Revista Estilo 34

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O Japão no Brasil Ano 7 N 0 34 R$ 3,50 1 0 PRÊMIO GAÚCHO DE EXCELÊNCIA GRÁFICA ABIGRAF 2005 AIKIDO, RAKU, SUSHI, ORIGAMI: O JAPÃO É AQUI

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Edição de setembro de 2005

Transcript of Revista Estilo 34

Page 1: Revista Estilo 34

O Japãono Brasil

Ano 7 N0

34 R$ 3,50

10

P R Ê M I O G A Ú C H O

D E E X C E L Ê N C I A G R Á F I C A

A B I G R A F 2 0 0 5

AIKIDO,

RAKU,

SUSHI,

ORIGAMI:

O JAPÃO

É AQUI

83677 capa1.p65 9/13/05, 9:15 PM2

Page 2: Revista Estilo 34

Milene Leal

[email protected]

EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO

REDAÇÃO Angela Farias, Cris Berger, Irene Marcondes, Magali Moraes, Paula

Taitelbaum

REVISÃO Flávio Dotti Cesa

PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi

DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade [email protected]

ILUSTRAÇÕES Nik

FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Letícia Remião

PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento e Restaurante Sakura

COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros,

Malu Coelho, Ruza Amon, Tetê Pacheco

EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS)

COLABORADORES Associação Nipo-Brasileira, Cézar Van Der Sand,

Erika Lie Hinohara Aso, Leandro Lopez da Silva, Livraria Cultura, Nádya Pesce da Silveira,

Parque Esportivo da PUC RS

Izabella Boaz

[email protected]

DIRETORA DE ATENDIMENTO

DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares

[email protected]

A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda., sob licença

da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas da rede Zaffari e Bour-

bon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é responsável por opiniões ou conceitos

emitidos em entrevistas, artigos e colunas assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do

conteúdo desta revista sem prévia autorização e sem citação da fonte.

TIRAGEM 25.000 exemplares

PRÉ-IMPRESSÃO Maredi

IMPRESSÃO Pallotti

ENDEREÇO DA REDAÇÃO

Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080

(51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781

[email protected]

CAPA: NINA HINOHARA ASO FOTOGRAFADA

POR LETÍCIA REMIÃO

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N O T A D O E D I T O R

Se você é daqueles que ficam com água na boca ao pensar em um sashimi de salmão, vai adorar

esta edição da Estilo Zaffari. Se, ao contrário, tem engulhos só de pensar em comer peixe cru, mas acha

fascinante a cultura japonesa e suas peculiaridades, também vai adorar a revista. Os adeptos das artes

marciais do Oriente vão se encontrar nesta edição da Estilo. Quem sonha em conhecer o Japão vai delirar

com a nossa matéria de viagem. E os apreciadores das artes milenares hão de encher os olhos com a

reportagem sobre o Raku, uma cerâmica japonesa que só se revela por inteiro depois de passar pelo fogo.

Esta edição da Estilo Zaffari tem Japão para todos os gostos, sob várias perspectivas, em diferentes

interpretações. Começamos pela capa. Impossível não se encantar com a Nina, uma menininha de dois

anos e meio, filha de japoneses nascidos no Brasil, que enfrentou heroicamente uma longa sessão de

fotos, mesmo gripada. A Nina resume o espírito desta revista: mostrar que Japão e Brasil estão

superentrelaçados. Ela é uma pequenina e linda porção de Oriente aqui nos trópicos.

Abrindo a edição, Paula Taitelbaum apresenta o perfil de dois sushimans que fazem parte da história

da culinária japonesa em Porto Alegre. Pai e filho, eles comandam o Sakura, um verdadeiro templo da

gastronomia oriental. E são autênticos mestres zen: concentrados, detalhistas, inspirados, habilidosos,

tranqüilos, poderosos. Melhor ainda: eles contam aqui os segredos de algumas das mais incríveis receitas

do restaurante, pra que você possa reproduzi-las em casa.

A publicitária Magali Moraes, que não freqüenta o Sakura por uma questão de foro íntimo – ela não

pode nem pensar em comer peixe cru, passou mal na última vez em que tentou –, redigiu uma matéria

deliciosa sobre a interação das culturas brasileira e japonesa. Magali faz um panorama da presença do

Japão no Brasil e, vice-versa, do Brasil no Japão. Mostra que estamos absolutamente misturados, integrados,

miscigenados e altamente influenciados uns pelos outros.

Repare: tendo ou não olhos puxados, todos nós, brasileiros, já somos um pouquinho orientais.

Sério! Basta olhar em volta e você vai perceber como a cultura japonesa está presente em nosso dia-a-dia:

são os desenhos animados, os gadgets eletrônicos, a comida, o karaokê, a moda, a decoração, os carros,

as plantas... Em quase tudo a gente encontra um pouquinho de Japão.

E se, como diz Luis Augusto Fischer, o Japão parece longe demais, geograficamente falando, os

milhares de encantos dessa cultura estão ao nosso alcance. É só, por exemplo, abrir a sua Estilo Zaffari!

entrelaçados

Brasil e Japão

OS EDITORES

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Correio

MICO PELA ESTILO

Milene e Renata:

Semana passada, sábado, paguei um mico,

um micão no Bourbon Assis Brasil. Vejam bem

que situação. Ninguém merece (eu mereço, por-

que sou louca e faço qualquer coisa pela Estilo)!

Estava nas compras diárias, encontrei minha

amiga Osmarina, seguimos pelos corredores pro-

curando produtos. Tchau, tchau, nos despedi-

mos. Aí, próximo a um caixa, bati o olho na Es-

tilo n° 33. Como se fosse a única, peguei. Na mes-

ma hora revi minha amiga, levantei a revista e gri-

tei bem alto: aqui, vê aqui, saiu, peguei! Olhei para

os lados, tudo parou, todos me olhavam. Os ge-

rentes de caixa sorriam discretamente sem enten-

der nada. Que educação. Passei as compras, o car-

tão e me agarrei na Estilo. Fui! Claro que saí rapi-

dinho sem olhar para lado nenhum. Até minha ami-

ga sumiu. A agonia de ler era maior. Li e devorei.

É, gente da Estilo, meu vício é esta revista.

Agradeço a toda editoria e redação por estarem

próximos a nós com competência, qualidade e

credibilidade. Até as próximas, com saúde e paz.

Sejam sempre profissionais e amigos. Valeu.

MARIA JOSÉ RÜCKHEM PESSOA – PORTO ALEGRE

Maria José, a sua carta é hilária! Ficamos

aqui imaginando a cena e nos divertimos

horrores. Só nos resta agradecer por seu en-

tusiasmo e sua alegria. Que coisa maravi-

lhosa ter leitores assim!!! A Estilo Zaffari

pode até ser um vício, mas é um vício do

bem! Até a próxima e um abração.

E MAIS PARABÉNS

Economizando um tempinho para coisas

agradáveis, abrimos o exemplar de inverno da

revista Estilo Zaffari. Que maravilha! O multi-

facetado cenário gaúcho, o inverno (que nós não

temos), o chimarrão, as sopas, o vinho, os quei-

jos, a roupa pesada, enfim... A revista é sempre

uma festa multicolorida, bem apresentada, bem

redigida, inovadora, surpreendente a cada novo

exemplar. Por tudo isto, nós queremos enviar

aquilo que já virou rotina: os nossos parabéns à

equipe da Estilo. É realmente uma REVISTA!

Abraços carinhosos.

ALICE E RONALD – FORTALEZA

NÃO PODE FALTAR

Oi, pessoal da redação! Como vão? Espero

que os encontre com saúde, numa nice e em paz!

Eu sempre que vou fazer minhas compras no

Zaffari e tem a Estilo já ponho no carrinho! Com

certeza! É a melhor revista! Superbonita, bem

escrita, lindas fotografias! Nota 10! Parabéns e

sucesso da amiga de vocês.

VERÔNICA BRAMBILLA – PORTO ALEGRE

CARDAMOMO NAS RECEITAS

Oi, tudo bem? Trabalho com uma linha de

temperos e conservas para culinária. Sou fã da re-

vista Estilo Zaffari e entendo que novidades de-

vem ser comunicadas em canais afins. O produto

semente de Cardamomo é superespecial, como a

revista Estilo Zaffari, para pessoas de bom gosto e

que procuram diferenciais. Gostaria muito que o

departamento de Produção de Alimentos anali-

sasse a oportunidade de comunicação desse pro-

duto especial em alguma receita. Um abraço.

Atenciosamente,

CINTIA BRANDENBURGER – PORTO ALEGRE

Cintia, adoramos receber os seus elogios e

estamos sempre abertos a sugestões de pau-

tas provenientes dos nossos leitores. Na edi-

ção nº 30, de dezembro de 2004, foi publi-

cada uma receita com o cardamomo. Tra-

ta-se de um drink chamado Margarita de

Manga com Cardamomo. Fez o maior su-

cesso. Se você não viu essa edição, pode-

mos enviar a receita por e-mail. Por favor,

sempre que você tiver sugestões de receitas

elaboradas com especiarias, sinta-se à von-

tade para nos escrever. Estamos sempre bus-

cando fontes diferentes. Agradecemos pelo

contato, abraço.

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Page 5: Revista Estilo 34

MÚSICA COM ESTILO

Olá, Izabella!!! Em primeiro lugar, queremos

parabenizá-la pela excelente qualidade da revis-

ta Estilo, desde a fotografia, as crônicas e entre-

vistas até as receitas deliciosas (já testei várias e

foram muito elogiadas), roteiros turísticos, en-

fim... tudo de muito bom gosto! Nós somos ir-

mãos, moramos em Canoas e formamos uma du-

pla de cantores em violão e voz de música pop

internacional romântica. Nosso repertório inclui

Bee Gees, Beatles, The Coors, Eric Clapton, Dire

Straits, Tears for Fears, Bryan Adams e outros.

UM ABRAÇO DA DUPLA MANFRED & ANNE!!

Queridos leitores, sucesso pra vocês nessa

carreira musical! Nós, da Estilo, amamos

música e vamos querer conhecer o trabalho

da dupla, ok? Abraços!

AFAGOS NO EGO

Olá. Não vou perder tempo tecendo elogios

para a revista. Vocês devem estar bem seguros da

qualidade dela. Mas, ego é ego. Então lá vai: morei

um bom tempo em Porto Alegre e por motivos pro-

fissionais estou agora em Florianópolis. Quando vou

a Porto Alegre, dou aquela passadinha básica pelo

Zaffari (Menino Deus) e trago para cá o exemplar

da Estilo Zaffari da hora. Sou fotógrafo e vou apro-

veitar para elogiar o nível das fotos apresentadas

nas matérias. Tem muita revistinha de circulação

nacional mostrando belas porcarias, com uma visi-

bilidade questionável. É triste. Vocês poderiam es-

tar com a Estilo em bancas. Curiosidade: quando

chego com um novo exemplar aqui no estúdio, mi-

nha sócia sai correndo para pegar a revista e vai

para a seção de culinária... Ela é apaixonada por

cozinha, eu também, e literalmente babamos sobre

as páginas. Em tempo: todas as colunas são boas,

mas as do Fernando Lokschin... estupendas. Para-

béns. Agradeço a atenção.

LUIS VENTURA – FLORIANÓPOLIS

Luis, para quem não ia elogiar, você até

passou da conta! Que coisa boa receber es-

tes seus não-elogios! Quanto ao nosso ego,

que ego? Nós somos tão modestos que nem

sabemos o que é isso... Um superabraço e

fique sempre por perto, por favor!

PARABÉNS 2

Milene, Bella e toda a equipe, parabéns pela

conquista no 1º Prêmio Gaúcho de EXCELÊNCIA

Gráfica. É muito mais do que merecido, pois o tra-

balho de vocês é maravilhoso. Um grande abraço.

ROSA MARIA MAGGIONI – HRM MULTIMÍDIA

PARABÉNS 3

Milene, parabéns a você e toda sua equipe pelo

prêmio com a Estilo! Vocês merecem!!! Beijos.

MARCO PERRONE – DIR. DE NEGÓCIOS – AG2

NO DIA 29 DE JULHO, A REVISTA ESTILO ZAFFARI FOI DES-

TACADA PELA ABIGRAF-RS (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA

INDÚSTRIA GRÁFICA) COM O 1º PRÊMIO GAÚCHO DE EXCE-

LÊNCIA GRÁFICA. A PUBLICAÇÃO CONCORREU COM MAIS

DE 270 PEÇAS, INSCRITAS EM SEIS CATEGORIAS, E FOI

VENCEDORA NO SEGMENTO PERIÓDICOS – REVISTAS DE

CARÁTER VARIADO. EM SUA PRIMEIRA EDIÇÃO, O PRÊMIO

AVALIOU O TRABALHO REALIZADO PELAS INDÚSTRIAS GRÁ-

FICAS DO RIO GRANDE DO SUL. O CORPO DE JURADOS FOI

COMPOSTO POR PROFISSIONAIS DE INDISCUTÍVEL CONHE-

CIMENTO TÉCNICO GRÁFICO E DE CRIAÇÃO, PUBLICITÁRIOS

E PERSONALIDADES, INCLUSIVE DE FORA DO ESTADO.

A REVISTA ESTILO ZAFFARI SERÁ UMA DAS REPRESENTAN-

TES REGIONAIS NO PRÊMIO FERNANDO PINI, MAIS DES-

TACADA PREMIAÇÃO DA INDÚSTRIA GRÁFICA NACIONAL,

QUE SERÁ REALIZADO NO FINAL DO ANO, EM SÃO PAULO.

ESTILO ZAFFARI RECEBE

PRÊMIO DE EXCELÊNCIA GRÁFICA

PARABÉNS 1

É com grande alegria que comunicamos que

a revista Estilo Zaffari, na categoria “Revistas de

Caráter Variado”, venceu o 1º Prêmio Gaúcho

de Excelência Gráfica. Na avaliação, além dos

quesitos de excelência gráfica, foram avaliados

também a criatividade e a funcionalidade do pro-

jeto. Portanto, parabéns a todos os envolvidos

neste belíssimo projeto. Que a nossa parceria seja

longa e que a revista Estilo Zaffari continue a ven-

cer em todos os quesitos, do projeto à satisfação

dos seus leitores e anunciantes. Abraços!

COM CARINHO DA DIREÇÃO, GERÊNCIAS, DEPTO.

COMERCIAL E PRODUTIVO DA GRÁFICA PALLOTTI

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Cesta Básica

Viagem: Mundo às Avessas

O Sabor e o Saber

O Japão no Brasil

Aikido, dança da defesa

Lugar: Unique Garden

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36

52

64

72

82

Í N D I C E

sushiman

Rideu e Jonnhy Fujimoto revelam

receitas de vida e de culinária

e seus segredos

20

Dois

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Page 7: Revista Estilo 34

Arnaldo Antunes

As palavras de

O multiartista falou com exclusividade

para Paula Taitelbaum. Não perca.

90

A magiacerâmica

japonesada

56

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Page 8: Revista Estilo 34

Cotidiano

A cultura japonesa está por tudo. É uma invasão consentida.

JAPAS

Alguns anos atrás, a rede de farmácias Panvel fez

uma promoção: na compra de X reais em determinados

produtos, o cliente ganhava um vídeo infantil. Foi assim

que surgiu na minha casa um filme chamado Meu Amigo

Totoro, que contava a história de duas garotinhas, Satsuki

e Mei, que vão morar com o pai no campo enquanto es-

peram a mãe se curar de uma doença no hospital. É nos

arredores deste novo lar que elas descobrem os “totoros”,

criaturas mágicas que não são animais, nem monstros,

nem gente. Aqui em casa todo mundo ficou fascinado

por este desenho. As meninas do filme eram lindas, a

música era delicada, e os cenários, os diálogos, a cultura,

tudo era diferente e cativante. Descobri que o mundo da

animação não se resumia aos estúdios de Walt Disney.

Meu Amigo Totoro foi o primeiro anime do qual to-

mei conhecimento – sem saber ainda o que era um anime

–, e sem imaginar que um dia eu me familiarizaria com

termos como mangá, otaku, inuyasha, cosplay. Se você não

sabe do que estou falando, é questão de tempo.

Anime é desenho animado japonês. Lá do outro lado

do mundo passa o dia inteiro na televisão, mas aqui, ex-

cetuando-se os Pokemón – estes você conhece –, passa

muito raramente, obrigando seus aficionados – os otakus

– a baixarem os desenhos pelo computador, ao som de

Orange Range, Do As Infinity, BoA, que são grupos de

rock que fazem o maior sucesso entre os japas. Além dos

desenhos animados, as histórias em quadrinho japonesas

podem ser lidas nos mangás, que são vendidos em qual-

quer banca de jornal aqui no Brasil. Os mangás são gibis,

cuja diferença é que devem ser lidos de trás para frente.

Se tudo isso parece muito estranho pra você, acre-

dite: já foi estranho pra mim também, até que descobri

que tinha em casa uma especialista em anime e mangá, e

ela não faz parte de uma entidade secreta. Minha filha

mais velha é apenas uma entre vários adolescentes que

são fascinados pela estética e pela cultura pop japonesa.

E abriu os horizontes aqui de casa, onde a imagem do

Japão ainda estava reduzida a sushis, origamis e arigatôs.

