e a meta 18 de capítulo do ensino fundamental do Plano Nacional de Educação estabelecem a necessidade de atendimento ao educando, no ensino fundamental, de programa suplementar de alimentação. Assim, o forneci-mento e a qualidade da alimentação passaram a ser objeto de análise judicial, como se observa das seguintes ementas:

Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal em face do Município de Sapé – PB e FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. A ação tramita perante o Tribunal Regional Federal da Par -aíba – Seção judiciária – 2007.82.00.008137-5. Consta como pedido da ação civil pública: a) a regularização do fornecimento da merenda escolar, conforme o cardá -pio elaborado, sem deixar faltar um item sequer para a elaboração dos ali-

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exigências previstas na lei e no regulamento; b) providencie a adequação das condições de transporte de alimentos perecíveis às escolas situadas fora do núcleo urbano, disponibilizando para tanto acondicionamento adequado por meio de freezers, etc. c) providencie a adequação das condições das escolas para a conservação e armazenamento dos gêneros alimentícios, disponibilizando água encanada, filtros, geladeiras, armários, e tudo o mais necessário conforme as normas de correta manipulação de alimentos prevista pela Vigilância Sanitária;d) Sejam disponibilizadas merendeiras ou servidores habilitados para o

27- Pode-se obter mais informações a respeito destas instituições através dos sites: www.tj.sp.gov.br, www.mp.sp.gov.br , www.mj.gov.br/defensoria ; www.stj.gov.br. 28 - Nos tópicos seguintes são citadas ementas (súmulas - resumos) de decisões dos Tribunais bem como de ações promovidas pelo Ministério Público(ação civil pública ou inquéritos civis) relacionadas à educação.

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manuseio e preparo de alimentos para todas as escolas municipais, no prazo de 60 (sessenta) dias; e) seja estruturado o CAE – Conselho de Alimentação Escolar - para seu perfeito funcionamento mediante a disponibilização de sala de reuniões, computador, telefone, secretária e veículo para realização de inspeções e vistoriasAção Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Olinda – PE visando o fornecimento de merenda escolar aos beneficiados, assim considerados os alunos matriculados na pré-escola e no ensino fundamental da rede municipal, sob pena do pagamento de 10.000 (dez mil reais) por dia de atraso, com fundamento do artigo 213, parágrafos 2º e 3º, da Lei nº 8.069/90 e artigo 214 da mesma legislação, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal.

b. TRANSPORTE ESCOLAR:

Da mesma forma como mencionado no item anterior, a Constituição Federal (art. 208, VII), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 54, VII) e a LDB (art. 4.º, VIII), meta 17 capítulo do ensino fundamental do Plano Nacional de Educação, também estabelecem a necessidade de atendimento ao educando, no ensino fundamental, de programa de transporte. Nesse sentido, apontam as decisões a seguir:

APELAÇÃO CÍVEL - Apelo voluntário da Municipalidade – Contagem de prazo que se submete à regra do art. 198, II, do ECA, ainda que apli-cado em dobro, em razão do disposto no art. 188 do Código de Processo Cível – Intempestividade da apelação do Município – Não conhecimento – Reexame necessário – Transporte escolar que deve ser providenciado, gratuitamente, a todos os estudantes, crianças e adolescentes do Município, das zonas urbanas e rural – Inteligência dos arts. 30, VI, 211, par. 2º e 227 da Constituição Federal, combinados com os arts. 54, I e VII e 208, I e V, do ECA – Improvimento. “Apelação Cível nº 59.494-0/0 – Comarca de Ituverava – TJSP – Relator Des. Nigro Conceição – j. 09/11/00.MANDADO DE SEGURANÇA - Impetração objetivando compelir o Mu-nicípio de Buritizal a fornecer transporte escolar a aluno do ensino fun-damental residente na zona rural - Segurança concedida corretamente em primeiro grau - Constituição Federal que impõe aos entes estatais o dever de assegurar o ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria, preconizando amplo atendi-mento ao educando através da implementação de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação eassistência à saúde (art. 208, I e VII) - Reexame necessário (pertinente na espécie) e apelo da Municipalidade não providos (Apelação Com Revisão 5383415200 - Relator(a): Paulo Dimas Mascaretti - Comarca: Igarapava - Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Público - Data do julgamento: 16/07/2008 - Data de registro: 22/07/2008 )AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Objetivo – Fornecimento de transporte escolar gratuito para crianças e adolescentes – Procedência – Admissibilidade –

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Dever constitucional do Estado e do Município – Garantia do livre acesso ao ensino fundamental – Possibilidade, ademais, de fixação de multa comi-natória pelo descumprimento – Recursos não providos (Apelação Cível nº 241.185-5/0-00. Apelantes: Prefeitura Municipal de Teodoro Sampaio e Fazenda Pública Estadual – Apelado: Ministério Público).MANDADO DE SEGURANÇA – Adolescente acometida de paralisia cere-bral, com tetraparesia espática e síndrome convulsiva – Necessidade de transporte especializado – Obrigação imposta à Municipalidade – Seguran-ça concedida – Apelo visando à reforma do julgado – Recurso improvido (Apelação Cível nº 110.690-0/5-00, da comarca de São Paulo. Apelante: Municipalidade de São Paulo. Apelado: Promotor de Justiça da Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional de Santana).PROCESSUAL CIVIL. Agravo regimental. Falta de prequestionamento. Transporte escolar gratuito. Universalização do ensino. Responsabilidade e dever do estado. Obrigação de fazer. Descumprimento. Multa. Cabimento. Prazo e valor da multa. Necessidade de apreciação do conjunto probatório. (AgRg no Ag 646.240/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.05.2005, DJ 13.06.2005 p. 178)

c. FALTA DE PROFESSORES:

A falta de professores prejudica o pleno desenvolvimento do educando, regra básica prevista na Constituição Federal (art. 205), Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 53) e LDB (art. 2, 12 e 13). Por outro lado, a LDB estabelece toda uma política de organização educacional (arts. 10 a 13) e normas relativas aos profissionais da educação (art. 67) que, uma vez desrespeitada, enseja medida judicial, como a ação a seguir mencionada:

Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado do Amapá objetivando que o Estado do Amapá imediatamente lote professores em todas as disciplinas ministradas nas seguintes escolas da rede estadual sediadas na Cidade de Calçoene: Professor Sílvio Elito da Lima Santos, Amaro Brasilino de F. Filho e Lobo Dálmada, fixando multa diária a ser paga pessoalmente pelo senhor secretário de Estado da Educação, no caso do não-cumprimento da obrigação, conforme previsto no art. 213, § 2º, do ECA;É certo que esta questão é extremamente complexa, posto que nem sempre a decisão judicial encontra efetividade, posto que em muitos situações não existem professores habilitados ou interessados nas vagas abertas. A inter-venção judicial, neste caso, somente encontrará resultado, desde que ocorra demanda para as vagas existentes.

d. CONDIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA:

O atendimento educacional especializado ao aluno com deficiência, preferencial-mente na rede regular de ensino (CF., art. 208, III, ECA., art. 54, III e LDB., art. 4º, III) provocou medidas judiciais para a garantia deste direito, conforme se observa a seguir:

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APELAÇÃO CÍVEL - Ação civil Pública com pedido de tutela antecipada. Criança portadora de paralisia cerebral infantil aliada a retardo mental. Limi-nar deferida. Procedência da ação sob pena de multa diária, condenando o apelante a inserir a criança em unidade de educação infantil (Apelação cível n. 149.237-0/9-00 – São Paulo – TJSP – Câmara Especial – voto n. 3.636).AÇÃO CIVIL PUBLICA – Fornecimento de tratamento a portadores de síndrome de autismo - Educação especializada - Art. 5º CF – Norma cons-titucional de proteção à saúde pública - Controle jurisdicional dos atos discricionários - Garantia de direito à saúde pública - Recurso não provido. (Apelação Cível n° 564.314.5/5-00-00 - Comarca de São Paulo. Apelante: Juízo ex officio. Apelado: Victor Martucelli (menor representado por genitora)APELAÇÃO CÍVEL - Mandado de Segurança com pedido de Liminar - Portadora de Deficiência Física - Direito a ensino especializado - Legali-dade - Dever do Município - Inteligência dos Artigos 208, I e III da CF; 227 “Caput” da CE; e da Lei 7853/89 - Sentença Mantida - Recursos oficial e voluntário do Secretário da Fazenda Municipal de Araçatuba Improvidos. (Apelação Cível n° 279.484-5/7-00. Comarca: Araçatuba. Apelante: Secre-tário Municipal da Fazenda de Araçatuba e Outro. Recorrente: Juízo “ex-officio”. Apelada: Maria Luiza Domingues Cardoso (menor representada por sua mãe).Ensino Especializado Criança com retardo no desenvolvimento neuropsi-comotor, atraso na fala e epilepsia. Inexistência de escola especializada na rede pública. Necessidade de garantir plena efetividade ao direito à edu-cação Inteligência do artigo 208 da CF, artigo 249, § 1°t da CE, Lei n° 8 069/1990 (ECA), Leis Federais n° 7.853/1989 e 9.394/1996 Segurança concedida para determinar a matrícula do impetrante em instituição particu-lar de ensino especializado Recurso voluntário e reexame necessário não providos (Apelação n° 752.718.5/4-00 – Comarca: Campinas (Paulinia). Apte: Prefeitura Municipal de Paulinea. Apdos: Paulo Eduardo Rodrigues da Silva (rep. p/ genitora) e outro.

e. ADEQUAÇÃO DO PRÉDIO ESCOLAR:

O atendimento do aluno com deficiência, requer a adequação da unidade es-colar. Esta regra está prevista na Constituição Federal (art. 227, § 2º e 244) e em leis específicas como a Lei nº. 7.853, de 24 de outubro de 1989 (art. 2º, parágrafo único), o Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (art. 24 e 46) e a Lei nº. 10.098, de 19 de dezembro de 2000 (art. 11, 12 e 21) que estabeleceu normas para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência mediante a supressão de barreiras e obstáculos.

O Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei n. 10.172/2001, estabeleceu como um dos objetivos e metas da educação básica a acessibilidade das escolas, com a adaptação para o atendimento do aluno com deficiência. Assim, várias são as ações visando dar cumprimento a esta previsão legal.

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Obrigação de Fazer – Interesse difuso – Adap-tação de prédio de escola pública para portadores de deficiência física – Obrigação prevista nos artigos 127, par. 2º e 244 da CF, artigo 280 da CE – Legitimidade ativa do Ministério Público – Lei Federal nº 7853/89 – Ine-xistência de violação do princípio da violação da separação dos Poderes – Multa diária para o caso de descumprimento da obrigação – Inexistência de ilegalidade – Artigo 644 do CPC – Recurso provido para julgar a ação procedente (Apelação Cível nº 231.136-5/9-00, da Comarca de Ribeirão Preto. Apelante: Ministério Público. Apelada: Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto).AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Objetivo – Facilitação do acesso de deficientes físicos em escola pública estadual – Obrigação de fazer por parte do Es-tado – Exegese dos artigos 227, parágrafos 2º e 244 da Constituição da República e das Leis Estaduais nºs. 5500/86 e 9086/95 – Recurso provido.” (Apelação Cível nº 244.235-5/0-00, da comarca de Ribeirão Preto. Apelan-te: Ministério Público. Apelado: Fazenda Pública Estadual”.AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Deficiente físico – Acesso as salas de aula em escola pública dificultado por escadas – Obrigação de fazer consistente na realização de obras para as devidas adaptações do prédio – Admissibili-dade – Direito de livre circulação em imóvel de uso comum assegurado na Constituição Federal de 1988, sobretudo a escola pública, que deve facilitar o quanto se pode o acesso ao ensino – Norma cuja aplicabilidade não pode ser condicionada à edição de lei estadual, que, passados dezesseis anos da Constituição Federal, não foi providenciada, constituindo reprovável con-duta que fere princípios éticos e ostenta flagrante inconstitucionalidade por omissão – Ação procedente – Recursos improvidos (Apelação Cível nº 275.964-5/9-00, da comarca de Ribeirão Preto. Apelante: Fazenda Pública Estadual. Apelado: Ministério Público).

f. VAGA EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA:

Existem ainda as hipóteses em que não se garantiu o oferecimento adequado de educação para todos, em especial para creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de idade , gerando também a intervenção judicial:

CRIANÇA DE ATÉ SEIS ANOS DE IDADE. ATENDIMENTO EM CRE-CHE E EM PRÉ-ESCOLA. EDUCAÇÃO INFANTIL. DIREITO ASSE-GURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV). COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO. DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º). RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO.

- A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvi-

29 - Várias decisões referem-se à pré-escola para crianças até 6 anos de idade. Contudo, alteração da onstituição Federal promovida pela Emenda Constitucional n. 53,de 2006 ao artigo 208, IV, estabeleceu como dever do estado a educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 anos de idade.

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mento integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV).- Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “crianças de zero a seis anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal.- A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental.- Os Municípios – que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º) – não poderão demitir-se do man-dato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político- -administrativa dos entes munici-pais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social.- Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legisla-tivo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases ex-cepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos políti-co-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório, vierem a com-prometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. A questão pertinente à “reserva do possível”. (Recurso extraordinário 541.281-4 São Paulo- rela-tor: min. Celso de Mello - recorrente: município de São Paulo – advogado: Luiz Henrique Marquez - recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo).MENOR - Mandado de Segurança - Creche municipal - Garantia de vaga à criança - Requisitos ensejadores presentes - Recurso oficial improvido. (Apelação Cível 1641620600 - Relator: Eduardo Pereira (Comarca: F.D. Paulínia/Campinas. Órgão julgador: Câmara Especial - Data do julgamen-to: 30/06/2008 - Data de registro: 17/07/2008 )

EDUCAÇÃO - Mandado de segurança visando matrícula de menor im-púbere em creche - Alegação da municipalidade de insuficiência de vagas para atender à demanda - fato que não exime a administração de cumprir sua obrigação não podendo se beneficiar da própria omissão – Segurança

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concedida - Recursos Improvidos. (Apelação Com Revisão 7356475500 - Relator: Luiz Burza Neto - Comarca: São José do Rio Preto . Órgão julga-dor: 12ª Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 25/06/2008 . Data de registro: 14/07/2008).

MANDADO DE SEGURANÇA - Direito das crianças à creche - Ga-rantia constitucionalmente prevista - Responsabilidade prioritária do Mu-nicípio pelo atendimento da educação infantil - Imposição de obrigação de fazer ao Município como decorrência da própria atividade jurisdicional - Violação do princípio da Independência dos Poderes não configurada – Re-cursos improvidos. (Apelação Cível 1639550800 - Relator: Viana Santos. Comarca: Campinas. Órgão julgador: Câmara Especial. Data do julgamen-to: 23/06/2008. Data de registro: 04/07/2008).

MENOR - Apelação - Ação civil pública para compelir o Município à abertura de matrículas na rede de ensino infantil a todas as crianças de zero a seis anos de idade, sem exceção - Legitimidade do Ministério Público reconhecida - Dever estatal com a educação - Competência municipal para o atendimento em creches e pré-escolas das crianças de zero a seis anos - Necessidade que se equivale à obrigatoriedade - Sentença de procedên-cia mantida - Recurso improvido. (Apelação n° 63.969.0/2-00. Recorrente: Município de Assis. Recorrido: Promotor de Justiça da Vara da Infância e Juventude de Assis).

g. OUTRAS HIPÓTESES:

A intervenção judicial nas questões educacionais ocorre da forma mais diversapossível e em relação a temas variados. Tendo sempre como fundamento a Consti-

tuição Federal, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Estatuto da Criança e do Adolescente, Pareceres e Resoluções dos Conselhos de Educação e portarias, as decisões a seguir, refletem a relação estabelecida entre a Justiça e a Educação e os inúmeros temas que são levados a julgamento.

TRANSFERÊNCIA COMPULSÓRIA DE ALUNO:APELAÇÃO CÍVEL - Mandado de Segurança - Ensino – Transferência compulsória de aluno – Não obediência ao “due process of law” – Desca-bimento da medida - Concessão da segurança. Recurso provido. (Apelação Cível n° 252 557 5/3-00 – Votuporanga Apelante Valdonir da Silva – Ape-lado Diretor da Escola Estadual Cecília Meireles e Conselho da Escola Es-tadual Cecília Meireles)MANDADO DE SEGURANÇA — Transferência compulsória de aluno — Necessidade de preservação do direito de defesa no processo administrativo — Recurso improvido (APEL. n°: 148.524-5/0. COMARCA: Garça. Apte: Juízo Ex-Officio. Apelado: Marcus Vinícius Marques Ogeda - menor repre-sentado por sua mãe Ana Luiza César Marques Cavalcante).PROBLEMAS DISCIPLINARES: ENSINO ESTADUAL - Freqüência do aluno ao estabelecimento em que se encontra matriculado – Questões disciplinares ensejaram transferência de

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escola - Inexistência de direito líquido e certo - Ordem denegada – Recurso desprovido. (AC n° 382.260.5/1-00 - Serra Negra - 2a Vara Cível - Voto n° 13.715 - Apte. Juliano Matrandrea de Barros Silveira (AJ). Apd°. Diretora da Escola Estadual Jovino Silveira).MANDADO DE SEGURANÇA. Suspensão do direito da utilização de serviço público gratuito, por motivo disciplinar. Observância do devido pro-cesso legal e direito de defesa. Não desatende ao devido processo legal e não exclui o direito de defesa, a suspensão do beneficio (transporte escolar gratuito) por motivo de indisciplina, se precedida da devida notificação ao responsável que, não obstante, não adotou nenhuma providência corretiva Segurança mal concedida. Recurso oficial provido para denegar a segurança (Apelação Cível n° 115.743.5/2-00, da Comarca de Palestina, em que é recor-rente o Juízo. Ex Officio e recorrida Ana Rosa Araújo Gavião Silva).CRIAÇÃO DE CURSOSAção Civil Pública. Criação de vagas em curso de ensino médio – Princípio da Inafastabilidade da jurisdição. Ingerência do Judiciário na Administração Pública inocorrente. Possibilidade/necessidade para garantia de direito cons-titucional. Repercussão orçamentária que não afasta a imposição constitus-cional. Obrigação de fazer regularmente imposta por preceito constitucional. (Tribunal de Justiça de São Paulo - Apelação Cível n. 335.913.5/3-00. Comarca de Sumaré. Recorrente: Fazenda Pública do Estado de São Paulo. Apelado: Ministério Público).FECHAMENTO DE SALA DE AULAS:Mandado de Segurança – Autoridade de Ensino não pode suprimir salas de aulas, com fundamento na Resolução n. 97/2004 e Resolução SE n. 125/98, as quais violam o disposto nos artigos 208 e seus incisos e 227, “caput” todos da Constituição Federal. As referidas Resoluções apenas determinam que a matrícula do aluno deverá respeitar o turno de seu tra-balho, inclusive dos que comprovarem ser aprendizes, na forma do Es-tatuto da Criança e do Adolescente.Desta forma, o ato da autoridade impetrada que implicou em retrocesso social, fato expressamente vedado pelos artigos 208 e seus incisos e 227 “caput” todos da Constituição Federal violou direito líquido e certo dos alu-nos. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível 427.364-5/2-00. Comarca de Pacaembu. Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo. Apelado: Ministério Público.CANCELAMENTO DE MATRÍCULAS:Ação Civil Pública – Determinação da Secretaria de Educação que cancelava a matrícula de crianças e adolescentes que não comparecessem nos primeiros dez dias do ano letivo. Manifesta ilegalidade. Determinar o cancelamento da matrícula de crianças e adolescentes em razão de falta escolares, ainda que injustificadas, viola o direito de acesso à educação. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Recurso ex officio n. 60.258-0/6- 00. Fazenda Pública do Estado de São Paulo e Ministério Público).Mandado de Segurança – Ensino. Anulação de ato administrativo. Indeferi-mento de matrícula em curso de língua estrangeira, ministrado pelo Centro de Estudos de Línguas, da Secretaria Estadual da Educação, com fundamento na

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Resolução n. 6, de 22/01/2003, que estabeleceu como beneficiários do curso de línguas somente aqueles alunos matriculados na rede pública de ensino. Alegação de incompatibilidade superveniente do impetrante com o programa CEL diante do fato de não mais estar matriculado na rede pública de ensino. Inadmissibilidade. Aluno carente que foi contemplado com bolsa de estudos em escola da rede particular para o ensino médio.Hipossuficiência não afastada. Ofensa aos dispositivos constitucionais que garantem o acesso integral à educação. Segurança concedida. Decisão Man-tida. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação n. 465.757-5/4. Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo. Comarca de Araçatuba).LICENÇA GESTANTE:Mandado de Segurança – Adolescente – Estudante – Licença gestante com prazo de 120 dias – Dirigente Regional de Ensino que concedeu afasta-mento de apenas 90 dias, fundado na Lei n. 6.202/75. – Prazo de 120 dias previsto no artigo 7º, inciso XVIII, da CF. Prevalência da norma constitu-cional. Ordem concedida. Sentença mantida. (Tribunal de Justiça do Es-tado de São Paulo. Apelação Cível n. 161.501-0/02 – Presidente Prudente. Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo. Apelado: Ministério Público.PROGRESSÃO CONTINUADAAção Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de São Pau-lo – Comarca de Várzea Paulista objetivando que o Estado e o Município passem a adotar o sistema de avaliação dos alunos do ensino fundamental, exigindo a comprovação, em média anual, de absorção de pelo menos 50% do conteúdo ministrado, por matéria, fixando multa diária no caso do não cumprimento da obrigação.

h. ESCOLAS PARTICULARES:

Além dos temas mencionados, existem outros que se referem especificamente as escolas particulares. Na discussão que se trava com as escolas particulares, o funda-mento legal extrapola o já mencionado, ou seja, a Constituição Federal, LDB, ECA, resoluções e portarias, incluindo como suporte o Código de Defesa do Consumidor – Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. As discussões travadas têm ligação direta com eventual cobrança por parte das escolas. São exemplos de decisões que bem demonstram esta relação.

Apelação - Cobrança - Prestação de serviços educacionais – Comprovação do réu de cancelamento de matrícula solicitada pelo aluno. Tendo a insti-tuição de ensino demonstrado expressamente que o réu protocolou pedido de cancelamento de sua matrícula, não há como exigir-se o pagamento das mensalidades restantes. (Apelação cível n. 1117339-0/2, Santo André, TJSP, Relatora: Des. Lino Machado)

Fornecimento de histórico escolar – Negativa ante a existência de débito – Inadmissibilidade – Segurança concedida – Recurso improvido. (Apelação cível n. 1160767-0/2, Ituverava, TJSP, Relator: Des. João Omar Marçura)

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Mandado de Segurança – Prestação de serviços educacionais. Recusa de fornecimento de certificado de conclusão de curso de ensino médio. In-admissibilidade. O caput do artigo 6º da Lei n. 9.870, de 23 de novem-bro de 1999, proíbe a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimple-mento. Além disso, a negativa da autoridade impetrada atenta contra o artigo 205 da C.F., uma vez que impede a continuidade dos estudos do impetrante. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Recurso n. 1.075.234.0/1. São Paulo).