O Japão é pequeno, os japoneses são menores ainda,

mas a contribuição deles ao mundo contemporâneo tem

sido gigantesca. Na Europa inteira a cultura japonesa se

faz presente em exposições de arte, moda, design, música

– sem falar, claro, em tecnologia. Atualmente, um dos

mais badalados restaurantes de Paris é o Kong, que fica na

cobertura da loja Kenzo. O ambiente é o que há de mais

moderno e high tech. Tóquio puro.

É uma invasão consentida. Oriente e Ocidente tro-

cando informações e convivendo em paz. O Japão já não

está longe. Está em todo lugar.

M A R T H A M E D E I R O S

MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA

10 Estilo Zaffari

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Page 9: Revista Estilo 34

Cesta básica

NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA DICAS E SUGESTÕES PARA CURTIR O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE VERDADE:

MÚSICA, CINEMA, LUGARES, OBJETOS ESPECIAIS, COMIDINHAS, PASSEIOS, COMPRAS. BOM PROVEITO!

Quem deseja se iniciar nas artes da gastronomia

japonesa já tem ponto de partida: o Riverside’s

promove periodicamente cursos de sushi e sashimi

para novatos, curiosos ou mesmo para quem já

conhece algumas manhas dessa escola culinária.

O professor é Línio Cardoso, sushiman há mais

de nove anos, que aprendeu a técnica com mestres

japoneses no próprio Riverside’s e depois aperfei-

çoou-se em São Paulo e Curitiba. No curso, Línio

ensina não só os segredos do preparo de sushis e

sashimis como também a arte da decoração dos

pratos japoneses. Depois dessas aulas, seus

quitutes vão arrasar em dois aspectos: sabor e

visual. As inscrições podem ser feitas em qualquer

casa Riverside’s ou pelo fone 3231.4032. Informe-se

sobre as próximas datas e já vá afiando as facas...

MILENE LEAL, JORNALISTA

AULAS PRÁTICAS

DE SUSHI E SASHIMI

FOTO: CRISTIANO SANT’ANNA

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Page 10: Revista Estilo 34

O frio parece unir cada vez mais este casal de gaúchos.

Desde 1997, Zelfa Silva e Gunnar Hagelberg passam boa

parte de seus dias percorrendo as paisagens geladas da

Antártida, a bordo de barcos de diferentes tamanhos.

Para eles, quebrar gelo é uma rotina. Tanto que se

associaram a uma empresa especializada em roteiros

pela Antártida e passaram a viajar no papel de guias,

levando ao extremo sul do continente pessoas de

diversos perfis: jovens, idosos, aventureiros, sedentários,

etc. Quem olha as fotos dessas expedições tem vontade

de sair correndo para arrumar a mala. Os cenários são

lindos, impactantes. E o viajante ainda tem o privilégio

de ver de perto pingüins, baleias, leões-marinhos e

várias outras espécies da região. Para saber mais sobre

as viagens, faça contato pelo e-mail

[email protected] ou visite o site

www.antarcticacruises.com.ar. O casal reside em Buenos

Aires, Argentina, e de lá recruta seus passageiros.

Quem sabe você não embarca na próxima expedição?

MILENE LEAL, JORNALISTA

Quebrando o gelo

Cesta básica

Quanto mais eu me interesso por música, mais perto

chego do entendimento da obra. Tom Jobim, por

exemplo: um mestre, uma obra jamais acabada e por

isso infinita... No CD Tom Jobim Inédito, gravado em

1987, em meio à parafernália do estúdio montado na

sala de piano da casa do artista, no Jardim Botânico,

começa mais um espetáculo. Foram 4 meses intensos

de gravações, na intimidade da casa de Tom, resultan-

do no que ele considerou um dos melhores registros

musicais da sua vida. Lançado pela gravadora Biscoito

Fino, reúne músicas maravilhosas como Wave, Chega

de Saudade, Águas de Março, Canção do Amor

Demais. Confira!!! O CD está disponível na Livraria

Cultura do Bourbon Shopping, fone 3028.4033.

IZABELLA BOAZ, EMPRESÁRIA

BISCOITO FINÍSSIMO!

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Page 11: Revista Estilo 34

Viciados em chocolate, preparem-se! Porto Alegre já

tem uma filial da carioca Chocólatras, uma loja que

explora aberta e despudoradamente o descontrole de

pessoas como eu, incapazes de resistir a uma trufa de

chocolate. O nome já é uma provocação, mas o

cardápio da Chocólatras é puro deboche. Confira os

ingredientes de uma das opções de tortas, a Tricolor:

camadas geladas de trufa de chocolate branco, trufa

de chocolate ao leite e musse de chocolate meio-

amargo. E o pior é que tem muito mais. Aí ao lado,

você pode avistar algumas miniaturas que eles

produzem para fazer os chocodependentes caírem em

tentação. É mesmo irresistível. Fone: (51) 3337.7118.

MILENE LEAL, JORNALISTA

CHOCÓLATRAS, TREMEI!

De acordo com o dicionário, GARBO significa elegância,

galhardia, primor. E é com estes substantivos que Patrícia

Lorensini e Marcelo Duarte Varnieri pretendem distinguir

os clientes do Garbo Hair Designers, salão que funciona em

meio ao burburinho e glamour do Moinhos de Vento, em

Porto Alegre. Glamour, aliás, é outra das fontes de

inspiração da dupla: o nome do salão também faz referência

a Greta Garbo, uma das mais charmosas atrizes do cinema

hollywoodiano. Pois Marcelo e Patrícia formularam uma

receita de trabalho que rima com o nome escolhido. Para

deixar seus clientes elegantes, garbosos, glamourosos, eles

estão sempre em dia com as tendências, preocupam-se com

a atualização dos profissionais e dedicam-se a entender de

estilo de uma forma abrangente, não restrita aos

tratamentos estéticos. De formação, Patrícia é colorista e

maquiadora; Marcelo é cabeleireiro. Mas os dois têm no

DNA os genes da inquietação e da criatividade. O Garbo já

conquistou seu espaço em uma região altamente disputada:

Hilário Ribeiro, 208, fone 3022.4111.

MILENE LEAL, JORNALISTA

Glamour e estilo

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no Garbo Hair

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Page 12: Revista Estilo 34

Ele veio de Milão para Porto Alegre, mas no caminho

fez várias escalas. Mário Grandella aperfeiçoou seu

talento para a gastronomia em cidades tão diversas

como Londres, Cabo Verde, Moscou e Paris. Então

conheceu uma gaúcha, e o resto da história você pode

imaginar. Mas o que importa é que desde o início deste

ano ele está expondo seus dotes culinários no restau-

rante que batizou de Locanda del Mario, um local onde

a Itália se faz presente em receitas deliciosas, requinta-

das, inovadoras, com autêntico sotaque milanês. Além

de pastas saborosíssimas e risotos deliciosos, Mario

prepara com maestria peixes e frutos do mar, no ponto

exato de cozimento e tempero. Mas o melhor, a meu

ver, está reservado para o final da refeição: peça o

Tiramisu e coma ajoelhado, rezando para não ter que

dividir com ninguém. O Tiramisu do Locanda del

Mario é preparado com autêntico queijo mascarpone,

biscoitos perfeitos e toda a sabedoria de um chef que

se profissionalizou aos 14 anos de idade. O Locanda

del Mario, com apenas alguns meses de vida, já

desponta no cenário gastronômico gaúcho. Foi

escolhido o melhor restaurante italiano de Porto

Alegre pela revista Veja. Vá conferir: Rua Pedro Ivo,

492, Mont’Serrat, fone (51) 3028.8422.

MILENE LEAL, JORNALISTA

O CHEF MILANÊS QUE

CONQUISTOU OS GAÚCHOS

Quando começou a trabalhar com argila branca,

há cinco anos, a artista plástica Simone Vieira

descobriu os encantos das rosas modeladas à mão

e decidiu que elas seriam sua marca registrada.

Desde então, peças decorativas, como centros de

mesa, painéis, cúpulas e candelabros, recebem

delicadas aplicações de flores de cerâmica. Simone

garante que trabalhar em torno de um único tema

é um desafio para a imaginação. “Desenvolvo peças

com formas e cores exclusivas. As pessoas se

surpreendem com a versatilidade das rosas de

argila”, conta. No seu charmoso ateliê em Caxias

do Sul, na serra gaúcha, ela oferece uma linha

pronta e também cria modelos personalizados para

seus clientes. Telefone: (54) 9122-2755.

IRENE MARCONDES, JORNALISTA

Românticas

e femininasFO

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FOTO: LETÍCIA REMIÃO

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Page 13: Revista Estilo 34

O Armazém Ventura reúne delícias gastronômicas, uma

excelente carta de vinhos e um ambiente agradável para

encontrar os amigos, namorar ou simplesmente bater

papo. Os proprietários partiram do conceito dos velhos

armazéns e mercearias e criaram um ambiente aconche-

gante, que reúne nostalgia e modernidade. O casarão

que abriga o Armazém Ventura data do início do século.

O cardápio é cuidadosamente elaborado pela consultora

gastronômica Andréa Kasprzak, que supervisiona a

produção diariamente. As especialidades vão desde

receitas da mãe de um dos proprietários, como bolinho

de aipim e carne moída, até um charmoso peixe com

molho de champanhe e lascas de amêndoas. O Arma-

zém Ventura está localizado na Av. Nilópolis, número 5,

funciona de domingo a quinta das 10h30 à meia-noite e

sextas e sábados das 10h30 à 1h. Fone para reservas:

(51) 3388-5956. Aqui ao lado, confira uma receita

ideal para as noites frias, em frente à lareira, acompa-

nhada de um bom vinho e de um grande amor...

LIZE JUNG, JORNALISTA

CREME RÚSTICO COBERTO

COM MASSA FOLHADA

INGREDIENTES: 30 G DE COGUMELOS SECOS, 100 G DE

COGUMELOS PARIS, 200 G DE NATA, 250 ML DE LEITE,

50 G DE FARINHA DE TRIGO, 50 G DE MANTEIGA, 80 G

DE MASSA FOLHADA, 50 ML DE VINHO TINTO, SAL,

PIMENTA-DO-REINO, 1 GEMA.

MODO DE FAZER: HIDRATAR O COGUMELO SECO NA

ÁGUA E NO VINHO POR CERCA DE 45 MINUTOS. FAZER

UM MOLHO BECHAMEL COM A FARINHA, A MANTEIGA E

O LEITE. ACRESCENTAR O COGUMELO HIDRATADO E A

NATA POR ALGUNS MINUTOS (UTILIZAR A ÁGUA EM QUE

O COGUMELO FOI HIDRATADO). DISPOR O CREME QUEN-

TE EM CUMBUCAS QUE POSSAM IR AO FORNO. COBRIR

COM A MASSA FOLHADA PINCELADA COM A GEMA. AS-

SAR ATÉ QUE A MASSA ESTEJA DOURADA.

Armazém

de sabores

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Consumo

A tendência no Ocidente é se orientalizar. E vice-versa.

O JAPÃO E O OUTRO LADO

Ouvi do estilista Walter Rodrigues, apaixonado

pelo Japão: “Eles são tão parecidos fisicamente (pelo

menos a partir do olhar ocidental) que adoram se dife-

renciar. E uma das possibilidades de exercitar isso é

através da roupa”.

De fato. As japonesas são alucinadas por moda.

Ao ponto de lojas como Prada e Armani venderem

mais lá do que em qualquer outra cidade do mundo.

Mas o gosto pela moda no Japão não é só expressado

através desse mundo de grifes globalizadas. Outro fenô-

meno interessante é a forma original como eles montam

seus figurinos, buscando uma identidade exclusiva, uma

expressão da personalidade a qualquer custo, sem medo

de, eventualmente, esbarrar até no bizarro.

A busca frenética pela diferenciação é um vale-tudo.

Os jovens, meninos e meninas, saem de casa com

seu uniformes escolares. E já na estação de metrô come-

çam a desmontar a imagem de estudantes certinhos, par-

tindo para uma verdadeira farra-do-boi fashion. As ruas

em torno do bairro Harajuku são diariamente tomadas

por centenas de adolescentes modernérrimos e esquisi-

tos cuja vitória máxima é figurar nas páginas da revista

Fruits (www.fruits-mg.com) – uma publicação que edita

os melhores looks, fotografados ali na rua mesmo.

Calcule: em Tóquio são 27 milhões de habitantes.

Não existe meca maior do consumo no planeta.

Tudo é comprado e vendido 24 horas por dia.

Os modismos e tendências já nascem com data para aca-

bar. Bares lançados no final do ano passado já são consi-

derados ultrapassados.

A ansiedade talvez venha na contramão da paci-

ência, da contemplação, do respeito ao tempo das coisas,

princípios fundamentais da milenar cultura japonesa.

Já no outro lado do mundo, onde antigüidade sig-

nifica ter pouco mais do que 500 anos, a modernidade se

aplica a valores muito menos ancestrais.

A coisa por aqui, nas américas, ficou tão

despudoradamente dispersa e esvaziada de conteúdo e

valor que nunca se falou tanto em meditação, contem-

plação, ioga. Nunca se desejou tanto uma vida menos

ansiosa, menos consumista, mais interior. Ironia. A moda

do lado de cá é ser o que o lado de lá considera ultrapas-

sado: ser zen.

Se a tendência no Ocidente é se orientalizar e a

tendência no Oriente é se ocidentalizar, quem é mais

moderno?

Os adolescentes que fazem de tudo pra se diferen-

ciar ou os que têm orgulho de se vestir uns iguais aos

outros?

Resposta de cabeça pra baixo.

méugniN: atsopser

T E T Ê P A C H E C O

TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA

18 Estilo Zaffari

83677 consumo.p65 9/13/05, 3:38 PM1

Page 15: Revista Estilo 34
Page 16: Revista Estilo 34

Sabor

J O N N H Y F U J I M O T O

83677 sabor.p65 9/13/05, 5:41 PM2

Page 17: Revista Estilo 34

T E X T O S P A U L A T A I T E L B A U M

F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O

Sushi

zen

Estilo Zaffari 21

83677 sabor.p65 9/9/05, 9:17 PM3

Page 18: Revista Estilo 34

Eles devem manter as mãos frias e, de preferência,

o coração quente. É bom que tenham paciência, concen-

tração e habilidade. E que possuam com sua faca uma

relação de cumplicidade e confiança, como se o instru-

mento fosse uma extensão do próprio corpo. Mais do que

ser um profissional, o sushiman é um artista. Cada sushi

ou sashimi preparado é uma efêmera escultura, um pe-

queno bibelô, uma flor que desabrocha por entre os dedos

ágeis desse artesão. Seu atelier é o outro lado do balcão e

seus muitos admiradores possuem as mais variadas idades

e profissões. Ou seja, a obra do sushiman caiu no gosto

popular. É pop arte. Muito diferente de vinte e cinco anos

atrás, quando os Fujimoto tinham um pequeno ponto na

Ceasa e comer de pauzinhos era uma excentricidade. Um

quarto de século depois, a família cresceu, a decoração

mudou, o endereço virou dois: na Cristóvão e no Bourbon

Country. O patriarca, Rideu Fujimoto, já não está mais

do lado de lá do balcão. Assim como aquele que foi seu

primeiro assistente, o filho Jonnhy, que agora é um mo-

derno empresário do ramo zen gastronômico. Um sushizen.

Entro no restaurante Sakura e pergunto por Seu

Rideu. “O Gitian está aqui”, diz alguém apontando para

um senhor que lê seu jornal, sentado em frente ao balcão.

Do outro lado, três jovens sushimans preparam os apetre-

chos para dar início a mais uma noite no Sakura. Todos

respeitam o Gitian. E penso que a expressão japonesa talvez

signifique algo como “mestre”. Só depois de alguns minu-

O S U S H I M A N É U M S E N S Í V E L S A M U R A I D O S S A B O R E S

Sabor

22 Estilo Zaffari

83677 sabor.p65 9/9/05, 9:18 PM4

Page 19: Revista Estilo 34

R I D E U F U J I M O T O

83677 sabor.p65 9/12/05, 2:46 PM5

Page 20: Revista Estilo 34

Sabor

83677 sabor.p65 9/9/05, 9:21 PM6

Page 21: Revista Estilo 34

T R A D I Ç Ã O É O P R I N C I P A L T E M P E R O D A C O Z I N H A J A P O N E S A

tos de conversa tomo coragem para perguntar o que quer

dizer. “Vovozinho”, responde Seu Rideu, com um forte so-

taque oriental. Faz quase cinqüenta anos que ele chegou ao

Brasil e o idioma japonês ainda vive com todo vigor em sua

fala. É a força de quem se apega intensamente às suas ori-

gens para assim não perder a sua essência. Gitian me conta

que está aposentado. Só muito de vez em quando veste

suas roupas típicas, empunha suas facas e, como um samurai

renascido, inicia o ritual de cortar os peixes e moldar o

arroz. Quando faz isso, todos que estão por perto ficam fas-

cinados com sua destreza. “Meu pai faz tudo naturalmente,

sem pensar”, diz Jonnhy.

Jonnhy Fujimoto é o principal discípulo do pai. Co-

meçou na cozinha, lavando louça e arroz. Em 1988 foi

para o Japão e lá ficou por quase cinco anos. “Foi assisten-

te de algum sushiman?”, pergunto eu. “Não, não, lá fiz

outras coisas. No Japão, se você diz que vai ficar menos

de dez anos, o sushiman não pega você para assistente,

tem que ficar muito tempo...” Jonnhy me explica que um

verdadeiro sushiman leva anos para dominar a sua técni-

ca, pois é preciso paciência e persistência para deixar o

ofício penetrar na alma. O aprendiz precisa observar mui-

to, já que o mestre normalmente dá poucas explicações.

“O assistente tem que ter sensibilidade, pode perguntar,

pode até errar, mas deve ter iniciativa”, diz Jonnhy. Con-

tinuo querendo saber mais sobre como as coisas são no

Japão e ele me conta que lá existem restaurantes só com

Estilo Zaffari 25

83677 sabor.p65 9/13/05, 5:41 PM7

Page 22: Revista Estilo 34

C O M I D A F E I T A P A R A C O N T E M P L A R A N T E S D E D E G U S T A R

Sabor

mulheres, as sushiwomans. Aproveito para tirar uma dú-

vida: se é verdade que as mãos femininas não são tão

boas para preparar sushi e sashimi por serem mais quen-

tes. Seu Rideu parece não ter certeza sobre isso, mas fala

que as mulheres normalmente usam mais perfume, o que

é desaconselhável, já que o peixe cru absorve qualquer

odor que passa por perto. Já Jonnhy concorda que a tem-

peratura corporal feminina é mais sujeita a mudanças, mas

diz que isso não chega a ser um problema. “Conheci um

sushiman que colocava as mãos no gelo”, conta.

O objetivo da culinária japonesa é aproximar a co-

mida de como ela é na natureza. Não se mói, não se cozi-

nha muito, não se pica nada. O que é frio deve ser degus-

tado bem frio. E o que é quente, bem quente. Não há

excesso de ingredientes, e ao olhar o prato a pessoa deve

identificar todas as iguarias.

O bom é que conseguir o que você precisa para pre-

parar uma nipodelícia está muito mais fácil do que quan-

do Seu Rideu abriu o restaurante. Nos primórdios do

Sakura, encontrar atum ou salmão fresco era coisa rara,

enquanto hoje a oferta é grande e há fornecedores

especializados. Você tem praticamente tudo do que pre-

cisa nos supermercados Zaffari. Tudo para preparar as

receitas que seguem e que foram gentilmente cedidas pela

família Fujimoto. Caso você fique com água na boca, mas

chegue à conclusão de que não tem habilidade suficiente

para o preparo, não se aflija. O Sakura está aí para isso.

26 Estilo Zaffari

83677 sabor.p65 9/14/05, 10:33 AM8

Page 23: Revista Estilo 34

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Page 24: Revista Estilo 34

Sabor

83677 sabor.p65 9/9/05, 9:22 PM10

Page 25: Revista Estilo 34

Sashimi

PEIXES FRESCOS COMO: ATUM, SALMÃO,

NAMORADO, LINGUADO, OLHETE, PARGO, ETC.

NABO COMPRIDO

SHOYU – MOLHO DE SOJA

RAIZ FORTE (WASABI)

PEPINO JAPONÊS

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Corte o nabo em tiras bem fininhas e deixe em água cor-

rente por, no mínimo, 10 minutos. Preparando a raiz forte:

se for em pó, faça uma pasta acrescentando água aos pou-

cos e mexendo sempre rapidamente, até ficar homogênea.

Tampe por alguns instantes. Existem pastas prontas em

lojas especializadas ou mercados. Depois de lavado, o pe-

pino deverá ser cortado com a casca em fatias delicadas

para decorar, entre o nabo e os peixes. Separe os filés de

peixe e corte-os com 3 cm a 4 cm de largura. Certifique-se

de que não há espinhas. Após, fatie os filés na diagonal

das fibras, utilizando toda a extensão da faca, com mais ou

menos 1 cm cada fatia. Disponha as fatias num prato ade-

quado para sashimi, apoiando as fatias dos peixes nas por-

ções de nabo ralado, como se fosse um leque. É importante

montar o prato com cores contrastantes. A forma correta

de comer um sashimi começa com o preparo do tempero:

coloque uma pequena quantidade de shoyu e wasabi (aque-

la preparada anteriormente) num pequeno recipiente

(kozara), misturando bem e completando com mais shoyu

a seu gosto. Passe delicadamente as fatias no molho, uma

de cada vez, sem soltá-las dos palitinhos (hashis). O nabo

ralado, além de decorar, é importante para a digestão do

peixe cru. Para o consumo de peixe cru, devem ser usados

os 5 sentidos: visão, tato, paladar, olfato e audição (este

serve para escutar o que o vendedor lhe fala). Se houver

desconfiança em algum desses, não adquira o pescado. Caso

não saiba comprar e limpar um peixe, peça para o peixeiro

de sua confiança fazer isto por você, observando onde e

como limpa. A faca deve ser extremamente afiada e espe-

cial para este tipo de corte. Cuidados e precisão são ele-

mentares. Se não tiver faca especial, use uma fina e reta. O

sashimi deve ser consumido o quanto antes, para que os

peixes não percam a temperatura e o sabor ideais.

Fatias de Peixes Crus

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Lave o Kombu em água corrente. Coloque em uma panela

junto com a água e deixe ferver. Retire o Kombu, diminua

o fogo e acrescente o Katsuobushi ou Hondashi. Deixe por

um ou dois minutos e desligue. Filtre e guarde. O Kombu

Dashi é um dos caldos básicos mais utilizados na cozinha

japonesa. Utilizado como base para sopas, molhos e cozi-

mento.

Kombu Dashi

Caldo Básico

1 KOMBU (ALGA MARINHA) COM CERCA

DE 20 CM

1,5 LITRO DE ÁGUA

30 G DE KATSUOBUSHI (RASPAS DE PEIXE

BONITO SECO) OU 2 COLHERES (CHÁ) DE

HONDASHI (EXTRATO DE PÓ DE PEIXE BONITO)

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Lave o Tofu e corte em cubinhos. Coloque para cozinhar

junto com o Moyashi em uma panela com o Dashi. Desli-

gue antes de ferver. Dissolva o Misô com um coador no

Dashi. Sirva em tigelas.

Misoshiro

Sopa de Misô

2 XÍCARAS DE DASHI (CALDO BÁSICO)

2 COLHERES (SOPA) DE MISÔ (PASTA DE SOJA)

50 G DE TOFU (QUEIJO DE SOJA)

½ XÍCARA DE MOYASHI (BROTO DE FEIJÃO)

Estilo Zaffari 29

83677 sabor.p65 9/13/05, 5:56 PM11

Page 26: Revista Estilo 34

Sabor

1 LULA MÉDIA (SÓ O “TUBO”) LIMPA E FRESCA

80 G DE COGUMELOS SHIMEJI FRESCOS

2 COLHERES (SOPA) DE SHOYU

2 COLHERES DE MANTEIGA

1 COLHER (SOPA) DE MIRIN (SAKÊ DE COZINHA)

Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:

Pré-aqueça uma frigideira e coloque 1 colher (sopa) de man-

teiga e refogue os cogumelos ligeiramente. Acrescente o shoyu

e o mirin e deixe cozinhar em fogo baixo por cerca de 5 minu-

tos. Desligue. Preencha a lula com este recheio e feche-a com

um palito. Em seguida, em outra frigideira, coloque 1 colher

(sopa) de manteiga ou azeite e doure a lula em fogo médio

por 2 minutos de cada lado. Retire a lula da frigideira e com

uma faca afiada corte a lula em anéis e disponha no prato.

Decore ao seu gosto.

Ika no Bata

Lula na Manteiga Recheada com Shimeji

Sabor

Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:

Lave os pepinos. Retire um pouco da casca, corte ao meio

no sentido do comprimento e remova as sementes. Corte

em fatias finas. Coloque em uma tigela e salpique com sal.

Deixe descansar por meia hora. Esprema e retire o excesso

de líquido. Acrescente os outros ingredientes e misture.

Sunomono

Salada de Pepino com Kani

3 PEPINOS JAPONESES

½ COLHER (SOPA) DE SAL

1 COLHER (SOPA) DE AÇÚCAR

2 COLHERES (SOPA) DE VINAGRE BRANCO

2 TABLETES DE KANI DESFIADO

30 Estilo Zaffari

83677 sabor.p65 9/13/05, 5:49 PM12

Page 27: Revista Estilo 34

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Page 28: Revista Estilo 34

Sabor

83677 sabor.p65 9/9/05, 9:24 PM14

Page 29: Revista Estilo 34

200 G DE MASSA PARA YAKISOBA (PODE SER

NISSIN)

50 G DE CAMARÕES MÉDIOS

160 G DE LEGUMES VARIADOS À SUA ESCOLHA

(ACELGA, REPOLHO, CENOURA, BRÓCOLIS,

COUVE-FLOR, VAGEM TORTA). PODE-SE USAR

BROTO DE BAMBU (TAKENOKO) E DE FEIJÃO

(MOYASHI).

ÓLEOS DE GIRASSOL E GERGELIM

CEBOLINHA PICADA

1 XÍCARA DE CALDO BÁSICO DE FRANGO

AMIDO DE MILHO

AJI-NO-MOTO

2 COLHERES (SOPA) DE SHOYU

Yakisoba

Massa Frita com Camarões e Legumes

Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:

Cozinhe a massa al dente e escorra na água fria e reserve.

Numa panela wok ou, se não tiver, frigideira grande antiade-

rente, aqueça o óleo de girassol suficiente para cobrir a meta-

de da massa e frite-a levemente. Retire e deixe escorrer o ex-

cesso de óleo. Limpe e unte a panela para refogar primeiro os

camarões picados e depois os legumes. Não cozinhe demais.

Acrescente o shoyu, uma pitada de aji-no-moto e misture ra-

pidamente; depois, o caldo de frango. Deixe ferver e coloque

um pouquinho de amido de milho para encorpar. Desligue e

acrescente a cebolinha picada e o óleo de gergelim. Numa

travessa coloque a massa e cubra-a com o molho de legumes.

Obs.: o fogo deve ser sempre o mais alto possível, para que os

ingredientes não cozinhem demais, apenas fiquem refogados.

2 LOMBOS DE PORCO (180 G CADA)

4 FOLHAS DE REPOLHO FINAMENTE FATIADO

1 COLHER (SOPA) DE ÓLEO

MOLHO DE GENGIBRE

4 COLHERES (SOPA) DE SHOYU (MOLHO DE

SOJA)

4 COLHERES (SOPA) DE SAKÊ

2 COLHERES (SOPA) DE MIRIN (SAKÊ DE

COZINHA)

1 COLHER (SOPA) DE GENGIBRE RALADO

2 COLHERES DE AÇÚCAR

Shoga-Yaki

Lombo Temperado com Gengibre

Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:

Combine os ingredientes do molho de gengibre numa ba-

cia, e deixe os lombos de porco marinando por 10 a 15 mi-

nutos. Aqueça uma frigideira com o óleo. Retire os lombos

do molho e frite em fogo alto por 2 a 3 minutos, até dou-

rar de um lado. Vire, diminua o fogo e frite tampando a

frigideira por mais 4 minutos. Retire da frigideira. Colo-

que o molho de gengibre para aquecer na frigideira num

fogo médio e cozinhe em fogo baixo por 2 minutos. Sirva

num prato decorando com o repolho. Derrame o molho da

frigideira sobre os lombos.

Estilo Zaffari 33

83677 sabor.p65 9/13/05, 5:55 PM15

Page 30: Revista Estilo 34

Bom conselho

P O R M A L U C O E L H O

SABEDORIA JAPONESA

34 Estilo Zaffari

Um país com costumes tão diferentes, conhecido pela forma

peculiar de ver a natureza, a religião, as artes, o trabalho, a família e

por sua sabedoria milenar. Ao falar no Japão acabamos nos trans-

portando a um mundo muito especial, de real beleza. Além disso,

tudo que se conhece das atitudes dos japoneses nos faz realmente

admirá-los e imaginar que temos muito a aprender.

A graciosidade dos origamis

O apreço aos detalhes popularizou o origami, que é muito mais do

que simplesmente dobradura em papel – é delicadeza, perfeição, fé,

esperança, oração, saúde, fortuna, distração e paz.

O origami mais popular do Japão é o tsuru, “garça da sorte”. Con-

siderada uma das dobraduras mais perfeitas, pois a sua forma serve de

base para compor outras dobraduras, desde animais até plantas.

Que tal uma Garça da Sorte?

Além da função decorativa, a garça passou a ser oferecida em

altares e templos, e ao dobrar a figura as pessoas depositam nela

toda fé e esperança. Antigamente se costumava pendurar essas aves

de papel no teto para distrair as crianças, especialmente bebês –

dizia-se que ela trazia longevidade.

Nos dias atuais a garça de papel é utilizada na decoração de

presentes, em casamentos, ano-novo, nascimentos e todo tipo de

comemoração festiva, simbolizando saúde e fortuna.

Crendices ou não, o certo é que as pessoas se unem no Japão

todos os anos, para confeccionar milhares de garças e depositar no

Monumento da Paz em Hiroshima, onde caiu a bomba atômica,

formando uma corrente de pensamento positivo pela paz mundial.

Se você está com vontade de fazer algum tipo de arte, o origami

não representa nenhum custo. Só leva papel, paciência, habilidade

manual e dedicação. E acima de tudo pode lhe trazer muita sorte e

vida longa. Os japoneses que o digam!

SÃO OU NÃO SÃO CHEIOS DE MISTÉRIOS?

O MÓBILE DE ORIGAMI QUE

ENFEITA ESTA PÁGINA É UM

TSURU E FOI CONFECCIO-

NADO PELA DESIGNER MA-

RIANA REIS, ESPECIALMEN-

TE PARA A ESTILO ZAFFARI.

FONE: 9955.3098.

83677 bom conselho.p65 9/13/05, 9:25 PM1

Page 31: Revista Estilo 34
Page 32: Revista Estilo 34

MAIOR TORII DO JAPÃO, NO MAR SETO (VISTO DO SANTUÁRIO DE ITSUKUSHIMA)

Viagem

83677 viagem Japao.p65 9/13/05, 3:12 PM2

Page 33: Revista Estilo 34

às avessasT E X T O S E F O T O S A N G E L A F A R I A S

Mundo

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:36 PM3

Page 34: Revista Estilo 34

Formado por um arquipélago de cerca de 4 mil ilhas, o

Japão é um lugar fascinante. Da agitada Tóquio à ilha sagra-

da de Miyajima, aqui há muito o que aprender. O povo é

gentil, reservado, religioso, trabalhador e em plena era da

globalização faz questão de manter intactos sua cultura e

seus costumes. Terra de aparentes contradições... Bem-vin-

dos ao Nippon, ou “terra do sol nascente”!

A primeira sensação que se tem ao chegar no Japão

é de que o mundo virou às avessas: trocamos o dia pela

noite, o verão pelo inverno e o trânsito tem mão inglesa.

Tarefa complicada até para os próprios japoneses,

encontrar endereços em Tóquio é uma aventura: fora as

grandes avenidas, a maioria das ruas não têm nome e a

numeração dos prédios não é por ordem seqüencial, mas

em ordem de construção. Para driblar este caos, consiga

sempre um mapa detalhado com explicações do tipo:

descer na estação de metrô “X”, saída “Y”, andar 50 m

até a loja de bicicletas, virar à direita, andar até o café e

atravessar a rua... Não se preocupe, esta é uma prática

absolutamente corriqueira para eles.

AO CHEGAR, A

SENSAÇÃO É DE QUE

O MUNDO VIROU ÀS

AVESSAS: TROCAMOS

O DIA PELA NOITE, O

VERÃO PELO INVERNO

MERCADO DE PEIXES E MAIOR TORII DO JAPÃO, NO MAR SETO

38 Estilo Zaffari

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:37 PM4

Page 35: Revista Estilo 34

Encontro meu prédio e digito a senha para entrar.

Isto é Japão! Uma sucessão de duas ou três portas automá-

ticas me faz lembrar a abertura do “Agente 86”. O apar-

tamento não é tão pequeno como a maioria de nós imagi-

na. Aqui há milhares de “JKs” bem menores... O que

chama a atenção é o pé-direito, muito mais baixo do

que o nosso. Basta levantar o braço e encosto a mão no

teto! E eu só tenho 1,63 m!

Está escuro lá fora e um cansaço terrível me abate. Eu,

que não sou de dormir cedo, vou ter que me entregar a

Morfeu. Devem ser 10h da noite. Os efeitos do jet lag são

avassaladores – só de Guarulhos a Narita são 24 horas de

vôo, somadas ao trecho Porto Alegre–São Paulo, mais es-

peras no aeroporto, uma hora e meia de ônibus de Narita

até Tóquio e doze horas de diferença de fuso horário. Mas

não é hora para matemática, e o sono é grande. Só por curi-

osidade, dou uma olhadinha no relógio: 5 da tarde! Não

pode ser! Azar, vou ter que dormir.

Totalmente renovada, desperto às 3h com todo o

gás e ansiosa por conhecer de perto esta terra tão dife-

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:22 PM5

Page 36: Revista Estilo 34

rente da nossa. A vontade de sair é tanta que não consigo

esperar o sol raiar e me aventuro pelas calçadas de Tóquio.