Prestação de serviços – Aplicabilidade do Código de Defesa do Con-sumidor à prestação de serviços educacionais – Multa limitada à 2% - Desconto pontualidade que configura multa disfarçada e inadmissível “bis in idem” – Retenção de documentos escolares – Dano moral – In-denização reduzida – Recurso improvido.(Apelação cível n. 930565-0/9, São Jose do Rio Preto,TJSP, Relator: Des. Eduardo Sá Pinto Sandeville). Não pode a apelante, sem justa causa, recusar-se a fornecer os documentos necessários para a transferência do apelado, uma vez que a Lei nº 9.870/99 no seu artigo 6º “caput” e §1º, proíbe a aplicação de pe-nalidades em razão de inadimplemento e, ainda, dispõe expressamente, que a instituição e ensino tem o dever de expedir, a qualquer tempo, os documentos mencionados. Recurso improvido (Apelação cível nº 1050329-0/4, São Paulo, Relator: Des. Gomes Varjão)Contrato de prestação de serviços educacionais – Diploma – Cobrança de taxa para expedição – Ilegalidade. Conseqüência lógica da freqüência a qualquer curso, de ensino fundamental, médio ou superior, é que, após a sua conclusão, seja emitido o correspondente certificado ou diploma, cujo custo por nova proveniente do Conselho Federal de Educação, pre-sume-se incluído na mensalidade. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Comarca de Bebedouro. Recurso n. 010107.Cobranças ilegais ou abusivas, às vezes não se limitam a escolas par-ticulares, atingindo também as públicas. As decisões a seguir transcritas referem-se à cobrança feita por escolas públicas.MATÉRIA CONSTITUCIONAL - Acesso ao ensino fundamental e mé-dio - Garantia da gratuidade - Cobrança de taxa para inscrição ao exame supletivo - Ilegalidade - Recurso parcialmente provido. (Apelação Cível n. 118.878-5 - São Paulo - 2ª Câmara de Direito Público - Relator: Alves Bevilacqua - 20.06.00 - V.U.)ACÃO CIVIL PÚBLICA - Exames supletivos - Taxa de inscrição - gra-tuidade de ensino público (Constituição Federal, artigo 206, IV) - A norma do artigo 206, IV, da Constituição Federal, de eficácia limitada, no que diz respeito a educação de jovens e adultos (“ensino supletivo”) foi integrada pela norma do artigo 37 da LDB, e assim é aplicável - As normas dos artigos 249, § 3º, e 250 da Constituição do Estado de São Paulo, estabelecem a gratuidade do ensino supletivo fundamental e médio - Recurso do Ministério Público provido para julgar procedente a ação. (Apelação Cível n. 76.640-0/1 - São Paulo - Câmara Especial - Relator: Alvaro Lazzarini - 12.07.01 - U.V.)

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4. ATO INFRACIONAL:

Diante da diversidade dos alunos que integram o sistema educacional, há que se distinguir um ato infracional de um ato (in)disciplinar. Ato infracional, define o Es-tatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contra-venção penal.

Assim, toda infração prevista no Código Penal, na Lei de Contravenção Penal e Leis Penais esparsas (ex. Lei de tóxico, porte de arma), quando praticada por uma criança ou adolescente, corresponde a um ato infracional. O ato infracional, em obe-diência ao princípio da legalidade, somente se verifica quando a conduta do infrator se enquadra em algum crime ou contravenção prevista na legislação em vigor. Um dos principais problemas que a escola pública enfrenta refere-se à ocorrência de ato infracional quando se defronta com a questão da violência, sobretudo a física.

Hoje, mais do que nunca, diante das relações de conflitos existentes em nossa sociedade, a escola passou a experimentar, com mais freqüência, a ocorrência de atos infracionais. Quando esta situação se verifica, o problema sai da esfera escolar paraatingir o sistema de garantia de direitos, ou seja, o Conselho Tutelar (quando o ato infracional for praticado por criança) ou a Policia (civil e militar), Ministério Público e Poder Judiciário (quando o ato for praticado por adolescente).

Estas situações acabam por judicializar ações envolvendo a escola, mas que digam respeito à prática de crimes ou contravenções penais. Vários são os exem-plos de medidas aplicadas a adolescentes infratores que praticam ato infracional relacionados ao ambiente escolar, como por exemplo, em caso de lesão corporal ou vias de fatos (por brigas entre alunos, alunos e funcionários ou professores), desacato e injúria (ofensas dirigidas aos alunos e aos professores), crimes de dano (quando danificam a escola ou mesmo os veículos de professores), porte de entor-pecente e de arma, tráfico de entorpecente, etc.

Nestas hipóteses, quando o adolescente infringe a lei, é responsabilizado fi-cando sujeito a uma das medidas sócio-educativas previstas no Estatuto da Cri-ança e do Adolescente:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:I - advertência;II - obrigação de reparar o dano;III - prestação de serviços à comunidade;IV - liberdade assistida;V - inserção em regime de semi-liberdade;VI - internação em estabelecimento educacional;

30 - Estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente que se considera criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade (art. 2º).

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Assim, o adolescente envolvido com a prática de ato infracional na escola é devi-damente responsabilizado. A violência que resulta em ato infracional ultrapassa os limites da escola e acaba por judicializar esta relação.

Quando a conduta não caracterizar ato infracional, deve ser analisada de forma exclusiva pela própria escola em face do regimento escolar, como ato de indisciplina,que deve ser considerado como:

Se entendermos por disciplina comportamentos regidos por um conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas: 1) a revolta contra estas normas; 2) o desconhecimento delas. No primeiro caso, a indisciplina traduz-se por uma forma de desobediência insolente; no segundo, pelo caos dos comportamentos, pela desorganização das relações (LA TAILLE,1996, p 10).

Assim, a indisciplina escolar se apresenta como o descumprimento das normas fixa-das pela escola e demais legislações aplicadas (ex. Estatuto da Criança e do Adolescente - ato infracional). Ela se traduz num desrespeito, seja do colega, seja do professor, seja ainda da própria instituição escolar (depredação das instalações, por exemplo).

05. EVASÃO ESCOLAR:

Antes da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, os casos de evasãoescolar se restringiam à intervenção da própria escola. A escola era competente para analisar o fato e utilizar os mecanismos necessários para fazer o aluno voltar a estudar. Hoje, a situação é diferente, pois, os casos envolvendo evasão escolar e eleva-dos níveis de repetência devem ser comunicados ao Conselho Tutelar e, na ausência de solução, ser levado ao conhecimento do Poder Judiciário. Esta regra está prevista no artigo 56 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Implica esta intervenção judi-cial na busca da efetividade do direito à educação.

São várias e as mais diversas as causas da evasão escolar ou infreqüência do aluno. No entanto, levando-se em consideração os fatores determinantes da ocorrência do fenômeno, pode-se classificá-las, agrupando-as, da seguinte maneira:

Escola: não atrativa, autoritária, professores despreparados, em número insuficiente,

Aluno: desinteressado, indisciplinado, com problema de saúde, gravidez, etc.,

Social: trabalho com incompatibilidade de horário para os estudos, agressão entre os alunos, violência em relação a gangues, etc.

Estas causas são concorrentes e não exclusivas, ou seja, a evasão escolar se veri -fica em razão da somatória de vários fatores e não necessariamente de um especifi-camente. Detectar o problema e enfrentá-lo é a melhor maneira para proporcionar o retorno efetivo do aluno à escola.

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Verifica-se em relação às causas que existem algumas de competência exclusiva do sistema de justiça, como por exemplo, as relacionadas à violência, descumpri-mento dos deveres referentes ao poder familiar, entre outras. Neste caso, a intervenção judicial se faz necessária para garantir o aluno na escola, resultando desta relação ajudicialização de outro tema referente a educação.

06. QUALIDADE DA EDUCAÇÃO:

A Constituição Federal (art. 205), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 53) e a LDB (art. 2º) traçou os seguintes objetivos para a educação:

O objetivo é dar uma diretriz única para os fins da educação e traz implicitamente à tona a questão da qualidade do ensino, posto que somente uma educação de qualidade pode favorecer esse desenvolvimento, bem como seu preparo para a cidadania e quali-ficação para o trabalho. Um aluno que deixa o ensino fundamental sem o conhecimento básico das disciplinas ministradas, sem saber ler e escrever adequadamente, não se de-senvolveu plenamente e pode ter comprometido a sua qualificação para o trabalho.

Quando isso ocorre, ou seja, na hipótese da educação ministrada não atingir ou não contemplar estes objetivos, questiona-se: Pode ser discutida no âmbito do poder judiciário a qualidade da educação? Como discutir este tema? A Constituição Federal apresenta de forma mais direta a questão da qualidade da educação e os responsáveis pela mesma, quanto estabelece:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:........VII - garantia de padrão de qualidade.Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios or-ganizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. § 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equali-zação de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.Desta forma, antes mesmo de discutir o que é qualidade da educação e se é

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possível o questionamento legal da mesma, a Constituição Federal deixou clara quem são os responsáveis por esta qualidade. Nesse sentido, esclarece CABRAL (2008, p.105) quanto a organização do sistema de ensino:

Portanto, conforme a CF/88 e a organização do sistema de ensino brasileiro, aci-ma descrito, compete aos Municípios e ao Estado promover o ensino fundamental de qualidade, o Município é responsável pelas séries iniciais do ensino fundamental (primeira à quinta série) e o Estado pelas demais séries (sexta a nona série), sendo que a União deve exercer a função redistributiva e supletiva, de forma a garantir padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou seja, a União em caso de oferta irregular por falta de qualidade no ensino fundamental, responde judicialmente de forma concor-rente, solidária, com o Estado ou Município – dependendo da série em que sepromova a deficiência na qualidade educacional – sendo ambos responsáveis pela promoção de uma educação de qualidade no ensino fundamental.

Esta questão é de extrema importância, posto que, não somente em relação a quali-dade da educação, mas todo e qualquer questionamento jurídico da educação no

Poder Judiciário deve levar em consideração o ente responsável pelo ensino que se pretende questionar. Em outras palavras, quem é a parte legítima passiva para re-sponder a ação judicial que se vai ingressar. Isto porque, adverte CABRAL (2008, p. 105) que a falta de conhecimento sobre quem é quem no âmbito da execução de nossos direitos, das políticas públicas e, mais especificamente, do direito à educação, muitas vezes inviabiliza o próprio exercício do direito.

Ciente de quem são os responsáveis pela educação, a segunda etapa consiste em saber o que é qualidade e como este debate se realiza no Judiciário. É inegável que todos os temas já abortados, como por exemplo, transporte escolar, merenda, falta de professores, extinção de salas de aulas, etc, indiretamente tem uma ligação com a questão da qualidade. Na verdade, todos os temas referidos resumem-se na busca da qualidade da educação. Mas, esta questão vai além e é muito complexa, como bem esclarecem Romualdo Portela de Oliveira e Gilda Cardoso de Araújo:

É muito difícil, mesmo entre os especialistas chegar-se a uma noção do que seja qualidade de ensino [...] provavelmente, essa questão terá múltiplas res-postas, seguindo valores, experiências e posição social dos sujeitos. Uma das formas para se apreender essas noções de qualidade é buscar indicadores uti-lizados socialmente para aferi-la. Nessa perspectiva, a tensão entre qualidade e quantidade (acesso) tem sido o condicionador último da qualidade possível, ou, de outra forma, a quantidade (de escola) determina a qualidade (de edu-cação) que se queira. (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2005, p. 6 e 8).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96) estabelece:Art. 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:....

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IX - garantia de padrão de qualidade;Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: (...)IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvi-mento do processo de ensino-aprendizagem.

Constata-se que se trata de afirmação vaga e sem a consistência necessária para colocar, no âmbito do Poder Judiciário, a discussão referente à qualidade da educação. Como afirma Cury (2007a) esse padrão de qualidade deverá ter algum parâmetro de referência até para se ter uma certa verificabilidade de resultado no âmbito do que é a finalidade das instituições escolares.

Existem vários estudos referentes à qualidade da educação, levando-se em con-sideração a questão do custo-aluno qualidade ou a qualidade aferida mediante testes padronizados em larga escala . Na verdade, existem diversos indicadores para se aferir a qualidade da educação. Como afirma Cury (2007a): a qualidade é, assim, um modo de ser que afeta a educação como um todo envolvendo sua estrutura, seu desenvolvi-mento, seu contexto e o nosso modo de conhecê-la.

Para a Justiça, o ideal seria o estabelecimento de mecanismos objetivos para avalia-ção da qualidade do ensino, de modo a unificar a atuação do Judiciário, como por exemplo, utilizando-se dos parâmetros mínimos estabelecidos por PINTO (2006), fixar a análise por aluno, de modo que qualquer Juiz do País possa avaliar diretamente a situação de seu município, levando-se em consideração:

Tamanho: considera-se que as escolas não devem nem ser muito grandes (o que dificulta as práticas de socialização e aumenta a indisciplina), mas, ao mesmo tempo, devem ter um número de alunos que permita à maioria dos professores lecionar em apenas uma escola; Instalações: assegurando-se salas ambientes (bibliotecas, laboratórios

etc), espaços de alimentação, lazer e de prática desportiva, com dotação orçamentária para uma manutenção adequada; Recursos didáticos em qualidade e quantidade, aqui incluídas as tecnolo-

gias de comunicação e informação, garantidos os recursos para a manuten-ção dos equipamentos; Razão alunos/turma que garanta uma relação mais próxima entre os pro-

fessores e seus alunos; Remuneração do pessoal: assegurar um piso salarial nacionalmente unifi-

cado, associado ao grau de formação dos trabalhadores da educação e um plano de ascensão na carreira que estimule a permanência na profissão; Formação: dotação anual de recursos financeiros para a formação continu-

ada de todos os profissionais da escola; Jornada de trabalho: definição de jornada semanal de 40 horas, com 20%

da mesma, no caso do professores destinados a atividades de planejamento, avaliação e reuniões com os pais, cumpridas nas escolas. No caso das creches

31 - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB); Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM); Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (ANRESC) e aAvaliação da Educação Básica (ANEB). Em nível internacional, tem-se o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA).

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(0 a 3 anos), optou-se pela jornada padrão de 30 horas semanais para os pro-fessores, também com 20% para atividades complementares; Jornada do aluno: fixação de uma jornada mínima de 10 horas/dia, no caso

das creches (cuja média nacional já é superior a 8 horas/dia) e de 5 horas/dia, nas demais etapas (cuja média nacional é um pouco acima de 4 horas/dia); Projetos especiais da escola: garantia de um repasse mínimo de recursos

para que as escolas possam desenvolver atividades próprias previstas em seu projeto pedagógico; Gestão democrática: entende-se que a gestão democrática envolve uma

série de aspectos que não possuem, necessariamente, um impacto mone-tário no custo aluno, mas é evidente que quando se propicia a jornada exclusiva do professor em uma escola, o tempo remunerado para atividades extra-classe, a proximidade da escola das residências dos alunos, um menor número de alunos/turma e de alunos/escola, todas estas medidas, facilitam muito (embora não assegurem) a construção de relações mais democrática em sala de aula e na escola. (PINTO, 2006).

Além destes indicadores, verificar o resultado dos índices dos testes padroniza-dos aplicados aos alunos.

Constata-se do exposto, que a questão da qualidade da educação é complexa e talvez, por conta disso, afirma CABRAL (2008, p. 150) que não há nenhuma de-cisão emitida pelos Tribunais Superiores brasileiros – Supremo Tribunal Federal

a uo onisne od edadilauq a odnaetielp seõça erbos – açitsuJ ed lanubirT roirepuS eresponsabilização do Poder Executivo pela falta de qualidade, em nenhum nível de ensino.

Assim, não obstante o reconhecimento legal pela Constituição Federal e demaislegislação, da necessidade de uma educação de qualidade, no âmbito do Poder

Judiciário esta questão ainda não foi debatida como deveria.Na verdade, o que se discute no Poder Judiciário é a não qualidade. Isto porque,

como diz Oliveira (2006) ... na falta de uma noção precisa de qualidade, é certo que tenhamos acordo, no momento, no que diz respeito à constatação de sua ausência. (p. 55).

E a não qualidade, assevera Cury (2007a) é a falta de escolas, é a falta de vagas nas escolas, são as barreiras excludentes da desigualdade social inclusive legais comoera o caso dos exames de admissão, a discriminação que desigualava o ensino profissional, os limites do ensino não – gratuito e a descontinuidade administrativa.

A não qualidade se expressou e ainda está presente nas repetências sucessivas redundando nas reprovações seguidas do desencanto, da evasão e abandono. Como diz Oliveira (2006): passávamos da exclusão da escola para a exclusão na escola. Em síntese, o debate sobre a qualidade da educação no âmbito judicial ainda está centrada em situações pontuais como a falta de vagas, falta de professores, trans-porte, merenda, etc. Não se constata uma análise mais ampla no sentido de se dis-cutir uma ação afirmativa que pontue todas estas questões sob o signo da qualidade.

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07. CONSEQÜÊNCIAS DA JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

É inegável que, em razão desta relação estabelecida entre a justiça e educação, sa euqatsed mecereM .sodivlovne serota so arap saicnêüqesnoc sa oãs sairáv

seguintes hipóteses:

7.1. SISTEMA DE EDUCAÇÃO.

a) Transferência de responsabilidade – Grande parte das questões escolares e que devem ser solucionadas na própria escola, são transferidas para a esfera judicial. Os responsáveis pela educação não assumem o compromisso que é próprio da educação em esgotar os recursos internos baseados no diálogo. Exemplo típico desta situação refere-se à questão da violência. Hoje, muitos casos encaminhados à justiça revestem-se mais de características de ato de indisciplina do que ato infracional. A escola, muitas vezes, sequer esgota os mecanismos previstos no próprio regimento escolar, preferindo provocar a atuação do Judiciário, Ministério Público, Autoridade Policial e Conselho Tutelar. Sendo ato de indisciplina, a competência para analisá-lo continua sendo da própria escola e não do sistema de garantia de direitos.

b) Desconhecimento da legislação relacionado à criança e ao adolescente: outra questão da judicialização da educação diz respeito a este desconhecimento legal. Várias são as situações em que a escola provoca a instituição errada para o encami -nhamento das ocorrências. Provoca-se o Poder Judiciário ou Ministério Público quando, na verdade, o caso deveria ser encaminhado ao Conselho Tutelar. Desconhe-cem as atribuições do sistema de garantia de direitos. Há também situações em que este desconhecimento legal acaba por levar ao Judiciário ou Conselho Tutelar, situações que não poderiam ser encaminhadas, antes do esgotamento das medidas administrativas. No mesmo sentido, ocorre esta hipótese quando da instauração de procedimento em face do aluno e não são obedecidos os princípios constitucionais básicos da ampla defesa e do contraditório.

Vale lembrar que não está se pretendendo que todo e qualquer profissional daeducação tenha o conhecimento do direito. No entanto, toda legislação que lhe diga respeito diretamente, não pode ser ignorada. Exemplo desta situação ocorre com o capítulo do direito à educação previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, quenão pode ser desconhecido do educador.

Como afirma Batista (1999, p. 233) os graves problemas da escola brasileira não podem ser solucionados sem a ação dos profissionais que nela trabalham. Mas, neste caso, tais profissionais devem ter ciência da legislação relacionada a sua atuação.

c) Trabalho em parceria: Não há como negar que a tarefa educativa é de competên -cia do professor. Contudo, vários problemas que ocorrem na escola, antes mesmo de se transformarem em questões judiciais, podem ser resolvidos com um trabalho conjunto do sistema educativo (diretores, coordenadores, supervisores e professores)

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com o sistema de proteção dos direitos da criança e do adolescente (Conselho Tute-lar, Poder Judiciário, Ministério Público, Policia Militar e Civil). Nesse sentido, vale destacar Batista (1999, p. 237) quando afirma que o pedagogo precisa estar preparado para ações integradas com os demais profissionais e com o espaço educativo como um todo, assim como para o entendimento da realidade e a produção de saberes pedagógi-cos com vistas à construção de práticas educativas que veiculem os conhecimentos e valores necessários à sociedade contemporânea.

Até porque, os problemas escolares deixaram de ser eminentemente educacionais, os problemas sociais converteram-se em problemas escolares e os professores não estão preparados pra enfrentar essa nova realidade (ALMEIDA, 1999, p. 12). O en-frentamento destes problemas deve ocorrer de forma conjunta. Todos em prol de uma educação de qualidade.

7.2. SISTEMA DE PROTEÇÃO:

a) Desconhecimento do sistema educacional: Nesta situação, ocorre o inverso do que foi mencionado no item anterior, ou seja, o despreparo dos integrantes do sistema de proteção – Juiz de Direito, Promotor de Justiça, Delegado de Polícia, Policial Mili-tar, Conselheiro Tutelar e Conselheiro Municipal. Desconhecem o sistema de ensino e há um despreparo para lidar com os problemas da educação. Para muitos integrantes deste sistema, o problema educacional ainda está restrito ao professor. Se a escola é ruim ou não atrativa, se ela não apresenta educação de qualidade, se os alunos são indisciplinados: a culpa é do professor transformado em culpado de todos os fracas-sos escolares.

Nesse sentido, aponta Almeida (1999, p. 11):

Os professores foram transformados em verdadeiros bodes expiatórios frente aos imensos problemas presentes nos sistemas de ensino, favorecen-do o enfraquecimento de sua profissionalização e do seu reconhecimento social. Responsabilizá-lo pelos insucessos da escola atende a vários interes-ses, dentre eles aos dos governantes, que podem se eximir das responsa-bilidades quanto ao que acontece; aos dos pais, que não em que enfrentar os problemas escolares com seus filhos; aos dos pesquisadores, que não precisam rever a direção de suas pesquisas, em boa parte sem sintonia com a realidade escolar. Mesmo posicionamento aponta Esteve (1995, p. 104):

Grande parte da sociedade, alguns meios de comunicação e também alguns gover-nantes chegaram à conclusão simplista e linear de que os professores, como respon-sáveis diretos do sistema de ensino, são também os responsáveis diretos de todas as lacunas, fracassos, imperfeições e males que nele existem.

Acabam por culpar o professor e consequentemente a escola pelo fracasso do alu-no. Conforme esclarece SCHÖN (1997, p.79): atribuímos à culpa às escolas e aos pro-fessores, o que equivale a culpar as vítimas. Sim, porque outros fatores se somam para

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apontar a situação atual da escola como financiamento, retribuição salarial, jornada, carreira e condições de trabalho entre outras. A aplicação da lei na esfera educacional requer do profissional do direito o conhecimento real da situação educacional, sob pena de cometer erros e equívocos.

b) Exagero na forma de agir: existe ainda a situação em que, na ânsia de provocar a defesa do direito à educação, os integrantes do sistema de proteção extrapolam na judicialização dos atos, instaurando protocolados, inquéritos civis, procedimentos ju-diciais de situações que não deveriam merecer a atenção do sistema de justiça. Nesta hipótese, há uma indevida invasão do sistema legal no educacional.

c) Burocratização das ações: num mundo informatizado e dinâmico, as institu-ições jurídicas ainda convivem, em sua grande maioria, com um sistema retrogrado e burocratizante. As relações entre este sistema e o educacional ficam muitas vezes emperradas. Exemplo típico desta intervenção burocrática diz respeito ao combate a evasão escolar. Quando ocorre a efetiva intervenção, muitas vezes é tardia, posto que a criança e o adolescente não mais têm condições de voltar ao sistema de ensino.

08. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Afirma PIMENTA (2000, p. 23) que a educação é um processo de humanização que ocorre na sociedade humana com a finalidade explícita de tornar os indivíduosparticipantes do processo civilizatório e responsáveis por levá-lo adiante. En -quanto prática social é realizada por todas as instituições da sociedade. Enquanto processo sistemático e intencional ocorre em algumas, dentre as quais se destaca a escola. A garantia da educação, como um direito social e público subjetivo, decorre de ações e medidas na esfera política e administrativa. A ausência de política pública que garanta o processo educacional, realizada de forma sistemática pela escola, acaba por acarretar medidas judiciais que interferem no cotidiano educacional. Poderia se indagar, diante desta situação: Não estaria o Poder Judiciário invadindo atribuições exclusivas do Poder Executivo? A resposta é dada pelo Desembargador Roberto Vallim Bellocchi, quando afirma: É função essencial do Poder Judiciário, por intermédio da atividade jurisdicional reconhecer os direitos subjetivos dos jurisdicionados e lhes conceder tutela útil e efetiva. Em outras palavras, o respeito aos direitos subjetivos dos cidadãos legitima o Poder Judiciário a imposição de comandos a todos aqueles, incluindo o Estado, que vierem a molestá-los (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação civil n. 107.397-0/0-00, comarca de Bauru).

Ademais, esclarece CABRAL (2008, p. 148):... os juízes são impelidos a agir sobre assuntos políticos referentes àAdministração Pública, pois houve uma evolução das expectativas dos cidadãos a respeito da responsabilidade política.

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Esta relação que se firma entre a educação e a justiça na sociedade contemporânea está muito evidente, conforme ficou demonstrado pelas decisões citadas quando se está em questão a existência de um molestamento de direitos pelos responsáveis. Con-tudo, extrapola o Poder Judiciário, sendo que outras instituições também se apresen-tam relevantes na garantia do direito à educação, podendo ser citado como exemplo o Ministério Público. Apenas a título de ilustração, em levantamento realizado junto ao Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, constatou-se no período de 01 de janeiro de 2008 a 19 de agosto de 2008 que foram protocolados 628 expedientes relacionados à área da Infância e da Juventude. Deste total, 288 referem-se à questão educacional, o que representa um total de 45,85%. Em vários Estados da federação, o Ministério Público está organizado de forma a contemplar Centros de Apoio aos Promotores de Justiça na área da educação. Esta informação revela como o tema educação tem se apresentado para as instituições jurídicas, como o Ministério Público, que integra o sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente.