A fama de que esta é uma das cidades mais seguras do mun-

do é suficiente para me arrancar de casa. Saio a pé para

conhecer o bairro, Akasaka, de madrugada, o que em qual-

quer outro canto do mundo seria no mínimo uma impru-

dência. Em Tóquio decididamente não é! Há várias pessoas

na rua passeando com seus cachorros. Em quase todos os

quarteirões há quitandas e lojinhas de conveniências aber-

tas 24 horas. E pessoas comprando!

Finalmente amanhece. A cidade é linda, a limpeza

impecável. Mesmo que se procure não há sequer baganas

de cigarro pelo chão – e como eles fumam! A elegância

das japonesas chama a atenção tanto quanto o equilí-

brio que desenvolvem sobre sapatos de plataformas gi-

gantes. Mas confesso que vi algumas torcendo o pé...

Começa a se formar um formigueiro humano – Tó-

quio tem cerca de 12,5 milhões de habitantes. Enquanto

alguns vão de carro, a pé ou de bicicleta, milhões de japo-

neses e eu nos dirigimos ao metrô. A rede é muito eficien-

Viagem

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:39 PM6

Page 37: Revista Estilo 34

te e abrange praticamente toda a cidade. É fácil entender

as placas de sinalização das estações.

Os japoneses em Tóquio andam com uma rapidez

impressionante. O ritmo é frenético e me dou conta de

que este movimento é apenas uma outra face da rapidez

com que o Japão se desenvolveu após a guerra e da velo-

cidade com que inventam tecnologias de ponta. Não é à

toa que projetaram o shinkansen, trem-bala que alcança

até 275 km/h, e os maglev, que em vez de rodas usam

ímãs e atingem mais de 500 km/h.

Vou para Akihabara, o bairro dos eletrônicos. E é

preciso preparar o espírito: lá tem tanta novidade tec-

nológica que você sai com a sensação de, no Brasil, viver

na era das cavernas. Mas este não é um bom lugar de

compras para nós, pobres dinossauros. Além dos preços

muito altos, grande parte da tecnologia não está dispo-

nível no Brasil e você pode ter problemas para encon-

trar assistência técnica especializada.

Um dos bairros mais bacanas de Tóquio é Harajuku.

E domingo pela manhã é o dia certo para visitá-lo. É bom

HARAJUKU É O

BAIRRO MAIS

DESCOLADO DE

TÓQUIO. OS JOVENS

SE FANTASIAM PARA

SEREM FOTOGRAFADOS

ADOLESCENTE EM HARAJUKU E TALISMÃS PARA SAÚDE, VITÓRIA, PROTEÇÃO CONTRA TERREMOTOS...

Estilo Zaffari 41

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:19 PM7

Page 38: Revista Estilo 34

TEMPLO KINKAKUJI (OU TEMPLO DE OURO), EM QUIOTO

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 8:08 PM8

Page 39: Revista Estilo 34

chegar antes das 10h, quando o movimento ainda é pe-

queno. Depois, tem tanta gente que mal se consegue an-

dar. Imagine a multidão da Rua da Praia na hora do almo-

ço e multiplique por cem! Mas se você não conseguir acor-

dar cedo, não desista: encare o formigueiro, porque o pas-

seio vale a pena! É para lá que se dirigem centenas de

jovens com cabeças e sacolas cheias de fantasias. Encon-

tram a sua “tribo” e começam a superprodução: maquia-

gem caprichada e roupas extravagantes, eles normalmen-

te copiam o estilo das bandas de rock japonesas e se diver-

tem posando para os curiosos fotografarem. Tudo muito

colorido, eles pontuam a sua popularidade de acordo com

o número de pessoas que pedem para fotografá-los. Aqui,

quantidade é sinônimo de qualidade.

Se você tiver sorte também pode assistir a algum

show de dança ou de rock japonês. Os novos artistas se

apresentam na praça, na esperança de que algum produ-

tor esteja assistindo e lhes ofereça um contrato. Algu-

mas bandas de sucesso surgiram assim. Harajuku tam-

bém é cheio de brechós, butiques ultramodernas e cafés

com mesas nas calçadas. Aqui é um ótimo lugar para

comprar artigos regionais. O Oriental Bazaar é conheci-

do como a melhor loja para encontrar quimonos, xilo-

gravuras, cerâmicas, artesanatos em madeira, papel e até

mesmo móveis.

À noite, dê um passeio pela Av. Ginza. Cheia de

painéis eletrônicos e vitrines sonorizadas, lembra um

pouco Nova Iorque, só que é muito mais legal.

A comida

Não gostar de comida japonesa ou falta de habilida-

de com os hashi – pauzinhos – não são desculpas para evi-

tar o Japão. Inúmeras são as opções gastronômicas dispo-

níveis: da sofisticada cozinha francesa ao fast food, passan-

do por churrascarias, restaurantes italianos, mexicanos,

chineses, tailandeses ou indianos. Em qualquer um deles

você será muito bem servido e atendido, mas atenção:

nem pense em dar gorjeta! Este hábito é considerado uma

indelicadeza, e além de não aceitarem de jeito nenhum os

japoneses se sentem muito ofendidos. Muitos restauran-

tes têm uma vitrine com cópias perfeitas dos pratos feitas

em plástico ou resina. Se você não entender o cardápio é

só mostrar o prato que deseja.

Para os amantes da culinária japonesa, o óbvio: você

está no paraíso! Mas o detalhe que conta e que faz toda a

diferença é que todos os pratos são elaborados com in-

gredientes extremamente frescos. Os peixes para o pre-

paro dos sashimis saem praticamente do mar para a mesa,

o que lhes confere um sabor especial. No mercado ataca-

dista de peixes Tsukiji, os barcos abarrotados de frutos do

mar e peixes chegam por volta das 3h da manhã e lá pelas

6h começam os leilões. Dali saem quase todos os peixes que

A IMAGEM DO

TEMPLO FOLHEADO

A OURO REFLETIDA

NO LAGO DE QUIOTO

É INESQUECÍVEL

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:20 PM9

Page 40: Revista Estilo 34

vão ser consumidos durante o dia em Tóquio. Nos arredo-

res do mercado há inúmeras bancas que vendem peixes e

frutos do mar direto para o consumidor. Muitos japoneses

comem sushi no café da manhã!

A comunicação

Apesar do confuso sistema de endereços, não é di-

fícil andar sozinho pelo Japão. Pelo menos nas grandes

cidades as informações principais estão disponíveis tam-

bém em inglês. Mas prepare-se para, em determinadas

circunstâncias, sentir-se um analfabeto: até hoje eu não

sei se não comprei ração para cachorro pensando ser

uma caixa de Sucrilhos... Pior que isso, além de não ler

ou escrever, você ainda não entende o que eles falam.

Em geral, esta situação não é assim tão desesperado-

ra porque a maioria dos japoneses, principalmente os mais

jovens, entende o inglês. Você pode “fisgar” o japonês com

um sumimasen – com licença – e pedir as informações em

inglês. O povo é muito gentil e atencioso, e se você pedir

uma informação para um japonês que não fale inglês, te-

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:33 PM10

Page 41: Revista Estilo 34

AO ENTRAR NOS

TEMPLOS E NAS CASAS

VOCÊ DEVE TIRAR

OS SAPATOS. FICAR

CALÇADO É GAFE!

nha certeza de que ele ficará muito mais desesperado do

que você e sairá, ele mesmo, à procura de alguém que possa

ajudar. É comum que alguns deles entendam bem o inglês

escrito, então tenha sempre papel e caneta à mão.

No entanto, mesmo para os que têm o inglês fluen-

te, é necessário fazer algumas “adaptações” para en-

tender o sotaque carregado dos japoneses. Eles não

conseguem pronunciar o “l”, então o substituem por

“r”. O “v” é trocado por “b”. Quando há duas consoan-

tes juntas ou uma consoante muda no fim da palavra,

acrescenta-se um “a”, “o” ou “u”, conforme o caso. Com-

plicou? Aqui vão alguns exemplos: Milk, leite, vira mi-

roko, hot dog passa a ser hoto dogo, Yakult é yakuruto,

Mc’Donalds, macu donaruto, Varig Brazilian Airlines fica

muito engraçado: Barigu Burazirianu Airurines... Não tem

jeito, é preciso acostumar o ouvido, e se você conseguir

imitá-los fica mais fácil de se fazer entender.

Aqui tira sapato!

A maior e pior gafe que você pode cometer no Japão é,

SANTUÁRIO DE ITSUKUSHIMA EM MIYAJIMA - PALCO E LANTERNA DE PEDRA

Estilo Zaffari 45

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:40 PM11

Page 42: Revista Estilo 34

OS CERVOS SÃO

CONSIDERADOS

MENSAGEIROS DOS

DEUSES. ESTES EU

FOTOGRAFEI NA

ILHA DE MIYAJIMA

ao entrar em uma residência, não trocar os sapatos pelos

chinelinhos que ficam na entrada. Para os japoneses, as

impurezas vindas do exterior não devem ser levadas para

dentro de um lar. Você também deve tirar os sapatos ao

entrar em templos, restaurantes tradicionais, provadores

de lojas e ryokans – hospedarias em estilo japonês. E se em

qualquer outro lugar você vir os chinelinhos na porta, não

hesite. Caso você tenha que pisar em um tatame, tire os

chinelos e fique descalço ou de meias. Um detalhe impor-

tante: quando for ao banheiro, você precisará trocar os chi-

nelos por outros de borracha ou de plástico. Não esqueça de

destrocá-los ao sair. Quando isto acontece – com um oci-

dental, é claro! –, eles acham constrangedor e engraçado.

Peça desculpas e vá correndo trocar.

Evitando micos

Alguns detalhes são imprescindíveis para enfrentar

com elegância as enormes diferenças culturais entre nós,

brasileiros, e os japoneses. Ao cumprimentá-los, em hi-

pótese alguma os beije ou abrace, e evite o aperto de mão.

CERVOS EM MIYAJIMA E LANTERNAS JAPONESAS

46 Estilo Zaffari

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:41 PM12

Page 43: Revista Estilo 34

Qualquer contato físico é considerado extremamente ín-

timo para um cumprimento. Os japoneses deixam os bra-

ços estendidos ao longo do corpo e o curvam para a frente

a partir da altura do quadril. Mas há uma série de regras a

serem seguidas neste gesto aparentemente simples. O grau

de curvatura do corpo e quem levanta antes é algo deter-

minado pela idade e pela hierarquia das pessoas envolvi-

das no cumprimento. Para não fazer feio, não tente imitá-

los. O mais adequado é um simples sorriso. Assim você

não cometerá nenhuma indelicadeza e eles entenderão

que você não conhece as regras por ser um estrangeiro.

Olhar para um japonês diretamente nos olhos é,

praticamente, o mesmo que xingá-lo. A menos que você

queira partir para a briga, ao conversar com um japonês

olhe na altura dos seus ombros. Ao receber um cartão de

visitas – e você receberá muitos – segure-o com as duas

mãos e olhe-o com muita atenção, mesmo que você não

entenda nada, por alguns segundos antes de guardá-lo.

E, finalmente, se for brindar com alguém, diga

“kanpai”. Lembre-se: nunca, jamais, nem que o mundo

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:20 PM13

Page 44: Revista Estilo 34

OS PEIXES SAEM

PRATICAMENTE DO

MAR PARA A MESA. OS

MERCADOS SÃO UMA

ATRAÇÃO À PARTE

acabe, diga “tintim”! O que significa? Uma maneira pouco

polida de se referir ao órgão sexual masculino. Chato, né?

Viajando pela Ilha de Honshu

É hora de pegar o shinkansen e ir para o sudoeste.

Até Quioto, parada obrigatória, são 512 km e somente

2h40min de viagem. No caminho, a apenas meia hora

de Tóquio, você pode ver pela janela o monte Fuji, cari-

nhosamente chamado de Fuji-san pelos japoneses. Qui-

oto foi, por mais de mil anos, a capital do Japão. Observe

que o caractere “quio”, que significa “capital”, aparece

tanto em Quioto como em Tóquio, que se chamava Edo

antes de a capital ser transferida para lá. Das principais

cidades japonesas, Quioto foi a única que escapou dos

bombardeios da segunda guerra, transformando-se em

símbolo da história do Japão. A cidade é um charme e

algumas casas têm bonsais na entrada. Dentre inúmeras

opções, resolvi visitar o Templo Ryoanji, a fim de co-

nhecer o mais famoso jardim de pedras, ícone do zen-

budismo japonês. De uma porção de seixos brancos cui-

MERCADO DE PEIXES

48 Estilo Zaffari

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:41 PM14

Page 45: Revista Estilo 34

dadosamente alinhados emergem quinze pedras que re-

presentam ilhas ou montanhas no mar. Recomenda-se

que a pessoa sente em frente a ele em estado contempla-

tivo. Juro, tentei obedecer. Mas em menos de cinco mi-

nutos fui invadida por uma terrível sensação de culpa:

eu tinha pouco tempo para ficar na cidade e me ator-

mentava a idéia de não estar me dirigindo a pelo menos

mais um dos 1.599 templos budistas restantes ou um dos

cerca de 300 santuários xintoístas existentes em Quio-

to. Saí de fininho tentando me esconder da minha pró-

pria falta de paz de espírito e sucumbi ao meu desejo de

turista-correndo-tentando-ver-tudo-o-que-dá!

Visitei, ainda, alguns jardins japoneses maravilhosos

e fui para o Kinkakuji, réplica do pavilhão de ouro construí-

do por um xogum em 1390 e destruído por um incêndio. A

imagem do tempo folheado a ouro refletida no lago é mais

uma das agradáveis lembranças que trago do Japão.

Nara, conhecida como Heijo-ko – cidadela da paz –,

foi a primeira capital do Japão e fica bem pertinho, cerca

de 40 km de Quioto. Vale a pena conhecer o Templo To-

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:21 PM15

Page 46: Revista Estilo 34

CASTELO SHIRASAGI-JO OU CASTELO DA GARÇA BRANCA, EM HIMEJI

Viagem

83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:42 PM16

Page 47: Revista Estilo 34

daiji, construído em meados dos anos 700, e o Daibutsu,

que é uma imagem de Buda de 15m de altura feita em

Bronze. Passear no Parque de Nara é uma delícia, e você

pode ver centenas de cervos andando livremente.

Himeji localiza-se a 130 km de Quioto e é a cidade

que abriga um dos castelos – ex-fortaleza militar – mais

lindos do Japão. O castelo, que hoje é patrimônio da hu-

manidade, aparece no filme Ran, de Akira Kurosawa, e é

conhecido como Shirasagi-jo, ou “castelo da garça bran-

ca”. Dizem os japoneses – que imaginação fértil! – que o

formato das paredes brancas do castelo lembra a ave vo-

ando na planície... Mais do que um legado atômico, Hi-

roshima é uma cidade bonita e moderna. Não fosse pelo

Parque, pelo Museu Memorial da Paz e pelo Domo da Bom-

ba-A – ruína do único prédio que sobrou após a explosão

–, seria difícil imaginar que já foi o palco de uma das mai-

ores tragédias da humanidade. O mais bonito de Hiroshi-

ma é, sem dúvida, a postura dos japoneses em relação ao

seu passado: eles não lamentam o horror, simplesmente

lutam e promovem a paz mundial. O museu está ali ape-

nas como um exemplo a não ser seguido. Ainda assim, a

visita ao Memorial da Paz foi um golpe forte. Saí de lá

completamente calada, sem pensamentos, vazia de tudo...

Sensação de flutuar

Por sorte, ali, quase ao lado, a apenas 13 km de Hi-

roshima, fica a ilha de Miyajima. Para chegar a ela é preci-

so pegar um trem e uma balsa que leva mais ou menos 10

minutos para cruzar o mar Seto. Do mar se ergue o maior

torii – pórtico, este com mais de 16 m de altura – do Japão,

indicando que a partir dali o território é sagrado. Tão sa-

grado que antigamente era proibido nascer ou morrer em

Miyajima. As mulheres grávidas e os doentes eram imedi-

atamente afastados de lá, para evitar que cenas demasiado

humanas acontecessem na ilha. Até hoje não há cemité-

rios ou maternidades no local. Coberta por florestas vir-

gens, Miyajima tem cerca de 31 km de circunferência.

A mais ou menos 10 minutos a pé partindo do píer está a

principal atração da ilha: o Santuário de Itsukushima,

construído em 592 em homenagem a três deusas. Nesta

pequena caminhada, dezenas de cervos extremamente

mansos vieram ao meu encontro. Não deve ser por acaso

que esses simpáticos animais são considerados “os men-

sageiros dos deuses”. A companhia deles foi muito diver-

tida e deixei para trás o “efeito Hiroshima”. Ao chegar no

santuário, procurei um monge para saber a que horas a

maré estaria cheia. Ele puxou um livrinho com uma tabe-

la e falou um horário preciso, algo como 11h38min. Tão

pontual como os japoneses – que são mais pontuais que os

ingleses –, o mar parou de subir na hora exata. O templo

pareceu flutuar sobre as águas tanto quanto, algumas ho-

ras depois, eu deixei a ilha... Flutuando...

CURIOSIDADES

OS CÃES E OS GATOS SÃO MUITO GORDOS NO JAPÃO.

OS JAPONESES ADORAM LER NO METRÔ, MAS ELES

SEMPRE ENCAPAM OS LIVROS PARA QUE NINGUÉM SAIBA

O QUE ESTÃO LENDO.