Em síntese, pode-se afirmar que a judicialização da educação representa a busca de mais e melhores instrumentos de defesa de direitos juridicamente protegidos. Essa proteção judicial avança na consolidação desse direito da criança e do adolescente e significa a exigência da obrigatoriedade da transformação do legal no real.

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REFERÊNCIAS

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CABRAL, Karina Melissa. A Justicialidade do Direito à qualidade do ensino fun-damental no Brasil. 2008. 195p. Dissertação [Mestrado em Educação]. Faculdadede Educação. UNESP.

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5. PROJETO DE LEI 3871/2013 – ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS

PROJETO DE LEI Nº 3.871/2013

Dispõe sobre ingresso no primeiro ano do ensino fundamental na rede pública de ensino do Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:Art. 1º - Para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental na rede pública de

ensino do Estado a criança deverá ter 6 (seis)anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.Art. 2º - As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida

no art. 10 deverão ser matriculadas na pré-escola.Art. 3º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.Sala das Reuniões, 14 de março de 2013.

Rogério Correia

Justificação: No cadastro de 2012, a Secretaria de Educação estabeleceu, por meio da Resolução N° 2.108, de 20/6/2012 ,que toda criança que completasse 6 (seis) anos de idade até 31/12/2013 deveria inscrever-se no cadastramento escolar para atendimento no ensino fundamental. O Fórum Mineiro de Educação Infantil, que é uma entidade que defende os direitos das crianças, é contra essa resolução e tem feito um amplo movimento envolvendo famílias, profissionais e gestores públi-cos, para reverter esse quadro.

Muitos argumentos encontrados para adiantar, apressar e acelerar as aprendiza-gens e os processos escolares, com a matrícula da criança aos 5 anos no ensino fun-damental, não se apoiaram no bem-estar da criança e no que é melhor para a infância. Queimar etapas no desenvolvimento pode ser prejudicial à criança. Cada vez mais os consultórios de psicologia estão recebendo crianças forçadas precocemente a atender às expectativas dos adultos. Defendemos que a criança pequena, antes de completar 6 anos, deva permanecer na educação infantil, cuja preparação do tempo e do espaço é feita para que as crianças possam brincar e interagir, o que não acontece no ensino fundamental, e que é essencial para o pleno desenvolvimento da criança, tendo inclu-sive influência sobre o seu desempenho escolar futuro.

É senso comum que a criança, simplesmente por já estar alfabetizada, necessita entrar logo no ensino fundamental. Mas o fato é que, cada vez mais, muitas crianças se alfabeti-zam mais cedo, devido ao maior número de estímulos presentes em nossa sociedade; esse deixa, portanto, de ser um critério a ser considerado para a entrada nesta etapa de ensino.

Por essas razões, contamos com o apoio dos nobres pares para aprovação de nosso projeto de lei.

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- Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Educação para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.

PARECER PARA O 1º TURNO DO PROJETO DE LEI Nº 3.871/2013

RELATÓRIODe autoria do Deputado Rogério Correia, a proposição em epígrafe dispõe sobre

ingresso no primeiro ano do ensino fundamental na rede pública de ensino do Estado. sà odíubirtsid otejorp o iof ,3102/3/61 ed ”ovitalsigeL od oiráiD“ on odacilbuP

Comissões de Constituição e Justiça e de Educação, Ciência e Tecnologia para receber parecer, nos termos do art. 188 do Regimento Interno.

Cabe a esta Comissão, preliminarmente, apreciar os aspectos jurídico, con-stitucional e legal da matéria, conforme prescreve o art. 102, III, “a”, do men-cionado Regimento.

FUNDAMENTAÇÃOPropõe-se, no projeto em análise, a instituição de requisito etário para ingresso no

primeiro ano do ensino fundamental na rede pública de ensino do Estado. De cordo com o projeto, a criança deverá ter 6 anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

De acordo com a justificativa apresentada pelo autor da proposição, no cadastro de 2012, a Secretaria de Educação estabeleceu, por meio da Resolução n° 2.108, de 20/6/2012, que toda criança que completasse 6 anos de idade até 31/12/2013 deveria inscrever-se no cadastramento escolar para atendimento no ensino fundamental. Ainda de acordo com a justificativa apresentada pelo autor, o Fórum Mineiro de Educação Infantil, entidade voltada à defesa dos direitos das crianças, é contra essa resolução e tem feito um amplo movimento envolvendo famílias, profissionais e gestores públicos.

Para situar a controvérsia que o projeto de lei procura dirimir, é preciso recordar que, com a finalidade de regulamentar dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB – , Lei Federal nº 9.394, de 20/12/1996, o Conselho Nacional de Edu-cação – CNE –, desde 2010, tem editado resoluções que estabelecem o dia trinta e um de março como data de corte para a matrícula no primeiro ano do ensino fundamental.

A LDB, em sua redação original, previa a obrigatoriedade da matrícula no ensino fundamental a partir dos 7 anos de idade. Todavia, no contexto da mobilização pela universalização do direito de acesso à educação, da ampliação do ensino fundamental de nove anos, bem como a partir de um princípio de justiça social, uma vez que as cri-anças oriundas de famílias com maior poder aquisitivo começam mais cedo o ensino fundamental, o Senador Ricardo Santos, do PSDB do Espírito Santo, propôs projeto de lei que resultou na Lei Federal nº 11.114, de 16/5/2005, e que conferiu a seguinte redação ao art. 6º da LDB:

Art. 6º - É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos meno-res, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental. (Redação dada pela Lei nº 11.114, de 2005).

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O sistema de ensino, no entanto, ainda dependia da solução do problema ati-nente à uniformização da data de ingresso no ensino infantil e fundamental. Tal questão é marcada por diversos fatores. Primeiramente, têm-se as implicações psicopedagógicas, visto que era, e ainda é, comum o ingresso de crianças fora da faixa etária ideal para a alfabetização no ensino fundamental. Outro fator é administração da demanda por vagas no sistema público de ensino. Também está em causa a uniformização de critérios, em âmbito nacional, para as matrículas na pré-escola e no ensino fundamental. Tal uniformização na admissão de educandos para a educação básica se refletirá, posteriormente, na eficácia dos mecanismos de avaliação do ensino e do desempenho dos educandos.

Desse modo, em 2010 a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação editou a Resolução nº 1 de 14/1/2010, posteriormente substituída pela Reso -lução 6, de 20/10/2010. Esta, em síntese, estabelece:

Art. 2º – Para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter idade de 4 (quatro) anos completos até o dia 31 de março do ano que ocorrer a matrícula.Art. 3º – Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.Art. 4º – As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida no artigo 3º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.

Apesar de seu relevante propósito, o referido regulamento do CNE foi alvo de ações judiciais e, em alguns Estados federados, sua aplicação está suspensa.

Este é o caso do Estado de Minas Gerais, que, em virtude de decisão judicial prolatada no âmbito da Justiça Federal, não pôde adotar a data de corte estipulada pela Resolução nº 6/2010 do CNE para a uniformização das matrículas do ensino fundamental. A referida decisão judicial apoiou-se em dois principais argumentos para suspender a aplicação da Resolução CNE-CEB 6/2010 no âmbito do Estado de Minas Gerais: a) obediência ao princípio da legalidade para a instituição de limitação à matrícula escolar, ou seja, tal limitação não poderia ter sido instituída por resolução sem amparo legal; b) observância do princípio constitucional que garante acesso aos níveis mais elevados do ensino segundo a capacidade de cada um.

O cerne da solução da questão passa a ser a definição da data de ingresso no ensino infantil e fundamental. Como a Constituição da República não estabelece reserva le-gal em sentido estrito, a falta de previsão legal pode ser suprida pelo estabelecimento da data de corte na própria lei, de modo expresso, ou pode ser suprida pela atribuição dessa competência a órgão administrativo.

Implantada tal providência, o segundo argumento, relativo à garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino segundo a capacidade de cada um, perde força. Isso porque cessará a recorrente situação de crianças chegando ao ensino infantil fora da idade ade-quada e, consequentemente, postulando o ingresso em idade equivocada no ensino fun-damental. Ademais, no tocante a alunos superdotados, a própria LDB já estabelece que:

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Art. 59 – Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessi-dades especiais:II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas defi-ciências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;.

Por outro lado, cumpre registrar que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 6.755, de 2010, que tem conteúdo análogo ao projeto de lei em exame. O referido projeto de lei, iniciado junto ao Senado Federal, já teve concluída a sua apre-ciação pela Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. O parecer dessa Comissão contém um substitutivo no qual a data de corte é 30 de junho:

Art. 3º – O art. 6º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:Art. 6º – É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos filhos ou dependentes a partir dos quatro anos de idade completos, ou a completar até 30 de junho do ano da matrícula, na educação infantil, bem como nas etapas seguintes da educação básica obrigatória..(...)Art. 6º – O “caput” do art. 32 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:“Art. 32 – O ensino fundamental obrigatório, com duração de nove anos, gratuito na escola pública, inicia-se aos seis anos completos ou a completar até 30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula e terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante (...).

Conforme noticiou a justificativa apresentada pelo autor do projeto de lei, o quadro -de insegurança jurídica gerado pela falta de respaldo legal da Resolução CNE-CEB 6/2010 obrigou a Secretaria de Estado de Educação a adotar data diversa daquela recomendada pelo órgão federal. E, nesse sentido, é forçoso reconhecer que, somente após definição da questão pelo Congresso Nacional, será possível solucionar defini-tivamente o problema.

Portanto, esse relato da questão jurídica que cerca o estabelecimento da data de 31 de março como data de corte para a matrícula de alunos do ensino fundamental revela a pertinência do projeto apresentado. Resta perquirir sua constitucionalidade e legalidade.

A competência do Estado Federado para dispor sobre matéria de educação é defi-nida pelos seguintes artigos da Constituição da República:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:XXIV - diretrizes e bases da educação nacional;(...)Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concor-rentemente sobre:(...)

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IX - educação, cultura, ensino e desporto;(...)§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.§ 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficá-cia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Daí se conclui que, inexistindo lei federal a especificar qual a data de corte para a matrícu-la no ensino fundamental, o Estado federado é competente para legislar sobre a matéria.

Vale registrar que não se trata de pretender a cassação da legítima decisão judicial proferida no âmbito da Seção Judiciária Federal do Estado de Minas Gerais. Tam-pouco se pretende, com lei estadual, convalidar ato normativo federal.

A previsão legal de uma data de corte não precisa obedecer, necessariamente, à data indicada na Resolução CNE-CEB 6/2010, pois, conforme indica o avançado andamento do Projeto de Lei nº 6.755/2010 no Congresso Nacional, em breve será necessário con-vergir as diversas datas hoje praticadas para aquela que o Congresso Nacional fixar.

Portanto, a utilidade prática do projeto de lei em exame é legitimar a unificação das datas de corte, reduzindo ao máximo a insegurança jurídica, essa sim o maior estorvo para os administradores públicos, os dirigentes de estabelecimentos de en-sino e, sobretudo, para as famílias.

Nesse cenário em que se busca afirmar uma data de corte unificada, bem como construir regras de transição que atendam as inúmeras situações particulares, é mais prudente atribuir às autoridades administrativas da política educacional do Estado de Minas Gerais, notadamente ao Conselho Estadual de Educação, a competência para disciplinar a matéria. Não havendo exigência na Constituição de que a data de corte conste em lei, nada impede que a lei estadual apenas especifique tal competência para os órgãos administrativos da política de Educação.

Diante de tais razões, para aperfeiçoar o texto apresentado em vista dos aspectos já abordados, entendemos ser pertinente a apresentação do Substitutivo nº 1, nos termos que constam da conclusão.

CONCLUSÃO

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, pela constitucionalidade e pela le-galidade do Projeto de Lei nº 3.871/2013 na forma do Substitutivo nº 1, a seguir redigido.

SUBSTITUTIVO Nº 1Dispõe sobre a idade de ingresso no primeiro ano da pré-escola e do ensino fundamental.A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:Art. 1º – É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos filhos ou

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dependentes no ensino fundamental a partir dos seis anos de idade completos, obser-vada a data de corte a ser definida pelo Conselho Estadual de Educação.

Art. 2º - As crianças que completarem seis anos de idade após a data de corte defini-da pelo Conselho Estadual de Educação deverão continuar matriculadas na pré-escola.

Parágrafo único – Poderá o Conselho Estadual de Educação, tendo em vista o princípio do acesso aos níveis mais elevados de ensino, estabelecer regras de transição que contemplem a situação de educandos que tenham ingressado na educação infantil com idade diversa.

Art. 3º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.Sala das Comissões, 2 de abril de 2013.Sebastião Costa, Presidente – Dalmo Ribeiro Silva, relator – André Quintão –

Duilio de Castro – Luiz Henrique – Leonídio Bouças.

PARECER PARA O 2º TURNO DO PROJETO DE LEI Nº 3.871/2013

RELATÓRIO

De autoria do Deputado Rogério Correia, a proposição em epígrafe dispõe sobre ingresso no primeiro ano do ensino fundamental na rede pública de ensino do Estado.

Aprovado em 1º turno na forma do Substitutivo nº 2, retorna agora o projeto a esta Comissão para receber parecer para o 2º turno, nos termos do art. 102, VI, combinado com o art. 189, do Regimento Interno.

Segue, anexa, a redação do vencido, que é parte deste parecer, nos termos do art. 189, § 1º, do Regimento Interno.

FUNDAMENTAÇÃO

Na sua forma original, o projeto em análise estabelece que, para ingressar no primeiro ano do ensino fundamental da rede pública de ensino do Estado, a criança deverá ter seis anos completos até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. Aquela que completar seis anos de idade após essa data deverá ser matriculada na pré-escola.

A Comissão de Constituição e Justiça, em seu parecer no 1º turno, concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 3.871/2013, na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou. No substitutivo apresentado, aquela Co-missão concedeu ao Conselho Estadual de Educação – CEE – a prerrogativa de fixar o requisito etário para que a criança ingresse no primeiro ano do ensino fundamen-tal. Facultou, ainda, a esse mesmo Conselho estabelecer regras de transição que se apliquem àquelas crianças que tenham ingressado no ensino fundamental com idade diferente da estabelecida.

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A Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia, quando da análise no 1º turno do projeto em epígrafe, emitiu parecer pela aprovação da matéria na forma do Substitu-tivo nº 2, que apresentou. A Comissão entendeu que o requisito etário para ingresso no ensino fundamental deveria constar expressamente no texto legal. Além disso, esta-beleceu regra de transição, válida até 2015, permitindo às crianças que completassem seis anos até 31 de dezembro serem matriculadas no ensino fundamental, desde que tivessem cursado por dois anos a pré-escola. Por fim, concedeu ao CEE a prerrogativa para estabelecer medidas de acompanhamento e avaliação das crianças que ingressas-sem no ensino fundamental na forma da referida regra de transição.

Conforme a argumentação de mérito já exposta no parecer de 1º turno desta Co-missão, não há unanimidade quanto ao critério mais adequado para decidir quando a criança deve ingressar no ensino fundamental – idade cronológica ou desenvolvimen-to cognitivo. Por isso, na oportunidade de rever a matéria em 2º turno, procuramos re-considerar e reavaliar ainda mais cuidadosamente as posições que nos foram manifes-tadas pelos representantes do Fórum Mineiro de Educação e representantes dos pais cujos filhos se encontram na idade própria de ingresso no ensino fundamental. Para tanto, analisamos a Ação Civil Pública impetrada na Terceira Vara Federal de Minas Gerais com decisão em 26/10/2012, que logrou, com êxito, a matrícula de crianças com seis anos incompletos naquele nível de ensino, fundamentada principalmente na preservação do direito universal de acesso à educação. Além disso, consultamos a Secretaria de Estado de Educação – SEE –, que, como gestora do sistema de educação básica no Estado, pôde contribuir com informações e argumentos que nos levaram a reconsiderar a posição que adotamos no 1º turno.

Estamos de pleno acordo com os argumentos apresentados pelo Fórum Mineiro de Educação de que não se deve antecipar a escolarização das crianças, sob pena de criar malefícios á sua formação. Também somos sensíveis ao apelo dos representantes dos pais de crianças que estão na educação infantil, pois permitir o acesso ao ensino fundamental apenas às crianças que completarem 6 anos de idade até 31/3 – idade de corte estabelecida pelas Resoluções do Conselho Nacional de Educação nº 1, de 14/1/2010, e nº 6, de 20/10/2010 – pode atrasar sobremaneira o seu desenvolvimento escolar. Considerando essas duas posições, julgamos que uma solução intermediária poderia atender aos dois lados da questão. Assim, apresentamos um substitutivo ao vencido em 1º turno, estabelecendo o dia 30 de junho como data limite para que a cri-ança complete seis anos de idade e ingresse no primeiro ano do ensino fundamental.

Estender a data limite que havíamos considerado razoável no 1º turno concederá às crianças mais tempo para seu desenvolvimento e amadurecimento social, emo-cional e cognitivo antes de iniciarem sua vida escolar no ensino fundamental. Além disso, essa data foi utilizada em Minas Gerais durante quatro anos letivos; conforme regulado pela SEE nas Resoluções nº 770 de 30/5/2006 , 1 de 21/5/2007, 1.112 de 21/5/2008 e 1.328 de 21/5/2009, e obteve boa aceitação na comunidade escolar.

Com a nova data limite estabelecida em 30 de junho, julgamos que não serão mais necessárias as regras de transição que haviam sido pensadas para permitir o ingresso antecipado das crianças no ensino fundamental.

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Diante da mudança de posicionamento desta Comissão de mérito, motivada pela consulta à SEE e novas discussões sobre os critérios mais adequados para estabelecer com que idade as crianças podem ingressar no ensino fundamental, apresentamos, ao final deste parecer, o Substitutivo nº 1 ao vencido em 1º turno. Acreditamos que as alterações propostas preservam, de forma ponderada, tanto o direito da criança à infância quanto à educação.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.871/2013, no 2º turno, na forma do Substitutivo nº 1 ao vencido no 1º turno, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1Dispõe sobre a idade de ingresso no primeiro ano do ensino fundamental.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:Art. 1º – Para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental no Estado, a

criança deverá ter seis anos de idade completos até o dia 30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula.

Art. 2º – A criança que completar seis anos de idade após a data definida no art. 1º será matriculada na pré-escola.

Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.Sala das Comissões, de de 2013.

Presidenterelator

PROJETO DE LEI Nº 3.871/2013(Redação do Vencido)Dispõe sobre a idade de ingresso no primeiro ano do ensino fundamental.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:Art. 1º - Para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental no Estado a cri-

ança deverá ter seis anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

Art. 2º – Será admitido, até o ano de 2015, o ingresso no ensino fundamental de crianças que completarem seis anos de idade até 31 de dezembro do ano em que ocor-rer a matrícula, desde que tenham cursado por dois anos a pré-escola.

Parágrafo único – Os órgãos competentes do Sistema Estadual de Educação es-tabelecerão medidas específicas para assegurar o acompanhamento e a avaliação das crianças que ingressarem no ensino fundamental na forma do “caput”.

Art. 3º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

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LEI Nº 20.817, DE 29 DE JULHO DE 2013.Dispõe sobre a idade de ingresso no primeiro ano do ensino fundamental.

O GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS,O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu

nome, promulgo a seguinte Lei:Art. 1º Para o ingresso no primeiro ano do ensino fundamental no Estado, a cri-

ança deverá ter seis anos de idade completos até o dia 30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula.

Art. 2º A criança que completar seis anos de idade após a data definida no art. 1º será matriculada na pré-escola.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Palácio Tiradentes, em Belo Horizonte, aos 29 de julho de 2013; 225° da Incon-

fidência Mineira e 192º da Independência do Brasil.

ANTONIO AUGUSTO JUNHO ANASTASIADanilo de CastroMaria Coeli Simões PiresRenata Maria Paes de VilhenaAna Lúcia Almeida Gazzola

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6. AÇÕES DO FÓRUM MINEIRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL – FMEI

a. CARTA ABERTA À COMUNIDADE

Belo Horizonte, julho de 2012.

CARTA ABERTA À COMUNIDADE5 ANOS É NA EDUCAÇÃO INFANTIL!No último dia 05 de julho de 2012, fomos surpreendidos com a republicação da Reso-

lução da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais Nº 2.108, de 20 de junho de 2012 (publicada pela primeira vez no dia 21 de junho) que estabelece as normas para o Cadastramento Escolar para o ano de 2013. Essa normativa fere o direito à Educação Infantil das crianças de zero a seis anos incompletos ao estabelecer em seu art. 4º que toda criança que completar 6 (seis) anos de idade no ano de 2013 deverá inscrever-se no cadastramento escolar para atendimento no Ensino Fundamental.

Em primeiro lugar, essa determinação desconsidera as especificidades da primeira infância que requer um atendimento educacional com finalidades, estratégias, recur-sos didáticos, materiais, espaços físicos, equipamentos e práticas docentes distintas das etapas subseqüentes da Educação Básica. A forma como a criança de zero a seis anos se relaciona com o mundo e com a qual dele se apropria requer espaços adequados nos quais possa brincar, descansar, experimentar e realizar atividades ora estruturadas, ora espontâneas e livres. Classes menos numerosas, menor tempo de permanência em ativi-dades dirigidas, maior alternância entre situações de aprendizagem com níveis variados de concentração e dispersão,

tempo maior de situações de aprendizagem que envolvem o uso do corpo e de movimentos amplos são alguns exemplos das diferenças existentes entre a educação da primeira infância e aquela que se destina ao ciclo seguinte.

Em segundo lugar, foram ignoradas as determinações legais e normativas que veem sendo construídas, há décadas, no âmbito da Educação Infantil brasileira. O arcabouço legal e normativo elaborado por especialistas em diálogo constante com gestores públi-cos, profissionais da área, movimentos sociais ao defender o direito das crianças à Edu-cação Infantil, o faz considerando a primeira infância como um momento distinto que requer situações e práticas educativas diferenciadas. Práticas essas que veem sendo cui-dadosamente gestadas na Educação Infantil e que, por isso mesmo, se constitui em uma das etapas da Educação Básica, justificando, assim, sua especificidade em relação às etapas seguintes. Dentre essas normatizações destacamos:

Art. 208 da Constituição Federal – educação básica, obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.(...)IV- educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade.

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RESOLUÇÃO Nº 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010 do CONSELHO NA-CIONAL DE EDUCAÇÃO que define as Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Em seu artigo 2º coloca que para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a cri-ança deverá ter 6 (seis) anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. RESOLUÇÃO Nº 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010 do CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO que define Diretrizes Operacionais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil . Nos Art. 1, 2, 3 e 4 estabelece que os entes federados, as escolas e as famílias devem garantir o atendimento do direito público subjetivo das crianças com 6 (seis) anos de idade, matriculando-as e mantendo-as em escolas de Ensino Fundamental, nos termos da Lei nº 11.274/2006. Para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter idade de 4 (quatro) anos completos até o dia 31 de março do ano que ocorrer a matrícula. Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Funda-mental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida no artigo 3º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.RESOLUÇÃO Nº 5, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2009 do CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO que fixa as Diretrizes Curriculares Nacio -nais para a Educação Infantil. Em seu artigo 5º, estabelece que é dever do Es-tado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade, sem requisito de seleção. É obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.As crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março devem ser matriculadas na Educação Infantil.

Em terceiro lugar, cabe alertar a população e os gestores que o impacto dessa medida atingirá drasticamente o sistema de ensino como um todo. Haverá um con-tingente considerável de crianças de cinco anos ingressando no Ensino Fundamental. Outro agravante é que muitas crianças que atualmente frequentam turmas de quatro anos irão automaticamente para as turmas de seis anos, caso seja mantida a data de 31 de dezembro.

O Fórum Mineiro de Educação Infantil, comprometido com a garantia do direito da criança a uma educação de qualidade, juntamente com pais, profissionais da Edu-cação Infantil, gestores públicos, representantes de universidades e sociedade civil defende que seja revogada a republicação de 05 de julho de 2012 da Resolução da Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais nº 2.108, de 20 de junho de 2012 e sejam mantidas as orientações contidas na Resolução publicada anteriormente em 21 de junho de 2012 que possibilitava que as crianças que completarão seis anos a partir de 31 de março de 2013 sejam matriculadas na Educação Infantil.