POR CERCA DE CEM DÓLARES, ELES PODEM ALUGAR

UM CACHORRO PARA PASSEAR COM O BICHO PELAS RUAS

DE TÓQUIO.

OS JAPONESES SE SENTEM TÃO CONSTRANGIDOS AO

FREQÜENTAR BANHEIROS PÚBLICOS QUE ALGUNS TÊM

ALTO-FALANTES EMITINDO O SOM DA DESCARGA PARA

QUE QUEM ESTEJA DO LADO DE FORA NÃO PRECISE OU-

VIR “OUTRO TIPO DE BARULHO”.

POR CAUSA DA COMPLICAÇÃO EM ACHAR ENDEREÇOS,

OS TAXISTAS SÓ PARAM PARA OCIDENTAIS SE ELES TI-

VEREM NA MÃO O CARTÃO DE VISITAS DO HOTEL OU DO

LUGAR ONDE QUEREM IR. AS PORTAS DOS TÁXIS ABREM

E FECHAM AUTOMATICAMENTE, E OS MOTORISTAS SEM-

PRE USAM LUVAS BRANCAS.

NOS RESTAURANTES, UMA HORA ANTES DE FECHAR

ELES ANUNCIAM O HORÁRIO, PARA QUE OS COMENSAIS

POSSAM FAZER O ÚLTIMO PEDIDO.

QUANDO VOCÊ ENTRA EM UMA LOJA OU RESTAURAN-

TE, ELES SEMPRE FALAM “IRASHAIMASE” – BEM-VINDO!

ALGUNS TURISTAS DESAVISADOS DÃO MEIA-VOLTA,

ACHANDO QUE ESTÃO SENDO EXPULSOS!

SE VOCÊ ESTÁ EM UM SHOPPING QUASE NA HORA DE

FECHAR, TODOS OS FUNCIONÁRIOS FAZEM UMA FILEIRA

FORMANDO UM CORREDOR NA PORTA. QUANDO VOCÊ

PASSA, ELES SE CURVAM PARA CUMPRIMENTÁ-LO.

A VARIEDADE DOS CARACTERES JAPONESES É TÃO GRAN-

DE QUE MESMO UM JAPONÊS CONSIDERADO EXTREMA-

MENTE CULTO NÃO É CAPAZ DE IDENTIFICÁ-LOS TODOS.

83677 viagem Japao.p65 9/13/05, 3:16 PM17

Page 48: Revista Estilo 34

O sabor e o saber

F E R N A N D O L O K S C H I N

A história foi contada por Walpole, ele mesmo um

bispo anglicano. Um rei francês, ao relatar suas fantasias

sexuais extraconjugais, foi severamente recriminado pelo pa-

dre confessor. Após a penitência, o rei quis saber do padre

qual era seu prato predileto. “Perdiz!”, foi a resposta entusi-

asmada. O rei ordenou então ao cozinheiro da corte que

sempre e somente perdiz fosse servida ao padre. Meses de-

pois, quando o rei perguntou ao padre como ia sua vida no

palácio, teria recebido como resposta um lamento desespe-

rado que se tornou proverbial: “Perdiz, sempre perdiz”...

Diferente da perdiz do padre e da esposa do rei, o

arroz tem a rara qualidade de nunca se tornar enfadonho.

Mais de 3 bilhões de pessoas comem arroz 2 ou 3 vezes

todos os dias de suas vidas sem nunca perderem o prazer e

o apetite. O arroz não causa monotonia de cardápio, quanto

mais é comido, mais é gostado.

O arroz brilha pela singeleza: a discrição de tamanho,

forma, consistência, cor, odor e sabor é sua maior qualidade.

É o acompanhante ideal para outros alimentos, seu grão

absorve o caldo em que cozinha e, assim, incorpora o gosto

que se queira dar.

Natural da Índia, o arroz é uma planta do seco que por

mutação se adaptou bem à água. Emigrou para China, leva-

do não pelo homem mas pelos ventos, águas e aves.

Aclimatou-se por toda a Ásia, onde moldou a demografia,

governo, cultura e caráter da região. Na verdade não é pos-

sível definir a Ásia pela geografia, clima, linguagem, etnia,

história ou religião, seu verdadeiro denominador comum é

o arroz! Lá ocorrem 90% do cultivo e consumo do arroz,

numa associação entre homem e alimento sem equivalentes.

A plantação do arroz na Ásia tende a ser coletiva, re-

querer uma força de trabalho volumosa, coordenada, paci-

ente como são aquelas comunidades. Os povos são, ou me-

lhor, tornam-se aquilo que comem.

Na agricultura tradicional, o arroz é o mais eficien-

te dos cereais; os asiáticos, nutridos pelo grão, foram por

séculos mais numerosos, poderosos e sadios do que os

europeus, africanos e americanos. Sem a máquina e a quí-

mica, o arrozal cria um ecossistema paralelo de piscicul-

tura que fornece as proteínas que complementam suas

calorias. Apesar da menor produtividade, há mais em-

prego e conservação do solo.

A tradição chinesa ensina que dos cinco grãos sagra-

dos – arroz, trigo, soja, cevada e milhete – o arroz é rei.

Grande onívoro, o chinês come cães, gatos e macacos, mas,

para ele, alimento mesmo é arroz, todo o resto é mero acom-

panhamento. Sua palavra para ‘arroz’, pán, é a mesma que

para ‘refeição’, e como um equivalente ao nosso “Como vai?”

o chinês pergunta: “Já comeu arroz hoje?”.

Lá, o arroz pode ser totalmente reciclado. Junto a

muita gente e pouco bicho, o chinês não faz qualquer

restrição ao uso de dejetos humanos como adubo, pelo

contrário: agricultores podem disputar o conteúdo de

latrinas e já foi praxe o consumidor pagar parte do arroz

com suas próprias fezes.

E o Japão, apesar da recente ocidentalização, ainda é

visto pelo clichê do arroz cozido e peixe cru. A bebida japo-

nesa é o saquê, aguardente de arroz oferecida aos hóspedes,

antepassados e divindades; o ano novo é celebrado com muki,

bolo de arroz; e nos sushi e sashimi o que faz diferença não é

o peixe, é o arroz, este sim, a verdadeira comida japonesa.

Como na China, a palavra japonesa para ‘arroz’ é a

mesma que para ‘comida’, goham, que ainda recebe o senti-

do adicional de ‘homenageado’. Assim como dizemos café

da manhã mesmo se bebemos leite ou chá, o japonês diz

sempre asagohan, ‘arroz da manhã’.

Para o japonês, só o imperador seria mais sagrado do

que o arroz, e para o budista – e Buda era filho de Sudodana,

‘arroz puro’ em sânscrito –, só Buda seria mais perfeito que o

arroz.

O Japão recebeu o arroz da China junto com a escrita,

o kanji. Cinco mil anos de intimidade se revelam em cente-

nas de ideogramas com o desenho do arroz. Palavras para

‘estação’, ‘outono’, ‘semente’, ‘colheita’, ‘imposto’ e ‘paga-

mento’ trazem em seus símbolos testemunhos literalmente

escritos da importância do arroz: ‘dúvida’ se expressa como

incerteza sobre a produção e preço do arroz, e ‘vizinhança’

como proximidade a um arrozal. Até a palavra ‘dente’ con-

tém o símbolo do arroz, uma comparação de cor e forma,

curiosamente a mesma metáfora usada por Neruda no ver-

RISO DI CARRETIÈREPara quem sorri o arroz com infinitos dentes brancos?

52 Estilo Zaffari

83677 sabor e o saber.p65 9/14/05, 12:34 PM2

Page 49: Revista Estilo 34

REFOGAR CEBOLA PICADA E UM MÍNIMO DE TOMATE. DOURAR ALI O GUISADO E RETIRAR DO FOGO. DERRA-

MAR 2 XÍCARAS DE ÁGUA MINERAL QUENTE. DEIXAR DESCANSAR. FRITAR 2 DENTES DE ALHO. RETIRAR O

ALHO E FRITAR O ARROZ. COAR A CARNE E DESPEJAR O CALDO NO ARROZ. COZINHAR MEXENDO EM FOGO

BAIXO. ADICIONAR 1 CÁLICE DE VINHO BRANCO SECO. PÔR MAIS ÁGUA MINERAL FERVENTE, SE PRECISO.

QUANDO QUASE AL DENTE COLOCAR A CARNE. ADICIONAR ERVILHAS OU BRÓCOLIS. ACRESCENTAR PARMESÃO,

TEMPERO VERDE, CUBOS DE TOMATES SEM PELE E SEMENTES. BORRIFAR OVO DURO PICADO E SERVIR.

83677 sabor e o saber.p65 9/14/05, 12:34 PM3

Page 50: Revista Estilo 34

O sabor e o saber

F E R N A N D O L O K S C H I N

‘riso’ é o mesmo, quem ri muito ouve a frase: mangiato la

minestra di riso (tomou a sopa de arroz/riso).

O arroz fez com que Jefferson acumulasse funções de

embaixador na França e contrabandista. Ao visitar a Itália,

sabedor de que a exportação de arroz era proibida e o con-

trabando um crime capital, ele subornou um muleteiro para

levar uns sacos até o porto de Genova. Temeroso de que o

homem não cumprisse o acordo, Jefferson cruzou a fronteira

com bolsos cheios de arroz que enviou para a Carolina do

Sul. (1787)

Sem a paella, Portugal nunca deu ao arroz o mesmo

destaque que a Espanha. Com a descendência foi o inverso:

o Brasil foi pioneiro no cultivo de arroz no Novo Mundo,

onde é o maior consumidor. Mesmo no sul, los hermanos

compartilham conosco o churrasco e chimarrão, mas não o

Arroz de Carreteiro.

Primeiro país europeu a comercializar com a Ásia, Por-

tugal cedo trouxe o arroz para o Brasil: em 1587 já se culti-

vava na Bahia, em 1650 em São Paulo, e aos poucos o arroz

foi assumindo o lugar da farinha de mandioca como o acom-

panhante de toda e qualquer refeição.

O brasileiro trata o arroz da mesma forma que a água,

o ar ou o afeto: quase indiferença à sua presença diária e

desespero na falta. O prato nacional é o Feijão com Arroz,

‘par sem par’, ícone nacional tal o carnaval, a bunda e o

Redentor. A convivência é tanta que o ‘Feijão com Arroz’

adquiriu o sentido de ‘rotineiro’, de ‘dia a dia’.

Se na Ásia o arroz é o alimento, no Brasil o arroz é o

acompanhamento; sem ele, qualquer comida parece nua e

solitária. O Ocidente tende a guarnecer com batatas, ervi-

lhas ou outros vegetais, mas no Brasil é ‘arroz, sempre arroz’,

o grão ganha atenção secundária mas permanente. E com

infinitos dentes brancos o arroz nos sorri, modestamente.

so: “Para quem sorri o arroz com infinitos dentes brancos?”.

Uma evidência biológica do longo convívio humano

com o arroz é a facilidade de sua digestão. Diferentemente da

maioria dos alimentos, trigo e leite inclusive, não existe qual-

quer alergia ou intolerância ao arroz. Sem glúten, o grão tem

absorção fácil, completa e universal, por isto é o cereal base

das farinhas infantis e suplementos dietéticos. O arroz é bem

recebido pelas barrigas do bebê, do idoso e do doente. Ainda

usamos a água de arroz, cujas virtudes intestinais foram des-

critas há dois mil anos, e a receita de arroz de leite remonta ao

milenar bálsamo estomacal dos médicos romanos.

Além de alimento e medicamento, o arroz purificava

o rosto da gueixa e camuflava as marcas da varíola nas cor-

tes européias: se o rouge tem o rubor do sangue, o pó de arroz

é imaculadamente branco.

Quando atiramos punhados de arroz aos noivos, bor-

rifamos prosperidade e fertilidade. Este é um costume india-

no que passou ao Ocidente, antes se jogavam trigo, figos,

confete e até ovos!

Para os indianos, os grãos de arroz devem ser como

bons irmãos, unidos mas não colados, e para o tailandês o

arroz é o sucedâneo natural do leite materno: a mais branca

e acolhedora nutrição. Como a batata para os incas, é o

arroz que dá a referência de tempo e espaço em Madagascar:

o ‘tempo que leva para cozinhar arroz’ significa um período

de meia hora e uma distância de três quilômetros.

A palavra arroz, como a planta, é de origem oriental,

sua origem está no sânscrito wrihri, que se disseminou via o

grego oryza e árabe ar-ruzz. Conta a tradição que carne de

camelo com o arroz amanteigado era o prato preferido de

Maomé. Seus seguidores, os sarracenos, levaram o arroz até

a Espanha e Sicília, e seus opositores, os cruzados, trouxe-

ram o arroz para a França e Itália. O cultivo do arroz nos

banhados do rio Pó nos legou o risoto e o italianismo das

palavras malária (‘mal ar’), paludismo (‘pântano’) e insalubre.

Mas se o poeta associa o arroz com o sorriso, o italiano

o faz com o riso: como o som das suas palavras para ‘arroz’ e

FERNANDO LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET

[email protected]

54 Estilo Zaffari

83677 sabor e o saber.p65 9/12/05, 4:25 PM4

Page 51: Revista Estilo 34
Page 52: Revista Estilo 34

Casa

Raku:

83677 casa raku.p65 9/13/05, 6:09 PM2

Page 53: Revista Estilo 34

T E X T O S I R E N E M A R C O N D E S

F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O

A magiacerâmica

japonesada

83677 casa raku.p65 9/9/05, 7:20 PM3

Page 54: Revista Estilo 34

Casa

83677 casa raku.p65 9/9/05, 7:21 PM4

Page 55: Revista Estilo 34

REPLETA DE SÍMBOLOS, A CERÂMICA

RAKU OCUPA ESPAÇO DE HONRA NA

CULTURA ORIENTAL DESDE O SÉC. XVI

É IMPOSSÍVEL PERCORRER OS CAMINHOS DA ARTE SECULAR DO RAKU SEM RESGATAR A HISTÓRIA

DA TRADICIONAL CERIMÔNIA DO CHÁ – UM RITUAL JAPONÊS INSPIRADO NOS IDEAIS BUDISTAS

QUE CULTUA A TRANQÜILIDADE, O AUTOCONHECIMENTO, A AUSTERIDADE E O EQUILÍBRIO.

OS MESTRES DO CHA-NO-YU, COMO ESTA CERIMÔNIA É CHAMADA, BUSCAM UM FORTE

RESPALDO FILOSÓFICO NAS PEÇAS DE CERÂMICA USADAS NO RITUAL DO CHÁ. FIRMEZA, EQUILÍBRIO

E UMA AGRADÁVEL TEXTURA NA BORDA DAS CUMBUCAS CARACTERIZAM ALGUNS ASPECTOS DO

RAKU MUITO VALORIZADOS PELOS MESTRES. A MÍSTICA DESTAS DUAS TRADIÇÕES ORIENTAIS

COMEÇA NA QUEIMA DAS PEÇAS DE CERÂMICA. AINDA INCANDESCENTES, ELAS SÃO PINÇADAS

DOS FORNOS A UMA TEMPERATURA DE 980ºC E IMEDIATAMENTE MERGULHADAS NUM TONEL

COM SERRAGEM. AS TÉCNICAS DESTE PROCESSO REVELAM UM PRIMEIRO APRENDIZADO: MESMO

DE APARÊNCIA FRÁGIL, A CERÂMICA RESISTE AO CHOQUE TÉRMICO SEM RACHAR E O EFEITO DO

SEU ESMALTE É ÚNICO E IRREPRODUZÍVEL, ASSIM COMO A NOSSA ALMA. A CERAMISTA ADMA

CORÁ ABRIU AS PORTAS DO SEU ATELIÊ EM PORTO ALEGRE E NOS REVELOU DETALHES DA ARTE

DO RAKU – UMA TÉCNICA QUE COMEÇOU EM 1550 NO JAPÃO E CONTINUA ATÉ HOJE REPLETA DE

SIMBOLISMOS.

Estilo Zaffari 59

83677 casa raku.p65 9/14/05, 12:15 PM5

Page 56: Revista Estilo 34

lendas

AS LENDAS DO RAKU

Duas histórias distintas narram o início desta arte em cerâmica de alta temperatura.

Estudiosos japoneses, porém, têm uma certeza: o imigrante coreano Chojiro foi quem ini-

ciou esta técnica no século XVI, no Japão. Antigos registros contam que nesse período

ocorreu um desastre natural no país e ceramistas coreanos foram convidados a ajudar na

reconstrução das casas. Chojiro e seu pai Ameyra estavam entre eles. Como a demanda por

telhas era enorme, o jovem artesão começou a retirar as peças ainda quentes dos fornos, e,

para surpresa de todos, elas resistiram ao choque térmico graças à enorme quantidade de

areia na massa. A outra versão que relata o início do Raku é menos romântica. Conta a

lenda que este ceramista coreano, que vivia em Kioto, produzia cumbucas para a Cerimônia

do Chá. Com as encomendas cada vez maiores, ele se viu obrigado a retirar as peças ainda

incandescentes dos fornos. “Não importa qual é a versão real. O que importa é que a quei-

ma das peças de Raku é um ritual mágico. Aqui no ateliê eu espero para abrir o forno à

noite. Assim, é maior a intensidade do fogo e da cor alaranjada das peças, com quase mil

graus. Convido amigos e familiares para participarem deste ritual. Degustamos vinhos e

aproveitamos para meditar e conversar ao redor das cerâmicas”, conta a artista plástica

Adma, que há 15 anos estuda Raku.