Nossa luta por uma educação de qualidade não pode descuidar-se do direito da criança de viver sua infância e de tudo o que este direito implica: brincar; aprender ludicamente; conviver em espaços que lhe garantam liberdade, autonomia, ampliação

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de suas experiências humanas. Defendemos a aprendizagem de acordo com as caracterís-ticas da idade, preservando a infância e respeitando as etapas do desenvolvimento infantil. Antecipar a entrada no Ensino Fundamental é uma forma de desconsiderar as especifici-dades da primeira infância que se constitui como um tempo próprio de formação humana.

Cordialmente,Fórum Mineiro de Educação Infantil

b. NOTA DE ESCLARECIMENTO

Aos Companheiros/Companheiras do FMEI,Mais uma vez fomos surpreendidos com uma ação na justiça contra o corte etário,

fixado em 31 de março. No último dia 26 de outubro, o Juiz Daniel Carneiro Macha-do, da 3ª Vara do Tribunal de Justiça Federal, concedeu Liminar a um pedido de tutela antecipada, suspendendo o efeito das resoluções n° 01, de 14/01/2010 e n° 6 de 20/10/2010 e demais atos posteriores editados pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE). Tais resoluções fixam critérios para o ingresso das crianças de 6 (seis) anos no Ensino Fundamental.

Quanto ao cumprimento da decisão judicial, recomendamos aos municípios que não façam uma alteração no Cadastro já realizado, uma vez que a decisão do Juiz estabelece que a ação de suspensão depende de avaliação e ocorrerá de forma indi-vidualizada, conforme destacamos no trecho da Liminar abaixo:

Dessa forma, estabelecer limitação de acesso à educação em razão de data em que a criança completa a idade de acesso ao nível escolar não me parece revestido de razoabilidade visto não haver previsão legal para tanto, bem como pelo fato de que a capacidade de aprendizado é individual, podendo ser determinada não somente pela idade, mas também pela capacidade in-telecto/psicológica de cada criança, que poderá ser conferida pelas escolas, de forma individualizada, por meio de testes psicológicos/pedagógicos.

Frente ao exposto no texto da decisão, cada família interessada na mudança deverá procurar o município e solicitar a revisão da situação da criança. Nesse sentido, um aspecto importante é que a liminar propõe uma avaliação psicopedagógica, ou seja, uma avaliação de um profissional específico. Entendemos que as unidades escolares, em sua grande maioria, não possuem psicopedagogos, devendo as famílias interes-sadas buscar, por conta própria, essa avaliação.

Sabemos que as recomendações acima não resolvem a situação, mas possibilitam um tempo até conseguirmos uma decisão favorável à nossa causa.

O FMEI está mobilizando para atuar junto à Justiça Federal e à Secretaria de Es-tado da Educação para reverter essa situação. O processo ainda está em julgamento e, enquanto não é proferida uma decisão final, a ordem judicial deve ser cumprida. Estamos aguardando para o dia 10 de dezembro um posicionamento da SEE/MG.

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c. CARTA AO PROMOTOR

Belo Horizonte, julho de 2012.

23ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Belo HorizonteAv. Olegário Maciel, 555. Centro. Belo Horizonte. MG. CEP 30.180-110

Exmo Sr. Promotor,

No último dia 05 de julho de 2012, fomos surpreendidos com a republicação da Resolução da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais Nº 2.108, DE 20 DE JUNHO DE 2012 (publicada anteriormente no dia 21 de junho) que estabelece as nor-mas para o Cadastramento Escolar para o ano de 2013. Essa normativa fere o direito à Educação Infantil das crianças de zero a seis anos incompletos ao estabelecer em seu art. 4º que toda criança que completar 6 (seis) anos de idade no ano de 2013 deverá inscrever-se no cadastramento escolar para atendimento no Ensino Fundamental.

Em primeiro lugar, essa determinação desconsidera as especificidades da primeira infância que requer um atendimento educacional com finalidades, estratégias, recur

-sos didáticos, materiais, espaços físicos, equipamentos e práticas docentes distintas das etapas subseqüentes da Educação Básica. A forma como a criança de zero a seis anos se relaciona com o mundo e com a qual dele se apropria requer espaços adequados nos quais possa brincar, descansar, experimentar e realizar atividades ora estruturadas, ora espontâneas e livres. Classes menos numerosas, menor tempo de permanência em atividades dirigidas, maior alternância entre situações de aprendi -zagem com níveis variados de concentração e dispersão, tempo maior de situações de aprendizagem que envolvem o uso do corpo e de movimentos amplos são alguns exemplos das diferenças existentes entre a educação da primeira infância e aquela que se destina ao ciclo seguinte.

Em segundo lugar, foram ignoradas as determinações legais e normativas que veem sendo construídas, há décadas, no âmbito da Educação Infantil brasileira. O arcabouço legal e normativo elaborado por especialistas em diálogo constante com gestores públicos, profissionais da área, movimentos sociais ao defender o direito das crianças à Educação Infantil, o faz considerando a primeira infância como um mo-mento distinto que requer situações e práticas educativas diferenciadas. Práticas essas que veem sendo cuidadosamente gestadas na Educação Infantil que, por isso mesmo, se constitui em uma das etapas da Educação Básica, justificando, assim, sua especifi-cidade em relação às etapas seguintes. Dentre essas normatizações destacamos:

Art. 208 da Constituição Federal – educação básica, obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.

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(...)IV- educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade.

RESOLUÇÃO Nº 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010 do CONSELHO NACIO-NAL DE EDUCAÇÃO que define as Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Em seu artigo 2º coloca que para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter 6 (seis) anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

RESOLUÇÃO Nº 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010 do CONSELHO NACIO-NAL DE EDUCAÇÃO que define Diretrizes Operacionais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil. Nos Art. 1, 2, 3 e 4 estabelece que os entes federa-dos, as escolas e as famílias devem garantir o atendimento do direito público subjetivo das crianças com 6 (seis) anos de idade, matriculando-as e mantendo-as em escolas de Ensino Fundamental, nos termos da Lei nº 11.274/2006. Para o ingresso na Pré-Escola, a criança deverá ter idade de 4 (quatro) anos completos até o dia 31 de março do ano que ocorrer a matrícula. Para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter idade de 6 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula. As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade após a data definida no artigo 3º deverão ser matriculadas na Pré-Escola.

RESOLUÇÃO Nº 5, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2009 do CONSELHO NA-CIONAL DE EDUCAÇÃO que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-cação Infantil. Em seu artigo 5º, estabelece que é dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade, sem requisito de seleção. É obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.As crianças que completam 6 anos após o dia 31 de março devem ser matriculadas na Educação Infantil.

Em terceiro lugar, cabe alertar a população e os gestores que o impacto dessa medida atingirá drasticamente o sistema de ensino como um todo. Haverá um con-

.latnemadnuF onisnE on odnassergni sona ocnic ed saçnairc ed leváredisnoc etnegnitOutro agravante é que muitas crianças que atualmente frequentam turmas de quatro anos irão automaticamente para as turmas de seis anos, caso seja mantida a data de 31 de dezembro.

O Fórum Mineiro de Educação Infantil, comprometido a garantia do direito da cri-ança a uma educação de qualidade, juntamente com pais, profissionais da Educação Infantil, gestores públicos e representantes de universidades solicita à Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Belo Horizonte orientações para que seja revogada a Resolução da SEE de Minas Gerais Nº 2.108, DE 20 DE JUNHO DE 2012 e sejam mantidas as orientações contidas na Resolução publicada anteriormente em 21 de junho de 2012.

Nossa luta por uma educação de qualidade não pode descuidar-se do direito da criança de viver sua infância e de tudo o que este direito implica: brincar; aprender ludicamente; conviver em espaços que lhe garantam liberdade, autonomia, ampliação de suas experiência humanas. Defendemos a aprendizagem de acordo com as carac-terísticas da idade, preservando a infância e respeitando as etapas do desenvolvimento infantil. Antecipar a entrada no ensino fundamental para a idade de cinco anos é uma

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forma de desrespeitar o direito de ser criança e de viver a infância como tempo de formação humana.

Cordialmente,Fórum Mineiro de Educação Infantil

d. ABAIXO – ASSINADO

Ilma. Sr.ªAna Lúcia Almeida GazzolaSecretária de Educação do Estado de Minas Gerais Nós, abaixo-assinados, pais, profissionais da Educação Infantil, gestores públicos

e representantes de universidades, vimos requerer de V.S.ª que seja revogada a Reso-lução da SEE de Minas Gerais Nº 2.108, DE 20 DE JUNHO DE 2012 e sejam man-tidas as orientações contidas na Resolução publicada anteriormente em 21 de junho de 2012 que possibilitava que as crianças que completarão seis anos a partir de 31 de março de 2013 sejam matriculadas na Educação Infantil. A luta por uma educação de qualidade não pode descuidar-se do direito da criança de viver sua infância e de tudo o que este direito implica: brincar, aprender ludicamente, conviver em espaços que lhe garantam liberdade, autonomia e a ampliação de suas experiência humanas. Defendemos a aprendizagem de acordo com as características da idade, preservando a infância e respeitando as etapas do desenvolvimento infantil. Antecipar a entrada no Ensino Fundamental é uma forma de desconsiderar as especificidades da primeira in-fância que se constitui como um tempo próprio de formação humana. Em razão disso, solicitamos de V.S.ª o máximo empenho para solucionar esta situação.

Assinaturas:

e. FOLDER DE DIVULGAÇÃO DA CAMPANHA

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TEXTO DO FOLDER:Desde a ampliação do Ensino Fundamental de oito para nove anos, o início da vida

escolar tem sido sinônimo de confusão para muitas crianças, suas famílias e para a organização dos sistemas de ensino. qual a idade certa para o ingresso das crianças no Ensino Fundamental? Alguns municípios brasileiros têm efinido que crianças que completam seis anos ao longo de todo o ano devem matricular-se no Ensino Funda-mental e outros determinam que apenas aquelas que completarem seis anos após o dia 31 de março deverão fazê-lo. As dúvidas têm gerado, a cada ano, processos jurídicos contra escolas e redes de ensino. No dia 05 de julho de 2012, a Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, por meio da Resolução da Nº 2.108, DE 20 DE JUNHO DE 2012, estabeleceu que as crianças que completassem 6 (seis) anos de idade ATÉ 31 DE DEZEMBRO, no ano de 2013, deveriam ser matriculadas no Ensino Fundamental.

O Fórum Mineiro de Educação Infantil, entidade que defende os direitos das crian-ças, se posicionou contrariamente a essa Resolução e junto com outros representantes da sociedade civil, pais, professores e gestores públicos conseguiu reverter a situação. Entenda por que defendemos que crianças de 5 anos devem ser matriculadas na Edu-cação Infantil e o que é preciso para assegurar essa medida.

O QUE É O CADASTRAMENTO OU CADASTRO ESCOLAR?A educação brasileira é organizada anualmente. Em Minas Gerais, o levantamento

do número de alunos que ingressarão no Ensino Fundamental da rede pública é feito pelo estado, em parceria com os municípios. Esse levantamento é chamado de Cadastro Escolar e permite saber quantas crianças deverão ser atendidas no ano subsequente para, assim, organizar as escolas para esse atendimento. Numa determinada data estipulada pelos órgãos competentes, as famílias devem comparecer a uma escola ou a uma agên-cia dos Correios portando a documentação exigida e realizar o cadastramento.

O QUE É CORTE ETÁRIO?O corte etário significa estabelecer uma data limite para que a criança possa ser

matriculada. O melhor é que essa data seja no início do ano para não prejudicar o processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Você deve se lembrar que durante muito tempo essa data foi o dia 30 de abril.

O RECORTE ETÁRIO É IMPORTANTE?Estabelecer uma data comum que determina quem será matriculado no primeiro

ano do Ensino Fundamental é uma forma de organizar o sistema educacional brasileiro. Como antecipado, essa data é chamada “Corte etário” e garante, com clareza e precisão, a equidade na idade de ingresso nos sistemas de ensino em todo o território nacional.

Além disso, o não estabelecimento dessa data impacta, pelo menos, de duas ma-neiras na vida das crianças e dos sistemas de ensino. O primeiro grande impacto é que crianças muito novas ingressarão no primeiro ano do Ensino Fundamental. Imagine uma criança que completaria cinco anos no dia 25 de dezembro de 2013. Ela fre-

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quentaria durante todo o ano de 2012 uma turma de crianças de quatro anos. Quando voltasse das férias, essa criança iria direto para uma turma de crianças do Ensino Fun-damental e lá ficaria com crianças que já tivessem completado seis anos, algumas que iriam completar no início ou no meio do ano e outras, como ela, que somente fariam aniversário no finalzinho do ano. Ela teria perdido a oportunidade de frequentar mais um ano na Educação Infantil e, consequentemente, desenvolver-se melhor cognitiva-mente e emocionalmente.

O segundo impacto é na organização das outras turmas da Educação Infantil. As es-colas precisariam adotar o mesmo sistema para evitar que o que explicamos acima ocor-resse nos próximos anos, ou seja, que as crianças que estivessem frequentando turmas de quatro anos passassem para o primeiro ano do Ensino Fundamental sem frequentar as turmas de cinco anos. Consequentemente, as turmas de início da pré-escola teriam crianças de três anos de idade que completariam quatro somente no final do ano.

QUAL É O CORTE ETÁRIO ADOTADO EM MINAS GERAIS?Durante muito tempo, a data definida foi o dia 30 de abril. Após a entrada da cri-

ança de seis anos no Ensino Fundamental ampliando, assim de oito para nove anos de duração essa etapa da Educação Básica, essa discussão veio à torna: quem é a criança de seis anos para o sistema educacional? A partir da homologação da lei que ampliou de oito para nove anos o Ensino Fundamental (Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006), houve um tempo de indefinições. Até que o Conselho Nacional de Educação, por meio das resoluções Nº 5, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2009, Nº 1, DE 14 DE JA-NEIRO DE 2010 e Nº 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010, definiu como data limite, ou seja, como corte etário, o dia 31 de março.

Para 2013, após modificações de âmbito nacional e discussões com a Secretaria de Estado da Educação, ficou definido pela RESOLUÇÃO 2108 que as crianças que têm seis anos completos ou que vierem a completar seis anos até o dia 31 de março de 2013 deverão ser matriculadas no Ensino Fundamental. Se seu filho completa seis anos após essa data ele deverá ser matriculado na Educação Infantil. Foi uma vitória importante, mas, e para os próximos anos?

POR QUE LUTAMOS PARA QUE AS CRIANÇAS DE CINCO ANOS (AQUE-LAS QUE COMPLETAM SEIS ANOS APÓS 31 DE MARÇO) SEJAM MATRICU-LADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL?

A matrícula dessas crianças na Educação Infantil assegura a elas o direito a uma educação de qualidade. A chamada primeira infância, que vai de zero a seis anos in-completos, possui algumas especificidades que exigem um atendimento educacional com características próprias. É por considerar que a criança pequena é diferente da criança com mais de cinco anos de idade que as diretrizes curriculares e pedagógi-cas para a organização do atendimento educacional nessa faixa etária pressupõem finalidades, estratégias, recursos didáticos, materiais, espaços físicos, equipamen-tos e práticas diferentes e específicas para esse público. A forma como a criança de

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zero a cinco anos se relaciona com o mundo requer espaços adequados nos quais ela possa brincar, descansar, experimentar e realizar atividades ora estruturadas, ora espontâneas e livres. Classes menos numerosas, organização do tempo e dos espaços que possibilite um equilíbrio adequado entre situações de aprendizagem com níveis variados de concentração e dispersão, maior oferta de atividades que envolvam o uso do corpo e de movimentos amplos são alguns exemplos que concretizam uma prática pedagógica apropriada às crianças nessa faixa etária. A Educação Infantil é a etapa de ensino que melhor pode educar essas crianças e cuidar delas, promovendo e ampli-ando a formação.

Há anos lutamos para que os poderes públicos reconheçam que as crianças são seres capazes, inteligentes, fortes e competentes e que possuem direito de aprender e de se desenvolverem em instituições educativas formais. Entretanto, esse direito de aprender e de se desenvolver só será efetivamente assegurado se a organização dos sistemas e as práticas pedagógicas respeitarem suas especificidades, isto é, a maneira como esses sujeitos se relacionam com o mundo, a forma com a qual dele se apro-priam e o tempo necessário para tudo isso.

Antecipar a entrada no Ensino Fundamental para a idade de cinco anos é uma forma de desrespeitar o direito de ser criança e de viver a infância como tempo de for-mação humana. Nossa luta é por uma educação no tempo justo e de qualidade! E, uma educação de qualidade no tempo justo deve garantir o direito da criança de viver sua infância, deve assegurar a ela tudo aquilo que este direito implica: o direito de brin-car; de aprender ludicamente; de conviver em espaços que lhe garantam liberdade, autonomia, enfim deve promover práticas educativas capazes de respeitar o ritmo, a condição de aprendizagem, os desejos e o direito de ampliar as experiências dessas crianças como ser humano.

f. TEXTO PARA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO: PRODUÇÃO NEPEI E FMEI

A CRIANÇA MENOR DE SEIS ANOS E SEU DIREITO À EDUCAÇÃO:CONTRIBUIÇÕES PARA O DEBATE SOBRE DATA LIMITE PARA MATRÍCU-LA NO ENSINO FUNDAMENTAL

No contexto dos questionamentos aos dispositivos ordenadores do corte etário para entrada no Ensino Fundamental, apresentamos à Associação Nacional do Ministério Público os posicionamentos defendidos pelo Fórum Mineiro de Edu-cação Infantil, espaço suprapartidário articulado por diversas instituições, órgãos e entidades comprometidas com a expansão e melhoria da Educação Infantil em Minas Gerais. Esperamos contribuir para a compreensão da importância dessa definição para o atendimento escolar e para as decisões necessárias à gestão educacional, no âmbito da política. Afirmamos ainda que nossas posições estão ancoradas na compreensão da melhor escola para a infância.

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Desde a ampliação do Ensino Fundamental de oito para nove anos, conforme a Lei nº 11.274/2006, a definição da idade para entrada nessa etapa da Educação Básica se tornou um tema relevante para a sociedade brasileira. A ausência de um dispositivo legal que determinasse quem era a criança de seis anos que deveria ingressar no En-sino Fundamental e até que idade a criança deveria permanecer na Educação infantil gerou uma série de transtornos para as famílias, os sistemas e as instituições de ensino. Desde então, convivemos com definições diferenciadas, assumidas pelos sistemas de ensino brasileiros que vêm estabelecendo datas diversas para o corte etário. Entre-tanto, relembremos que o Conselho Nacional de Educação definiu data-limite por meio das Resoluções CNE/CEB Nº 5, de 17 dezembro de 2009, Nº 1, de 14 de janeiro de 2010 e Nº 6, de 20 de outubro de 2010, ou seja, estabelecendo que a matrícula no Ensino Fundamental deveria ser assegurada à criança que completasse seis anos até o dia 31 de março daquele ano escolar. Essa definição, reiterada em diversos pareceres do Conselho Nacional de Educação, além das Resoluções citadas, não foi suficiente para aplacar as dúvidas e anseios de uma parcela da população que entendia como direito, a antecipação da entrada das crianças de cinco anos no Ensino Fundamental.

Antes de qualquer outro esclarecimento, é preciso que se diga que o direito à Educação da criança menor de seis anos foi assegurado pela legislação atual, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. É preciso também que se diga que a ampliação da escolarização obrigatória, conforme previsto na Emenda 59/2009 e reforçada pela Lei 12796 de abril de 2013, determina o atendimento educacional com-pulsório a partir de quatro anos, que passa a ser estabelecido como direito público subjetivo. Essa alteração certamente irá repercutir num maior compromisso dos po-deres públicos com a garantia de vagas, bem como numa maior responsabilização das famílias pela matrícula das crianças. Assim, as crianças menores de seis anos e a partir dos quatro anos de idade possuem as mesmas condições de acesso à Educação do que as crianças com seis anos ou mais. A definição de uma data de corte para início do Ensino Fundamental não restringe, portanto, esse direit0. Por reconhecer as especificidades de uma escola para a primeira infância, indica isso sim, em que etapa da Educação Básica essa criança terá seu direito melhor assegurado.

Reafirmamos, pois, que uma educação de qualidade nessa etapa da vida é a que assegure à criança o direito de viver a infância com tudo aquilo que este direito implica: o direito de brincar, de aprender ludicamente, de conviver em espaços com liberdade, com autonomia, enfim, por meio de práticas educativas respeitosas dos rit-mos, das condições de aprendizagem, dos desejos e dos direitos das crianças a ampli-ar, pela formação, suas experiências humanas e culturais. Nessa direção, a função do Estado, complementar à função da família, se consolida na mediada em que a escola assegure à infância brasileira a escolarização capaz de articular vivências familiares e comunitárias com práticas intencionalmente construídas e adequadas à etapa da vida, como aclamado nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, postas pela Resolução CNE/CEB nº5/2009. Não se trata de uma escola exclusiva ou priori-tariamente voltada à aquisição da leitura, da escrita, da matemática e nem estritamente

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preparatória para a escola fundamental. Crianças que experimentem suficientemente bem o convívio e as trocas com seus pares e com profissionais devidamente capacita-dos, com quem convivam e com os quais tenham oportunidades de acesso às múltiplas linguagens – gestual, oral, artísticas, escrita -, passarão por percursos escolares satis-fatórios, próprios à sua idade.

Além da entrada precoce e antecipada a um modelo educacional que desrespeita os ritmos e as condições de aprendizagem das crianças, o ingresso antecipado por meio de avaliações e aferições de capacidades intelectuais, como vêm determinando alguns juízes, fere, gravemente, o preceito legal estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases Nacionais – LDB- no seu artigo 31 e confirmado nas alterações da LDB conforme a Lei 12.796/2013, que determinam que a avaliação na Educação Infantil não pode ter caráter de promoção. Os processos de avaliação nessa etapa escolar visam documentar percur-sos e reorientar modelos de atendimento buscando assegurar a qualidade da oferta, ao invés de medir competências e promover ou reter crianças em faixas escolares.

A defesa do direito à Educação deveria arregimentar esforços da sociedade civil e dos poderes públicos no sentido de coibir avaliações de prontidão, de aptidão e outras para ingresso na escola infantil. Os chamados vestibulinhos e avaliações similares deveriam ser objeto de denúncia, de apuração e de punição daqueles que os praticam por impedirem iguais condições de ingresso e oportunidades escolares às crianças brasileiras nas primeiras etapas da Educação Básica. Conforme observamos ocorrer em diversos sistemas de ensino e como consequência da pouca eficiência e rigor dos entes governamentais para esclarecer a população a respeito do assunto, ao se con-dicionar a entrada da criança de cinco anos no Ensino Fundamental a uma avaliação psicopedagógica, ferimos o princípio legal que proíbe a realização de avaliação clas-sificatória nessa etapa da Educação Básica.

Há ainda que se mencionar os impactos que a falta de definição de uma data de corte causam na organização dos sistemas de ensino e na planificação pública da oferta escolar. Os dados obtidos no Cadastro Escolar – nascimento/idade, residência, escolari-dade; a análise de fluxo das crianças de cada série/ciclo para a seguinte; a capacidade física das escolas - localidade/bairro, região, cidade, estado, país; as previsões de expan-são e/ou reorganização conforme demandas e oferta de vagas; todos esses são aspectos que impactam sobre as diretrizes orçamentárias e os planos plurianuais de governo, sobretudo o dimensionamento da execução orçamentária pelos respectivos órgãos. Os posicionamentos dispersos dos entes públicos quanto ao corte etário, sobrepostos às condições para que se planeje e se organize o atendimento escolar comprometem as condições de garantia de tratamento mais eficiente, eficaz e efetivo ao conjunto dos elementos necessários à capacidade da gestão pública de assegurar a oferta do serviço educacional. Agreguem-se as dificuldades próprias à gestão e ao controle social do fun-do de financiamento, o FUNDEB, conforme o Decreto-lei 6.253/2007, ordenado com base no número de matrículas em cada etapa do ensino. A delimitação dos grupos de crianças que irão compor esses conjuntos ordenadores do fluxo garante a capacidade governamental de assegurar a todo cidadão o direito à escola.

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Finalmente, ainda que se admita certa imprecisão ou certo grau de arbitrariedade na definição de qual data deva servir de referência para o corte etário, esperamos que tal imprecisão ou arbitrariedade incidam positivamente e em direção aos direitos edu-cacionais das crianças. O apelo à compreensão do que seja uma escola para a infância é um apelo ao direito das crianças ao tempo da infância, cabendo conclamar o dever do Estado de complementar a função da família na garantia das condições para viver esse tempo de forma mais saudável possível, reconhecido no âmbito das políticas e efetivamente nos ambientes escolares próprios à sua etapa da vida.

A judicialização do tema, fruto do expressivo número de liminares e mandados ju-diciais que vêm sendo expedidos para responder às demandas de certos segmentos so-ciais médios da população, orienta nossa disposição para o diálogo com o Judiciário. Na conjuntura da universalização do acesso ao direito à Educação Infantil, e para enfrentar a dívida social histórica para com a população do País, de fato, o que parece ficar de fora da discussão são as necessidades das crianças de desenvolvimento inte-gral, físico, emocional, cognitivo, social. Considerando, pois, a Educação da criança a partir dos quatro anos como direito público subjetivo, esperamos dos operadores do direito o posicionamento a favor da eficiência e do rigor compatíveis com a justiça e a equidade, contribuindo com a reflexão sobre a responsabilidade parental e o papel dos adultos frente aos destinos das crianças. Nessa direção, entendemos ir além das argu-mentações particularizantes e em direção ao interesse social, atuando pela garantia da escola para a pequena infância brasileira em acordo com os princípios constitucionais do direto de todos e com qualidade, como aclamado nos incisos I e VII do artigo 206 da Constituição Federal.

Esperamos, com este posicionamento, contribuir para as discussões e de-liberações do Ministério Público e para o reconhecimento da necessidade de uma data única de corte etário que oriente as ações nos estados, municípios e respectivos sistemas de ensino do País sob pena de infringir o direito de nossas crianças de se educarem e de se formarem em instituições capazes de respeitar seus ritmos próprios, seus interesses, desejos, capacidades e competências, mas, sobretudo, o seu direito de viver incondicionalmente a primeira infância.

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7. POSICIONAMENTO DE OUTRAS INSTITUIÇÕES

a. FÓRUM GAÚCHO DE EDUCAÇÃO INFANTIL

Sobre o direito à Educação Infantil para as crianças de 5 anosRecentemente, a mídia divulgou a decisão da 2ª Vara da Justiça Federal de

Pernambuco que, se estendida a todo o país, garantiria o acesso ao primeiro ano do ensino fundamental para crianças de 5 anos de idade. Esta determinação suspenderia os efeitos das resoluções do Conselho Nacional de Educação que autorizam esta matrícula apenas a crianças com 6 anos completos até 31 de Março do ano de ingresso no ensino fundamental. Mas esta não é uma questão restrita à data de aniversário estabelecida como “ponte de corte”. Trata-se de um debate que exige reflexão sobre quais concepções nossa sociedade tem de criança, de infância e de educação infantil, primeira etapa da educação básica regulamentada pela atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e que tem Diretrizes Curriculares Nacionais próprias. A Resolução CEB/CNE 05/2009 determina que o eixo da organização curricular na educação infantil devem ser as interações e a brincadeira, experiências adequadas às necessidades e poten-cialidades das crianças de até 6 anos, em período único de suas vidas. Esta etapa não deve ser tratada como um momento preparatório para o exercício de uma futura cidadania: o Brasil tem orientações legais que normatizam o acesso a esse direito constitucional em espaços coletivos de educação, devidamente equipa-dos e organizados para tal, de acordo com as normas previstas pelos respectivos sistemas educacionais. Circularam na imprensa posicionamentos no sentido de que as escolas passem a avaliar as crianças, decidindo quais delas poderiam in-gressar antes dos 6 anos no primeiro ano, prática que seria um retrocesso ao ex-tinto Teste ABC, punindo as crianças classificadas como “não aptas” por algo de que elas não têm culpa. Nossa legislação educacional, amparada em pesquisas e práticas junto às crianças brasileiras, determina que a avaliação na educação in-fantil não tenha caráter classificatório ou eliminatório para o ingresso no ensino fundamental. A Emenda Constitucional nº 59/09 já tornou obrigatória a matrícu-la na pré-escola para todas as crianças de 4 e 5 anos, com acesso universal até 2016. A sociedade precisa conhecer e reivindicar este direito. Se quisermos que as crianças pequenas tenham direito à educação, que seja a partir da ampliação de vagas na educação infantil, em creches e pré-escolas, garantindo, de fato, o direito de cada criança a viver a sua infância.

Maria Luiza Rodrigues FloresProfessora Adjunta do Departamento de Estudos Especializados daFaculdade de Educação - Universidade Federal do Rio Grande do SulCoordenação Colegiada do Fórum Gaúcho de Educação InfantilComitê Diretivo do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil

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b. CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO

POSICIONAMENTO PÚBLICO:“O direito à educação das crianças é o seu direito à infância”

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação é uma rede social que articula mais de 200 entidades de todo o Brasil, incluindo movimentos sociais, organizações não-governamentais, sindicatos, gestores, conselheiros educacionais, universidades, grupos estudantis, juvenis e comunitários, além de indivíduos que acreditam que um país cidadão somente se faz por meio do acesso a uma educação pública de qualidade.

O principal exemplo da atuação da Campanha no Congresso Nacional foi o movi-mento “Fundeb pra Valer!” durante o processo de elaboração e tramitação da Emenda Constitucional no 53/2006, que criou o Fundeb, e da Lei 11.494/2007, que o regu-lamentou. No parlamento, a rede participou ativamente também do debate sobre a extinção da Desvinculação de Receitas da União (DRU), promulgada por meio da Emenda Constitucional no 59/2009.

Em todos seus posicionamentos, a Campanha defende o conceito de educação como direito humano e social que o poder público deve cumprir, garantindo espaços e currículos condizentes com a etapa de desenvolvimento das crianças, dos jovens e adultos. Seguindo tais propósitos, ofertar educação infantil de qualidade significa respeitar e proteger os direitos das crianças à brincadeira, ao cuidado, ao respeito à diversidade, ao acesso à cultura, dentre outros direitos inalienáveis.

A recente controvérsia sobre o corte etário de ingresso no primeiro ano do en-sino fundamental, com decisões de inúmeros formatos de data, reforça a importante decisão da Conferência Nacional de Educação (CONAE) de construir urgentemente o Sistema Nacional de Educação, de forma a regulamentar o regime de colaboração entre os entes federados.

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 6755/2010, de autoria do Senador Flávio Arns (PSDB-PR), que torna obrigatório o ingresso de crianças com cinco anos no ensino fundamental. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação se posiciona contrária a sua aprovação pelos motivos enumerados abaixo:

1. O espaço e o tempo adequados para a criança de 5 anos viver experiências educacionais significativas é a educação infantil. Para todos aqueles que lu-tam pelo direito ao pleno desenvolvimento de nossas crianças, o fundamental é garantir o direito de ser criança e tudo o que este direito implica, inclusive a aprendizagem de acordo com as características da idade.2. Não considera o acúmulo obtido por meio dos debates realizados pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) para construir a Resolução da Câ-mara de Educação Básica (CEB) no 5/2009 que determina que até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, a criança deve completar quatro ou cinco anos para ingressar ou cursar a pré-escola.

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3. Desconsidera também e especialmente, a Resolução da CEB/CNE no 1/2010 que estabelece que, até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, a criança deve completar seis anos para ingressar no primeiro ano do ensino fundamental.4. Antecipar o ingresso da criança no ensino fundamental é colocar em risco a infância. Nesse período devem ser proporcionadas as brincadeiras, ativi-dades lúdicas e o aprendizado de acordo com as características da idade. Esse processo é fundamental para o pleno desenvolvimento da criança, para sua adaptação à escola e para sua alfabetização. A antecipação de um ano para o início do ensino fundamental poderia repercutir negativamente em sua vida escolar.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação confia que o Congresso Nacional, espaço que deve expressar com responsabilidade a vontade democrática do povo bra-sileiro, reforçará o direito de nossas crianças de cinco anos ao acesso à educação infantil de qualidade.

Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à EducaçãoAção EducativaActionAid do BrasilCentro de Defesa da Criança e do Adolescente – Cedeca/CECentro de Cultura Luiz FreireCNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em EducaçãoFundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do AdolescenteMieib – Movimento Interfóruns de Educação Infantil do BrasilMST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem TerraUncme – União Nacional dos Conselhos Municipais de EducaçãoUndime – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação

c. ANPEd

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPEd considerando o amplo debate por ocasião da elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Resolução CNE/CEB Nº 5, DE 17 DE DEZEM-BRO DE 2009) envolvendo seus pesquisadores, manifesta-se contrariamente ao PLS 414/2008/ PL 06755/2010 e conclama toda a sociedade a lutar contra a sua aprovação pelas seguintes razões:

1. Pesquisas e experiências nacionais e internacionais têm demonstrado a im-portância da educação infantil para a socialização e a aprendizagem das crianças de 0 a 5 anos de idade, adotando-se para isso processos pedagógicos próprios e adequados às necessidades e demandas das crianças pequenas, investindo-se na formação es-pecífica dos profissionais;

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2. As recentes Diretrizes Curriculares de Educação Infantil, elaboradas a partir de amplo processo de consulta na área educacional e em resposta às mudanças cons-titucionais que ampliaram a obrigatoriedade escolar para pessoas de 4 a 17 anos, buscaram assegurar o entendimento de que a educação infantil inclui crianças de 0 a 5 anos e 11 meses, de modo que somente aos 6 anos completos inicia-se o ensino fun-damental (Art.5º - § 2 e § 3 - Resolução CNE/CB nº 5, de 17 de dezembro de 2009);

3. Segundo essas Diretrizes Curriculares, e outros documentos oficiais orienta-dores e normativos produzidos nos últimos anos no âmbito do Ministério da Edu -cação, a garantia de uma educação infantil brasileira de qualidade significa respeitar e proteger os direitos das crianças à brincadeira, ao cuidado, ao respeito à diversi -dade, ao acesso à cultura (entre outros). Para tanto, os espaços e tempos da educação infantil devem assegurar “a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo indissociável ao processo educativo” e “a indivisibilidade das dimensões expressivo-motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética, estética e sociocultural da criança” (DNCEI, Art. 8º, § 1º, I e II);

3. o desenvolvimento integral das crianças (LDB 9394/96, Art. 29), finalidade da educação infantil, deve ser promovido em contextos educacionais específicos a partir de propostas e práticas pedagógicas adequadas, elaboradas por profissionais qualifi-cados, visando a que as crianças construam suas identidades pessoais e coletivas, brin-quem, imaginem, fantasiem, desejem, aprendam, observem, experimentem, narrem, questionem e construam sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (DCNEI, Art.4º), ou seja, respeitando processos de desenvolvimento e aprendizagem;

4. Pesquisas nacionais em andamento e reportagens veiculadas pela mídia im-pressa têm evidenciado reiteradamente a lentidão e as enormes dificuldades na imple-mentação do ensino fundamental de nove anos, iniciando-se para as crianças de 6 anos de idade, em atendimento à EC n. 53/06 e à Lei 11.274/2006, dificuldades advindas da cultura escolar cada vez mais produtivista, do despreparo dos professores e das es-colas de ensino fundamental, da ausência de condições materiais e pedagógicas, para a acolher a criança nessa idade nas suas necessidades e direitos;

4. O Projeto de Lei do senador Flávio Arns - PLS 414/2008/ PL 06755/2010, além de desconsiderar a realidade acima referida, que poderá ser imensamente agravada com a entrada de crianças ainda mais novas na escola regular de ensino fundamental, diminui em um ano a possibilidade da criança pequena viver experiências educacio-nais significativas na educação infantil, e não prevê o aumento da duração do ensino fundamental para 10 anos, o que torna mais perniciosa a sua aprovação, atentando contra o direito à educação consagrado na CF 1988.

Assim, compreendendo que o Projeto de Lei do senador Flávio Arns - PL 414/2008/ PL 06755/2010 – desconsidera a especificidade da educação infantil concebida como a primeira etapa da educação básica e desrespeita tanto os direitos das crianças de 5 anos de idade quanto os avanços obtidos no campo da pedagogia da infância, nos manifestamos CONTRA a sua aprovação.

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d. CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE BELO HORIZONTE

Manifesto do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte – CME/BH Pela matrícula das crianças de 5 anos na Educação Infantil!Elaborado pela Câmara Técnica de Educação Infantil e aprovado em Sessão

Plenária Ordinária de 21 de março de 2013O Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte – CME/BH, no uso de suas

atribuições e considerando:1. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CF, que em seu art.

208 diz expressamente:“O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:I – educação básica, obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos

de idade, assegurada inclusive sua oferta para todos que a ela não tiveram acesso na idade própria;”

2. A LEI Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional – LDBEN) que “estabelece as diretrizes e bases da educação nacional”, e que define: o direitos e deveres atrelados a critérios objetivos de idade; a

3. finalidade da educação infantil e como deve ser a avaliação nesta etapa de ensino:“art. 4º - O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado medi-

ante a garantia de atendimento gratuito em creches e pré escolas às crianças de zero a seis anos de idade”;

… “art. 29 - A Educação Infantil, primeira etapa da Educação básica tem como finalidade

o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,psicológico, intelectual e social, complementado a ação da família e da comunidade.”

...“art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e

registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.”

4. As Resoluções do Conselho Nacional de Educação - CNE/CEB nº 01/10 e 06/10 que definem respectivamente “Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos” e “Diretrizes Operacionais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil;

5. A Resolução CNE/CEB nº 5, de 17 de dezembro de 2009, que “Fixa as DiretrizesCurriculares Nacionais para a Educação Infantil, que determina em seu art. 5º, § 2°

que “é obrigatória a matrícula na Educação Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula”;

6. A Resolução CME/BH nº 01/2010 que “estabelece diretrizes complementares para a organização do atendimento às crianças nas Instituições de Educação Infantil, do Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte -SME/BH”;

Vem a público manifestar seu repúdio à liminar proferida pela 3º Vara da Justiça Fede-ral em outubro de 2012 que autoriza a matrícula das crianças que completarem 6 anos

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entre janeiro e dezembro de 2013, no Ensino Fundamental, uma vez comprovada sua capacidade intelectual mediante avaliação psicopedagógica por cada entidade de ensino.

A polêmica sobre o recorte etário para ingresso no Ensino Fundamental ou na Educação Infantil iniciou-se logo após a aprovação da Lei Federal 11.114, de 16 de maio de 2005, que ampliou o Ensino Fundamental para nove anos de duração. Essa lei, bem como a que a ela se seguiu (11.274 de 06 de fevereiro de 2006), foram omis-sas quanto a definição do recorte etário que estabelece quem seria, para os sistemas de ensino, a criança de seis anos de idade. Essa lacuna na legislação repercutiu nos estados e municípios brasileiros.

Em Minas Gerais, a Resolução Conjunta SEE/MG – SMED/BH nº 01, de 15 de julho de 2012, que estabelece normas para a realização do Cadastro Escolar para o ensino fundamental e matrícula na rede pública de ensino de Belo Horizonte e dá outras providências, determinou que toda criança que completasse 6 (seis) anos de idade até 31 de março de 2013, deveria ser matriculada no ensino fundamental, em conformidade com o que estabelece as diretrizes do Conselho Nacional de Educação, regulamentadas pelas Resoluções CNE/CEB, nº 01/10 e 06/10.

Neste período alguns pais recorreram ao poder judiciário pleiteando a reavaliação dos critérios de classificação dos alunos do ensino fundamental, de forma a garantir, também, o acesso de crianças com seis anos incompletos. Em 26 de outubro de 2012 uma liminar suspendeu em Minas Gerais os efeitos das Resoluções CNE/CEB nº 01, de 14 de janeiro de 2010 e nº 6 de 20 de outubro de 2010 e dos demais atos posteriores que reproduzem o mesmo comando. Em consequência foi autorizada e garantida a matrícula na primeira série do ensino fundamental das crianças que vierem a com-pletar seis anos de idade no decorrer de 2013, uma vez comprovada sua capacidade intelectual mediante avaliação psicopedagógica por cada entidade de ensino”

A definição de uma idade para a entrada no Ensino Fundamental, não é conside-rada por este Conselho, como um ato ilegal ou mesmo que venha ferir a Constituição, uma vez que esta estabelece em seu art. 208 “idade própria para acesso à educação básica”. Ter uma data para corte etário com abrangência nacional é condição funda-mental para a organização dos sistemas de ensino. Tal como ocorre em diferentes áreas da legislação, essa definição, em âmbito nacional, garante a homogeneidade entre os sistemas de ensino, determinando com clareza e precisão a idade com que as crianças iniciarão o primeiro ano do ensino fundamental.

Consequentemente, impacta na organização da etapa subsequente, determinando a idade de conclusão do Ensino Médio, cuja duração prevista é de três anos, ou seja, aos 17 anos de idade, conforme determina a Constituição Federal.

Ainda que a desorganização dos sistemas seja uma consequência bastante nega-tiva, o principal dano causado por essa medida é a sua influência inoportuna para a concepção de educação da primeira infância.

Ao condicionar a entrada da criança no ensino fundamental a uma avaliação psico-pedagógica, essa determinação jurídica não apenas fere o princípio legal que proíbe a realização de avaliação classificatória nessa etapa da educação básica, como impõe

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à educação infantil um currículo a ser seguido. Tal currículo estaria visivelmente em oposição ao que tem sido normatizado até então em âmbito nacional, por meio das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e demais documentos ofi-ciais. Os princípios defendidos nesses documentos concebem a educação da pequena infância como um compromisso com a educação integral da criança e não unicamente comprometida com o desenvolvimento de aspectos cognitivos.

Muitos são os estudos científicos que tratam da importância de se compreender as especificidades do desenvolvimento na primeira infância. Esses estudos veem, ao longo do tempo, estabelecendo parâmetros para a oferta de um atendimento educa-cional que garanta o “desenvolvimento integral da criança até seis

anos de idade em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social (art. 29 da Lei 9394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Esse atendimento vem sendo normatizado, há mais de duas décadas, por diferentes resoluções e pareceres, tanto do Conselho Nacional de Educação quanto por este Conselho Municipal de Edu-cação de Belo Horizonte, que resultaram de debates e consensos entre especialistas, usuários e sociedade civil. Os parâmetros estabelecidos nessas normatizações cor-roboram para assegurar um atendimento educacional capaz de respeitar as especifici-dades da primeira infância, de forma a garantir espaços adequados nos quais a criança possa brincar, descansar, realizar atividades ora estruturadas, ora livres; vivenciar experiências corporais, afetivas, sociais e expressar-se por meio de diferentes lingua-gens. A educação infantil é, pois, a etapa educativa que melhor possibilita às crianças vivenciar um processo por meio do qual ela possa ir construindo sentidos pessoais e significados coletivos, na medida que vai se apropriando, de modo singular, das for-mas culturais de agir, sentir e pensar.

Cabe, ainda, expressar nosso mais profundo repúdio a um processo que podería-mos denominar de “judicialização de questões pedagógicas”. Essa tendência de se determinar por meio de atos legais temas que devem ser debatidos e problematizados em espaços que guardem as especificidades pedagógicas desconsidera importantes avanços teóricos e conquistas da área educacional, que veem lutando há anos pelo reconhecimento da infância como período no qual a criança deve ser protegida, in-clusive das pressões equivocadas impostas pela lógica apressada e competitiva do mundo adulto.

Finalmente, ressaltamos que o CME/BH pauta suas ações e discussões no sentido de buscar assegurar o direito da criança pequena de viver a infância como tempo pleno de formação humana.

Belo Horizonte, 21 de março de 2013.

Stelita Alves GonzagaPresidente do Conselho Municipal de Educação

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e. RESPOSTA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

São Paulo, 07 de maio de 2009.

Ilustríssima Sra Dora Martin StrilicherkDD. Promotora de Justiça de Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos da Infân-

cia e Juventude da Capítal

Em resposta às solicitações do Of. Nº 1237/09 (Complementação do Of. Nº1164/09) e diante da gravidade das questões formuladas por V. Sa. , o corpo docente respon-sável pela área de educação infantil da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo faz as seguintes ponderações: a legislação vigente traz as respostas às indagações formuladas no referido ofício.

As crianças de 0 a 6 anos e as referências legais Na esfera internacional, desde os anos 70, discutia-se a necessidade de formular

um documento que, ultrapassando as dimensões da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA, promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1959, comprometesse os países com a reformulação dos instrumentos de proteção à infância e com a garantia de direitos mais compatíveis com suas necessi -dades e com as concepções de infância emergentes. No final de 1989, foi criada a Convenção dos Direitos da Criança, ratificada pela maioria dos governos do mundo e, no Brasil, promulgada pelo Decreto 99.710, de novembro de 1990.

Do ponto de vista nacional, a CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA, de 1988, e o ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA), de julho de 1990, em consonância com esse movimento internacional, asseguraram à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à edu -cação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Art. 227 da Constituição; Art. 4° e Art. 5° do ECA).

A CONSTITUIÇÃO FEDERAL incluiu, pela primeira vez, o direito da criança pequena ao atendimento em creches e pré-escolas, estendido a toda faixa etária de 0 a 6 anos, o que é considerado um marco na história da educação infantil brasileira. Pela primeira vez na história desse nível de escolaridade, a criança pequena foi con -siderada um cidadão de direitos.

Nesta condição, tem, entre outros, o direito de ser atendida em creches e pré-escolas. O direito da criança pequena ao acesso à educação está incluído nos Arts. 205

e 208 da seção Da Educação. No primeiro, o direito à educação foi estendido às cri -anças com idade entre 0 e 6 anos por inclusão, uma vez que a Carta afirma ser a edu -cação direito de todos. O segundo reafirma o dever do Estado para com a educação dessas crianças e considera creches e pré-escolas instituições equivalentes:

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O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de [...] atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade” (BRASIL, 1988).

A concepção de criança como sujeito pleno de direitos é confirmada, de forma direta ou indireta, em outras partes da Constituição:

o Art. 7°, incisos XVIII, XIX e XXV, do capítulo Dos Direitos Sociais reconhece como direitos do trabalhador a licença-gestação de 120 dias, a licença paternidade e a assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas;

o Art. 203 da seção Da Assistência Social define, entre os objetivos da assistência social, nos incisos I e II, a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, bem como o amparo às crianças e aos adolescentes carentes, independe-ntemente de contribuição à seguridade social;

o parágrafo 4° do Art. 212 da seção Da Educação define que os programas assisten-ciais inseridos no sistema educacional, programas suplementares de alimentação e assistência à saúde, por exemplo, podem ser estendidos a creches e pré-escolas.

O ECA reproduz, em seu Art. 4°, o que dispõe o Art. 227 da atual Constituição, confirmando que aos direitos da criança deve ser dada absoluta prioridade, ou seja, eles devem ter preferência na formulação e na execução das políticas sociais e na destinação de recursos públicos. O Inciso IV do Art. 54 reforça o dispositivo cons -titucional (Art. 208) que afirma o dever do Estado para com a educação das crianças de 0 a 6 anos, as quais devem ser atendidas em creches e pré-escolas. Acrescenta, no Capítulo VIII, da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos, Art. 208,que: “Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular ”: (...) “III - de atendimento em creche epré-escola às crianças de zero a seis anos de idade”.

Entre 1994 e 1996, a Coordenação Geral de Educação Infantil (COEDI), da Secre-taria de Ensino Fundamental (SEF), do Ministério da Educação e do Desporto (MEC) publicou a Política Nacional de Educação Infantil, um conjunto de documentos que buscava a superação da dicotomia educação/assistência, explicitando objetivos, di-retrizes e linhas de ação prioritárias para o segmento, para a garantia do direito da pequena infância a uma educação de qualidade. Seus princípios norteadores:

1. A Educação Infantil é a primeira etapa da Educação Básica e destina-se à crian-ça de zero a seis anos de idade, não sendo obrigatória, mas um direito a que o Estado tem obrigação de atender.

2. As instituições que oferecem Educação Infantil, integrantes dos Sistemas de Ensino, são as creches e as pré-escolas, dividindo-se a clientela entre elas pelo critério exclusivo da faixa etária (zero a três na creche e quatro a seis na pré-escola).