A ESTÉTICA DESTA ARTE

Tanto para os ceramistas quanto para os mestres era importante respeitar critérios

estéticos relacionados às formas e às cores das cumbucas. Preto e vermelho predominavam

no acabamento das peças. Adma conta que as cores eleitas tinham uma importante função:

ressaltar a tonalidade verde do chá que era servido nas cerimônias. Uma pedra do rio Kamo

que continha altas porcentagens de silício, magnésio e ferro dava origem ao esmalte negro.

Já o pigmento vermelho era proveniente da soma de uma substância rica em ferro com

chumbo. “Hoje em dia não passamos nenhum esmalte com chumbo nas peças utilitárias.

Apenas objetos decorativos, como vasos e centros de mesa, recebem acabamento com este

minério. Também temos a liberdade de explorar a vasta paleta de cores para dar novos

acabamentos ao Raku”, revela a artesã.

Se hoje as tonalidades podem variar de acordo com o desejo dos ceramistas, o mesmo

não se pode dizer das formas das cumbucas. Estas devem seguir alguns critérios básicos: são

redondas, simbolizando a harmonia e o círculo virtuoso, e não possuem asas, já que as

pessoas devem segurá-las com as duas mãos. As únicas variações permitidas estão relaciona-

das ao clima. As cumbucas baixas com boca larga são perfeitas para os dias de verão, e as

mais altas com bordas fechadas conservam a bebida quente no inverno. “Quando queremos

ousar nas formas do Raku moldamos vasos, pratos e bules. As cumbucas são sagradas e

mantêm há séculos a mesma modelagem”, explica.

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Page 59: Revista Estilo 34

O RITUAL DO CHA-NO-YU

Uma frase proferida pelos mestres da Cerimônia do Chá resume a essência deste ritual

japonês: “O cha-no-yu é uma estética de austera simplicidade e refinada pobreza”. As rígi-

das normas de etiqueta, que parecem complicadas e difíceis à primeira vista, foram criadas

com o propósito de reduzir ao máximo os movimentos do corpo durante a cerimônia. Só

assim é possível entrar numa atmosfera de meditação cujo objetivo maior é alcançar a har-

monia num mundo cheio de tensões. Quatro palavras-chave definem simbolicamente o

cha-no-yu. A primeira é wa, que significa paz e harmonia entre os homens e todas as coisas.

A segunda é kei, ou seja, o respeito mútuo e o equilíbrio entre os seres humanos e a natureza.

A terceira palavra é sei, que representa a pureza espiritual e corporal. A quarta e última

palavra, djaku, busca a tranqüilidade e a calma em qualquer instante de nossas vidas. “Eu

nunca participei de um ritual do chá. Isso porque é preciso estar na presença de um mestre

que nos oriente e ensine esta arte secular”, revela Adma. “No entanto, eu vivencio estes

quatro símbolos nos momentos em que estou absorvida na criação das cerâmicas de Raku”,

afirma. Adma nos conta que certa vez leu num livro o seguinte relato: “Um ocidental per-

guntou ao grande mestre Sen-no-Rikyu qual era o segredo da arte do chá. Rikyu respondeu

que primeiro era preciso esquentar a água, preparar a infusão verde e em seguida bebê-la da

forma adequada. Decepcionada, a pessoa disse que já sabia de tudo isso. O mestre encerrou

a conversa dizendo: se for assim, com muito gosto serei seu aluno e você será meu mestre”.

OS LEGADOS DO RAKU E DO CHA-NO-YU

A palavra Raku nasceu do ideograma kanji, que significa alegria, prazer, satisfação e

glória do dia. O mestre Sen Soshitsu costumava dizer que a paz no mundo deve perpetuar-

se a partir da compreensão humana e de uma taça de chá. Tanto o Raku quanto o cha-no-

yu buscam preservar os valores espirituais, a arte, o trabalho, a habilidade com as mãos e,

especialmente, a cortesia entre as pessoas. Por isso, quando você tiver a oportunidade de

participar de uma queima de Raku ou de um ritual do chá, lembre-se: você estará diante de

uma das cerimônias mais importantes da cultura oriental. Conhecer seus ensinamentos e

colocá-los em prática significa abrir uma porta que o levará para um mundo melhor.

LIVRO PESQUISADO – RAKU: SUA HISTÓRIA, DE ALEJANDRA RAMOS DE JONES E ANA M. GOLDENBERG DE DIVITO. ATELIÊ ADMA CORÁ – TEL.: (51) 3331.3257

ritual

Estilo Zaffari 63

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Page 60: Revista Estilo 34

Um olho no

T E X T O S M A G A L I M O R A E S

I L U S T R A Ç Õ E S N I K

Estilo

Sushi

Manekineko

outro no

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Atenção: este é um texto cheio de palavras japo-

nesas. Mas fique zen, porque você não vai precisar de

tradução simultânea. A idéia é justamente mostrar

quantos japonismos já foram incorporados ao samba

nosso de cada dia. E vice-versa.

Vamos começar com um passinho para cá, dois para

lá: a palavra sushi dispensa apresentações e foi deliciosa-

mente explicada na matéria de capa. Agora, cá entre nós,

Manekineko pareceu grego para mim. Eu conhecia os sim-

páticos gatinhos mas não sabia que eles tinham esse nome.

Amuleto típico do Japão, o Manekineko é um primo

sortudo da Hello Kitty e possui diversas cores e significa-

dos: o gatinho manchado é o desejo de sucesso profissio-

nal, o preto atrai saúde e o dourado (adivinhe!) é riqueza

na certa. Se o gato estiver com a patinha direita levanta-

da, você vai encontrar um grande amor. Se for a patinha

esquerda, prepare-se para receber bens materiais.

Sim, os japoneses também são supersticiosos como

nós. Siga adiante e descubra que as semelhanças não

param por aí.

O Japão aqui

Enquanto os japoneses dormem no outro lado do

mundo e sonham com celulares miniatura implantados no

tímpano, o Ocidente vive um dia-a-dia cheio de referên-

cias nipônicas e nem se dá conta. Se a palavra Ocidente

parece distante demais para você, esqueça a Europa e os

Estados Unidos. Feche seus olhos e pense no Brasil.

Pedro Álvares Cabral ia achar uma piada se voltas-

se ao Brasil em 2005 e descobrisse o nosso japa way-of-

life. Nas praias, garotas com os cabelos presos com hashis

revelam suas nucas tatuadas com ideogramas japoneses

(eles continuam em alta nas melhores casas de tatoo do

ramo). Nas baladas, essas mesmas mulheres surgem de

Estilo

SE FEIJÃO COM

ARROZ PARECE

BRASILEIRO DEMAIS,

MELHOR DESCONGELAR

UM YAKISSOBA

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Page 63: Revista Estilo 34

cabelos exageradamente lisos por horas de escova, chapi-

nha japonesa e progressiva – quem sabe tentando ser

gueixas à procura de samurais nas pistas de dança.

No centro das cidades, lojas de departamento ven-

dem filmadoras Sony, máquinas digitais Panasonic e DVDs

que vêm com tudo – inclusive karaokê, o passatempo pre-

ferido dos japoneses. As empresas de locação para festas

que o digam: o karaokê e suas pastas cheias de opções

musicais animam desde aniversário de sete anos a jantar

de gente grande. Apesar de eu não achar graça em ver a

imagem congelada do Monte Fuji e a letra da música pu-

lando na parte de baixo do vídeo, o povo se diverte e canta

aos berros para então ganhar uma nota. Silêncio, alguém

lá dentro da TV está pensando... seis e meio!! Parabéns,

você é um excelente cantor de chuveiro!

Na hora do almoço, o feijão com arroz parece bra-

sileiro demais. Melhor chamar um telesushi, passar por

um sushi-drive ou descongelar um Yakissoba comprado

no supermercado. Se a fome for pouca, um Miojo Nissin

ou uma saladinha de cogumelos Shitake temperada com

molho Shoyo resolve o problema.

De tarde, adultos estressados fazem shiatsu no tra-

balho e idealizam um banho de ofurô no fim do dia. Já

as crianças tomam Yakult com lactobacilos vivos e se

divertem com a infinita quantidade de desenhos japo-

neses. Cavaleiros do Zodíaco, Yu-Gi-Oh, Pokémon,

Samurai Jack e Power Rangers agitam ainda mais os

meninos. E para as meninas que amam a gatinha Hello

Kitty, tem o novo desenho Ami e Yumi do Cartoon

Network – inspirado nas roqueiras japonesas mais pop

da terra do sol nascente –, que mistura animação com

cenas verdadeiras dos seus shows.

Se tudo isso parecer coisa de criança, as adolescen-

tes podem ligar a TV no seriado Malhação da Rede Glo-

bo e copiar o modelito que a atriz japa-fashion Daniela

Suzuki está usando. Os garotos vão preferir fazer origami

com o cérebro de quem inventou essas novelinhas teen e

certamente irão escolher um videogame de lutas marci-

ais. Ou ler Mangás – as histórias em quadrinhos japone-

sas que cada vez mais conquistam os brasileiros.

A moda ocidental há tempos reverencia estilistas

japoneses, como Kenzo, Issey Miyake, Yoji Yamamoto e

Rei Kawakubo, da Commes des Garçons. Quimonos e

Obis vão e voltam nas passarelas, orientalizando os guar-

da-roupas de tempos em tempos. A indústria da beleza

também pede a bênção aos lançamentos da Shiseido.

E que brasileira seria kamikaze a ponto de ignorar as japo-

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Estilo

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nesas com sua pele alva e macia, a boca vermelha e peque-

na como uma cereja, o cabelo impecavelmente liso, os

gestos delicados e o corpo esguio?

Apertando os olhos e forçando o foco no Rio Gran-

de do Sul, descobrimos que o Japão também é aqui. Pe-

gue seu Toyota ou Honda e vá até a Praça Japão, no cora-

ção de Porto Alegre. Ou o recanto oriental da Redenção

num belo domingo de sol. Você vai ver muito gaúcho da

gema tomando chimarrão misturado com chá verde. Faz

bem para a saúde, sem dúvida. Mas virou moda. Quem

preferir tomar mate no aconchego de casa pode escolher

a poltrona perto da luminária japonesa e apoiar os pés

num futon de seda. Ou então ir para a tranqüilidade da

sacada decorada com pedrinhas brancas e muro de bam-

bus onde corre um fio de água da fonte presa na parede –

opa, alguém andou vendo revistas zen e buscou inspira-

ção nos jardins japoneses. Só falta um Bonsai no centro

da mesa e carpas no aquário do banheiro.

Se antes eu achava exótico ter bala de algas para

vender no supermercado, imagine agora que fazem no

interior do Estado até campeonato de Sumô, a tradicio-

nal arte que surgiu no Japão há milênios. Por isso, mi-

nha amiga, pegue um saquê e faça um brinde a tudo de

bom que vem do Japão. Desde, é claro, que os gafanho-

tos caramelizados permaneçam bem longe daqui.

O Brasil lá

Enquanto os brasileiros dormem e sonham com o fi-

nal das CPIs, no lado de lá o Japão acorda e se prepara para

outro dia de trabalho árduo – especialmente se forem os

mais de 250 mil dekasseguis, descendentes de japoneses

que largaram o Brasil para voltar à terra dos antepassados.

Mas não pense que eles só enxergam as linhas de

montagem na sua frente. Depois de um dia puxado den-

tro das fábricas, nada como pegar a bicicleta e ir até o bar

mais próximo tomar uma cerveja com os amigos. Se o

assunto for futebol, a pedida é uma Brahma ou Antarctica

(que atravessaram o mundo e continuam geladíssimas) e

ficar conversando sobre a atuação do Zico, técnico da

seleção japonesa de futebol. Quando o assunto terminar,

os brazucas podem fazer como os nativos e apreciar as

árvores de Cerejeira que florescem e formam túneis cor-

de-rosa. A beleza é tanta que o garçom vai entender se

você levantar o dedo e pedir “Salta um Haicai na mesa

3!”. Em caso de fome, que venham o pastel e um churras-

quinho de saideira.

Se mesmo bebendo for difícil entender o que eles

falam, nada de pânico. Onde tem brasileiro, tem jeiti-

nho para tudo. Um bom exemplo é o jornal semanal

Tudo Bem, editado pela JBC – Japan Brazil

Communication, que também faz a ponte aérea de

mangás e livros. O jornal é escrito em português e ven-

dido em mais de 400 locais, além da versão atualizada

diariamente na internet (www.tudobem.co.jp). É um

verdadeiro guia de sobrevivência para os conterrâneos que

vivem no Japão e também o elo com o Brasil. Outra aju-

da providencial é o Jornal Nippo-Brasil e seus sites

www.nippobrasil.com.br e www.nippojovem.com.br, esse

feito exclusivamente para salvar a garotada.

Site lembra internet, que lembra cybercafé, que dá

uma vontade louca de tomar um cafezinho. Se você é

como eu, movida a expressos e cappuccinos, fique tran-

qüila, porque os japoneses já descobriram o kohi (do inglês

coffee) e tomam o pretinho quente ou frio. É, aos poucos

nós estamos invadindo a ilha. Já exportamos até mani-

festações culturais típicas como a festa de São João e, cla-

ro, o carnaval, que no Japão se chama Matsuri e também

enche as ruas de alegria. Quem sabe o próximo a cruzar o

oceano é o Festival de Parintins – consigo imaginar os

bois Caprichoso e Garantido dizendo arigatô no final.

Samba, música sertaneja, show do Supla e gente pu-

lando com a Sandy e o Júnior pedem licença ao J Pop (como

DÁ ATÉ PRA IMAGINAR OS BOIS

CAPRICHOSO E GARANTIDO, DE

PARINTINS, DIZENDO ARIGATÔ

Estilo Zaffari 69

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Page 66: Revista Estilo 34

Estilo

eles chamam o som pop nipônico) e arrancam bis da galera.

E mesmo que os japoneses fabriquem ídolos na mesma ve-

locidade com que produzem eletrônicos, sempre tem palco

sobrando para o astral dos brasileiros. Até a Turma da Mô-

nica enfrentou o jet lag para mostrar os planos infalíveis do

Cascão e Cebolinha, o pêlo azul do Bidu e a gula da minha

xará – aposto que a Magali deve ter adorado as melancias

sem sementes que eles inventaram.

Nova Iorque ficaria com ciúmes se visse a quanti-

dade de lojas que vendem produtos brasileiros nas ruas

do Japão. Em algumas cidades, há placas em português

e o brazuca way-of-life bomba nas vitrines. Falando em

consumismo, nós parecemos o Tio Patinhas perto dos

orientais. Pegue sua máquina digital e vá para os bairros

de Shibuya e Harajuku. Você vai se sentir numa

Disneylândia fashion – ou dentro de um Mangá-Rave,

quem sabe numa festa a fantasia de dragqueens. Imagi-

VOCÊ VAI SE SENTIR NUMA DISNEYLÂNDIA

FASHION OU DENTRO DE UM MANGÁ-RAVE

nou algo excêntrico e bizarro? E é mesmo. Foi o jeito que

a molecada encontrou para acabar com esse papo de que

japonês é tudo igual. Quando a semana termina e eles

tiram os sisudos uniformes do colégio, o negócio é se

vestir de Anjo de Luto, Sailormoon da Sapucaí, Barbie-

Pikachu, Gueixa Psicopata, Marilyn Shoyo Manson e

curtir o domingo, cada um na sua tribo.

O Japão é assim, muita informação para assimilar.

Ouvi dizer que tem japonesa colocando silicone no

bumbum para imitar o nosso padrão estético. E não vou

estranhar se a Ana Maria Braga ensinar a fazer cuscuz

de sashimi no seu programa. O fato é que as culturas

oriental e ocidental nunca se misturaram tanto. Viva a

globalização que transformou o globo numa bolinha de

pingue-pongue que a gente joga de lá para cá.

Sophia Coppola que me perdoe, mas existem muito

mais encontros do que desencontros com os japoneses.

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Zen

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P O R P A U L A T A I T E L B A U M F O T O S A N G E L A F A R I A S

EU ACHAVA QUE ERA LUTA E APRENDI QUE É FILOSOFIA. EU PENSAVA QUE ERA ATAQUE, MAS COMPRE-

ENDI QUE É PURAMENTE DEFESA. EU TINHA CERTEZA DE QUE JAMAIS ME INTERESSARIA POR AIKIDO,

ATÉ PERCEBER TODA A BELEZA QUE ORBITA EM TORNO DESSA ARTE MARCIAL. UMA BELEZA QUE

COMEÇA NAS ROUPAS DE SAMURAI, ESTENDE-SE PELOS GESTOS CIRCULARES E VAI ATÉ A ELEVAÇÃO

ESPIRITUAL. AINDA NÃO CHEGUEI A FAZER UMA AULA SEQUER. MAS JÁ COMECEI A ABSORVER OS

ENSINAMENTOS DO MESTRE: DEIXEI A RESISTÊNCIA DE LADO.