3. A Educação Infantil é oferecida para, em complementação à ação da família, proporcionar condições adequadas de desenvolvimento físico, emocional, cognitivo

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e social da criança e promover a ampliação de suas experiências e conhecimentos, estimulando seu interesse pelo processo de transformação da natureza e pela con-vivência em sociedade.

4. As ações de educação, na creche e na pré-escola, devem ser complementadas pelas de saúde e assistência, realizadas de forma articulada com os setores competentes.

5. O currículo de Educação Infantil deve levar em conta, na sua concepção e ad-ministração, o grau de desenvolvimento da criança, a diversidade social e cultural das populações infantis e os conhecimentos que se pretendem universalizar.

6. Os profissionais de Educação Infantil devem ser formados em cursos de nível médio ou superior, que contemplem conteúdos específicos relativos a essa etapa da educação.

7. As crianças com necessidades especiais devem, sempre que possível, ser atendi-das na rede regular de creches e pré-escolas (BRASIL, 1994, p. 15-16).

Em 1996, foi aprovada a LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL, Lei 9394/96, que apresenta a Educação Infantil como etapa inicial da Educação Básica, anterior ao Ensino Fundamental e ao Médio. Ao lado do direito da criança de 0 a 6 anos a freqüentar creches e pré-escolas, e do dever do Estado em proporcioná-las (Art. 4°, Inciso IV), a LDB afirmou sua não obrigatoriedade, além de explicitar que seria submetida a “ padrões mínimos de qualidade de ensino” que, por sua vez, seriam operacionalizados “ por variedade e quantidade mínimas por aluno, de insumos indispensáveis para o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem” (Art. 4°, Inciso IX). A LDB, em seu Art. 4º, reitera que a educação escolar pública é de responsabilidade do Estado e garante que as crianças de 0 a 6 anos serão atendi-das de forma gratuita em creches e pré-escolas. À educação infantil foi conferida a finalidade de, em complemento à ação da família e da comunidade, promover o “[...] desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectuais e sociais” (BRASIL, 1996, Art. 29). Para tanto, as crianças com até 3 anos de idade devem ser atendidas em creches ou entidades equivalentes e as de 4 a 6 anos em pré-escolas (Art. 30).

Em maio de 1998, a SEF publicou os SUBSÍDIOS PARA CREDENCIAMENTO E FUNCIONAMENTO DE INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL, docu-mento organizado por conselheiros representantes dos Conselhos de Educação de cada estado e do Distrito Federal, por representantes da União Nacional dos Dirigen-tes Municipais de Educação (UNDIME), consultores e especialistas, e coordenado pelos técnicos do MEC, com o objetivo de “apoiar os conselhos de educação na nor-matização da educação infantil nos seus respectivos sistemas de ensino“ (MEC/SEF/COEDI, 1998, p.109). Esse documento contribuiu significativamente para a formu-lação de diretrizes e normas para a Educação Infantil no Brasil.

O Conselho Nacional de Educação, no final de 1998, estabeleceu as DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL (Parecer CEB n° 022/98), a partir de um relatório que analisa o papel da educação da infância e da LDB 9394/96. A relatora Regina de Assis refere a concepção de educação infantil:

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[...] que ela constitua um espaço e um tempo em que, [para as crianças] de 0 a 3 anos haja uma articulação de políticas sociais, que lideradas pela educação, integrem desenvolvimento com vida individual, social e cultural, num ambiente onde as formas de expressão, dentre elas a linguagem verbal e corporal ocupem lugar privilegiado, num contexto de jogos e brinca-deiras, onde as famílias e as equipes das creches convivam intensa e cons-trutivamente, cuidando e educando. E que, para as de 4 aos 6 anos, haja uma progressiva e prazerosa articulação das atividades de comunicação e ludicidade, com o ambiente escolarizado, no qual desenvolvimento, social-zação e constituição de identidades singulares, afirmativas, protagonistas das próprias ações, possam relacionar-se, gradualmente, com ambientes distintos dos da família, na transição para a Educação Fundamental.

Pesquisas indicam que as crianças pequenas são vulneráveis e necessitam de um ambiente educativo com ações integradas com a família e outras áreas para o cuidado e a educação. As DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDU-CAÇÃO INFANTIL especificam essa necessidade:

As próprias crianças pequenas apontam ao Estado, à sociedade civil e às famílias a importância de um investimento integrado entre as áreas de edu-cação, saúde, serviço social, cultura, habitação, lazer e esportes no sentido de atendimento a suas necessidades e potencialidades, enquanto seres humanos. Este é pois o grande desafio que se coloca para a Educação Infantil: que ela constitua um espaço e um tempo em que, de 0 a 3 anos haja uma articulação de políticas sociais, que lideradas pela educação, integrem desenvolvimento com vida individual, social e cultural, num ambiente onde as formas de ex-pressão, dentre elas a linguagem verbal e corporal ocupem lugar privilegiado, num contexto de jogos e brincadeiras, onde famílias e as equipes das creches convivam intensa e construtivamente, cuidando e educando.” Diretrizes Cur-riculares de Educação Infantil (CEB 022/98, p. 07).

Em 2000, integrando o movimento de regulamentação da Educação Infantil no país, foram estabelecidas as Diretrizes Operacionais para a Educação Infantil, que esclarecem a vinculação das instituições de educação infantil aos sistemas de ensino e tratam da proposta pedagógica e Regimento Escolar, da formação de professores e outros profissionais para o trabalho nas instituições de educação infantil e dos espaços físicos e recursos materiais para a educação infantil. O documento aponta que a políti-ca nacional para as crianças de 0 a 6 anos deve ser feita com o apoio e a participação de todos os segmentos da sociedade, envolvendo Ministérios, Secretarias e Conselhos Estaduais e Municipais, Conselhos Tutelares, Juizados das Varas da Infância, asso-ciações e organizações da sociedade civil.

Publicado em 2001, o PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (PNE), Lei 10.172, referenda a educação infantil como nível da Educação Básica. Para a edu-cação infantil, o PNE estabelece um conjunto de 26 objetivos e metas, que, em sín-

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tese, tratam da ampliação da oferta de creches e pré-escolas; elaboração de padrões mínimos de qualidade de infra-estrutura para o funcionamento das instituições; au-torização de funcionamento das instituições; formação de profissionais; garantia de alimentação para as crianças atendidas em estabelecimentos públicos e conve-niados; fornecimento de materiais adequados às faixas etárias; estabelecimento de padrões de qualidade como referência para a supervisão, o controle, a avaliação e o aperfeiçoamento da educação infantil.

A Política Nacional de Educação Infantil, de 2006, vem acompanhada dos docu-mentos PADRÕES DE INFRA-ESTRUTURA E PARÂMETROS DE QUALIDADE PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL. Organizada em diretrizes a política de educação infantil, objetivos, metas e estratégias, recomenda que:

a prática pedagógica considere os saberes produzidos no cotidiano por to-dos os sujeitos envolvidos no processo: crianças, professoras e professores, pais, comunidade e outros profissionais; estados e municípios elaborem ou adequem seus planos de educação em

consonância com a Política Nacional de Educação Infantil; de Educação Infantil ofereçam, no mínimo, 4 horas diárias

de atendimento educacional, ampliando progressivamente para tempo inte-gral, considerando a demanda real e as características da comunidade aten-dida nos seus aspectos socioeconômicos e culturais; as instituições de Educação Infantil assegurem e divulguem iniciativas

inovadoras, que levem ao avanço na produção de conhecimentos teóricos na área da Educação Infantil, sobre a infância e a prática pedagógica; a reflexão coletiva sobre a prática pedagógica, com base nos conhecimen-

tos historicamente produzidos, tanto pelas ciências quanto pela arte e pelos movimentos sociais, norteie as propostas de formação; os profissionais da instituição, as famílias, a comunidade e as crianças

participem da elaboração, da implementação e da avaliação daspolíticas públicas. (p.27)

Mudanças no Ensino Fundamental e Implicações para Educação Infantil

A Resolução Nº 3, de 3 de Agosto de 2005, do Conselho Nacional de Educação - Câmara de Educação Básica, define normas para ampliação do ENSINO FUN-DAMENTAL COM 9 ANOS DE DURAÇÃO (6 a 14 anos) e traz impactos para a educação infantil que se restringe à faixa etária de 0 a 5 anos de idade. As crianças de 6 anos passam a pertencer ao segmento do ensino fundamental, mas permanece a indicação de que as creches destinam-se às crianças de até 3 anos e pré-escola, de 4 e 5 anos. O documento determina que:

Art. 2º A organização do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos e da Educação Infantil adotará a seguinte nomenclatura:

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Etapa de ensino

Educação Infantil Até 5 anos de idade

Até 3 anos de idade

4 e 5 anos de idade

Até 14 anos de idade 9 anos

5 anos

4 anos

De 6 a 10 anos de idade

De 11 a 14 anos de idade

Creche

Pré-Escola

Ensino Fundamental

Anos iniciais anos

Anos finais

Faixa etária prevista Duração

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Novas Orientações do Ministério da Educação na formulação de instrumento de qualidade para auto-avaliação das instituições infantis.

A preocupação atual da política pública com a qualidade da educação infantil re-sultou na produção de um instrumento de auto-avaliação da qualidade das instituições de educação infantil (em fase final de produção gráfica) que se denomina: INDI-CADORES DA QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL – MEC 2009. Entre a diversidade dos indicadores destaca-se a proporção de crianças e adultos em cada agrupamento como item de qualidade e a seguinte recomendação:

6.3 Condições de trabalho adequadas6.3.1. Há no mínimo uma professora para cada agrupamento de:6 a 8 crianças de 0 a 2 anos15 crianças de 3 anos20 crianças de 4 até 6 anos.

Os indicadores reduzem o número de crianças por agrupamento infantil sinalizan-do a necessidade e a relevância de um menor número de crianças para uma educação de melhor qualidade.

Evidencia-se, portanto, que a Portaria nº 4448/08 - SME e a realidade do trabalho nas EMEIs contrariam toda legislação vigente na área inclusive as novas orientações do MEC. Se a recomendação é de 15 crianças de 3 anos para um agrupamento com um adulto, como aceitar a realidade da EMEI de 35 crianças em um agrupamento, com um adulto? Mais do que o dobro recomendado? E o direito da criança e da família a uma educação de qualidade? A Portaria 4448, é contraditória pois clama por medidas administrativas de redução do número de alunos por sala com vistas à melhoria da qualidade de ensino e age no sentido oposto de aumentar a quantidade de crianças de 3 anos em um agrupamento . Acrescente-se que é perversa: o documento aponta uma proporção adulto-criança, na faixa dos 3 anos, de um adulto para 18 crianças, mas em seguida, institui trinta e cinco crianças por sala; ora, se fossem 36, haveria a pos-sibilidade de dois adultos, mas limitando em 35, mantém-se praticamente o dobro de crianças para cada adulto.

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Nesse sentido, retomando às DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS DE EDUCAÇÃO INFANTIL que, coerentes com as postulações atuais dos estudos sobre a infância, indicam que as crianças de 0 a 3 anos necessitam de um ambiente educa-tivo tranqüilo, com ações compartilhadas com a família e outros setores da assistência social, médica, psicológica e jurídica, em que crianças, filhas de trabalhadores possam permanecer em tempo integral. É preciso acrescentar que a necessidade de agrupa-mentos menores é fundamental para essa tarefa. A educação e o cuidado requerem atenção individualizada e mediações do adulto para todas as iniciativas das crianças. Não se pode realizar ações dessa natureza em ambientes massificados que ultrapas-sem, por exemplo, o limite de 15 crianças de 3 anos em um agrupamento. As EMEIs especificam o absurdo de 35 crianças por agrupamento! Sua forma de organização remete para questões de custos, de barateamento do sistema e insere-se no âmbito da política econômica e não da educativa.

As crianças de 4 a 5 anos que freqüentam as pré-escolas ou escolas municipais de educação infantil já têm outra especificidade, pois embora permaneça sua ligação com a família inicia-se a transição para o ensino fundamental.

E que, para as dos 4 aos 6 anos, haja uma progressiva e prazerosa articulação ,odaziralocse etneibma o moc ,edadicidul e oãçacinumoc ed sedadivita sad

no qual desenvolvimento, socialização e constituição de identidades singu-lares, afirmativas, protagonistas das próprias ações, possam relacionar-se, gradualmente, com ambientes distintos dos da família, na transição para a Educação Fundamental (DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL, CEB 022/98, p. 07).

Prejuízos decorrentes da transferência de crianças pequenas para as EMEIs

As EMEIs não respondem às funções da educação das crianças pequenas em relação ao atendimento das necessidades de trabalho dos pais e das mães por funciona-rem em turno parcial; além disso, a educação oferecida na EMEI não é compatível com a educação de crianças pequenas de 0 a 3 anos, ou seja, sua estrutura é inade-quada até para as crianças de 4 e 5 anos, pois:

A EMEI não dispõe de estrutura e funcionamento para a educação e ocuidado da criança pequena. Não há espaço para o descanso e a tranquili-dade que a educação dessas crianças requer: agrupamentos menores (15 cri-anças para um adulto), mediações do adulto, atendimento individualizado, ambiente adequado para a educação e o cuidado. A EMEI especifica 35 crianças em cada sala, e quando há falta de

professor/a, o que é constante, esse volume aumenta para 44 crianças (em-períodos com 5 turmas; a falta de uma professor/a obriga a redistribuição das crianças; cerca de 9 crianças a mais para as 4 turmas restantes). Não se pode pensar em educação com a quantidade de 35 a 44 crianças para um/a professor/a. Choros, estressse e deseducação predominam nas salas abarro-

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tadas de crianças pequenas. É o retorno das “salas de decepção” dos tempos do início da República em São Paulo. A função da EMEI é de levar a criança a ser educada em “ambientes dis-

tintos dos da família, na transição para a Educação Fundamental”, diverso da integração da educação e do cuidado, o que é característico das crianças bem pequenas de até 3 anos de idade. A organização da EMEI no município de São Paulo é inadequada até para

os de 4 e 5 anos. Sua estrutura de atendimento em massa (35 a 44 crianças) inviabiliza um processo de inserção de qualidade. As normas nacionais e internacionais especificam 20 a 25 crianças para essas idades.

Assim, entende-se que a Portaria 4448/08 fere a legislação vigente e os direitos dos trabalhadores e das crianças pequenas a uma educação de qualidade. Busca ape-nas interesses econômicos ao inchar as EMEIs para dar onta da DEMANDA. Segue na contramão de toda discussão nacional e internacional. Destaque-se que, ao iniciar suas considerações, o documento indica:

- a necessidade de otimizar os recursos físicos disponíveis nas Unidades Educacionais;- as providências administrativas visando a extinção do turno intermediário das EMEFs até 2010:- o compromisso assumido pela administração de reduzir o número de alu-nos por sala de aula com vistas à melhoria de qualidade do ensino;

As medidas para otimizar os recursos físicos devem levar em conta osPARÂMETROS BÁSICOS DE INFRA-ESTRUTURA PARA AS INSTITUI -ÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL, de 2006 e as novas orientações dos INDICA -DORES DE QUALIDADE PARA EDUCAÇÃO INFANTIL, de 2009. No que tange à extinção do turno intermediário pergunta-se a razão de apenas as EMEFs serem mencionadas. E o turno intermediário das EMEIs? Crianças menores são mais vul-neráveis e requerem mais atenção! Não se admite a extinção de turno apenas nas EMEFs. Todas as EMEIs deveriam ter seus turnos intermediários extintos!

Se o compromisso da administração é o de reduzir o número de alunos por sala de aula qual é a razão de aumentar para as crianças de 3 anos que, de 18 passam a ter 35 a 44 nas EMEIs? Ocultam-se no discurso da qualidade da educação e da otimi-zação do espaço físico os valores do capitalismo que colocam em último lugar o ser humano e sua educação.

Por fim, em consonância com o Plano Nacional de Educação, de 2001, e com as diretrizes da Política Nacional de Educação Infantil, de 2005, o documento Parâme -tros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil, publicado pela a Secretaria de Educação Básica/MEC, com o intuito de “estabelecer padrões de referência orienta-dores para o sistema educacional no que se refere à organização e funcionamento das instituições de Educação Infantil” (vol.1, p.8), recupera especificações relevantes já anunciadas em disposições legais como é o caso das Diretrizes Curriculares Nacionais

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para a Educação Infantil, instituídas pela Resolução CNE/CEB no. 1 de 07/04/1999, que têm caráter mandatório para todos os sistemas municipais e/ou estaduais de edu-cação. Nessas disposições reitera-se, por exemplo, a indicação da seguinte proporção adulto/criança: 1 professor para 6 a 8 bebês de 0 a 2 anos; 1 professor para cada 15 crianças de 3 anos e 1 professor para cada 20 crianças de 4 a 6 anos. O documento dos Parâmetros assume essa indicação .(vol. 2, p.36) Observada essa sugestão, fica evidente a necessidade de as políticas públicas do município respeitarem as especifi-cidades de atendimento em creches, instituições dedicada aos bebês e às crianças menores, sem, contudo, como pretende a referida Resolução, deixar de engloba-las como instituições de Educação Infantil juntamente com as pré-escolas, classes e cen-tros de educação infantil. (vol. 1, p. 35)

Ao tratar da organização da proposta pedagógica, dos tempos, espaços e materiais, o documento advoga a flexibilidade das condições de atendimentos com vistas nas especificidades da faixa etária atendida e nas necessidades próprias da criança e de sua família. ( vol.2)

Quanto aos referenciais para a concepção de ambientes educativos para a edu-cação infantil em creches e pré-escolas, o documento Parâmetros Básicos de Infra-Estrutura para Instituições de Educação Infantil, publicado em 2006, acentua a im-portância da ambientação adequada às especificidades postas pela idade das crianças, o que faz pensar na impossibilidade de criação de ambientes que possam dar conta indistintamente dos bebês, das crianças muito pequenas e das crianças maiores (refe -rências podem ser encontradas nas páginas 8, 27, 28, 29, 30). Isso corresponde a dizer que creches e pré-escolas precisam ser pensadas em suas edificações e ambientações de acordo com as particularidades de atendimento.

Pelas razões delineadas manifestamo-nos contrárias às especificações da POR-TARIA 4448/08 - SME.

Atenciosamente,

Tizuko Morchida Kishimoto Maria Letícia Nascimento

Mônica Appezzato Pinazza Patrícia Dias Prado

f. O POSICIONAMENTO DA REDE NACIONAL PRIMEIRA INFÂNCIA – RNPI

Proposta da Rede Nacional Primeira Infância de mudanças no PL 6.755/2010 (PLS 414/2008)

São objeto deste texto os itens relativos à idade de frequência à educação infantil e de ingresso no ensino fundamental. Ele apresenta algumas considerações iniciais, as sugestões de nova redação e sua justificação.

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I – Considerações iniciaisA intenção expressa pelo Senador Flávio Arns ao elaborar o PLS 414/2008 é de

re-estabelecer a coerência entre a idade definida pela Constituição Federal para a edu-cação infantil e a do início do ensino fundamental, definida pela LDB (modificadas pelas leis 11.114/2005 e 11.274/2006) e dar clareza ao texto legal para uniformizar o ingresso no ensino fundamental entre os diversos sistemas de ensino.

O propósito de clarificar o texto da lei merece a maior atenção. Nesse particular item, que os especialistas chamam de “corte etário” para a matrícula, a legislação dá margem a dúvidas e tem sido objeto de diferentes interpretações. Orientações díspares têm sido dadas pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino da União e de Estados ou de Municípios e demandas judiciais foram acatadas em duas Unidades da Fede-ração (Estado do Paraná e do Mato Grosso do Sul), obrigando os sistemas de ensino a matricular as crianças de cinco anos de idade no primeiro ano do ensino fundamental, enquanto nos demais seu início se dá aos seis anos.

É preciso que a legislação seja coerente e clara sobre a idade de ingresso no ensino fundamental para assegurar a necessária harmonia entre os sistemas de ensino, mormente nos casos de transferência dos alunos de um sistema de ensino para outro.

Além disso, o claro ordenamento etário da educação básica deve assegurar a continuidade entre suas três etapas e a especificidade de cada uma delas, tanto no seu fazer pedagógico quanto nos conteúdos de aprendizagem.

É assente que a educação básica carece de um novo instrumento legal para dirimir dúvidas e estabelecer clareza tal que não dê margem a novas demandas judiciais ou continue gerando interpretações conflitantes. A Carta de Florianópolis, firmada pelo MEC, Consed, Undime e Frente Nacional de Prefeitos, no dia 28/4/2010, insta aos parlamentares a elaboração de uma lei com esse propósito.

No entanto, essa iniciativa deve enquadrar-se em parâmetros já estabelecidos em decisões e consensos anteriores. Entre eles:

a) preservar os espaços da educação infantil e do ensino fundamental, com suas respectivas especificidades

b) manter a duração da educação infantil e a do ensino fundamental defini-das, respectivamente, pela Constituição Federal e pela LDB (modificada pelas leis

)7002/494.11 ºn ieL( bednuF o atnemaluger euq ieL alep e )6002/472.11 e 5002/411.11c) manter o início do ensino fundamental aos seis anos de idade, de sorte a que

seja concluído aos quatorze e, dessa forma, o ensino médio aos dezessete. O ensino fundamental tem nove anos de duração (dos seis aos quatorze anos de idade). Ante-cipar mais um ano seu início, suprimindo esse ano da educação infantil, não deve ser a pretensão nem é esse o entendimento dos gestores dos sistemas de ensino e dos es-pecialistas em educação básica. Ampliar mais um ano o ensino fundamental também não está em cogitação. Concluí-lo aos treze anos de idade também não é objeto de debate nem intenção manifesta pelos sistemas de ensino. Assim, o ensino fundamental de nove anos para terminar aos quatorze anos deve começar aos seis.

d) manter a intenção do legislador quando da aprovação da Emenda Constitu-cional nº 53/2006 sobre o término da educação infantil. Diz a Lei 11.494/2007, que regulamenta a EC 53/2006, em seu art. 10 § 4o:

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O direito à educação infantil será assegurado às crianças até o término do ano letivo em que completarem 6 (seis) anos de idade.

Este parágrafo foi introduzido na lei especificamente para regulamentar a nova disposição da EC 53/2006 sobre a duração da educação infantil, no inciso IV do art. 208. Ao regulamentar dessa forma aquele inciso IV, o legislador estampou o sentido que dera àquela expressão, ou seja, a intenção de que a criança estivesse na educação infantil até antes de completar seis anos.

Desnecessário é dizer que a mudança do inciso IV do art. 208 da CF, introduzida por aquela Emenda, foi feita precisamente para adequá-la à antecipação de um ano do início do ensino fundamental (dos sete para os seis), que já estava em curso por força das Leis 11.114/2005 e 11.274/2006.

Em outras palavras, como antes da EC 53/2006 a educação infantil ia até o final do ciclo que antecede o aniversário de sete anos de idade – entendido como seis anos... -, a partir da nova duração e novo início do ensino fundamental, ela vai até o final do ciclo que antecede o aniversário de seis anos – entendido como quinto ano de idade.

II – Sugestões de alteração na redação de dispositivos do PLS 414/2008 (PL 6755/2010), com suas justificações

Algumas alterações ao Projeto decorrem da necessidade de adequá-lo ao texto cons-titucional modificado pela EC 59/2009, que estendeu a obrigatoriedade da escolarização para a faixa etária dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos. O PLS 414 é de 2008, portanto, anterior àquela Emenda Constitucional, razão porque este se prende à obrigatoriedade apenas ao ensino fundamental. Apesar de ter sido aprovado pelas Comissões do Senado (CCJ e CE) em dezembro de 2009, não foi ajustado ao novo texto da Constituição.

As demais alterações têm outras razões, como uma diferente interpretação da expressão “até cinco anos de idade” e da sequência etária entre a pré-escola e o ensino fundamental definida pela Constituição Federal e pelas leis 11.114/2005, 11.274/2006 e 11.494/2007.

1. Art. 1º. O inciso IV do art. 4º da Lei nº 9392, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

PLS 414Art. 4º...... IV – atendimento gratuito em cre-ches e pré-escolas às crianças de zero até cinco anos de idade....................”

Proposta da RNPI“Art. 4º...... IV – atendimento gratuito em cre-ches e pré-escolas às crianças de zero até cinco anos compreendido o período que antecede o início do ensino fundamental, aos seis anos de idade”.

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Justificação:A EC 53/2006 alterou, entre outros dispositivos, o inciso IV do art. 208 da Cons-

tituição Federal precisamente para ajustar a idade da educação infantil às novas disposições legais (lei nº 11.114/2005 e 11.274/2006) sobre o início do ensino fun-damental aos seis anos de idade e com duração de nove anos. A Lei 11.494/2007, que regulamenta a EC 53/2006 é explícita em determinar que a educação infantil prossegue até o dia anterior ao sexto aniversário da criança.

A CF não define a idade de início do ensino fundamental, competindo, portanto, à lei fazê-lo. Assim, a Lei 4.024/1961 fixava o início da educação primária aos sete anos (art. 27) e a educação pré-primária até sete anos; a Lei 5.692, de 1971, determi-nava a idade mínima de sete anos para iniciar o ensino fundamental (art. 19) podendo começar antes dos sete se assim dispusessem as normas de cada sistema de ensino (§ 1º daquele mesmo artigo) e estabelecia a obrigatoriedade desse ensino na faixa etária de 7 a 14 anos (art. 20).

Ao antecipar o início do ensino fundamental para seis anos, o legislador preten-deu dar vigência prática à meta do Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei 10.172/2001, que diz: “Ampliar para nove anos a duração do ensino fundamental obrigatório com início aos seis anos de idade, à medida que for sendo universalizado o atendimento na faixa de 7 a 14 anos”. E ele o fez por meio das Leis nº 11.114/2005 e 11.274/2006, que alteraram os art. 6º, 30, 32 e 87 da LDB, que o PLS 414/2008 pretende alterar novamente.

Ora, se a LDB já foi alterada pelas duas citadas leis de 2005 e 2006 para ampliar o ensino fundamental para nove anos começando aos seis anos de idade e, em função dessa alteração do ensino obrigatório, o legislador alterou o texto constitucional sobre a idade de término da educação infantil, alterar novamente a lei para adequá-la ao texto constitucional seria entrar num círculo vicioso.

Em síntese, o legislador constitucional entendeu que, sendo o ensino fun-damental obrigatório na faixa de seis a quatorze anos e, sendo este o único obrigatório na época da PEC que deu origem à EC 53/2006, a etapa anterior da educação básica – a educação infantil – deveria ter sua duração reduzida em um ano e não em dois.

Caso se antecipe o início do ensino fundamental para cinco anos, e mantendo a duração de nove anos, ter-se-ia, coerentemente, que alterar a idade de término da obrigatoriedade para treze anos. Não parece ser esta a intenção do legislador.

Outro inconveniente de iniciar o ensino fundamental aos cinco anos man-tendo sua duração de nove anos, vem do fato que a criança terminaria o ensino fundamental aos treze anos e, caso prosseguir sem interrupção ao ensino médio, também obrigatório, terminaria este aos dezesseis. Como nessa idade o trabalho é proibido (ECA, trabalho infantil), o adolescente que não lograsse vaga no ensino superior ficaria no ócio. E aí os problemas sociais se avolumariam com milhares de adolescentes sem escola e sem trabalho.

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O Conselho Nacional de Educação, órgão da estrutura educacional brasileira com a competência de estabelecer as diretrizes operacionais para aplicação das leis da educação, expediu o Parecer CNE/CEB nº 22/2009, homologado pelo Ministro da Educação, publicado no D.O.U de 11/1/2010 e a Resolução correspondente, pela qual determinou que “para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, a criança deverá ter 6 (seis) anos de idade completos até o dia 31 de março do ano em que ocor-rer a matrícula” (art. 2º da Resolução)

Essa norma da Câmara de Educação Básica do CNE interpreta o sentido que a lei dá ao início do ensino fundamental aos seis anos de idade.

2. Art. 2º. O art. 6º da Lei 9.394, de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

JustificaçãoA alteração proposta pelo PL 6755 não está coerente com o texto constitu-

cional, que estende a obrigatoriedade da educação básica dos 4 aos 17 anos. A partir da EC 59/2009, a obrigação dos pais e responsáveis não é apenas sobre o ensino fundamental, e sim sobre a educação básica obrigatória dos 4 aos 17 anos.

Particularizar uma faixa de obrigatoriedade é opor-se ao novo dispositivo cons-titucional que pretende construir um processo educativo de 12 anos universali -zado para todas as crianças e adolescentes brasileiros. Com a EC 59, ultrapassa-se a fase do “só o ensino fundamental” como objeto de prioridade, de direito público subjetivo, de obrigação dos pais e dos alunos. Insistir sobre a obrigatoriedade do segmento ensino fundamental é anacrônico e inconstitucional.

Além disso, a emenda proposta pelo PLS 414 (PL 6755) mantém a ex-pressão “menores”, que deveria ser substituída por “filhos e dependentes”, coerentemente com a terminologia adotada pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

PLS 414/2008Art. 6º. É dever dos pais ou respon-sáveis efetuar a matrícula de dos menores, a partir dos cinco anos de idade, no ensino fundamental.

Proposta da RNPIArt. 6º. É dever dos pais ou re-sponsáveis efetuar a matrícula dos filhos e dependentes a partir dos quatro anos de idade completos, na educação infantil e prosseguir re-alizando sua matrícula nas etapas seguintes da educação básica, até o fim da obrigatoriedade escolar.

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3. Art. 4º. O inciso II do art. 30 da Lei nº 9394, de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

JustificaçãoA mesma das sugestões de alteração anteriores.

4. Art. 5º. O caput do art. 32 da Lei nº 9.394, de 1966, passa a vigorar com a seguinte redação:

JustificaçãoPelas razões expostas anteriormente, não há necessidade de alterar a data de início

do ensino fundamental: ele continua com nove anos de duração, terminando aos qua-torze. Para terminar aos quatorze, seu início regular se dá aos seis anos.

A alteração recomendada é suprimir a palavra “obrigatório”, pois a partir da EC 59/2009, a obrigatoriedade já não é estatuto exclusivo do ensino fundamental, mas da educação básica dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos. Continuar usando a expressão “ensino fundamental obrigatório” retira o sentido e a força de uma educação obriga-tória mais ampla.

PLS 414/2008“Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 5 (cinco) anos de idade, terá objetivo a formação bási-ca do cidadão, mediante...”

Proposta da RNPI“Art. 32. O ensino fundamental, com duração de 9 (nove) anos, gra-tuito na escola pública, iniciando-se aos seis anos completos ou a com-pletar até 31 de março no ano da matrícula, terá objetivo a formação básica do cidadão, mediante...”

PLS 414/2008Art. 30 ............II – pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) até 5 (cinco) anos de idade.

Proposta da RNPI Art. 30 ............II – pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) e 5 (cinco) anos.

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5. Art. 6º. O § 3º do art. 58 da Lei nº 9.394, de 1966, passa a vigorar com a seguinte redação:

JustificaçãoNão há necessidade de dizer que tem início na faixa etário de zero a cinco anos,

basta dizer que seu início é na educação infantil, pois esta começa no nascimento da criança, conforme o art. 208, IV, da CF. Caso haja intenção de explicitar que essa educação especial deve começar logo após o nascimento, a expressão “na faixa etária de zero a cinco anos” não atende, pois começando aos quatro, por exemplo, a de-terminação legal estaria sendo atendida, pois começou dentro da faixa. Nesse caso, recomenda-se a acolher a redação proposta na alternativa acima.

6. Art. 7º. O art. 87 da Lei nº 9.394, de 1966, passa a vigorar com a seguinte redação:

PLS 414/2008“Art. 58....§ 3º. A oferta de educação espe-cial, dever constitucional do Es-tado, tem início na faixa etária de zero até 5 (cinco) anos, durante a educação infantil.

Proposta da RNPI “Art. 58.... § 3º. A oferta de educação espe-cial, dever constitucional do Esta-do, tem início na educação infantil. Alternativa: “A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início logo após o nas-cimento da criança”.

PLS 414/2008“Art. 87....§ 2º. O poder público deverá recen-sear os educandos no ensino funda-mental, com especial atenção para o grupo de 5 (cinco) anos a 14 (qua-torze) anos de idade e de 15 (quinze) a 16 (dezesseis) anos de idade.

Proposta da RNPI“Art. 87....§ 2º. O poder público deverá re-censear os educandos na educação básica obrigatória dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos, visando à universalização da matrícula em cumprimento da obrigatoriedade estabelecida pela Constituição Federal”.

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JustificaçãoA redação aqui proposta adéqua o texto da LDB ao da Constituição Federal (art.

2008, I). Não cabe mais fazer recenseamento dos educandos apenas para o ensino fun-damental e o ensino médio. A Emenda Constitucional nº 59/2009 estendeu a obriga-toriedade da educação básica à faixa etária dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos. Sobre toda essa faixa de idade o Estado deve velar com especial zelo para que o dever das crianças e adolescentes à escola seja cumprido. Omitir as crianças de quatro anos do recenseamento escolar, como faz o texto do PLS 414/2008, é desonerar o Estado de um dever constitucional de atender a toda a população que também a ele está obrigado.

Não cabe, igualmente, fazer separação, no recenseamento, entre as idades até 14 (quatorze) anos e 15 (quinze) e 16 (dezesseis), como propõe o texto do PLS 414/2008. Essa distinção cabia na LDB de 1996, porque o ensino médio, até 2009, era “progres-sivamente obrigatório”. A citada Emenda Constitucional acabou com a progressivi-dade da obrigatoriedade ao ensino médio.

7. O inciso I do art. 87 passa a vigorar com a seguinte redação:Sugestão da RNPI: I – matricular no ensino fundamental todas as crianças a

partir de seis anos de idade ou que venham a completar seis anos até 31 de março no ano da matrícula.

As razões são as mesmas expostas acima.

SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI No 6.755, de 2010(Apensos os PL’s nº 1.558, de 2007; nº 2.632, de 2007; nº 4.049, de 2008; nº 4.812,

de 2009; nº 6.300, de 2009; nº 6.843, de 2010; nº 7974, de 2010; nº 2711, de 2011; nº 3.137, de 2012; nº 3.799, de 2012 e nº4.067, de 2012)

Altera a redação dos arts. 4º, 5º, 6º, 30, 32, 58, 59 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispõe sobre o corte etário para o ingresso no ensino fundamental aos seis anos de idade e dá outras providências.

O Congresso Nacional decreta:Art. 1º O inciso IV do art. 4º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a

vigorar com a seguinte redação:“Art. 4º................................................................................. ....................................

.........................................................IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a cinco

anos de idade, compreendido o período que antecede o início do ensino fundamental aos seis anos de idade.”(NR)

Art. 2º O caput e o inciso I do § 1ºdo art. 5º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 5º O acesso à educação básica, dos quatro aos dezessete anos, assegurada a oferta gratuita aos que a ela não tiveram acesso na idade própria, é direito público sub-jetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organi-zação sindical, entidade de classe, entidade estudantil ou outra legalmente constituída, e, ainda, o ministério público, acionar o Poder Público para exigi-lo. (NR)

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§ 1º ......................................................................................I – recensear a população em idade escolar para a educação básica, e os jovens e

adultos que a ela não tiverem acesso; ...................................................................................” (NR)Art. 3º O art. 6º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com

a seguinte redação:“Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos filhos ou depende-

ntes a partir dos quatro anos de idade completos, ou a completar até 30 de junho do ano da matrícula, na educação infantil, bem como nas etapas seguintes da educação básica obrigatória.” (NR)

Art. 4º O art. 23, § 1º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 23...............................................................................§ 1º Os sistemas de ensino estabelecerão regras para que a escola possa reclassifi-

car os alunos, mediante avaliação que defina seu grau de desenvolvimento, inclusive:I – quando se tratar de transferências entre estabelecimentos situados no país e no

exterior, tendo com base as normas curriculares gerais;II – de forma a mudar de etapa da educação básica (NR).Art. 5º É inserido parágrafo único no art. 30 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e seus incisos I e II passam a vigorar com a

seguinte redação:“Art. 30.................................................................I – creches, centros de educação infantil, ou entidades equivalentes, para crianças

de até três anos de idade; II – pré-escolas, para crianças de quatro e cinco anos de idade. Parágrafo único. É assegurado o direito à educação infantil, até o término do ano

letivo, às crianças que completarem seis anos de idade após o dia 30 de junho.” (NR)Art. 6º O caput do art. 32 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a

vigorar com a seguinte redação:“Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de nove anos, gratuito

na escola pública, inicia-se aos seis anos completos ou a completar até 30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula e terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante.” (NR)

Art. 7º É inserido § 7º no art. 32 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com a seguinte redação:

“Art. 32................................................................................. §7º As crianças que completarem seis anos de idade após a data definida no caput

deste artigo deverão ser matriculadas na educação infantil, ressalvado o disposto no art. 23,§ 1º, II.” (NR)

Art. 8º O parágrafo 3º do art. 58 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 58.................................................................................

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§ 3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na educação infantil, assegurado a aprendizado ao longo de toda a vida.” (NR)

Art. 9º É acrescido inciso VI ao art. 59 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com a seguinte redação:

“Art. 59.................................................................................VI – interação com a família na decisão sobre o tipo de atendimento a ser ofer-

ecido.” (NR)Art. 10. O parágrafo 2º do art. 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996,

passa a vigorar com a seguinte redação:“Art. 87.................................................................................§ 2º O Poder Público deverá recensear os educandos na educação básica dos qua-

tro aos dezessete anos e promover a busca ativa das crianças e adolescentes desta faixa que não estiverem incluídos no sistema educacional.

§ 3º.......................................................................................I – matricular todos os educandos a partir seis anos completos ou a completar até

30 de junho do ano em que ocorrer a matrícula, no ensino fundamental.”(NR)Art. 11. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.Sala da Comissão, em

de novembro de 2012.Deputado JOAQUIM BELTRÃORelator

CARTA AOS DEPUTADOSExcelentíssimas Senhoras Deputadas e Senhores Deputados,

A REDE NACIONAL PRIMEIRA INFÂNCIA, formada por 74 organizações da sociedade civil, do governo, do setor privado, de organizações multilaterais e outras redes de organizações, vem solicitar a Vossas Excelências a rejeição do dispositivo constante do PL nº 6755/ 2010 (original PLS nº 414/2008) que pretende obrigar as crianças de cinco anos a ingressar no ensino fundamental. O Projeto se encontra na Comissão de Educação, em regime de prioridade. Diz o texto:

Art. 6º. É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos 5 (cinco) anos de idade, no ensino fundamental.Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 5 (cinco) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante...Art. 87............... § 3º ............................................................................I - matricular todos os educandos a partir dos 5 (cinco) anos de idade no ensino fundamental.

A proposta é um atentado contra a infância e um desserviço à educação básica brasileira. Além disso, muda o processo educacional de 3 milhões de crianças, implica qualificação de 100 mil professores e impõe novas exigências aos sistemas de ensino dos 5.563 municípios, que não foram ouvidos sobre essa matéria.

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O argumento do Projeto repousa na intenção de estabelecer coerência entre o iní-cio do ensino fundamental e o término da educação infantil (“até cinco anos de idade”, segundo o texto constitucional, art. 208, IV). Interpreta que as Leis nº 11.114/ 2005 e 11.274/ 2006 estão incorretas ao estabelecer o início do ensino fundamental aos seis anos, como se houvesse um vácuo entre o ”até cinco” e “aos seis”. Ora, a faixa etária da educação infantil foi alterada pela Emenda Constitucional nº 53/ 2006 precisa-mente para adequá-la à modificação introduzida pelas leis acima citadas.

Consideremos, preliminarmente, o significado etário da expressão “até cinco anos”. Não nos parece válido interpretar “até cinco” como: “nenhum dia além da data de aniversário do quinto ano”. Se fosse correta essa interpretação, o adolescente com 17 anos e um dia já estaria fora da inimputabilidade penal e desnecessárias seriam as inúmeras e felizmente frustradas tentativas para baixar a idade penal... Diríamos, também, que um bebê de um dia de vida, com um mês, com dois meses... tem um ano de idade e deve ser cuidado como criança de um ano... Seria um desastre para sua sobrevivência, saúde e educação. Da mesma forma, ninguém diz, no dia seguinte ao aniversário de 50 anos, que tem 51... Ora, o argumento do PL 6755/ 2010 (PLS 414/2008) de que o ensino fundamental começa aos seis anos de idade e, portanto, de que a matrícula deve ocorrer a partir do dia imediatamente posterior à celebração do aniversário de cinco anos comete esse deslize de interpretação.

O que está em jogo, no entanto, não é um número – cinco ou seis – mas a infân-cia, o direito de ser criança e tudo o que este direito implica, inclusive a aprendi-zagem de acordo com as características da idade. Começar o ensino fundamental aos cinco anos equivale a estar a criança impedida de ser criança, a perder a infância e ser proibida de brincar? Não apenas pelo fato de estar no 1º ano, mas por aquilo a que ela será submetida. Basta ler as frequentes reportagens sobre as conseqüências perversas de um atendimento inadequado: (a) estresse, por ver-se diante de exigên-cias de aprendizagem, de testes de avaliação e ter que corresponder à expectativa da professora e dos pais, (b) problemas de saúde causados pela inadequação dos longos horários estáticos e das cadeiras escolares muito grandes para o tamanho da criança, (c) diminuição radical, quando não a supressão do tempo de brincar, substi-tuição da ludicidade pelo ensino formal e impositivo, a que o próprio professor se vê condicionado, (d) aumento da reprovação e sua repercussão sobre a auto-estima e a expectativa da criança em relação à escola.

A antecipação do início do ensino fundamental para cinco anos será, forçosa-mente, um fracasso pedagógico, aumentando a reprovação e a exclusão escolar, além de uma violência contra a infância.

O que se pretende obter com essa antecipação?Não o desenvolvimento sadio das crianças, porque lhes rouba um ano de infância e da

experiência pedagógica da educação infantil. A pedagogia, a psicologia e a própria neuro-ciência atestam que o tipo de vivência educacional que as crianças têm na educação infantil é fator determinante de um amplo desenvolvimento de sua personalidade e das estruturas cognitivas, sociais e afetivas que vão sustentar todo desenvolvimento posterior da pessoa. Processos formais precoces de ensino entram na linha do “treinamento” e da robotização.

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Não o aumento da escolaridade, porque a maioria das crianças de cinco anos já está na pré-escola. Com a obrigatoriedade estabelecida pela EC 59/2009, brevemente o universo delas estará sendo atendido pela pré-escola. E de forma mais adequada, por ser esta desenhada segundo a pedagogia da primeira infância.

Não um benefício às famílias, porque seus filhos têm direito à educação infantil até a entrada no ensino fundamental, cujo início a lei fixa aos seis anos de idade. A Resolução 1/2010 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Edu-cação determina que a criança tenha seis anos completos até 31 de março no ano de matrícula para o ensino fundamental.

Não o aprimoramento do ensino fundamental, que, em grande parte, ainda se en-contra imerso no desafio de adaptar espaços, mobiliário e material didático para as crianças de seis anos de idade. Empurrar-lhe, por força de uma determinação legal, mais três milhões de crianças de cinco anos, é provocar deliberadamente o caos.

Além desses equívocos, o PL 6755/2010 não pode escamotear uma velada sub-missão aos interesses privatistas na educação, que visam ao aumento de lucro com o aumento da clientela de ensino fundamental.

Confiamos no elevado espírito democrático de Vossas Excelências em permitir o debate da matéria e convocar para discuti-la as organizações que reúnem os gestores da educação, técnicos e especialistas em temas de infância e aprendizagem, uma vez que um dispositivo legal de tanta relevância pedagógica não pode ser decidido à reve-lia do conhecimento especializado.

Agradecemos a compreensão de Vossas Excelências e colocamo-nos à disposição para quaisquer outros esclarecimentos.

Brasília, 2 de maio de 2010

Rede Nacional Primeira InfânciaOMEP/Secretaria Executiva

ORGANIZAÇÕES QUE COMPÕEM A REDE NACIONAL PRIMEIRA INFÂNCIA

ABEBÊ/Associação Brasileira de Estudos sobre o Bebê Ágere/Cooperação em AdvocacyALANAAliança pela InfânciaANUUFEI/Associação Nacional das Unidades Universitárias Federais de Educação InfantilAssociação Brasileira de BrinquedotecasAssociação Brasileira Terra dos HomensAssociação Centro Cultural VivaAssociação Comunitária Monte AzulAssociação Espírita Lar Transitório De Christie/AELTC

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ATEAL/Associação Terapêutica de Estimulação Auditiva e LinguagemAto CidadãoAvante Educação e Mobilização SocialBerço da Cidadania/Instituto de Capacitação e Intervenção Psicossocial pelos Direitos da Criança e Adolescente em Situação de RiscoCampanha Nacional Pelo Direito à EducaçãoCECIP/Centro de Criação de Imagem PopularCentro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância - CIESPICoordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São PauloCoordenadoria da Mulher da Prefeitura de CanelaCPPL/Centro de Pesquisa em Psicanálise e LinguagemCriança Segura FASA/Comunidade Família e SaúdeFederação das Escolas Waldorf do Brasil/FEWBFUNAI/Fundação Nacional do ÍndioFundação ABRINQ pelos Direitos da Criança e do AdolescenteFundação OrsaFundação Xuxa MeneghelIBGE/Instituto Brasileiro de Geografia e EstatísticaIDIS/Instituto para o Desenvolvimento do Investimento SocialIFAN/Instituto da InfânciaInstituto Beneficente Conceição Macedo/IBCMInstituto C&AInstituto EcoFuturoInstituto Entreatos de Promoção HumanaInstituto para Vivências Humanas para um Mundo MelhorInstituto Roerich da Paz e Cultura do BrasilInstituto São Paulo Contra a Violência/ISPCVInstituto Viva InfânciaInstituto Zero a Seis/Instituto Primeira Infância e Cultura de PazIPA/Instituto Pelo Direito de BrincarLugar de Vida - Centro de Educação TerapêuticaMãe Coruja PernambucanaMaterne – Assessoria e Consultoria para a Primeira InfânciaMDS/Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à FomeMEC – Ministério da Educação/SEB/Coordenação Geral de Educação InfantilMIEIB/Movimento Interfóruns de Educação infantil do BrasilMS/Ministério da SaúdeOMEP/Organização Mundial para Educação Pré-Escolar- BrasilOPAS/Organização Pan-Americana da Saúde/BrasilOrganização Social Crianças da BahiaPantákulo – Assessoria, Consultoria e Projetos Ltda

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Pastoral da CriançaPlan International do Brasil Portal Cultura InfânciaProdiabéticosPrograma Equilíbrio (SP)PIM - Programa Primeira Infância Melhor/Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do SulProjeto AnchietaPromundoPulsar/Associação para a democratização da ComunicaçãoRede ANDI BrasilRede de Educação Infantil Comunitária do Rio de Janeiro/São GonçaloRede Marista de SolidariedadeSave the Children Reino UnidoSolidariedade França Brasil - SFBUFF/Universidade Federal Fluminense (NUMPEC/Núcleo Multidisciplinar de Pes-quisa, Extensão e Estudo da Criança de 0 a 6 anos)UFRGS/Universidade Federal do Rio Grande do SulUFRN/Universidade Federal do Rio Grande do Norte/Núcleo de Educação InfantilUncme – União Nacional de Conselhos Municipais de EducaçãoUndime/União Nacional dos Dirigentes Municipais de EducaçãoUNESCO/Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a CulturaUNICEF/Fundo das Nações Unidas para a InfânciaValor CulturalVisão Mundial

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AUDIÊNCIA PÚBLICA DA COMISSÃO DE EDUCAÇAO E CULTURA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS SOBRE O PL

6755/2010

Vital Didonet, Representando a Rede Nacional Primeira Infância

Agradeço o convite de Sua Excia. o Dep. Ângelo Vanhoni, Presidente desta Co-missão, ao Sr. Relator, Dep. Joaquim Beltrão e às Sras. e Srs. Deputadas e Deputados que acolheram com espírito democrático e vivo interesse nossa sugestão de ouvir a sociedade e os organismos educacionais públicos sobre a matéria de tamanha relevân-cia para a vida das crianças e para a gestão dos sistemas de ensino, objeto do PL 6755 e dos demais projetos de lei a este apensados.