Estilo Zaffari 73

Dança

defesada

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Page 70: Revista Estilo 34

AI

SIGNIFICA HARMONIA,

QUE SURGE POR MOVI-

MENTOS CIRCULARES E

PELA SUPERAÇÃO DAS DI-

FICULDADES E LIMITA-

ÇÕES DO CORPO

A arte da não-resistência

Ao sermos atacados, nossa tendência natural é fu-

gir ou resistir. Já para os praticantes do Aikido é diferen-

te. Eles utilizam a própria energia do atacante para

controlá-lo e neutralizá-lo, sem que para isso precisem

usar a força física. Para entender melhor, é preciso co-

nhecer um pouco dos valores dessa filosofia criada no Ja-

pão por Morihei Ueshiba, um filho de samurai nascido

em 1883. Ao procurar um sentido mais profundo para a

vida, Ueshiba combinou técnica e espiritualidade, crian-

do uma arte marcial voltada para a reconciliação, a har-

monia e a cooperação. Segundo ele – e todos os seus se-

guidores –, os princípios do Aikido poderiam ser aplica-

dos nos desafios diários da vida, nos relacionamentos pes-

soais e na interação com a sociedade e a natureza. No

fundo, Ueshiba queria criar guerreiros da paz. E foi por

isso que, em 1969, o governo japonês declarou que o

mestre criador do Aikido era um tesouro nacional sagra-

do. Hoje, o líder mundial é seu neto, Moriteru Ueshiba,

que dirige e leciona no Hombu Dojo, o mais importante

centro de treinamento do mundo e o local onde Vargas

Sensei já realizou diversos treinamentos intensivos.

Vargas Sensei é Roque Cruz Vargas Filho, a auto-

ridade máxima do Aikido no Rio Grande do Sul. Ser

um Sensei significa ser “aquele que vem primeiro no

caminho”, e a caminhada de Vargas teve início no judô,

quando ele tinha 12 anos. Depois de ser um judoca cam-

peão, de praticar Kempo, Karatê e Kung-Fu, ele encon-

trou-se no Aikido. E é por isso que agora, dezenove anos

depois, Vargas é capaz de responder com tanta certeza

quando pergunto qual a diferença entre o Aikido e as

outras artes marciais: “O Aikido preserva antigos valo-

res de disciplina, hierarquia, gratidão e respeito aos mais

velhos, enquanto as outras artes marciais, por terem se

tornado esporte, perderam isso”. Ele explica ainda que

praticantes de Karatê, por exemplo, podem ter dificul-

dade com o Aikido, porque os comandos são diferentes.

Zen

AIKIDO É UMA ARTE

MARCIAL VOLTADA

PARA A HARMONIA

74 Estilo Zaffari

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Zen

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Page 73: Revista Estilo 34

Além disso, artes marciais que usam mais a força do que

a técnica também acabam prejudicando, já que, no

Aikido, a busca é pela solução e não pela vitória. “Em

vez de sentir raiva e desenvolver a agressão, nós procu-

ramos uma via alternativa” completa o Sensei.

Movimentos que imitam a natureza

No Dojo Central, assisti a uma das aulas semanais de

faixas pretas. Todos eram professores da escola de Vargas.

Todos usando uma calça-saia negra que faria o maior su-

cesso nas passarelas do São Paulo Fashion Week. Em certos

momentos, parecia que eu estava vendo uma apresentação

de dança, pois os movimentos imitam as evoluções da na-

tureza, como a rotação dos planetas, o ciclone e um chorão

balançado pelo vento. Não pense, no entanto, que é só de

delicadeza que vive o Aikido. Observando os faixas pretas

divididos em duplas, eu vi do que eles são capazes com a

sua “não-resistência”. Lá pelas tantas, depois de um passinho

suave aqui e outro ali, plaft, lá se foi um deles para o chão.

Imobilizado, ele foi ficando vermelho até que bateu com os

dedos no chão, o que significa que chegou no limite de sua

dor. Sim, caros leitores, Aikido dói e muito. A força que a

pessoa faz para se livrar da imobilização é usada contra ela

mesma. Nada fácil.

Por falar em dor, ela é uma das responsáveis pela

desistência imediata de alguns principiantes no Aikido.

Mas não é a única. Alguns executivos, por exemplo, acos-

tumados mais a mandar do que a obedecer, não ficam

muito confortáveis ao ter que baixar a cabeça para o pro-

fessor, receber comandos em japonês e permanecer imo-

bilizados. E quando percebem que adolescentes são capa-

zes de fazer coisas que eles não conseguem, então, aí mes-

mo é que saem correndo. Talvez lhes falte um pouco de

humildade e paciência, pois, como diz Vargas Sensei, “a

pessoa só tem uma pálida idéia do que é o Aikido depois

de três meses de prática”. Para diminuir a desistência, o

Dojo Central agora oferece aulas dirigidas, onde o aluno

KI

SIGNIFICA A ENERGIA DA

VIDA QUE FLUI COM VIGOR,

MAS DENTRO DA ÓTICA DA

NÃO-RESISTÊNCIA, SEM O

USO DA FORÇA BRUTA

RESPEITO, DISCIPLINA

E COOPERAÇÃO SÃO

OS VALORES DO AIKIDO

Estilo Zaffari 77

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Page 74: Revista Estilo 34

DO

SIGNIFICA CAMINHO DE

VIDA, UMA VIA FILOSÓFICA

ORIENTAL PARA O CRESCI-

MENTO DO HOMEM. DE-

MONSTRA A IMPORTÂNCIA

DA EXPERIÊNCIA E DA PER-

SISTÊNCIA

Zen

começa com noções de etiqueta, disciplina e movimentos

básicos. A partir daí, é uma caminhada rumo à faixa pre-

ta. Para chegar lá, o tempo normalmente varia entre 4 e 8

anos, dependendo da capacidade de aprender e da dedi-

cação de cada um. Alongamento e flexibilidade também

ajudam bastante. Fabrício Meirelles, professor da escola,

chegou à faixa preta depois de 3 anos e 8 meses e hoje,

depois de conquistar o 4º grau dentro desse nível, é tam-

bém considerado um Sensei. Vale lembrar que, segundo a

filosofia oriental, o objetivo jamais deve ser a chegada,

mas sim a caminhada.

Para praticar, basta carregar um quilo de arroz

O Aikido não está ligado a nenhuma prática reli-

giosa ou de alimentação. Naturalmente, acontece de

as pessoas procurarem uma vida mais equilibrada e sau-

dável, pois, com o tempo, adquirem uma consciência

maior em relação ao seu corpo. Pessoas muito agressi-

vas ou antiecológicas não permanecem. Elas mudam,

ou vão embora. O criador, Ueshiba, dizia que para pra-

ticar basta conseguir carregar um quilo de arroz. Ou

seja, é uma prática bastante democrática e procurada

por crianças e mulheres. “O Aikido é a arte marcial do

terceiro milênio, a mais feminina de todas elas”, diz

Vargas Sensei. Mesmo assim, a maior parte dos alunos

ainda são homens, 80% profissionais liberais com cur-

so superior e acima de 25 anos.

“O Aikido não é um modo de lutar ou de derro-

tar os inimigos; é uma maneira de reconciliar o mun-

do e fazer de todos os seres humanos uma família”;

ou ainda, “O Aikido é primeiramente uma forma de

conseguir a própria maestria física e psicológica”. São

frases que estão no site www.aikido.com.br. Se você

achar que vale a pena experimentar essas sensações,

vá lá. Só não se esqueça de baixar a cabeça em reve-

rência ao seu mestre. Mesmo que ele seja mais novo

do que você, é mais experiente.

O AIKIDO UTILIZA AS

ARMAS DO ADVERSÁRIO

CONTRA ELE MESMO

AS FOTOS FORAM REALIZADAS

NO PARQUE ESPORTIVO DA PUC

RS COM OS FAIXAS PRETAS LE-

ANDRO LOPEZ E NÁDYA PESCE

DA SILVEIRA

78 Estilo Zaffari

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Page 76: Revista Estilo 34

Bem Viver

A atividade física regular é que melhora a qualidade de vida

ATLETAS DE FIM DE SEMANA

Nos sábados e domingos os parques costumam ficar

cheios dos famosos "Atletas de Fim de Semana", pessoas ca-

minhando, jogando, correndo ... atitudes saudáveis, mas que

deveriam ser mantidas pelo menos quatro vezes por semana.

Muitas vezes essas atividades físicas vigorosas e esporá-

dicas, como jogar bola com os amigos de vez em quando ou

desafiar seu adversário para aquele jogo de tênis no sábado à

tarde, são consideradas por muitos como uma forma prazerosa

de lazer, enquanto outras pessoas cultivam este hábito com o

objetivo de interagir com os amigos e, acima de tudo, procu-

rando espantar o famoso estresse. Saiba que essas atitudes

aparentemente saudáveis podem ser responsáveis por algu-

mas surpresas desagradáveis.

Entretanto, as atividades físicas, mesmo que esporádi-

cas, jamais devem ser desencorajadas, porém os praticantes

devem ter uma avaliação médica e orientação física adequa-

da para poderem executá-las com segurança.

Antes de iniciar alguma atividade é necessária a reali-

zação de uma avaliação médica para afastar alguma patologia

importante. Essa avaliação deve ser realizada por todo o pra-

ticante de atividade física, independentemente da idade. Já

em pessoas com mais de 40 anos ou que apresentam diabetes,

hipertensão arterial, colesterol elevado, obesidade ou são fu-

mantes, o acompanhamento deve ser no mínimo anual.

SAIBA QUE...

É fundamental manter o condicionamento físico ade-

quado praticando alguma atividade física regularmente (no

mínimo 4 vezes por semana).

O bom condicionamento físico reduz drasticamente o

risco de lesões osteomusculares.

Se você tem o hábito de jogar futebol apenas no final

de semana, é importante realizar uma caminhada de 45 mi-

nutos em três dias da semana. Além de você reduzir o risco

de lesões, terá uma resistência física bem mais adequada.

Exigir a manutenção física apenas com o futebol, tênis

ou vôlei – todas atividades de impacto – é uma agressão ao

corpo. É como tirar um veículo do zero e exigir que em segun-

dos ele chegue a 200 km/h e mantenha esse desempenho.

Antes e após cada atividade física, principalmente as

de maior impacto, é imperativa a realização de alongamentos

por aproximadamente 10 minutos. Esse simples exercício re-

duzirá o risco de lesão muscular e as dores musculares do dia

seguinte.

Desenvolver atividades de forma desordenada e sem

uma avaliação e orientação médica adequada aumenta o ris-

co de desenvolver lesões osteomusculares, crises hipertensivas

e até infarto agudo do miocárdio.

Prevenção! Essa é a resposta para você poder praticar o

seu esporte preferido tranqüilamente. Se você realiza seu check-

up periodicamente e mantém seu condicionamento físico, além

do futebol, vôlei ou tênis do final de semana, você colherá bons

frutos em sua saúde e boas vitórias no seu esporte.

Alerta! No entanto, se você não faz nada disso e du-

rante a prática esportiva vem sentindo algo diferente, pare e

procure um médico. Esse pode ser um sinal de que algo não

está bem em seu corpo.

Por fim, manter uma atividade física regular, além de ser

prazeroso e manter a integridade física, certamente estará pro-

porcionando um grande incremento na sua qualidade de vida.

C É Z A R V A N D E R S A N D

CÉZAR VAN DER SAND É CARDIOLOGISTA, MEMBRO DA SOCIEDADE

BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA E DA SOCIEDADE GAÚCHA DE CARDIOLOGIA

80 Estilo Zaffari

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Lugar

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NO INTERIOR PAULISTA, UMA ÁREA DE 300 MIL METROS QUADRADOS DE VERDE, MUITO VERDE, FOI TRANSFORMADA EM

UM HOTEL SPA. QUEM CONCEITUOU O EMPREENDIMENTO FOI VICTOR SIAULYS, EMPRESÁRIO QUE JÁ HAVIA COLOCADO

SUA ASSINATURA NO CÉLEBRE HOTEL UNIQUE DA CAPITAL PAULISTA. NO UNIQUE GARDEN, A ADEQUADA COMBINAÇÃO

DE REQUINTE E BOM GOSTO SE FAZ PRESENTE, TENDO A NATUREZA E A TRANQÜILIDADE COMO BÔNUS. ELE FICA A 60

QUILÔMETROS DA CAPITAL, NO PARQUE ESTADUAL DA CANTANEIRA, PERTO DA CIDADE DE ATIBAIA.

T E X T O S E F O T O S C R I S B E R G E R

únicoSer

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Lugar

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Esta versão garden do padrão Unique de hotelaria

quer transmitir paz e tranqüilidade. A proposta é ser

único e tratar o hóspede de forma ímpar. São apenas 25

chalés que vêm acompanhados de deliciosas mordomias:

massagens terapêuticas, vinhoterapia, banhos de ervas,

acupuntura e ofurô. Mimos que podem ser usufruídos

em meio a jardins e trilhas.

Grandes nomes assinam arquitetura e gastrono-

mia. Cheguei no Unique imaginando encontrar um

pedacinho do paraíso na Terra, e foi exatamente com

isso que me deparei. Posso dizer que o Unique Garden

cabe perfeitamente nos sonhos de quem deseja viver

uma lua-de-mel no melhor estilo ou simplesmente se

desconectar da frenética vida urbana.

Conforto e gastronomia especial

Ruy Othake projetou os dez chalés da Vila Con-

temporânea. Com seu tradicional traço, criou dois es-

tilos distintos: frio e quente. Mármore e pedra deco-

ram os frios; madeira, os quentes. Em cada chalé, atra-

ções sem fim: varanda, sala de estar, televisor de plas-

ma, lençóis de algodão egípcio, móveis de design, dois

chuveiros e ofurô.

Os chalés da Vila Mediterrânea têm o teto lilás.

Ficam em volta de um jardim de flores e da fonte da

amizade, outra criação de Othake. O Chalé das Flores

oferece alguns diferenciais: banheira de hidromassa-

gem, sala de massagem, jardim de inverno e ofurô ao

ar livre.

Sofisticação é o principal ingrediente utilizado pelo

chef francês Michel Darque na elaboração dos pratos.

Apesar de ser considerado um spa, o Unique Garden

não adota a linha de restrições alimentares e o hóspede

tem a opção de montar seu próprio cardápio dentro do

conceito de gastronomia personalizada do hotel, além

de contar com uma carta de vinhos com 150 rótulos.

A SOFISTICAÇÃO É A MARCA DOMINANTE NA

ARQUITETURA E NA GASTRONOMIA DO HOTEL

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MORDOMIAS, MIMOS, BONS TRATOS E

PRODUTOS EXCLUSIVOS. ASSIM É O SPA PANDORA

Lugar

86 Estilo Zaffari

QUEM LEVA

GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES

WWW.VOEGOL.COM.BR – 0300 7892121

MAIS INFORMAÇÕES

WWW.UNIQUEGARDEN.COM.BR – (11) 4486.8700

OBS.: CÃES SÃO BEM-VINDOS NO HOTEL E GANHAM UM PET KIT

Mimos no Spa Pandora

O Unique Garden foi projetado para agradar às

mulheres. Estas são palavras de Victor Siaulys, absolu-

tamente comprovadas quando observamos tantos mi-

mos e detalhes. O Spa Pandora é a prova mais fiel das

boas intenções deste conhecedor da alma feminina.

Eu posso contar que este centro de tratamento te-

rapêutico e estético tem 15 salas, saunas secas e úmidas,

masculinas e femininas, mais um salão de beleza – e você

vai ficar impressionado como eu fiquei. Mas o que real-

mente me conquistou foi a personalidade expressa em

seus 2.500 metros quadrados. É fascinante admirar as

peças de decoração que Victor trouxe de suas viagens,

ao redor do mundo, e que hoje emprestam charme ao

Pandora.

O fisiologista Roberto Nogueira é quem comanda

a equipe de profissionais que são orientados a sugerir,

dentro do menu de tratamentos do Pandora, a terapia

que mais se encaixa com o gosto do cliente. Neste car-

dápio de prazeres está o Rasul (aplicação de argila ama-

zônica seguida de sauna), banhos em ofurôs com ervas

retiradas do ervanário do hotel, banhos cromáticos e

para casais e massagem a seis mãos.

Dentro do conceito de exclusividade, todos os cre-

mes e óleos do Unique são preparados na farmácia de

manipulação do hotel, de acordo com a preferência de

cada hóspede. Afinal, lembre-se: aqui a ordem é fazer

você sentir-se único.

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(con)vivências

Quem se atreve a dar conselhos às mulheres?

A BÍBLIA SOBRE O ÓBVIO

Deveria ser óbvio, mas não é. Ao menos para as mu-

lheres da atualidade, não parece ser tão óbvio que um

homem deva ser descartado só porque ele não telefona

ou porque não respondeu a um torpedo. Afinal, ele pode

estar muito ocupado, ser traumatizado ou avoado, andar

complicado ou querer se sentir abandonado... Ninguém é

perfeito. Muitas mulheres costumam compreender com

generosidade namorados que somem, não respeitam ho-

rários, não se interessam pelos assuntos delas, não as de-

sejam na cama, não as acompanham em visita a parentes,

não as presenteiam ou não lhes dizem a verdade. Mesmo

assim, o livro “Ele simplesmente não está a fim de você”

chegou recentemente às livrarias se achando a cartilha

da libertação feminina. Dos autores Greg Behrent e Liz

Tuccillo, a publicação diagnostica e cataloga as mais vari-

adas formas masculinas de descaso, manipulação, indife-

rença, menosprezo e negligência. “Ele telefona durante a

semana, mas desaparece no sábado? Abra o olho que é

casado. Vai todas as noites na sua casa mas não assume o

namoro? Dispense! Ele está só ‘passando uma chuva.’ Che-

gou de viagem, virou pro lado e dormiu? Caia fora, ele está

pensando em outra.” Ufa! Que seria de nós, mulheres, se

não tivesse aparecido em tempo essa verdadeira bíblia sobre

o óbvio! Compre vários exemplares! Use um na bolsa, um na

mesa de cabeceira, um na cintura e outro junto da lista

telefônica! Esteja prevenida!...