Desde o início, a RNPI encarou o propósito desse Projeto como uma oportunidade de aprofundar o conhecimento sobre a infância e o direito da criança à educação e de clarear mais os campos específicos da educação infantil e do ensino fundamental e suas inter-relações. Raras vezes a educação infantil e o ensino fundamental estiveram lutando juntos. No passado, havia até competição, em função dos recursos, sempre es-cassos, da prioridade do ensino obrigatório e da importância educacional e da necessi-dade social da educação infantil não obrigatória... Avançamos tanto na concepção de educação básica, que hoje estamos juntos argumentando contar um projeto de lei que pode acarretar fraturas nesse entendimento.

O debate que se faz nesta Casa, como se fez no Senado, a propósito da idade de ingresso no ensino fundamental, está sendo propício para desenvolver a acuidade do olhar político, social e pedagógico para enxergar a criança como sujeito e cidadã. Te-mos confiança de que Vossas Excelências acolham estes debates como contribuições para o aperfeiçoamento da legislação relativa à criança.

No plano internacional, e no Brasil, com destaque, vem se realizando, de forma mais intensa nos últimos sessenta anos, um processo social e político de reconheci-mento da criança como sujeito de direitos e de direitos específicos da infância, e, simultaneamente, uma expressiva produção científica e reflexão pedagógica sobre o desenvolvimento e a aprendizagem da criança, em outras palavras, sobre a formação da pessoa a partir do início da vida.

Reconhecemos na iniciativa do senador Flávio Arns, com seu PLS 414/2008, bem como na dos deputados e deputadas autores de projetos que versam sobre maté-ria afim, o mérito de levantar uma discussão necessária. Registro, entretanto, a dis-posição do Sen. Flávio Arns, que acaba de ser expressa por escrito e distribuída nesta Audiência, de dialogar e buscar o entendimento. Tivemos, na semana passada, uma longa reunião com ele, debatendo seu Projeto de Lei. Em que pese as concordâncias sobre educação e desenvolvimento infantil, não chegamos a um texto consensual so-

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bre a idade de ingresso no ensino fundamental. Portanto, a questão polêmica continua. O fato de que sua disposição de construir um consenso continua mostra o elevado espírito democrático do senador.

O embate de visões e concepções sobre a infância – que é um fenômeno cultural – e sobre desenvolvimento e aprendizagem da criança - que são produções biológicas, psicológicas e culturais – deve levar ao aprofundamento do conhecimento e a um sempre necessário ajuste das políticas e da prática social relativas à criança. Temos claro que são adultos que falam, propõem e decidem sobre as crianças e para as crian-ças. E que há sempre o risco de considerá-las objeto das leis, das políticas e das ações e, com a melhor das intenções, como objeto tratá-las.

O tema do PL 6755 põe em cena não meramente uma questão de número – cinco ou seis – nem apenas uma questão de idade – até cinco ou o ciclo de 365 dias que antecede o aniversário de seis anos – mas o processo educacional de formação hu-mana, de desenvolvimento global e harmônico da criança, como preconizam nossas disposições legais sobre a educação básica. Qualquer iniciativa que interfira nessa formação e desenvolvimento, seja no âmbito da legislação, seja no das políticas públi-cas e mesmo no meio familiar e social, tem, por uma questão ética e de direito, que respeitar o sujeito ao qual se destina.

Sumarizando o que acabo de dizer, temos:a) A criança é sujeito de direitos, inclusive do direito de ser ouvida, de participar,

especialmente naquilo que lhe diz respeito. Trata-se de desenvolver nossa capaci-dade e habilidade de entender sua linguagem: do corpo, do olhar, da face, da voz, do comportamento. Crianças muito novas no ensino fundamental têm falado de seu desagrado, desajuste ou insatisfação por meio de estresse, cansaço, desinteresse pela escola, nova baixa. Ultrapassamos a fase da criança objeto, quando se decidia tudo sobre ela a partir de cima, da visão adultocêntrica, que, projetando o olhar para o que ela seria ou deveria ser como adulto, definia o que e quando ela deveria fazer e apren-der. Autoritarismo e ditaduras não vicejam apenas na política, mas também podem camuflar-se nas leis e na prática educacional. Hoje é preciso ter percepção acurada sobre a complexidade desse sujeito criança;

b) A criança é o centro para o qual as leis, as políticas sociais e as ações públicas sobre a infância devem voltar-se. Não é o sistema de ensino, não é o desejo dos pais, não é o interesse do mercado, não é a urgência do desenvolvimento social e econômico do País que determinam o que exigir da criança desde a primeira in-fância, mas a compreensão e o respeito ao seu complexo e dinâmico processo de desenvolvimento físico, social, psicológico e cognitivo. Ignorar a centralidade da criança quando se trata de assunto que lhe diz respeito é, muitas vezes, como entrar no jardim com pés de elefante;

c) A pessoa passa por um processo contínuo de crescimento, desenvolvimento e formação, mas que tem etapas ou fases que podem ser até consideradas rupturas. É importante ver a continuidade, mas igualmente importante é respeitar as diferentes características de cada etapa. Sabe-se, hoje, que a infância tem um forte componente

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cultural, e que a manifestação da vida infantil se diferencia ao longo dos séculos e nas diferentes culturas. Isso, no entanto, não nega, antes ressalta, a existência de características universais, presentes em todas as crianças. Apenas para exemplificar, são características da criança pequena a dependência do adulto, a necessidade dos vínculos afetivos, do apego, a ludicidade, a curiosidade, a iniciativa, o desejo de criar e inventar, o impulso para conhecer o âmago das coisas, inclusive abrindo os brinque-dos para chegar ao coração que o move e explica;

d) É preciso respeitar o processo de desenvolvimento e formação da criança. Peço vênia aos que já conhecem esse conto, mas vou trazê-lo por causa de seu poder ilus-trativo dessa afirmação. Um menino encontrou um casulo do qual emergia, penosa e lentamente, uma borboleta. Ela se esforçava para passar o corpo pelo pequeno buraco do casulo. Condoído e solidário, o garoto quis ajudar a frágil borboleta a libertar-se, ganhar o espaço, abrir as asas, voar. Pegou uma tesoura, abriu o alvéolo e a borbo-leta ficou solta e livre. Mas o seu corpo estava murcho e as asas, ainda amassadas. O menino aguardou que a borboleta distendesse as asas. Nada aconteceu. Ele não compreendera que o esforço de esgueirar-se pelo orifício apertado do casulo era o processo que engendraria o fluido no corpo na borboleta, para que suas asas adquiris-sem maturidade, força, resistência para voar. Abreviado artificialmente o processo, passou apenas a rastejar, não foi capaz de elevar seu corpo no ar e ganhar o espaço da liberdade, da autonomia. Queimar etapas, antecipar as coisas na vida além de certo limite, é prejudicial ao desenvolvimento humano. Brincar, aprender em ambiente de liberdade e ludicidade, sem pressão de horários e avaliações que reprovam e rotulam, espaço de espontaneidade, iniciativa e criatividade são necessários na primeira infân-cia. As clínicas e consultórios de psicologia começam a atender cada dia mais crianças estressadas, inseguras, que manifestam medos e angústias, conseqüência, em grande parte, da pressão que recebem dos pais, da escola, do meio social, para corresponde-rem às expectativas de altos desempenhos ou até mesmo de aprendizagens forçadas.

e) Nossa civilização tomou partido pela criança, ao definir seus direitos e exigir que se respeitem as etapas de desenvolvimento. Por isso, condena o trabalho infantil (ou seja, a antecipação do trabalho que lhe tira a infância e o direito ao lazer, à ex-pressão livre, à descoberta e desenvolvimento da criatividade e lhe impõe deveres, horários e regras próprias do adulto); condena o ingresso precoce em milícias, como são os meninos soldados; a exploração sexual e a erotização precoce, porque ateia fogo em etapas da compreensão e da vivência da sexualidade; procura evitar a gravidez na adolescência, porque a menina se torna mãe antes da maturidade biológica e psicológica que a maternidade requer. Isso tudo, para nós, parece óbvio e necessário. Não parece tão óbvio, no entanto, a queima de etapas no processo de desenvolvimento cognitivo e da aprendizagem;

f) O difícil equilíbrio está em não precocizar nem retardar o processo. Não se trata de manter a criança na infância, porque isso seria infantilizar. Seria como obstruir o orifício do casulo, para que a borboleta, enfrentando mais dificuldade, desenvolvesse melhor a musculatura de suas asas... Nem puxar para idades mais avançadas, porque

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pode causar distensão e fragilizar o desenvolvimento. Hoje existe uma pressão para alunizar a criança, inseri-la no ensino formal com idades sempre mais novas, na ex-pectativa de que ela se torne mais inteligente. Nem a neurociência escapa de ser usada e abusada como argumento para estimular de forma artificial e intensiva a formação de sinapses e aumentar a rede de circuitos neuronais.

O debate e a mobilização nacional contra a pretensão de antecipar mais um ano o início do ensino fundamental – ele já foi antecipado dos sete para os seis anos, pelas leis 11.114/2005 e 11.274/2006 – começando após o aniversário de cinco anos de idade nos faz lembrar do menino com a tesoura na mão abrindo o casulo e querendo ver a borboleta voar antes da hora. Há tempo para tudo e tudo tem seu tempo, ensinou o sábio Salomão: “Tudo tem seu tempo, há um momento oportuno para cada em-preendimento debaixo do céu. Tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de colher a planta...” (Ecl. 3,1-8)l.

Vivemos numa sociedade que faz da pressa o símbolo da eficiência. Vivemos agi-tados atrás dos compromissos, com a sensação de estarmos sempre atrasados. Foge-nos a calma da contemplação e afoga-nos o fervilhar dos compromissos. O ponteiro do relógio nos tortura, porque o tempo se esgota como água em nossas mãos. Sabemos que isso é um mal para nossa saúde e a paz de nossa mente, mas é a roda viva, que o Chico tão bem cantou. Insatisfeitos em estar nessa roda, queremos puxar as crianças para nela entrarem cada vez mais cedo. Brincar é perder tempo. Estar na pré-escola até um dia antes de fazer seis anos é perder tempo de estudo, é atrasar-se na vida. É preciso aprender a ler e escrever mais cedo, é preciso terminar a faculdade mais cedo, fazer concurso e conseguir um emprego bem jovem, é preciso correr. Contamos para as crianças com tanta pressa a fábula do coelho e da tartaruga que não percebemos estarmos sendo, nós mesmos, o coelho que perde a corrida para a esperta tartaruga.

Estou expondo o pensamento e a posição da Rede Nacional Primeira Infância, que é formada por 74 organizações. Apenas uma delas não consta da lista das que assinam a Carta aos Deputados, que expõe as razões da discordância com o PL 6755. No seio da Rede, Cartas, Manifestos, Atos e Moções foram enviados ao Congresso Nacional. A maior parte deles consta do CADERNO organizado pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. Atos públicos e debates vêm sendo realizados em diversas partes do País. Os colegas que aqui se encontram são protagonistas desse movimento em seus respectivos Estados e Municípios, diretamente e por meio das Redes de Or-ganizações das quais fazem parte.

Por que a RNPI é contra a pretensão do PL 6755 de mudar as leis 11.114/2005; 11.274/2006, 11.494/2007, que regulamentou a EC 53/2006 (FUNDEB) no item es-pecífico da idade da educação infantil, e a LDB, para obrigar os pais a matricular os filhos a partir de cinco anos no ensino fundamental?

od e aicnâfni ed oãçpecnoc an átse oinícoicar ed esab ajuc ,seõzar 7 onoicaleRdesenvolvimento e aprendizagem da criança, que expus até agora.

1. Começar o EF aos cinco anos é prejudicial para o desenvolvimento infantil e para a aprendizagem continuada da criança. Meus colegas na Mesa falaram sobre

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isso. Destaco os dados apresentados pelo Carlos Eduardo, Presidente da Undime. No CADERNO da CEC distribuído nesta Audiência Pública consta, além de outros, um texto da Dra. Maria Malta Campos com resultados de pesquisa comparando aprendi-zagem de crianças que entraram no EF em diferentes idades.

2. A pedagogia da educação infantil é a mais adequada para as crianças pequenas até completarem seis anos de idade. Ela considera a criança o centro e o ponto de partida das atividades. A experiência pedagógica é diversificada, procurando desen-volver as diferentes linguagens – do corpo, da fala, das artes, da escrita -, estimula a criatividade, valoriza a iniciativa, e, sobretudo, é um tempo e um espaço do brincar e do aprender ludicamente.

3. A Educação Infantil e o Ensino Fundamental adotam alguns princípios comuns, mas a cultura escolar os distingue como duas etapas específicas com característi-cas próprias. É importante reconhecer que existem culturas, concepções e práticas históricas diferentes entre a educação infantil e o ensino fundamental. O EF é um ensino formal de conteúdos curriculares pré-definidos e sobre os quais é cobrada a aprendizagem mediante avaliação. O MEC, a Undime e um grande número de Secre-tarias Municipais de Educação estão fazendo um grande esforço para ajustar a prática pedagógica do 1º ano do EF às características biopsicológicas e de aprendi-zagem das crianças de seis anos. Mas as mudanças estão lentas e, em termos na-cionais, pouco expressivas. A RNPI criou um Grupo de Trabalho para analisar essa situação e propor novas medidas operacionais que ajudem na aplicação das diretrizes pedagógicas do MEC e do CNE. Em muitos lugares, as crianças de 6 anos estão sofrendo uma inserção inadequada no primeiro ano do EF. A criação de um conceito unitário de educação básica, que seria um avanço na política educacional, não implica a uniformização de métodos pedagógicos entre a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio.

4. Se a intenção do PL 6755 for assegurar um ano mais de escolaridade para as crianças das classes populares, mediante a obrigação de começarem o EF mais cedo, ele já não é mais necessário. EC 59/2009 estendeu a obrigatoriedade à educação bási-ca dos 4 aos 17 anos de idade. Portanto, todas as crianças não apenas a partir dos cinco, mas dos quatro anos de idade, estão obrigadas a freqüentar a pré-escola. Por essa via, a escolaridade do brasileiro será aumentada em cinco anos, sendo dois anos na pré-escola e três no ensino médio. Sob este ângulo, o Projeto é extemporâneo e desnecessário. A EC 59, que é de 2009, introduziu uma medida mais ampla do que essa proposta em 2008, pelo PL 6755, de antecipação do ensino fundamental obriga-tório para os cinco anos de idade.

5. Teria o legislador em 2005 e 2006 se enganado no cálculo ao determinar o en-sino fundamental de nove anos começando aos seis anos de idade e terminando aos quatorze? Ou incorre em engano agora ao manter a mesma duração de nove anos, iniciando aos cinco e terminando aos quatorze? Ou pretende que termine aos 13, e o ensino médio comece aos 14 e termine aos 16... E os adolescentes tenham que esperar um ano para entrar no mercado de trabalho ou entrar mais cedo na universidade, numa

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idade em que ainda a maioria não definiu sua opção profissional...6. Há um círculo vicioso no raciocínio que embasa o argumento do PL 6755: ex-

plicitamente ele pretende adequar a lei à Constituição. Esta diz que a EI vai até cinco anos e aquela, que o EF começa aos seis. Como a Constituição é superior, a lei deve ser modificada. Ora, até 2006, a EI ia de zero a seis anos (art. 2008, IV da CF) e o EF, com 8 anos de duração, ia dos 7 aos 14 anos de idade. Quando este foi ampliado para 9 anos, começando aos 6 e terminando aos 14, houve necessidade de reduzir um ano a EI. Foi feita, então a emenda no inciso IV do art. 2008. Ou seja, justamente para adequar o texto constitucional a uma norma legal que já vinha sendo posta em prática. Quer dizer: a lei determinou que se fizesse a mudança na duração e no término da educação infantil, sendo esta estabelecida até cinco anos. E agora se usa o argumento de que o texto da Constituição leva à mudança na lei sobre o início do EF porque este está incoerente com o término da educação infantil!... Muda-se, então, a lei e, mais adiante, novamente ter-se-á que mudar a Constituição... para, mais tarde, outra vez mudar a lei... E, a valer esse raciocínio, a criança entrará cada vez mais cedo no ensino fundamental.

7. O inciso IV do art. 2008, sobre a extensão da educação infantil, modificada pela EC 53/2006, foi regulamentado pela Lei 11.494/2007. Nessa regulamentação, o legislador tornou claro e operacional o que determina aquele inciso IV do art. 2008. E assim diz o art. 10 § 4º dessa lei:

O direito à educação infantil será assegurado às crianças até o término do ano letivo em que completarem seis anos de idade.

Estaria sendo obliterada, agora, essa regulamentação da Emenda Constitucional? Como as crianças não podem fazer simultaneamente o último ano da educação infantil e o primeiro do ensino fundamental, obrigá-las à matrícula no EF implica negar-lhe o direito à educação infantil.

O que tem mais valor: uma lei aprovada exatamente para interpretar uma Emenda Constitucional ou um projeto de lei que faz outra leitura?

Provavelmente estamos todos de acordo com as concepções e os princípios sobre a primeira infância, desenvolvimento da criança, aprendizagem nos primeiros anos de vida, a importância do brincar, a pedagogia lúdica... as especificidades da educação infantil e do ensino fundamental...

Então, o que é que separa quem defende o PL 6755 e os que querem que seja rejeitado ou modificado? Seria apenas um advérbio de tempo de três letras (“até”)?... Pois providencie-se uma Emenda Constitucional que retire essa palavrinha do inciso IV do art. 208 da Constituição e salvemos a criança da calamidade de ter que ser aluna do primeiro ano do EF com apenas cinco aninhos de idade. Antes, porém, que se faça isso, pois demanda tempo, sirvamo-nos da lei que interpreta esse inciso IV do art. 208 e asseguremos a freqüência na educação infantil até o término do ano letivo em que a criança completa seis anos de idade e não alteremos a LDB.

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Termino com o parágrafo final da Carta da RNPI e ABMP entregue a 1.600 juízes, promotores públicos, defensores da infância e juventude, advogados, estudantes de direito, e vários outros profissionais que trabalham com crianças e adolescentes, no 23º Congresso da ABMP, em Brasília, no dia 5 de maio:

“...os signatários desta Carta encarecem a necessidade de preservar a infância, respeitando as etapas do desenvolvimento infantil. Que as tendências de antecipar exigências e expectativas que seriam mais apropriadas para idades posteriores sejam contrapostas por uma defesa firme do direito da criança ser criança, de brincar, de aprender ludicamente, de conviver em espaços de liberdade e expressão criativa. An-tecipar a entrada no ensino fundamental para a idade de cinco anos é uma forma de reduzir a infância e impor exigências que acabarão por produzir efeito contrário do desejado: estresse, desinteresse pela escoa, reprovação e abandono. Mas o efeito mais pernicioso se instala no íntimo da criança e esse dificilmente será reparado, porque criança sem infância é, na grande parte dos casos, adulto infeliz”.

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8. INDICAÇÃO DE OUTRAS LEITURAS PARA APROFUNDAMENTO NA TEMÁTICA

BARBOSA, Maria Carmen Silveira; DELGADO, Ana Cristina Coll et al. A infância no ensino fundamental de 9 anos. Porto Alegre: Penso, 2011.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, promul-gada em 5 de outubro de 1988. Brasília:1988.

BRASIL. Lei n.° 8069 de 13 de julho de 1990. Estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília:1990.

BRASIL. Lei n.° 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.

BRASIL. Lei n.º 11.114, de 16 de maio de 2005. Altera os arts. 6º, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do ensino fundamental aos seis anos de idade. Brasília, 2005.

BRASIL. Lei n.º 11.274, de 06 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fun-damental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Brasília, 2006.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Subsídios para di-retrizes curriculares nacionais da educação básica: diretrizes curriculares nacionais específicas para a educação infantil. Brasília: MEC/SEB, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Praticas cotidiana na Educação Infantil: bases para a reflexão sobre as orientações curriculares. Projeto de cooperação técnica MEC e UFRGS para construção de orientações curriculares para a Educação Infantil. Bra-sília: MEC/SEB, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Indicadores da Qualidade na Educação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2009.

BRASIL. Parecer CNE/CEB n.° 20/2009, de 11 de novembro de 2009. Estabelece a revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília, 2009.

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BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 12/2010, de 8 de julho de 2010 . Diretrizes Operacio-nais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil. Brasília: 2010.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 18/2005,de 15 de setembro de 2005.Orientações para a matrícula das crianças de 6 (seis) anos de idade no Ensino Funda-mental obrigatório, em atendimento à Lei nº 11.114, de 16 de maio de 2005, que altera os Arts. 6º, 32 e 87 da Lei nº 9.394/1996. Brasília: 2005.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 22/2009, de 9 de dezembro de 2009 . Diretrizes Oper-acionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Brasília: 2009.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 26/2003, de 29 de setembro de 2003. Aprova o questionamento sobre a realização de “vestibulinhos” na Educação In fantil e Ensino Fundamental. Brasília: 2003.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 39/2006, de 8 de agosto de 2006. Consulta sobre situações relativas à matrícula de crianças de seis anos no Ensino Fundamental. Brasília: 2006.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 4/2008, de 20 de fevereiro de 2008. Orientação sobre os três anos iniciais do Ensino Fundamental de nove anos. Brasília: 2008.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 41/2006, de 9 de agosto de 2006. Consulta sobreinterpretação correta das alterações promovidas na Lei nº 9.39 4/96 pelas recentes Leis nº 11.114/2005 e nº 11.274/2006. Brasília: 2006.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 45/2006, de 7 de dezembro de 2006. Consulta referente à interpretação da Lei Federal nº 11.274, de 6/2/2006. Brasília: 2006.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 5/2007, de 1º de fevereiro de 2007.Consulta com base nas Leis nº 11.114/2005 e n° 11.274/2006, que tratam do Ensino Fundamental de nove anos e da matrícula obrigatória de crianças de seis anos no En-sino Fundamental. Brasília: 2007.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 6/2005, de 8 de junho de 2005.Reexame do Parecer CNE/CEB 24/2004, que visa o estabelecimento de normas nacion-ais para a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos de duração. Brasília: 2005.

BRASIL. Parecer CNE/CEB nº 7/2007, de 19 de abril de 2007.Reexame do Parecer CNE/CEB nº 5/2007, que trata da consulta com base nas Leis nº 11.114/2005 e n° 11.274/2006, que se referem ao Ensino Fundamental de nove anos e à matrícula obrigatória de crianças de seis anos no Ensino Fundamental. Brasília: 2007.

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BRASIL. Resolução CNE/CEB n.° 5/2009, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Dire-trizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil. Brasília, 2009.

BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 01/2010, de 14 de janeiro de 2010. Define Di-retrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Brasília, 2010

BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 06/2010, de 20 de outubro de 2010. Define Dire-trizes Operacionais para a matrícula no Ensino Fundamental e na Educação Infantil. Brasília, 2010.

BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 24/2004, de 15 de setembro de 2004. Estudos visando ao estabelecimento de normas nacionais para a ampliação do Ensino Funda-mental para nove anos de duração. Brasília, 2010.

BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 3, de 3 de agosto de 2005Define normas nacionais para a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos de duração. Brasília: 2005.

BRASIL. Resolução n. 1, de 7 de abril 1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacion-ais para a Educação Infantil. Brasília, 1999.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RECURSO ESPECIAL Nº 753.565 - MS (2005/0086585-2). Relator: Ministro Luiz Fux. Brasíl-ia, 27 mar. 2007. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/juris-p rudenc ia /busca?q=RECURSO+ESPECIAL+N%C2%BA+753 .565+-+MS+%282005%2F0086585-2%29&s=jurisprudencia>. Acesso em: 17 dez. 2011.

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CABRAL, Karina Melissa. A Justicialidade do Direito à qualidade do ensino funda-mental no Brasil. 2008. 195p. Dissertação [Mestrado em Educação]. Faculdade de Educação. UNESP.

CARBONARI, Francisco. Quando uma criança deve ser matriculada no ensino fun-damental? 8 dezembro 2011. Disponível em: <http://www.franciscocarbonari.com.br/noticias/idade-minima-para-ensino-fundamental-pode-cair>. Acesso em: 14 dez. 2011.

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php?pid=S0104- 40362008000100002&script=sci_arttext&tlng=pt - Ensaio: Aval-iação e Políticas Públicas em Educação. ISSN 0104-4036: Aval.pol.públ.Educ. vol.16 no.58 Rio de Janeiro Jan./Mar. 2008 - doi: 10.1590/S0104-40362008000100002.

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