Depois do mico de ficar na fila do caixa agarrada

num livro com esse título, fui comentá-lo com outras

mulheres e ouvi uma delas dizer: “Não deve existir nenhu-

ma mulher que não tenha cometido, em algum momento

de sua vida, pelo menos um dos mil pecados que o livro

descreve”. Concordo. Mas alguém já pensou por que razão

uma mulher moderna necessitaria da ajuda de um manual

de bolso para se dar conta dessas aparentes obviedades? Pois

se até hoje não foram escritos livros suficientes sobre o que

não é legal no amor, convenhamos que não faltam clássicos

sobre a ousadia da homarada em chegar junto quando o

negócio é paixão forte. De Adão a Rodrigo Cambará – pas-

sando por Julio César, Romeu e Tristão (só para citar os que

me vêm à mente neste momento) –, eles pulam muros, fa-

zem serenatas, se batem em duelos, abrem mão do paraíso,

tomam porres, tomam veneno, tomam atitudes, mas parados

é que não ficam. Sim, todas nós sabemos muito bem identi-

ficar um homem realmente motivado. O que talvez Greg

Behrent tenha esquecido é que grande parte da beleza do

amor vem justamente dos casos mal-resolvidos. Nelson

Rodrigues, que atacava de conselheiro sentimental nos anos

50, sob o pseudônimo de “Mirna”, poderia muito bem expli-

car a questão dizendo: “Meu filho, qualquer um de nós já

amou errado, já odiou errado... É a soma de todos os amores

falhados que torna o ser humano capaz de amar e de ser

amado”. É, Greg, não é assim tão simples dar conselhos a

uma mulher...

R U Z A A M O N

RUZA AMON É JORNALISTA

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Perfil

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P O R P A U L A T A I T E L B A U M

F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O

Ar

da

pa

lavra

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Perfil

PROCURO UMA ÚNICA PALAVRA: POETA... MÚSICO... CRIA-

DOR... CRIATURA... TITÃ... NÃO ENCONTRO. E NÃO ENCON-

TRO PORQUE É REALMENTE IMPOSSÍVEL DEFINIR ARNALDO

ANTUNES COM UMA SÓ EXPRESSÃO VERBAL. ELE NÃO É

RÓTULO. É PURO CONTEÚDO. ARNALDO DAS MUITAS PA-

LAVRAS: PALAVRA POÉTICA, PALAVRA VISUAL, PALAVRA MU-

SICAL, PALAVRA MOVIMENTO. NASCIDO ARNALDO AUGUSTO

NORA ANTUNES FILHO, ESSE PAULISTA TALVEZ POSSA SER

DEFINIDO MAIS COMO PERFORMER DO QUE COMO PERSO-

NAGEM. SE BEM QUE QUANDO NÃO ESTÁ NO PALCO OU NA

FRENTE DAS CÂMERAS, ARNALDO TEM UMA EXPRESSÃO

CALMA, QUASE CÂNDIDA. CONVERSEI COM ELE NA GALE-

RIA BOLSA DE ARTE, UM POUCO ANTES DA ABERTURA DA

EXPOSIÇÃO PALAVRA IMAGEM, ONDE O DESTAQUE ERA

UMA SÉRIE CALIGRÁFICA DE MONOTIPIAS QUE ME LEM-

BROU MIRÓ. NOS BASTIDORES DA CONVERSA, ARNALDO

DEU ATENÇÃO PARA UMA FÃ, RECEBEU PRESENTES, FOI

SIMPÁTICO COM TODOS. O QUE ME FEZ PENSAR QUE TAL-

VEZ EXISTA UMA PALAVRA, SIM, UMA MICROPALAVRA CON-

TIDA NO SEU PRÓPRIO NOME: AR. ARNALDO ANTUNES É

AR. ETÉREO E FUNDAMENTAL...

UMA IMAGEM VALE POR MIL PALAVRAS?

Isso é uma máxima que funciona para uma determina-

da circunstância. Claro que você ver uma cena pode ser

muito mais revelador do que um monte de gente te contar

o que tinha naquela cena. Agora, a palavra poética não é

bem a palavra, é quase como se ela fosse uma cena. Mes-

mo quando ela está desprovida do tratamento visual que

eu dou, que também é pensado junto, estruturalmente, ela

apresenta o mundo muito mais do que diz ele. Então eu

diria que sim, uma imagem vale por mil palavras. Mas a

palavra poética não seria uma dessas mil aí.

COMO É O SEU PROCESSO DE CRIAÇÃO?

Depende... Ou o poema já vem impregnado de pensa-

mento visual ou vem o texto primeiro e eu descubro uma

forma gráfica. Agora, nesse trabalho de monotipia, quase

que o visual vem antes, tem um pré-texto na cabeça, mas

o fazer é muito obsessivo, muito físico, muita tinta, acaba

sendo um exercício da poesia vindo da coisa caligráfica.

VOCÊ FICA O TEMPO INTEIRO PENSANDO NAS PALAVRAS, NA

SONORIDADE DELAS?

Eu fico. Na verdade, eu não distingo trabalho de lazer, o

meu trabalho é o tempo todo. Hoje, por exemplo, eu acordei

com uma idéia, aí fui anotar... Pode ser durante a noite, pode

ser andando na rua, essa coisa de as idéias virem... é claro que

a palavra em si tem uma dimensão visual, uma dimensão so-

nora... Os poemas têm uma carga fonética importante...

COMO VOCÊ DEFINIRIA A SUA RELAÇÃO COM AS PALAVRAS?

O código verbal é como se fosse um porto seguro de

onde eu parto pra visitar outros códigos. Eu faço música,

faço canções, uso a palavra cantada. Faço trabalhos visuais,

“A PALAVRA POÉTICA NÃO É BEM A PALAVRA,

É QUASE COMO SE ELA FOSSE UMA CENA”

92 Estilo Zaffari

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Perfil

“TEM UMA MÚSICA

EM QUE EU

DIGO: SOMOS

O QUE SOMOS,

INCLASSIFICÁVEIS”

palavras para serem lidas e vistas ao mesmo tempo. Faço

vídeo, a palavra falada em movimento... Eu nunca me senti,

por exemplo, artista plástico, o que eu faço é poesia visual.

Também nunca me senti músico, no sentido de querer fazer

música instrumental. Eu faço canções que têm o uso da pa-

lavra associada a todo um universo musical.

COMO VOCÊ SE DEFINIRIA?

Eu faço várias coisas, mas não acho que tenho ne-

nhum mérito por isso. Acho que é apenas uma adequa-

ção à época em que a gente vive, onde está se tornando

cada vez mais comum esse trânsito por várias linguagens.

A tecnologia está resgatando um aspecto meio da comuni-

dade primitiva, onde não havia diferença entre arte e vida,

onde a dança era associada à música que era associada ao

canto religioso que era associado à prática de guerra e à

relação com a natureza... era tudo junto. A civilização foi

dividindo os sentidos do homem, e de certa forma a

tecnologia foi contribuindo pra gente resgatar um pouco

desses laços.

94 Estilo Zaffari

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OK, MAS COMO VOCÊ SE DEFINIRIA, ENTÃO?

Não sei... Eu acho que não precisa. Tem uma música em

que eu digo: somos o que somos, inclassificáveis. Na verdade,

eu estou falando da questão racial no Brasil, mas isso poderia

servir para a minha condição estética pessoal, entende? Eu

prefiro assim. A necessidade de nomear é sempre redutora,

então não precisa disso.

VOCÊ TEM FILHOS?

Tenho quatro.

E COMO É A RELAÇÃO ARTÍSTICA ENTRE VOCÊS? ELES INSPI-

RAM? VOCÊ APRENDE COM ELES?

Eu sou muito influenciado pelo olhar deles. Eu

aprendo tanto com eles quanto eles devem aprender

comigo. Espero que eles aprendam alguma coisa comi-

go... Muito do meu olhar poético vem desse convívio com

criança. O olhar da criança é muito virgem, essa coisa de

fazer associações com o que vê... Eu já usei literalmente

frases dos meus filhos. A própria construção gramatical,

por exemplo. Criança fala “beija eu” em vez de “me beija”.

QUAL A PALAVRA QUE VOCÊ MAIS USA?

Em português acho que a palavra que a gente mais usa

é “é”. Essa maçã “é” vermelha. Isso “é” bonito... Pro chinês

e pro tupi não existe o verbo ser como verbo de ligação.

Tanto que a gente vê nos filmes americanos índio falando:

“maçã vermelha”, “índio bonito”... O ser não tá deslocado

da palavra.

SE VOCÊ PUDESSE, TIRARIA O VERBO “SER” DA NOSSA LÍNGUA?

Acho que a gente já tira um pouquinho fazendo poesia...

EXISTE ALGUMA IMAGEM QUE VENHA COM FREQÜÊNCIA À SUA

CABEÇA?

(Silêncio) Não...

E UMA IMAGEM INESQUECÍVEL...

O parto dos meus filhos. Assisti a todos e foi uma coisa

maravilhosa...

Estilo Zaffari 95

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ISSO QUER DIZER QUE O QUE TORNA UMA IMAGEM INESQUECÍ-

VEL É A EMOÇÃO QUE ESTÁ CONTIDA NELA?

Pode ser, mas eu acho que a memória não obedece tan-

to à emoção. Às vezes a gente lembra muito bem de coisas

irrelevantes emocionalmente, e existem outras coisas que

podem ser importantíssimas e que você esquece. Então eu

acho que a coisa seletiva da memória não obedece tanto

assim à emoção. Mas claro que algumas imagens são

marcantes por serem muito intensas.

O QUE VOCÊ GOSTARIA DE FAZER E NUNCA FEZ?

Gostaria de saltar de pára-quedas. Tenho vontade e

ainda vou fazer.

QUAL A SUA COR PREFERIDA?

Quando eu era criança, verde. E eu me apeguei a isso

e acho que continua sendo, mais por um apego com essa

coisa da infância.

VOCÊ TEM FOME DE QUÊ?

Ah, de um monte de coisas...

ALGUMA FOME MAIS IMEDIATA?

Não, o que eu quero fazer eu estou fazendo... A coisa

mais imediata que eu quero fazer é respirar. A consciência

disso é importante.

PRA CONQUISTAR VOCÊ, QUE PRATO UMA PESSOA DEVERIA

PREPARAR?

Cuscuz de camarão.

VOCÊ COZINHA?

Adoro cozinhar, mas tenho muito pouco tempo. En-

tão raramente eu consigo ter a serenidade pra fazer algu-

ma coisa e tal, mas quando dá pra fazer é muito bom.

TEM ALGUMA ESPECIALIDADE?

Ah, adoro fazer massas... tem muita coisa... Fazer faro-

fa... Eu sou um bom fazedor de farofa.

VOCÊ É UM APAIXONADO PELAS LETRAS NO SENTIDO LITERAL

DA PALAVRA?

Eu gosto de caligrafia, sou apaixonado por essa coi-

sa da caligrafia desde muitos anos atrás. O meu primeiro

livro era todo caligráfico, eu fiz uma exposição de cali-

grafia no começo dos anos 80... Aí sempre fui fascinado

pela escrita antiga oriental, essa tradição milenar, ára-

be, chinesa, que é maravilhosa. Acabei sempre pensan-

do essa coisa caligráfica como uma forma de entonação

gráfica que sugere sentidos para além do que o discurso

verbal está dizendo, você teria uma expressividade atra-

vés da maneira como escreve, curvatura do traço, do tre-

mor da mão...

VOCÊ SE INTERESSA POR GRAFOLOGIA?

Já me interessei, mas é uma coisa mais mística. Mas

eu acho interessante porque tem toda uma ciência, e eu

já comprei alguns livros de grafologia muito inspirado nis-

so... Uma época eu também me interessei por taquigrafia,

que é uma forma resumida de escrever, escrita rupestre.

Esse interesse por caligrafia se desdobra em outros...

Perfil

“A COISA MAIS IMEDIATA QUE EU QUERO FAZER É

RESPIRAR. A CONSCIÊNCIA DISSO É IMPORTANTE”

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Page 94: Revista Estilo 34

Assim, ó...

Mesmo sem ir até lá, a leitura pode nos aproximar do Japão

Meu repertório de viagens é restrito à América do Sul e à Euro-

pa, com uma brevíssima escapada a Tânger, no Marrocos, e isso só

porque, estando no sul da Espanha, amigos fizeram toda a força para

cruzar o estreito de Gibraltar, só pra depois poder dizer “Cruzamos

Gibraltar” ou “Fomos à África”. Conto isso para dizer que países de

magnífica história e cultura, como a Índia e o Japão, nunca passaram

pelas minhas hipóteses de direção de passeio. Nem vão, acho eu.

A densidade histórica desses países velhos talvez seja insuportá-

vel para um ocidental, que é um homem recente. Ouvi não faz muito

uma historinha real ocorrida com uma conterrânea nossa que dá aulas

na Coréia. Perguntada sobre o que se estudava no curso de Letras no

Brasil, ela disse que, entre outras, se estudava a literatura brasileira e a

portuguesa. O coreano que fez a pergunta, também letrado, fez cara de

espanto: como assim, a literatura brasileira e a portuguesa? Ele queria

saber, em seu desolamento, se a gente tinha a pecha, ou o descaramen-

to, ou a loucura, de estudar toda a literatura brasileira e toda a portu-

guesa. Sim, respondeu nossa representante na conversa. E então ela

começou a entender um pouco aquele país: para um coreano, é impos-

sível estudar a literatura coreana, que tem, sei lá, uns 5 mil anos de vida

e seus milhares de autores, ao longo de séculos. Só em mais de uma

encarnação seria possível freqüentar tamanho patrimônio.

Que dizer então da Índia e do Japão? Eu pouco digo; conheço

os limites da minha ignorância. Tenho pedaços de leitura do magní-

fico Mahabharata, conjunto de lendas indianas talvez mais vasto que

a obra de Homero, e mais umas dentadas nos Upanishades; do Ja-

pão, conheço uns poemas, mais o recente romancista Kenzaburo Oe.

Fico imaginando a quantidade e a potencial maravilha da experiên-

cia humana transformada em arte, lá naquela Terra do Sol Nascen-

te, onde jamais porei os pés.

Terra do Sol Nascente: este é um dos cognomes do Japão, cujo

nome é já um mistério para nós, ocidentais. Segundo uma fonte de

grande interesse (El origen de los nombres de los países del mundo – y

de mucha de las islas que éstos poseen, de Edgardo Otero, publicado

pela Editorial De Los Cuatro Vientos, Buenos Aires, 2003), os chine-

ses, mais velhos ainda que os japoneses, usavam para designar o Japão

uns signos que significam “sol” e “origem” ou “fonte”, de maneira que

para eles, chineses, o nome do arquipélago japonês era uma composi-

ção que acabava significando “origem do sol”. Isso porque também

para os chins, assim como para nós, é de lá que vem o sol.

Os japoneses teriam passado a chamar-se com uma palavra

que seria “Ni-Hom” ou “Ni-Pon”, resultado da pronúncia deles para

os signos chineses. Quando o valente italiano Marco Polo andou por

lá, ouviu esta palavra, à qual se acrescentava uma partícula “guo”,

que significa “terra”, “país”. Mas o que ouviu, com seus ouvidos oci-

dentais, não era “Niponguo”, isto é, “Terra do Sol Nascente”, mas

“Cipango”, e foi esta a forma que ficou consagrada aqui no nosso

lado do planeta. Já o nosso Houaiss, o melhor dicionário da língua

portuguesa disponível, diz que a palavra Japão tem origem malaia

(pronuncia-se|djapã|). De forma que “Cipango” era “Nipon” mas

acabou se transformando em “Japão”, forma portuguesa.

Ainda esses dias foram lembrados os 60 anos de uma atroci-

dade que o Ocidente, especificamente os Estados Unidos (um país

sem nome, conforme disse Caetano Veloso), cometeu contra duas

cidades japoneses, Hiroshima e Nagasaki. Bombas atômicas jogadas

contra população civil é qualquer coisa de demencial. Não sei se há

como corrigir; mas para amenizar, sempre há leituras: Crônicas ja-

ponesas, do francês Nicolas Bouvier (L&PM); Viagem ao Japão, uma

edição ilustrada concebida por Renata Cordeiro (Landy editora),

com dados da cultura e da história, além de uma excelente coletâ-

nea de poemas e gravuras japonesas; e Luis Fernando Verissimo, com

a parceria do Joaquim da Fonseca, em seu Traçando o Japão (Artes e

Ofícios). Aliviam o peso de nossa ignorância e nos aproximam da

sensacional cultura japonesa.

L U Í S A U G U S T O F I S C H E R

LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR

JAPÃO TÃO LONGE

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